Acórdão nº 494/11.9TBVCD.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 03 de Novembro de 2011

Magistrado ResponsávelAMARAL FERREIRA
Data da Resolução03 de Novembro de 2011
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Apelação nº 494/11.9TBVCD.P1 - 2011.

Relator: Amaral Ferreira (641).

Adj.: Des. Deolinda Varão.

Adj.: Des. Freitas Vieira.

Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I. RELATÓRIO.

  1. B…, litigando com apoio judiciário nas modalidades de nomeação e pagamento de honorários a patrono e de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo instaurou, em 16/2/2011, no Tribunal da Comarca de Vila do Conde, contra Instituto da Segurança Social IP, acção declarativa com forma de processo ordinário, pedindo que seja declarado que é titular das prestações por morte, no âmbito dos regimes da segurança social, decorrentes do óbito de C…, e o R. condenado a tal reconhecer.

    Alega, para tanto e em resumo, que sendo solteira, durante cerca de 40 anos e até à data da morte do referido C…, ocorrida em 10 de Abril de 2006, no estado civil de divorciado, viveu com ele em situação análoga à dos cônjuges, sendo reconhecidos e tratados pelas pessoas com que se relacionavam como se de marido e mulher se tratassem, tendo dessa união nascido treze filhos, todos maiores, e, não tendo o falecido deixado quaisquer bens, exceptuando os que constituíam o recheio da habitação, após o referido óbito, passou a viver com dificuldades económicas, já que se encontra desempregada e vive exclusivamente do rendimento social de inserção, no montante de € 189,52, paga de renda mensal de casa a quantia de € 300 e tem problemas de saúde que lhe não permitem o desempenho de qualquer actividade profissional remunerada.

  2. Contestou o R. que apresentou defesa por excepção, em que sustenta que não tendo a A. alegado que não tinha ascendentes nem irmãos que lhe pudessem prestar alimentos, nem que os filhos estivessem incapacitados de lhos prestar, ocorria insuficiência de causa de pedir, e por impugnação, concluindo pelo julgamento da acção de acordo com a prova que viesse a ser produzida.

  3. Respondeu a A. que, depois de alegar que não tem ascendentes e tem apenas um irmão, com o qual não tem qualquer contacto e não tem capacidade financeira de lhe prestar alimentos, e que, exceptuando a filha D…, que tem três filhos menores e uma irmã a seu encargo e vive com o salário mínimo, pagando de renda de casa € 325, e, por isso, também lhe não podendo prestar alimentos, não tem contactos com restantes os filhos, que foram todos criados em instituições devido à sua incapacidade económica para os educar, conclui como na petição.

  4. Foi proferido despacho saneador que, depois de julgar improcedente a invocada, pelo R., insuficiência da causa de pedir, com o fundamento de que, de acordo com a Lei nº 23/2010, de 30/8, a A. tinha direito à pensão de sobrevivência por óbito do falecido, independentemente de carecer ou não de alimentos, ainda que, de acordo com o regime jurídico vigente à data do óbito tivesse que alegar factos que demonstrassem carecer de alimentos, considerou que, tendo a referida Lei nº 23/2010 natureza interpretativa, sendo, em consequência de aplicação imediata, a A. não tinha interesse em agir porquanto o direito que pretende exercer não dependia da carência de alimentos e a prova da união de facto se fazia pelos meios estabelecidos no artº 2º-A da Lei nº 7/2001, na nova redacção, competindo à entidade responsável pelo pagamento das prestações promover a competente acção judicial com vista à sua comprovação, caso tivesse dúvidas sobre a existência da união de facto, e absolveu o R. da instância.

  5. Inconformado, apelou o R.

    que, nas respectivas alegações, formula as seguintes conclusões: 1ª: O artº 8º do Dec. Lei 322/90, ao remeter para a situação prevista no artº 2020º, nº 1, do CCivil, está a equiparar a situação de quem tem direito à pensão de sobrevivência à situação de quem tem direito a alimentos da herança.

    1. : Isto é, a situação que se exige no artº 8º para ser reconhecido o direito às prestações da Segurança Social é a mesma daquele que tem direito a exigir alimentos da herança, nos termos do artº 2020º, nº 1, do C. Civil.

    2. : Na sequência do disposto no artº 8º, nº 2, do Dec. Lei 322/90, foi publicado o Dec. Regulamentar 1/94, de 18 de Janeiro, que nos seus artºs 3º e 5º estabeleceu as condições e processo de prova de atribuição das prestações às pessoas que se encontram na situação prevista no nº 1 do artº 8º do DL 322/90 (o mesmo é dizer à situação prevista no nº 1 do artº 2020º do C. Civil.

    3. : