Acórdão nº 2289/2006-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 13 de Dezembro de 2007

Magistrado ResponsávelRIJO FERREIRA
Data da Resolução13 de Dezembro de 2007
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA: I - Relatório Manuel e outros e Cooperativa de Habitação Mar da Palha CRL intentaram acção declarativa de condenação sob a forma de processo ordinário contra Parque Expo 98 SA e Vodafone/Telecel, Comunicações Pessoais SA pedindo a condenação destes a demolirem a frontaria e os aspectos do edifício sede da Vodafone que contrariam o plano de pormenor originário e a pagar uma indemnização por danos patrimoniais e morais, que até à propositura da acção liquidam em € 14.964.

Alegam, para fundamentar tal pedido, que a primeira Ré, enquanto vendedora do terreno em que edificaram e habitam o edifício Gil Eanes, se comprometeu a respeitar o enquadramento urbanístico definido no plano de urbanização do local, sendo que veio a permitir a construção nas imediações do seu edifício do edifício sede da segunda Ré, o qual desrespeita as directrizes do referido plano de urbanização - facto conhecido e querido também pela segunda Ré - causando-lhes desvalorização do edifício e stress, desgosto e desilusão pela frustração das expectativas de usufruírem do enquadramento urbanístico planeado.

Foi chamado a intervir como parte principal BPI Pensões, Sociedade Gestora de Fundo de Pensões SA enquanto proprietária do terreno onde estava a ser erigido o edifício de que a segunda Ré era promotora e promitente arrendatária.

RR e chamada contestaram excepcionando a ineptidão da petição inicial, a ininteligibilidade do pedido, a incompetência absoluta do tribunal, a ilegitimidade activa e passiva e ilegal coligação de autores e por impugnação.

No despacho saneador foram desatendidas as excepções invocadas, com excepção da ininteligibilidade do pedido quanto à demolição dos aspectos da frontaria do edifico com a consequente absolvição da respectiva instância.

Inconformados, agravaram os AA daquela absolvição da instância; e a chamada recorreu subordinadamente da mesma.

Foi elaborada base instrutória, da qual os AA reclamaram sem sucesso.

No decorrer da audiência de julgamento foi proferido despacho de não admissão de depoimento de uma testemunha a determinados quesitos.

Inconformados, agravaram os AA.

Posteriormente foi proferido despacho a ordenar o desentranhamento de documentos.

Inconformados, agravaram os AA.

A final foi proferida sentença que, considerando indemonstrada qualquer desconformidade entre as características do edifício Vodafone e aquilo a que se havia comprometido a 1ª Ré, julgou improcedente a acção, absolvendo as RR e a interveniente do pedido.

Inconformados, apelaram os AA, concluindo, em síntese, por errónea elaboração da base instrutória, erro na decisão da matéria de facto e erro de julgamento.

Houve contra-alegações onde se propugnou pela improcedência da apelação.

A Cooperativa de Habitação Mar da Palha CRL veio, entretanto, desistir do pedido, desistência essa que, limitada aos interesses da desistente, foi homologada por sentença que transitou em julgado.

Nesta Relação foi negado provimento aos agravos interpostos, com excepção do agravo do despacho que não admitiu o depoimento de testemunha, tendo sido ordenada a repetição do julgamento "por forma a poder ser inquirida a testemunha em causa aos factos que a parte indicar"; e não se conheceu, por prejudicada, da apelação.

Voltados os autos à 1ª instância e tendo sido designado para a inquirição da referida testemunha o dia 23ABR2007, recebeu-se notícia de que a mesma havia falecido.

Tal facto foi comunicado ao mandatário dos AA através do registo RJ097529685PT, de 7MAR2007.

Por comunicação electrónica de 3ABR2007 vieram os AA requerer a substituição da testemunha, a qual foi indeferida com fundamento em extemporaneidade, decretando-se a subida dos autos à Relação para conhecimento da apelação.

Inconformados, agravaram os AA concluindo, em síntese, pela admissibilidade da substituição da testemunha e pela inexistência de apelação a ser conhecida pela Relação.

Contra-alegou a chamada propugnando pela improcedência do agravo.

II - Questões a Resolver Consabidamente, a delimitação objectiva do recurso emerge do teor das conclusões do recorrente, enquanto constituam corolário lógico-jurídico correspectivo da fundamentação expressa na alegação, sem embargo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer ex officio(1).

De outra via, como meio impugnatório de decisões judiciais, o recurso visa tão só suscitar a reapreciação do decidido, não comportando, assim, ius novarum, i.e., a criação de decisão sobre matéria nova não submetida à apreciação do tribunal a quo(2).

Ademais, também o tribunal de recurso não está adstrito à apreciação de todos os argumentos produzidos em alegação, mas apenas - e com liberdade no respeitante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito - de todas as "questões" suscitadas, e que, por respeitarem aos elementos da causa, definidos em função das pretensões e causa de pedir aduzidas, se configurem como relevantes para conhecimento do respectivo objecto, exceptuadas as que resultem prejudicadas pela solução dada a outras(3).

