Acórdão nº 1994/09.6TBVIS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 06 de Março de 2012

Magistrado ResponsávelTELES PEREIRA
Data da Resolução06 de Março de 2012
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra I – A Causa 1.

Em 12/06/2009[1], D… e a sociedade V…, Lda.

(AA. e Apeladas no presente recurso), demandaram o Banco A… (R. e aqui Apelante), invocando a constituição em 2007 de alguns depósitos a prazo neste Banco, a 90 dias e com uma remuneração mínima de 5,2% e máxima de 8%, sendo que a aplicação em moeda estrangeira (dólares e libras esterlinas) pelo Banco dos valores depositados pelas AA., não envolveria – e estamos a reproduzir a tese das AA. expressa no articulado inicial –, em função de alterações cambiais desfavoráveis (depreciações da moeda em causa relativamente ao euro), qualquer diminuição do valor depositado em euros e remunerado à taxa mínima de 5,2%[2].

Sucede que, tendo as AA. detectado em Novembro de 2007 diminuições no valor inicialmente depositado, na contabilização feita pelo Banco R., desencadearam uma reunião (em 27/11/2007) com este visando resgatar imediatamente os depósitos no seu valor em euros, sendo que, mediante contraproposta do Banco (apresentada nesta reunião através do seu representante …), teria ficado subsequentemente consensuado o seguinte: “[…] Face às propostas apresentadas pelo Banco ficou verbalmente acordado entre as partes (Banco, aqui R./AA. […]) o seguinte: Os depósitos mantiveram-se na agência e o Banco, aqui R., ficou com o direito de gerir por sua conta e risco os depósitos até 27/05/2008, e obrigou-se a, nesta data de vencimento, devolver, em euros, às AA. os capitais iniciais depositados em euros e remunerados a uma taxa de juro de 5,2% ao ano e computados desde as datas de constituição referidas no artigo 2º da p.i.

[…]” [transcrição de fls. 6].

Sucede que o R. – e continuamos a indicar os argumentos das AA. – não cumpriu este acordo “[propondo-se], apenas, reembolsar, em euros, às AA. o capital inicialmente depositado, alegando prejuízos com esta operação” (transcrição de fls. 7), apenas creditando as contas dos AA. por este valor sem os juros à taxa (combinada com as AA.) de 5,2%.

É, pois, o valor dos juros – desses juros à taxa de 5,2% e tomando como data de vencimento 27/05/2008 – que as AA. pretendem obter na presente acção, formulando os seguintes pedidos: “[…] [Ser] a R. condenada a pagar o seguinte: 1. À 1ª A., e com respeito ao depósito supra 2.1.1.: a quantia, de capital, no montante de €19.557,53, acrescendo €724,43 de juros vencidos[[3]], e nos que se vencerem à taxa de 05,20% até integral pagamento; 2. À mesma A. e com respeito ao depósito supra 2.1.2.: a quantia, de capital, de €5.307,96, acrescendo €196,61 de juros vencidos, e nos que se vencerem à taxa de 05,20% até integral pagamento; 3. À 2ª R. e com respeito ao depósito supra 2.2.1.: a quantia, de capital, no montante de €2.435,89, acrescendo €84,96+€91,30 de juros vencidos, e nos que se vencerem segundo as taxas estabelecidas pela Portaria nº 1105/02, de 16/10, e que actualmente é de 09,50%, até integral pagamento; 4. À 2ª A. e com respeito ao depósito supra 2.2.2.: a quantia, de capital no montante de €41.249,86, acrescendo €1.438,71 + €1.556,75 de juros vencidos, e nos que se vencerem segundo as taxas estabelecidas pela Portaria nº 1105/02, de 16/10, e que actualmente é de 09,50%, até integral pagamento.

[…]” [transcrição de fls. 12/13] 1.1.

A R. contestou impugnando a pretensão das AA. referindo aqueles depósitos a prazo em moeda estrangeira, no seu retorno aos depositantes, às contingências das flutuações cambiais, podendo estas originar, por depreciação da moeda considerada relativamente ao euro, valores inferiores ao depósito inicial em euros. Foi – afirma-o o R. – o que sucedeu com os depósitos das AA. em moeda estrangeira, logo à partida e posteriormente à falada reunião de 27 de Novembro de 27/11/2007[4].

1.2.

Realizado o julgamento, fixados que foram, a culminar este, os factos provados (vale a tal respeito o despacho de fls. 419/422), foi a acção decidida através da Sentença de fls. 426/437 – esta constitui a decisão objecto do presente recurso –, julgando-a integralmente procedente, condenando o R. nos seguintes termos: “[…] [P]agar às AA.: a) D… a quantia global de €24.865,59 (vinte e quatro mil oitocentos e sessenta e cinco euros e cinquenta e nove cêntimos) acrescida de juros vencidos e vincendos desde 8 de Setembro de 2008 à taxa de 05,20% até integral pagamento; b) V…, LDª, a quantia global de €43.685,75 (quarenta e três mil seiscentos e oitenta e cinco euros e setenta e cinco cêntimos) acrescida de juros vencidos e vincendos, às taxas legais comerciais que se forem sucedendo desde 8 de Setembro de 2008 até integral pagamento.

[…]” [transcrição de fls. 437] 1.3.

