Acórdão nº 32/11.3TCFUN.L1-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 23 de Novembro de 2011

Magistrado ResponsávelPEDRO MARTINS
Data da Resolução23 de Novembro de 2011
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo assinados: “A”, casada, com domicílio no …, nº …, Edifício …, …, Funchal, intentou contra o seu marido, “B”, residente na mesma morada, a presente acção pedindo que seja decretada a separação judicial de bens entre a autora e o réu.

Para o efeito e, em síntese, alegou o seguinte: autora e réu casaram no dia 27/11/1993, no regime supletivo da comunhão de adquiridos; o réu dedica-se a negócios nesta cidade, designadamente através da “C” Metalúrgica Unipessoal, Lda e da “D”, Lda; a autora sempre foi alheia aos negócios do réu; durante alguns anos, a situação económica do casal decorreu de forma equilibrada; a autora, porém, veio a tomar conhecimento que o réu se encontra seriamente endividado, decorrendo contra ele três execuções instauradas pela administração fiscal: uma por conta de dívidas da “D”, Lda, no valor de 92.352,25€; outra igual pelo valor de 23.807,87€; e uma terceira, por conta de dívidas da “C” Metalúrgica Unipessoal, Lda, pelo valor de 17.214,01€; a autora é funcionária administrativa e alheia à actividade comercial do marido; no seguimento da instauração das referidas execuções foi notificada, no dia 23/12/2010, da penhora da fracção autónoma que descreve, para garantia de 176.687,39€, proveniente de dívidas de IRS, IRC, IVA e coimas dos anos de 2003 a 2010, juros e custas exigidas nos dias processos, revertidos contra o réu, fracção essa que constitui um bem comum do casal e a casa de morada de família [a fracção está no Caminho …, nº…., como se lê n documento autêntico de fls. 28]; face à referida penhora e outras que se avizinham a curto prazo, por conta dos referidos processos e outros, a autora está em perigo de perder o seu património, por culpa imputável ao réu, o qual, segundo apurou, veio a realizar alguns dos seus negócios de forma menos responsável; apesar das promessas feitas pelo réu à autora, esta constata apenas um agravar da situação financeira daquele, já não podendo mais confiar na sua administração dos bens do casal; e a autora tem receio que o réu continue com a sua má administração dos bens do casal e que, por isso, venha a perder todo o património.

Citado o réu para, querendo, contestar, nada disse.

Ao abrigo do disposto no art. 484º/1 do CPC, foram considerados confessados os factos alegados pela autora.

Cumprido o nº 2 do referido artigo, a autora apresentou alegações de direito.

Após isso foi proferida sentença, julgando a acção improcedente.

A autora recorre desta sentença - para que seja revogada e substituída por outra que decrete a separação pedida -, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões: “1. Para fundamentar a simples separação judicial de bens, basta a prática de actos de má administração, e que a má administração coloque a autora em risco sério de perder o que é seu (cfr. art. 1767º CC).

  1. Não se trata de pôr directamente em risco os bens, através de incorrectas medidas de conservação ou de frutificação dos bens, mas de os pôr de qualquer modo em perigo, de os perder, ao fazê-los responder pelas dívidas, como a autora alegou na acção.

  2. A autora pode perder o que é seu não apenas nos casos em que os seus bens próprios ou os bens comuns são administrados pelo outro (cfr. arts 1678º/2, a) a f), e 1681º/1, do CC), como no caso em que as dívidas ou outras responsabilidades que o réu administrador tenha contraído onerem bens comuns do casal, na medida em que se tornem da responsabilidade de ambos, nos termos dos arts 1691º/1 e 1695º/1 do CC.

  3. Como as dívidas foram contraídas pelo réu, no exercício do comércio são, por regra, da responsabilidade de ambos os cônjuges e por elas respondem os bens comuns do casal e, na falta ou insuficiência deles, solidariamente, os bens próprios de qualquer dos cônjuges.

  4. Assim, a afectação do património comum do casal e até dos bens próprios da cônjuge autora, embora subsidiariamente, à solvência das dívidas contraídas pelo réu marido na sua actividade comercial permite concluir que o seu endividamento traduz uma má administração do património conjugal.

  5. No caso sub judicio, o réu é subsidiariamente responsável em relação às sociedades, pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da sociedade se tornou insuficiente para a sua satisfação.

  6. Má administração essa, que, por ter culminado com a penhora da casa de morada de família, demonstram total e inequivocamente, que o receio da autora em perder o seu património não só é real, como actual e eminente, porquanto poderá vir a afectar igualmente os demais bens comuns do casal e os bens próprios da apelante.

  7. Mesmo sem estarem demonstradas incorrectas medidas de conservação ou de frutificação dos bens do casal, há um perigo sério de os perder e, por isso, a má administração pode resultar da afectação dos bens do casal ao pagamento das dívidas contraídas por um dos cônjuges numa actividade comercial a que o outro é completamente alheio, justificando o decretamento da simples separação judicial de bens.” * Questões que importa solucionar: saber se a afectação do patrimó-nio comum do casal e até dos bens próprios da cônjuge autora, embora subsidia-riamente, à solvência das dívidas contraídas pelo réu marido na sua actividade comercial permite concluir que o seu endividamento traduz uma má administração do património conjugal e, logicamente, saber se as dívidas que estão em causa nestes autos são dividas comerciais ou, mais genericamente, se são da responsabi-lidade de ambos os cônjuges; e saber se essa má administração deriva, no caso, de uma conduta que se presume culposa.

    * Os factos Como se viu acima, na sequência da falta de contestação, os factos alegados pela autora foram dados como confessados. Por outro lado, na sentença dão-se por integralmente reproduzidos os factos confessados pelo réu.

    Isto coloca a necessidade de deixar consignados os factos que po-dem ser considerados como dados como provados pela sentença recorrida, o que não é o mesmo, diga-se desde já, que considerar quais são os factos que estão provados. Ou seja, não se trata de ser este tribunal de recurso a considerar quais os factos que foram admitidos por acordo -, mas sim de saber quais foram os factos que o tribunal recorrido considerou admitidos por acordo.

    A diferença reflecte-se nisto: se se tratasse de uma decisão do tribu-nal de recurso, nenhum dos factos se considerariam como confessados (o que talvez não impedisse a prova de parte deles por documentos…), porque se trata de uma relação jurídica indisponível, já que os cônjuges não podem obter, por sua única vontade, a separação – judicial – de bens. Por isso é que ela é judicial… (arts. 1767 e 1768 do CC). Assim sendo, estar-se-ia pe-rante a excepção do art. 485/c) do CPC ao efeito semi-cominatório da falta de contestação.

    Neste sentido, vendo a questão por diversos modos, vai o ac. do STJ...

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