Acórdão nº 7/10.0GDPNH.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 18 de Janeiro de 2012
Magistrado Responsável | MARIA JOS |
Data da Resolução | 18 de Janeiro de 2012 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
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Relatório 1. No âmbito do processo comum [singular] n.º 7/10.0GDPNH do 3.º Juízo do Tribunal Judicial da Guarda, mediante acusação pública, foi o arguido A...
, melhor identificado nos autos, submetido a julgamento, vindo-lhe imputada a prática, como autor material, em concurso efectivo, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez e de um crime de violação de proibições, p. e p. respectivamente nos artigos 292º, nº 1, 69º, nº 1, al. a) e 353º, todos do Código Penal.
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Realizado o julgamento, por sentença de 12.04.2011, veio o arguido a ser condenado na pena de 10 [dez] meses de prisão, pela prática de cada um dos sobreditos crimes e, em cúmulo jurídico, na pena única de 1 [um] ano e 4 [quatro] meses de prisão efectiva e, ainda, na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de 26 [vinte e seis] meses.
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Inconformado com a decisão recorreu o arguido, extraindo da respectiva motivação as seguintes conclusões: I. DE FACTO 1ª O arguido estava e está em tratamento ao alcoolismo.
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No dia dos autos trabalhara desde as cinco da manhã e ainda estava em jejum.
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Bebera ao fim da manhã Ricard oferecido por um emigrante, mas não pensava em conduzir – do que até estava impedido.
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A pedido de uma vizinha – para passar com a burra – desviou (levianamente – sim) o tractor, para cerca de 10 metros de distância, embatendo com ele na parede.
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Desmaiou, chegou a mulher, o INEM e a G.N.R.
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Confessou ao Tribunal que foi ele quem conduziu e o fez por necessidade da vizinha, tendo agido negligentemente.
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Está arrependido e quer prosseguir a cura do álcool.
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Tem um rebanho de 400 cabeças de gado ovino e caprino, financiadas pelo INGA.
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A sua prisão levará à morte o gado todo e a devolução dos incentivos recebidos.
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A solução será ver a pena suspensa pela última vez.
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DE DIREITO 11ª Impugna-se a decisão sobre a matéria de facto, nos termos dos artigos 412º, nºs 3 e 4, do Código de Processo Penal, na medida em que se considera, que a alínea E) da matéria de facto dada como provada pela Sentença recorrida está incorrectamente julgada.
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O meritíssimo Juiz “a quo” deu como provado tal facto com base na eventual confissão integral e sem reservas do arguido, que não existiu.
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Neste sentido transcreve passagens das declarações que prestou donde retira a falta duma “confissão integral e sem reservas”. – depoimento do arguido Victor Batista Pires (suporte magnético de gravação da audiência – 14:40:51 a 14:57:36).
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Como ficou claramente demonstrado, o arguido não fez uma confissão integral e sem reservas dos factos dos quais vinha acusado, mas tão só uma confissão parcial. Nesta medida nunca poderia o Meritíssimo Juiz “a quo” ter dado como provado o ponto E) dos factos dados como provados.
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Decorre da conclusão anterior que deve ser modificada a decisão sobre a matéria de facto no parágrafo e nos termos assinalados (vide artigo 431º do Código de Processo Penal) e proceder-se a decisão jurídica em conformidade, qual seja a de dar o facto E) da sentença recorrida como não provado.
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De acordo com o n.º 2 do art.º 344º do C.P.P., a confissão integral e sem reservas implica: a) a renúncia à produção da prova relativa aos factos imputados e consequente consideração destes como provados; b) passagem de imediato às alegações orais e, se o arguido não dever ser absolvido por outros motivos, à determinação da sanção aplicável; e c) redução da taxa de justiça em metade.
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A confissão, bem como a decisão sobre o valor da confissão conferido pelo Tribunal, deverá ficar documentada em acta de audiência de julgamento, segundo as regras gerais (cf. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 09/10/91, in Boletim do Ministério de Justiça, nº 410, página 591).
