Acórdão nº 207/09.5TBTMR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 08 de Novembro de 2011

Magistrado ResponsávelHENRIQUE ANTUNES
Data da Resolução08 de Novembro de 2011
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: 1.

Relatório.

D… propôs, no 3º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Tomar, contra J… e cônjuge, H…, e A… e cônjuge, M…, acção declarativa de condenação, com processo comum, ordinário pelo valor, pedindo que se: a) Declare que o prédio rústico sito no lugar de …, freguesia de …, concelho de Tomar, actualmente inscrito na matriz cadastral rústica da dita freguesia sob o nº , da secção N, é o mesmo que na anterior matriz predial se encontrava inscrito sob o artigo … e está descrito na Conservatória do Registo Predial de Tomar sob o nº , a folhas 38, do livro B-110; b) Declare o A. como único dono e legítimo propriedade do prédio referido na alínea anterior; c) Declare nula ou ineficaz e não susceptível de produzir quaisquer efeitos, na parte que respeita ao prédio inscrito na matriz cadastral rústica da freguesia de … sob o nº…, de secção V, a escritura pública de justificação outorgada pelos 1ºs RR. em 2 de Fevereiro de 1999, de fls. 85 vº. a fls. 87, do Livro nº. 74-E, do 1º Cartório Notarial de Tomar; d) Ordene o cancelamento dos registos que com base nessa parte da dita escritura foram efectuados na Conservatória do Registo Predial de Tomar, designadamente a abertura da descrição nº. …, da freguesia de …, concelho de … e a inscrição G-1, Ap. 13/090399, feita sobre a dita descrição.

  1. Declare nula e de nenhum efeito escritura de compra e venda outorgada entre os 1ºs e 2ºs RR. em 23 de Setembro de 1999, de fls. 63 a fls. 64, do Livro nº. 11-I, do 2º Cartório da Secretaria Notarial de Tomar, f) Ordene o cancelamento do registo que com base nessa escritura se mostra efectuado na Conservatória do Registo Predial de Tomar, designadamente, a inscrição G-2/Ap. 17/300999, sobre a descrição nº… da freguesia de ...

  2. Condenem os 2ºs RR. a restituir ao A. o prédio inscrito rústico inscrito na matriz cadastral respectiva da freguesia de …, concelho de … sob o nº…, da secção V, fazendo-lhe entrega do mesmo livre e desembaraçado de pessoas e bens.

Fundamentou esta pretensão no facto de ser herdeiro de J…, falecido no dia 5 de Julho de 1985, no estado de casado com P…, tendo-lhe cabido, na partilha da herança do primeiro, aquele prédio, de o réu J…, aproveitando-se da entrada em vigor, em Setembro de 1988, em Tomar, do cadastro geométrico rústico, ter, dolosamente, averbado a respectiva matriz em seu nome – alegações que não foram seleccionadas para a base instrutória - e de aquele réu e o cônjuge terem, em escritura de justificação, outorgada no dia 2 de Fevereiro de 1999, declarado, falsamente, que o adquiriram por usucapião, vendendo-o, no dia 23 de Setembro de 1999, aos réus J… e M...

Os réus J… e H… não contestaram.

Os réus A… e M… defenderam-se alegando que são terceiros de boa fé, desconhecendo qualquer vício do negócio oneroso; que confiaram no registo do prédio a favor dos 1ºs RR, tendo-o adquirido na convicção de que o mesmo pertencia aos co-réus, que o tinham adquirido por usucapião; que não existe identidade entre o prédio de que o autor se diz proprietário e aquele que adquiram aos co-demandados e que caso a pretensão do autor proceda sempre teriam direito ao preço que pagaram pelo prédio, actualizado de acordo com os coeficientes de actualização de desvalorização da moeda.

O autor replicou dizendo que os contestantes não ignoravam que o prédio não pertencia ao réu J…, mas sim ao autor e, antes dele, aos seus pais, e que sabiam que os co-réus nunca tinham sido possuidores dele – enunciados de facto que não foram seleccionados para a base instrutória.

A sentença final da causa – depois de observar que o prédio adjudicado ao A. por sucessão e partilhas por óbito do seu pai é o mesmo que veia ser justificado pelos 1º RR.

, que a compra e venda feita através da escritura (de 23 de Setembro de 1999) é uma venda de bem alheio, mas que a nulidade apenas se aplica na relação entre o alienante e o adquirente, sendo ineficaz em relação ao dono da coisa – julgou procedente a acção, declarando, não a nulidade, mas a ineficácia em relação ao A. da compra e venda outorgada entre os 1ºs e 2º RR, em 23 de Setembro de 1999.

Apelaram, claro, os réus contestantes, que pedem, no recurso, a revogação da sentença impugnada e a sua substituição por acórdão que os absolva do pedido.

Os recorrentes condensaram a sua discordância relativamente à decisão impugnada nestas latitudinárias conclusões: … Não foi oferecida resposta.

  1. Factos provados.

O tribunal de que provém o recurso julgou provados os factos seguintes: … 3.

Fundamentos.

3.1.

Delimitação objectiva do âmbito do recurso.

Além de delimitado pelo objecto da acção e pelos eventuais casos julgados formados na instância recorrida e pela parte dispositiva da decisão impugnada que for desfavorável ao impugnante, o âmbito, subjectivo ou objectivo, do recurso pode ser limitado pelo próprio recorrente. Essa restrição pode ser realizada no requerimento de interposição ou nas conclusões da alegação (artº 684 nºs 2, 1ª parte, e 3 do CPC).

Nas conclusões da sua alegação, é lícito ao recorrente restringir, expressa ou tacitamente, o objecto inicial do recurso (artº 684 nº 2 do CPC). Porém, se tiver restringido o objecto do recurso no requerimento de interposição, não pode ampliá-lo nas conclusões[1].

Portanto, tendo em conta o conteúdo da sentença impugnada e das alegações dos recorrentes, as questões concretas controversas que o acórdão deve resolver são as saber se decisão impugnada se se encontra ferida com o vício da nulidade e com um error in iudicando, tanto da questão de facto como da de direito.

A resolução destes problemas vincula, naturalmente, à aferição das causas de nulidade da sentença representadas pelo excesso de pronúncia e pela contradição intrínseca, dos pressupostos da aquisição tabular e dos poderes de controlo desta Relação relativamente à matéria de facto.

Entre a matéria de facto e a matéria de direito existe uma relação nítida relação de interdependência e de delimitação recíproca, especialmente na sua confluência para a obtenção de uma decisão num caso concreto. A delimitação da matéria de facto em função da matéria de direito é patente, dado que os factos são recortados e escolhidos nos acontecimentos naturais ou sociais segundo a sua relevância jurídica, i.e., segundo a sua relevância para cada uma das soluções plausíveis da questão de direito (artº 511 nº 1 do CPC).

Esta constatação permite, metodologicamente, que a abordagem dos problemas enunciados se abra com a determinação dos pressupostos da aquisição tabular e com o recorte dos poderes de controlo desta Relação relativamente à decisão da matéria de facto. De resto, esta metodologia pode também justificar-se pela circunstância de a resposta dada ao problema do error in iudicando, por erro sobre o objecto da prova, ser susceptível de prejudicar o conhecimento do objecto do recurso representado pelo error in procedendo em que resolve a arguição da nulidade da decisão recorrida (artº 660 nº 2 do CPC).

3.2.

Pressupostos da aquisição tabular.

O registo predial tem essencialmente por escopo dar publicidade aos direitos reais inerentes às coisas imóveis: pretende-se patentear a história da situação jurídica da coisa, desde a data da descrição até á actualidade (artº 1 Código de Registo...

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