Acórdão nº 8609/06.2TBVNG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 17 de Janeiro de 2012

Magistrado ResponsávelM. PINTO DOS SANTOS
Data da Resolução17 de Janeiro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Pc. 8609/06.2TBVNG.P1 – 2ª Secção (apelação) ___________________________________ Relator: Pinto dos Santos Adjuntos: Des. Ondina Carmo Alves Des. Ramos Lopes* * *Acordam nesta secção cível do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório: B…, Lda.

, com sede em Vila Nova de Gaia, instaurou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma comum ordinária, contra C…, Lda.

, com sede em Lisboa, pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de 16.856,79 €, acrescida de juros de mora vincendos, à taxa legal, sobre a quantia de 15.597,12 €.

Fundamentou a sua pretensão na realização, a solicitação da ré, de trabalhos topográficos, constantes das facturas que enviou àquela e que juntou aos autos, facturas essas que a demandada não pagou integralmente, estando por liquidar os valores das facturas nºs 2/05, 3/05, 4/05 e parte da factura nº 1/05, bem como os respectivos juros de mora uma vez que as mesmas se venceram a 30 dias (após a data da sua emissão).

A ré contestou nos seguintes termos: ● admitiu a prestação dos trabalhos alegados pela autora; ● excepcionou o pagamento da factura nº 4/05 e do remanescente da factura 1/05; ● confessou o não pagamento das facturas nºs 2/05 e 3/05, num total de 10.769,00 €; ● considera, porém, que estas facturas ainda não se venceram, porque o seu pagamento, como acordado com a autora, só seria feito quando os trabalhos lhe fossem pagos a ela, demandada, pela dona da obra, o que ainda não aconteceu; ● excepcionou, ainda, a existência de defeitos (que descreveu) nos trabalhos realizados pela demandante, que procedeu à sua denúncia/comunicação (por carta datada de 13/07/2006) junto da mesma, tendo-a interpelado para proceder à respectiva reparação, mas a autora não os reconheceu e recusou-se a repará-los; ● excepcionou também o abandono da obra, sem a concluir, por parte da autora e que devido a isso e à urgência da mesma (a obra estava sujeita a prazos e a penalidades/multas) teve que ser ela própria, ré, a terminar os trabalhos e a reparar os defeitos, suportando os respectivos custos, no valor total de 5.359,73 €, que pretende ver compensados com o que tiver que pagar à autora; ● invocou, por fim, que a demandante litiga de má fé por deduzir pretensão cuja falta de fundamento não podia ignorar, fazendo uso reprovável do processo.

Concluiu pugnando pela procedência das excepções invocadas e pela improcedência da acção, com a sua absolvição do pedido, requerendo, ainda, a condenação da autora, como litigante de má fé, em multa e indemnização a seu favor.

A autora replicou, tendo invocado a caducidade dos direitos que a ré pretende fazer valer com base nos alegados defeitos e sustentado a improcedência das excepções arguidas na contestação.

Realizada uma audiência preliminar, foi proferido despacho saneador e foram seleccionados, sem reclamação das partes, os factos assentes e os controvertidos, estes formando a base instrutória.

Teve lugar a audiência de discussão e julgamento e no seu termo, após produção da prova, foi proferido despacho de resposta aos quesitos da base instrutória, igualmente sem reclamação das partes.

Seguiu-se, sem discussão por escrito do aspecto jurídico da causa, a prolação de sentença que, julgando parcialmente procedente a acção, decidiu condenar a ré a pagar à autora a quantia de 10.769,50 € (dez mil setecentos e sessenta e nove euros e cinquenta cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa que resultar da aplicação da Portaria 587/05, de 19/07, desde 15.03.05 sobre a quantia de 5.057,50 € e desde 15.04.05 sobre a quantia de 5.712,00 €, até efectivo e integral pagamento.

Mais julgou não verificada a litigância de má fé e absolveu a autora do pedido de indemnização que a tal título a ré formulou.

Inconformada com o decidido, interpôs a ré o recurso de apelação em apreço, cujas alegações culminou com as seguintes conclusões: “A) Salvo melhor opinião, a douta sentença (de) que ora se recorre não aplicou bem o direito; B) Resulta da matéria de facto provada que os trabalhos respeitantes às facturas nºs 02/05 e 03/05 dos autos foram realizados com defeitos; C) Que a Apelada recusou-se a reparar esses defeitos; D) Que a Apelante tinha prazos a cumprir na execução da empreitada sob pena de se sujeitar a aplicação de pesadas multas diárias; E) Que a Apelante viu-se por isso obrigada a proceder à correcção dos defeitos, suportando diversos custos; F) A Apelante não chegou a aceitar a obra, seja de forma expressa ou tácita, não tendo havido qualquer recepção material da obra; G) Aplica-se ao caso dos autos a excepção do não cumprimento; H) Tendo a Apelada violado o princípio da boa fé no cumprimento dos contratos; I) Configurando a exigência dos valores das facturas citadas, referentes a trabalhos defeituosos, uma situação de um verdadeiro abuso de direito; J) Tendo a Apelada entrado numa situação de mora do credor, as facturas citadas não vencem quaisquer juros; K) A Apelada não cumpriu o ónus previsto no art. 342, nº 1 do Código Civil, nem afastou a presunção de culpa que sobre si impende de acordo com o art. 799 do mesmo diploma legal.

L) Pelo que o Meritíssimo Juiz a quo violou os arts. 334, 342, nº 1, 428, nº 1, 762, nº 2, 799, 813, 814, nº 2, 847, 1208, 1211, nº 2 e 1220, todos do Código Civil.

Pelo que Vossas Excelências, julgando procedente o presente recurso, revogando a decisão recorrida, substituindo-a por outra que absolva a ora Apelante dos valores em que foi condenada, farão a costumada JUSTIÇA!” A autora não apresentou contra-alegações.

* * *II. Questões a apreciar e decidir: O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente [art. 684º nº 3 e 690º nºs 1 a 3 do CPC, na redacção aqui aplicável, anterior à introduzida pelo DL 303/2007, de 24/08, atenta a data da propositura da acção que é anterior a 01/01/2008] e este Tribunal não pode conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser em situações excepcionais que aqui não se colocam, já que os recursos não visam a criação de decisões sobre questões/matérias novas, além de que o que neles se aprecia são as questões suscitadas e não as razões ou os argumentos que recorrente e/ou recorrido apresentam.

Por isso, as questões que este Tribunal tem que decidir consistem em saber: ● Se os trabalhos compreendidos nas facturas nºs 2/05 e 3/05 foram realizados defeituosamente; ● Se não chegou a haver aceitação da obra e, por via disso, se a denúncia efectuada pela ré foi tempestiva ou se já havia caducado o respectivo direito; ● Se a ré podia ter procedido, ela própria, à correcção/reparação dos defeitos e reclamar da autora, mediante compensação de créditos, os custos que despendeu com isso; ● Se funciona «in casu» a excepção do não cumprimento do contrato; ● Se a pretensão da autora configura um caso de abuso de direito; ● Se são devidos juros de mora.

* * *III. Factos provados: Na sentença recorrida foram dados como provados os seguintes factos [que não vêm impugnados e não sofrem dos vícios a que alude o nº 4 do art. 713º do CPC]: 1) A autora tem por objecto a prestação de serviços relacionados com a topografia, a saber: levantamentos, fiscalização topográfica de obras, apoio topográfico de obras públicas, cadastro, apoio fotogramétrico e posicionamento de estruturas [al. A) da Matéria de Facto Assente].

2) Nessa qualidade, a solicitação da ré, a autora efectuou os trabalhos topográficos constantes das facturas a seguir referidas, juntas a fls. 6 a 13 dos autos, que aqui se dão por reproduzidas, pelos valores abaixo discriminados (todas incluindo IVA): a) factura nº 7/04, emitida em 28.05.04, no montante de 9.996,00 €; b) factura nº 8/04, emitida em 30.07.04, no montante de 5.206,50 €; c) factura nº 10/04, emitida em 30.08.04, no montante de 12.792,50 €; d) factura nº 12/04, emitida em 12.11.04, no montante de 5.652,50 €; e) factura nº 1/05, emitida em 15.01.05, no montante de 8.211,00 €; f) factura nº 2/05, emitida em 15.02.05, no montante de 5.057,50 €; g) factura nº 3/05, emitida em 15.03.05, no montante de 5.712,00 €; h) factura nº 4/05, emitida em 4.05.05, no montante de 1.487,50 € [al. B)].

3) A factura nº 2/05 respeita à execução de serviços nos trabalhos de beneficiação da EN …, à execução de vários levantamentos entre … e …, cuja dona da obra era a EP – Estradas de Portugal, EPE [al. C)].

4) A factura nº 3/05 respeita à execução de serviços de levantamento para execução de cadastro (da) ligação do IP. à EN nº ., em Viseu, e outros levantamentos (da) ligação a Viseu EN .., cuja dona da obra era a D…, SA [al. D)].

5) Por conta dos serviços referidos em 2), a ré pagou à autora, pelo menos, as seguintes quantias: - em 11.02.05 a quantia de 5.206,50 €; - em 17.05.05 a quantia de 9,996,00 €; - em 2.06.05 a quantia de 12.792,50 €; - em 4.07.05 a quantia de 5.652,50 €; - em 4.08.05 a quantia de 8.211,00 €; - em 4.01.06 a quantia de 1.487,50 € [al. E)].

6) Pelo menos os valores constantes das facturas nºs 2/05 e 3/05 não foram pagas pela ré [al. F)].

7) A autora remeteu à ré a carta datada de 5.05.05, cuja cópia se encontra junta a fls. 14 e cujo teor se dá por reproduzido, reclamando o pagamento das facturas nº 7/04, 10/04, 12/04, 1/05, 2/05 e 3/05, a que a ré respondeu por carta datada de 16.06.05, cuja cópia se encontra junta a fls. 98 e que se dá por reproduzida [al. G)].

8) A ré remeteu à autora, que a recebeu, a carta datada de 13.07.06, cuja cópia se encontra junta a fls. 81, e aqui se dá por reproduzida, afirmando que os clientes referidos em 3) e 4) não haviam aceite os trabalhos executados e por isso não haviam procedido ao pagamento, anunciando que, em anexo, remetiam a listagem dos trabalhos que faltava executar, aguardando que no prazo máximo de oito dias a autora “entre em trabalhos de campo no local dos projectos” e mais referindo que, caso a autora se recusasse a efectuar os trabalhos, iria contratar uma terceira entidade, debitando o respectivo custo, a compensar no momento do pagamento das facturas reclamadas [al. H)].

9) Em anexo com a...

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