Acórdão nº 957/11.6JAPRT-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 07 de Dezembro de 2011

Magistrado ResponsávelMARIA DO CARMO SILVA DIAS
Data da Resolução07 de Dezembro de 2011
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

(proc. n º 957/11.6japrt-A.P1)*Acordam, em conferência, os Juízes do Tribunal da Relação do Porto:*I- RELATÓRIO 1. No âmbito do inquérito nº 957/11.6japrt, após primeiro interrogatório judicial como arguido detido de B…, efectuado em 29.7.2011, o Sr. Juiz proferiu o seguinte despacho (fls. 382 a 388 do respectivo inquérito, correspondente a fls. 162 a 168 destes autos de recurso em separado): “Validação da detenção: Da validade/invalidade da detenção do arguido: Antes de mais, apreciemos o que se entende por detenção, por questão de precedência lógica.

Noção de detenção: A detenção de alguém visa sempre as finalidades previstas no artigo 254°. Este artigo e os seguintes ocupam-se da detenção, a qual é efectuada ou - a) para, no prazo máximo de 48 horas o detido ser apresentado a julgamento sob forma sumária ou ser presente ao juiz competente para 1° interrogatório judicial ou pala aplicação ou execução de uma medida de coacção; ou - b) para assegurar a presença imediata ou, não sendo possível, no mais curto prazo, mas sem nunca exceder 24 horas, do detido perante a autoridade judiciária em acto processual. Esta alínea b) compreende sempre a detenção fora de flagrante delito e concretiza, ao nível processual, a excepção contida na alínea f) do n° 3 do artigo 27° da Constituição.

Trata-se, neste caso, de uma medida de polícia do processo, permitida para evitar a perturbação dos trabalhos e as faltas sucessivas e é aplicável não só ao arguido, mas também a qualquer outra pessoa regularmente convocada para comparecer em diligência processual; neste caso, a detenção só poderá ser ordenada pelo juiz.

No caso de detenção fora de flagrante delito para aplicação ou execução da medida de coacção de prisão preventiva o arguido, nos termos do artigo 254°, n° 2, é sempre apresentado ao juiz.

A detenção é uma medida cautelar, não é uma medida de coacção processual. A noção de detenção envolve um sentido de precariedade numa tripla ordem de considerações: pela possível natureza não judicial da ordem, pela medida do tempo de duração a que está imperativamente conformada e pela imediata finalidade processual que a justifica e faz com que nessa finalidade se esgote. A detenção tem, pois, finalidades especificas, cautelares e de polícia, que a distinguem de outras formas de privação da liberdade; não é necessariamente dependente de mandado judicial, não pressupõe a qualidade processual de arguido, e tem uma limitação temporal absolutamente inultrapassável. O rigor da análise das condições da detenção, e o estrito respeito por prazos legais curtos, está muito presente, por exemplo, na jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem. Cf. o Parecer n° 35/99 da PGR, publicado no DR - II Série de 24 de Janeiro de 2000. A detenção, traduzindo-se, embora, numa privação da liberdade - e muitas vezes funciona como prelúdio da prisão preventiva - não constitui uma medida de coacção processual, como a prisão preventiva, mas antes uma medida meramente cautelar, votada a certos e exclusivos fins (cf. Simas Santos e Leal-Henriques, Código de Processo Penal Anotado, II volume, 2 ed., 2000, p. 44). A detenção não deve ser confundida, como já se advertiu, com as medidas cautelares de polícia previstas no artigo 250°. Inclusive, a obrigação de identificação perante a autoridade competente não se considera medida de coacção (artigo 191°, n° 1). A detenção também não deverá confundir-se com a prisão preventiva. A detenção tem a ver com as fases preliminares do processo e a correspondente privação da liberdade só se prolonga se vier a ser confirmada por intervenção judicial, “isto para acentuar o carácter precário e condicional da detenção, sujeita à condição resolutiva da homologação judicial” (Maia Gonçalves, p. 521). A prisão preventiva é sempre imposta pelo juiz (artigo 202°, nº 1, do CPP).

A detenção fora de flagrante delito pode também ser ordenada por entidade diferente do juiz, mas sempre que qualquer entidade policial proceder a uma detenção comunica-a de imediato ou ao juiz, se for o caso da alínea b) do artigo 254°, ou ao MP, nos restantes casos.

No artigo 256° a lei distingue entre flagrante delito, quase flagrante delito e presunção legal de flagrante delito.

A detenção fora de flagrante delito só pode ser efectuada por mandado do juiz ou, nos casos em que for admissível prisão preventiva, do Ministério Público, desde que verificadas alguma das circunstâncias previstas no n° 1 do art° 257° do CPP.

Por iniciativa das autoridades de polícia criminal (directores, oficiais, inspectores e subinspectores de polícia e todos os funcionários policiai a quem as leis respectivas reconhecerem aquela qualificação: artigo 1°, n° 1, alínea d)), a detenção fora de flagrante delito pode ainda realizar-se, se concorrerem os restantes pressupostos enumerados no n° 2 do artigo 257° do CPP (pressupostos de verificação cumulativa).

Visto o regime legal, apreciemos.

O arguido, conforme declarações que prestou, corroboradas pela informação da PJ de fls. 339 e 340, foi detido nas circunstâncias seguintes: - Conforme se alcança de fls. 339 e 340, o arguido B…, depois de sujeito a dispositivo de vigilância, no sentido de o localizar e abordar, foi “abordado por elementos desta Policia Judiciária que para o efeito se identificaram devidamente. Face aos antecedentes criminais do individuo em causa, á violência dos crimes em causa e á própria zona de abordagem, foram adoptados especiais cuidados, nomeadamente a sua imobilização previa e revista de segurança “Não obstante os cuidados tidos, certo é que o suspeito ofereceu alguma resistência à sua imobilização e revista, tendo sido necessário o emprego de força física para o subjugar e possibilitar a revista de segurança, pelo que foi cautelarmente algemado. Assim que as condições de segurança o permitiram, foi o mesmo constituído arguido verbalmente no local, após que foi conduzido até ás instalações desta Directoria, para realização de diligências tendentes ao esclarecimento dos factos de que está indiciado “.

Conforme se alcança do mandado de detenção de fls. 343 a 345 e execução do mesmo a fls. 346 formalmente ocorreu a detenção do arguido no dia 28/07/2011, pelas 20:45 horas. Dizemos formalmente porquanto e quanto a nós o arguido porque privado da liberdade, conforme se alcança desde logo do relatório intercalar de fls. 339 a 342 encontrava-se privado da liberdade desde as 11 horas do dia 28/07.

Note-se que nesse mesmo dia, conforme resulta desse mesmo relatório, foi constituído arguido, sujeito a diligências de prova com reconhecimentos pessoais, sendo que a fls. 336 consta que um deles teve lugar pelas 20 horas e em que o arguido a identificar como suspeito e que nesse mesmo dia pelas 12:30 horas o arguido é considerado e qualificado como tal (conferir fls. 324). Foi igualmente sujeito a busca domiciliária que ocorreu pelas 12:15 horas, conforme fls. 332. Foi interrogado como arguido nesse mesmo dia com diligência que terminou pelas 17:50 horas (conferir fls. 335).

Conforme supra referido e relatado no relatório de fls. 339 a 342, o arguido foi então: abordado “por elementos desta Policia Judiciária, que para o efeito se identificaram devidamente. Face aos antecedentes criminais do individuo em causa, á violência dos crimes em causa e á própria zona de abordagem, foram adoptados especiais cuidados, nomeadamente a sua imobilização previa e revista de segurança “Não obstante os cuidados tidos, certo é que o suspeito ofereceu alguma resistência à sua imobilização e revista, tendo sido necessário o emprego de força física para o subjugar e possibilitar a revista de segurança, pelo que foi cautelarmente algemado. Assim que as condições de segurança o permitiram, foi o mesmo constituído arguido verbalmente no local, após que foi conduzido até ás instalações desta Directoria, para realização de diligências tendentes ao esclarecimento dos factos de que está indiciado”.

Face ao teor do supra referido, entendemos que o arguido, desde as 11 horas do dia 28/07 se encontrava em situação de verdadeira detenção porque privado da respectiva liberdade de locomoção.

Ocorreu pois situação de verdadeira detenção.

Com os fundamentos de fls. 343 a 345 mormente pela “hora actual (19:30 horas) resulta inviável suscitar a intervenção da autoridade judiciária competente” e foram emitidos pelo coordenador de investigação criminal da Polícia Judiciária, ao abrigo do disposto no art.° 257.°, n.° 2, al.s a), b) e c), mandados de detenção em relação ao arguido, cuja execução formal ocorreu pelas 20:45 horas (conferir fls. 346, verso).

Quanto a nós e conforme referido, o arguido B…, e não obstante ter sido sujeito a interrogatório na presença do seu defensor ora constituído, já se encontrava em situação de detenção quando abordado por elementos da PJ (conferir fls. 339): • encontrava-se factualmente na situação de detido, por privado da sua liberdade e do jus ambulanti.

Só posteriormente, e com os fundamentos de fls. 343 a 345, a PJ emite mandados de detenção, cuja execução teve lugar no dia 28-07-2011, pelas 20:45 horas.

Por se tratar de situação fora de flagrante delito, a detenção por autoridade de polícia criminal terá que obedecer aos requisitos previstos nas als. a), b) e c), do n° 2 do art° 257° do C.P.P..

Tais requisitos são de verificação cumulativa, pelo que na falta de qualquer um deles falece a autoridade de polícia criminal de legitimidade para ordenar a detenção de uma pessoa fora de flagrante delito.

No caso em apreço, não se mostrava a impossibilidade de intervenção da autoridade judiciária, prevista na alínea c). Havendo situação de urgência e perigo na demora, deveria ser o Ministério Público, se assim o entendesse, a ordenar a detenção do arguido, mesmo por telefone, seguindo-se confirmação da ordem por mandado - n.°s 1 e 2 do Art.° 258.°, do C.P.P.. Só na impossibilidade de contacto com o Ministério Público seria admissível a emissão de mandados de detenção pela autoridade de polícia criminal e...

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