Acórdão nº 3610/10.4TAALM.L1-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 07 de Fevereiro de 2012

Magistrado ResponsávelLUÍS GOMINHO
Data da Resolução07 de Fevereiro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência na (5.ª) Secção Criminal da Relação de Lisboa: I – Relatório.

I - 1.) No Tribunal de Família e Menores de Almada, o Ministério Público, nos autos em epígrafe, requereu a abertura da fase jurisdicional do processo tutelar educativo contra o menor A..., melhor identificado, imputando-lhe a prática, em co-autoria material e na forma consumada, de três crimes de violação p. e p. pelo art. 164.º, n.º1, do Cód. Penal, e de um crime de roubo, p. e p. pelo art. 210.º, n.º 1, ambos com referência ao art. 26.º do mesmo diploma.

Efectuado o julgamento e proferido o respectivo acórdão, veio o menor a ser absolvido de todas as referidas imputações, razão pela qual inconformado, recorreu o Ministério Público para esta Relação, sustentando as seguintes conclusões: 1.ª - Discorda-se da douta sentença em crise por ser omissa quantos a elementos materiais recolhidos no local e tempo do ilícito com relevância criminal e por não atender prova testemunhal - depoimento da vítima - junta aos autos.

  1. - A douta sentença em crise não faz referência a elementos materiais recolhidos no local e tempo da actividade ilícita com relevância penal: um casaco com capuz reconhecido como sendo pertença do menor agressor. Tal omissão inquina-a de nulidade, nos termos combinados do n.º 2 do art. 110.º, e art. 111.°, al. a), da Lei Tutela Educativa (Lei 166/99, de 14/09).

  2. - No caso dos autos, daí também nossa discordância, está em causa não a validade de depoimento efectuado para memória futura no âmbito de um processo penal, figura não prevista na lei tutelar educativa nem exigida, como ressalta da formulação escolhida pelo legislador no n.º 4 do art. 66.° da LTE, mas antes a validade de elementos probatórios legais recolhidos em processo criminal conexo, e que no caso concreto se reporta a declarações prestadas por uma vitima menor de 16 anos de idade prestadas no processo criminal conexo perante juiz de Instrução. Com efeito, 4.ª - A Lei Tutelar Educativa contempla normas relativas à aquisição de provas designadamente no que concerne ás declarações de menores agressores e de vítima/ofendida, menor de 16 anos, art. 66° da LTE. Ver ainda o princípio enunciado na al. a) do art. 45.° da LTE, este relativamente ao menor agressor.

  3. - Donde, ao importar-se, quanto a essa núcleo de questões, sem mais, normas processuais penais, como é feito viola-se o princípio da subsidiariedade vertido no art. 128.º da LTE.

  4. - A razão de ser, em crimes contra a autodeterminação sexual de menores, da obrigatoriedade de prestação de depoimento de menor para efeitos de memória futura, no âmbito do processo penal, previsto no art. 271.° do Cód. Proc. Penal, prende-se com a protecção da vitima menor e no equilíbrio desta tutela com a tutela de garantir os direitos do arguido em processo penal, nos termos do estatuto deste previsto no normativismo processual penal em, processo criminal.

  5. - No processo Tutelar Educativo não existem arguidos, e o estatuto de arguido, destinado a maiores de 16 anos, é acautelado no Cód. Processo Penal. Por seu turno, o conjunto dos direitos do agressor menor de 16 anos de idade vem previsto no art. 45° da LTE.

  6. - São estatutos distintos. Do ponto de vista meramente formal, só por aí seria de entender que o acautelamentos dos direitos menores de 16 anos que pratiquem factos qualificados como ilícitos criminais, havendo normas próprias na LTE, o justo equilíbrio desse acautelamento com o de outros sujeitos tutelados em Processo Tutelar Educativo não tem de passar por recurso ao Cód. Proc. Penal. Só por aí seria de entender a não aplicabilidade do disposto no art. 271.º do C.P.P em sede de situações abrangidas pela LTE.

  7. - O n.º 4 do art. 66.° da LTE prevê a questão das declarações de vítima menor de 16 anos cujos interesses também são acautelados na Lei Tutelar Educativa.

  8. - Extrai-se do indicado normativo uma maior protecção deste tipo de vítima - menor de 16 anos - na medida em que só prestará declarações quando a autoridade judiciária o entender por conveniente.

  9. - Necessário é que a aquisição dessa prova seja feita de forma legal. Protege-se aqui, pois, em maior grau o interesse da vitima menor de 16 anos, do que propriamente o escopo de direitos do menor agressor, salvaguardados no art. 45° da LTE.