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Se da gravação das declarações prestadas em audiência de julgamento não resulta inequivocamente que o arguido tenha confessado a totalidade dos factos que lhe são imputados, as declarações que prestou não podem qualificar-se como uma confissão integral e sem reservas e darem-se como provados os factos com base em tais declarações (CFR. Acórdão da Relação de Coimbra in www.djsi.pt Proc. nº 44/10.4EALSB.C1 de 15-12-2010).
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Ora, ouvida e lida a gravação das declarações do arguido constata-se, claramente, que o convite a uma confissão integral e sem reservas com todos os formalismos legalmente exigidos para tal, não foi efectuado.
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Em parte alguma o Meritíssimo Juiz “a quo” questiona o arguido se a sua confissão é integral e sem reservas explicando-lhe em que se traduz tal confissão e as consequências da mesma.
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Antes pelo contrário, o arguido confessa parcialmente os factos, dando uma justificação para a ocorrência dos mesmos e o Meritíssimo Juiz, continua com a produção de toda a prova, ouvindo todas as testemunhas, da acusação e abonatórias que corroboraram a versão apresentada pelo arguido, nomeadamente a testemunha …nas suas declarações gravadas e suporte magnético – 15:06:20 a 15:11:36.
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Nessa medida violou o Tribunal “a quo” o artº 344º, nº 1 do C.P.P., o que constitui uma nulidade, que se invoca.
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Ao considerar provados todos os factos que integram a prática do crime com base numa pretensa “confissão integral e sem reservas”, o tribunal violou o artº 344º do Código de Processo Penal.
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A decisão do Tribunal sobre o carácter livre, integral, verdadeiro e sem reservas da confissão e as respectivas consequências processuais é recorrível, nos termos conjugados dos artigos 399º e 407º, nº 3 do C.P.P.
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Consequentemente haverá de repetir-se o julgamento por falta de prova bastante para todos os factos havidos como provados.
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Não se compreende como possa ter ficado provado o ponto E) da douta sentença recorrida.
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É que, para dar este facto como provado o “Tribunal baseou a sua convicção essencialmente e desde logo na confissão integral e sem reservas dos factos constantes da acusação conforme tal confissão foi efectuada pelo arguido, tendo-se por isso dado os factos em causa como provados” – cf. Ponto 3 da Sentença recorrida. O que de facto, como já se expos anteriormente, não aconteceu.
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O arguido/recorrente não teve a consciência do exacto significado do que lhe era perguntado pelo que não podem ter-se por confessados os factos que integram a prática do crime, nomeadamente o elemento subjectivo tido por provado – o dolo do arguido/recorrente.
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E quanto aos elementos objectivos o arguido apenas admitiu que efectivamente tinha bebido, no entanto não tinha consciência que se tratava de uma bebida tão forte uma vez que era misturada com água, e ainda o facto de o mesmo se encontrar praticamente em jejum. E perguntado se sabia que estava influenciado por bebidas alcoólicas quando pegou no tractor, o arguido apenas respondeu: “Aquilo foi tão de repente Sr. Dr. …” 30.ª Ora, dos factos provados e supra transcritos não resulta a verificação de conduta dolosa, nem a título de dolo eventual.
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Não consta que o arguido ao ingerir bebidas alcoólicas o fez representando que iria provocar no seu sangue uma taxa de álcool superior à legalmente permitida e que mesmo assim continuou a ingerir tais bebida e, que sabendo da possibilidade de ter ingerido álcool que provocaria o ultrapassar do limite legalmente permitido, foi conduzir.
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Nem resulta provado que o arguido tivesse praticado a condução, consciente do seu grau de alcoolemia.
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Houve, por isso erro notório na apreciação da prova (artº 410º, nº 2 – c) ), numa clara violação às leis da lógica, ou seja, a valoração da não confissão do...
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