Inconformado com a perda da acção, apelou o Banco R. a fls. 442/543, formulando as seguintes conclusões a rematar a motivação: “[…] 1.3.1.

As Apeladas responderam ao recurso pugnando pela confirmação da Sentença recorrida.

II – Fundamentação 2.

Neste recurso, como em qualquer outro, as conclusões – mesmo quando, como é o caso, apresentam extensão manifestamente desproporcionada aos argumentos pretendidos esgrimir no recurso – operam a delimitação temática do respectivo objecto, nos termos dos artigos 684º, nº 3 e 685º-A, nº 1 do Código de Processo Civil (CPC)[5].

Assim, reconduzindo as conclusões à sua verdadeira essência, constata-se pretender o Banco Apelante, desde logo – no que constituirá o primeiro fundamento do recurso (a) – discutir uma parte substancial dos factos considerados provados na primeira instância (os consubstanciados nas respostas aos quesitos 1º a 9º e 13º e 14º da base instrutória), através da suscitação do exercício por este Tribunal dos poderes de modificação da decisão de facto previstos nos nºs 1 e 2 do artigo 712º do CPC[6]. Adicionalmente – no que constituirá o segundo fundamento do recurso (b) – pretende a Apelante, com ou sem a almejada modificação dos factos, discutir os pressupostos jurídicos que conduziram o Tribunal a quo ao resultado decisório expresso na procedência da acção, por consideração da relevância de uma alteração ao contrato de depósito primitivo (introduzida numa reunião ocorrida em 27/11/2007) que projectava a permanência do depósito até 27/05/2008, com a restituição, então, do capital remunerando-o, pelo menos, à taxa de 5,2% – note-se que estamos a expor a ratio decidendi do pronunciamento da primeira instância, nos termos em que esta resulta do trecho expositivo de fls. 435/437 da Sentença.

Da Questão de Facto 2.1.

Os factos fixados na primeira instância foram os seguintes (e são aqui indicados com a ressalva de que o recurso do Apelante visa alterá-los em alguns pontos que a transcrição infra assinalará): “[…] 2.2. (a) Interessa a este primeiro fundamento do recurso, como ponto de partida, o elenco dos factos acabado de transcrever, estando em causa, como indicámos acima, as respostas positivas (todas as respostas aqui contestadas foram de teor irrestritamente positivo) aos quesitos 1º a 9º e 13º e 14º da base instrutória de fls. 356/359[7], respostas estas que vieram a originar os itens 17 a 21 e o item 23 do elenco dos factos provados.

Está em causa no primeiro grupo destes factos (17 a 21), grosso modo, a caracterização das incidências dos depósitos a prazo em moeda estrangeira contratados entre o Banco R. e as AA., particularmente no que respeita à repercussão do risco da aplicação em moeda estrangeira desses depósitos na integralidade do capital depositado em euros. O segundo bloco de factos, que acabaram por corresponder, agregadamente considerados, ao item 23, respeita ao acordo adicional de alteração dos termos do depósito – e estamos a seguir, como explicitaremos mais à frente, o iter decisório da Sentença apelada – decorrente da reunião de 27 de Novembro de 2007 entre o cliente V… (quem contratou em nome das AA.) e os funcionários do Banco R. ...

Note-se que foi este segundo aspecto dos factos, expresso no item 23, e não tanto os factos em causa nos itens 17 a 21, em si mesmos considerados, que acabou por funcionar como verdadeira ratio decidendi da procedência da acção, sendo certo que o Tribunal a quo acabou por referir a condenação do Banco a satisfazer aquelas quantias não tanto ao sentido do acordo inicial, nos termos em que o caracterizou, como ao acordo adicional – rectius, à posterior alteração do contrato – decorrente da reunião de 27/11/2007 indicada no ponto 14 do mesmo elenco de factos, sendo através do item 23 que determinamos alcançamos qual foi o resultado desta reunião. Queremos com isto dizer, enfim, que não sendo irrelevantes os termos (iniciais, chamemos-lhe assim) em que foram contratados os depósitos a prazo no Banco R. – e os factos não deixam de descrever essa incidência nos itens 17 a 21 –, acabou por ser o que, independentemente de tudo o mais, foi acordado nessa reunião de 27 de Novembro que acabou por determinar a condenação do Banco naquilo que mais não expressou que o adicionar à devolução do capital em euros o valor correspondente à aplicação a este da taxa de juros de 5,2%[8].

2.2.1. (a) Numa caracterização geral dos termos em que aqui, na segunda instância, se procederá ao reexame dos factos, sublinharemos assentar essa reapreciação no que consideramos corresponder a um indeclinável dever de valoração directa dos elementos probatórios documentais existentes nos autos, propostos como fontes de prova por ambas as partes ao longo da marcha do processo, e numa valoração mediata da prova pessoal (da prova testemunhal) adrede produzida. O carácter intrinsecamente mediato (indirecto se assim quisermos dizer as coisas) do controlo deste último tipo de prova (a prova pessoal oralmente produzida perante o julgador a quo), controlo que assenta na audição de registos áudio aos quais escapam, pela própria natureza das coisas, uma ou outra das incidências significativas do acto probatório presenciado pela instância precedente. Tal carácter mediato da percepção associada ao acto de reapreciação referido a esta dimensão da prova, não conduz, todavia, a que...

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