  10. - Na expressão escolhida pelo legislador na LTE, seu art. 66.º, n.º 4, “o ofendido é inquirido quando a autoridade judiciária (...) o entender (...) conveniente” tem de acolher o depoimento de vítima menor de 16 anos inquirida perante juiz de instrução, na presença de magistrado do Ministério Público e de advogados. Esse é um acto solene, e garantístico, tenham as declarações da vítima menor de 16 anos sido prestadas no âmbito de prestação de depoimento para memória futura ou outro tipo de acto judicial, em processo criminal.

  11. - O art. 106.º, n.º 2, al. b), da LTE, conjugado com o indicado 66.º, n.º 4, prevê e permite a leitura de tais depoimentos.

  12. - A douta sentença absolutória em crise, cuja fundamentação faz tábua rasa de tal depoimento, por via de despacho nulo, o que oportunamente se invocou, está pois inquinada de nulidade, por errada interpretação e aplicação de normativismo processual penal já que se olvidam as regras próprias do processo Tutelar Educativo, ao invocar normas processuais penais, nos termos em que o fez, designadamente a nulidade insanável prevista na al. c) do art. 119.°, do Cód. Processo Penal, inquina de nulidade, e é violado o disposto no art. 128.° da LTE que apenas manda aplicar o Código de Processo Penal, subsidiariamente, o que não é o caso por dispor a LTE de normativismo próprio e, consequentemente, também viola o disposto nos art.ºs 66.º, n.º 4 e 106.º, n.º 2, al. b), todos da LTE.

    Termos em que deve ser declarado nula a douta sentença absolutória e ordenado a repetição do julgamento.

    I – 2.) Não foi apresentada qualquer resposta.

    I – 3.1.) Posto que o Digno recorrente não tenha dado cumprimento à especificação constante do n.º 5 do art. 412.º, do Cód. Proc. Penal (aqui aplicável subsidiariamente ex vi do art. 128.º da LTE), ou seja, a indicação de eventuais recursos retidos nos quais mantém interesse, a verdade é que, dos autos se evidencia que na acta da sessão de julgamento que teve lugar no dia 27/09/2011, o Ministério Público havia interposto um outro, reagindo ao despacho então proferido pela Mm.ª Juiz Presidente (cfr. fls. 246 a 248), que considerou nula a prova traduzida nas declarações para memória futura da testemunha B... prestadas em processo crime, junta em momento anterior.

    I – 3.2.) Nesse recurso (cfr. fls. 269 a 282), mostram-se formuladas as seguintes conclusões: 1.ª - O douto despacho recorrido, lavrado em acta na sessão de audiência do ITE, em 27/09/2011, a fls. 245 (será antes 246), declara nula prova já admitida pela mesma juiz a quo e instância jurisdicional por despacho de 15/07/11, a fls. 166.

  13. - Ao pronunciar-se, sem mais, sobre questão já decidida nos autos, viola o princípio do caso julgado.

  14. - A Lei Tutelar Educativa contempla normas relativas à aquisição de provas designadamente no que concerne ás declarações de menores agressores e de vítima/ofendida, menor de 16 anos, art. 66° da LTE. Ver ainda o princípio enunciado na al.a) do art. 45° da LTE, este relativamente ao menor agressor.

  15. - Donde, ao importar-se, quanto a essa núcleo de questões, sem mais, normas processuais penais, como é feito no Despacho em crise, viola-se o principio da subsidiariedade vertido no art. 128° da Lei n.º 166/99, de 14/12 - LTE.

  16. - A razão de ser, em crimes contra a autodeterminação sexual de menores, da obrigatoriedade de prestação de depoimento de menor para efeitos de memória futura, no âmbito do processo penal, previsto no art. 271° do Cód. Proc. Penal, prende-se com a protecção da vitima menor e no equilíbrio desta tutela com a tutela de garantir os direitos do arguido em processo penal, nos termos do estatuto deste previsto no normativismo processual penal em, processo criminal.

  17. - No processo Tutelar Educativo não existem arguidos, e o estatuto de arguido, destinado a maiores de 16 anos, é acautelado no Cód. Processo Penal. Por seu turno, o conjunto dos direitos do agressor menor de 16 anos de idade vem previsto no art. 45° da L TE.

  18. - São estatutos distintos. Do ponto de vista meramente formal, só por aí seria de entender que o acautelamentos dos direitos menores de 16 anos que pratiquem factos qualificados como ilícitos criminais, havendo normas próprias na LTE, o justo equilíbrio desse acautelamento com o de outros sujeitos tutelados em Processo Tutelar Educativo não tem de passar por recurso ao Cód. Proc. Penal. Só por aí seria de...

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