Assim, em face do que se acaba de expor e das conclusões apresentadas, são as seguintes, e já logicamente ordenadas, as questões a resolver por este Tribunal: 1. - se deve ser admitida a substituição da testemunha falecida; 2. - se há apelação a conhecer; 3. - se houve incorrecta elaboração da base instrutória; 4. - se ocorreu erro na matéria de facto; 5. - a que se obrigou a 1ª Ré no contrato que celebrou com a Cooperativa de Habitação Mar da Palha CRL; 6. - se os AA se podem prevalecer das obrigações decorrentes desse contrato; 7. - se a 1ª Ré incumpriu esse contrato; 8. - se a 2ª Ré e a chamada são igualmente responsáveis por esse incumprimento; 9. - das consequências desse incumprimento.

III - Do agravo Afastada que está a aplicação do disposto no artº 512º-A do CPC, porque iniciada a audiência de julgamento com a prestação de depoimento, quer das partes quer das testemunhas, em 22FEV2005 (fls 898) e haver a testemunha cuja inquirição foi admitida pelo anterior acórdão desta Relação prestado depoimento (ainda que limitado a parte da matéria de facto) em 2MAR2005 (fls 922), a substituição da testemunha Fernando Azevedo apenas poderia ocorrer nas específicas circunstâncias previstas no artº 629º do CPC, que logo dispõe na 2ª parte do seu nº 1 que "a substituição deve ser requerida logo que a parte logo que a parte tenha conhecimento do facto que a determina".

Aceitando que, não obstante o advérbio ‘logo', o prazo para requerer a substituição é o prazo geral previsto no artº 153º do CPC e que à situação é aplicável o disposto no artº 145º, nº 5, do CPC, o certo é que, tendo sido remetida aos AA notificação do decesso da testemunha em 7MAR2007, a possibilidade de pedir a substituição da testemunha precludiu, como se refere na decisão recorrida, em 27MAR2007. Pelo que o requerimento a substituir a testemunha apresentado em 3ABR2007 é efectivamente extemporâneo.

E do artº 631º do CPC não resulta, como pretende o recorrente, a regra de que a substituição da testemunha pode ser efectuada até cinco dias antes do julgamento. O que ele estabelece é que no caso de substituição de testemunha, regulada no artº 629º, ainda assim a inquirição não pode ocorrer antes de decorridos cinco dias sobre a data em que à parte contrária foi comunicada essa substituição. O que tal disposição intenta é a indicação da forma de nessa particular circunstância garantir a aplicação dos princípios da equidade e lealdade processual e do contraditório, assegurando que a parte contrária tenha efectiva possibilidade de se inteirar sobre a idoneidade da nova testemunha e de poder lançar mãos dos meios processuais da sua impugnação ou contradita.

Absolutamente impossibilitado o depoimento da testemunha e impossibilitada a sua substituição, não há, como pretende o recorrente, lugar a nova audiência e à repetição dos actos subsequentes (designadamente reedição da decisão de facto, da sentença e da interposição de recurso desta).

Desde logo porque, mantendo-se inalterada a situação pré-existente, tal corresponderia a uma mera repetição meramente formal dos actos já praticados, num mero desperdício de tempo e recursos, sem qualquer utilidade. E os actos inúteis são proibidos pelo artº 137º do CPC.

Por outro lado, a anulação do julgamento para que fosse possibilitada à parte a inquirição da testemunha por si apresentada a toda a matéria de facto a que a quisesse indicar não implica, por si só, a invalidação de tudo o concomitante ou subsequentemente praticado. Pelo contrário vigora como princípio geral de direito "o máximo aproveitamento dos actos" segundo o qual a invalidade de um acto não abrange a parte não viciada do mesmo, não impede a produção dos efeitos para que, apesar da invalidade, se mostra idóneo e só invalida consequencialmente os actos que se encontrem numa absoluta dependência do acto inválido, e que tem afloramento nas disposições dos artigos 201º, 684º, nº 4, e 714º, nº 4, do CPC.

Por último, é de aplicar igualmente a regra geral, com consagração nos artigos 710º e 752º do CPC, segundo a qual os recursos só devem ser apreciados/providos na medida em que nisso haja utilidade objectiva. E no caso concreto não se vislumbra qualquer utilidade objectiva em estar a determinar a prática de actos em tudo idênticos, porque nenhuma alteração subsequente ocorreu, aos já anteriormente praticados e sobre os quais as partes tiveram efectiva oportunidade de se pronunciar.

Considerando, assim, válidos os actos anteriormente praticados, designadamente a sentença proferida e as subsequentes interposição de recurso e alegações, sem necessidade da sua repetição, evidente se torna a necessidade de, finalmente, se conhecer da apelação oportunamente interposta.

Termos em que conclui pela total improcedência do agravo.

IV - Fundamentos de Facto Oportunamente foi elaborada a seguinte Base Instrutória: 1Na venda do terreno para construir de que os AA. vieram a fruir, a R...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT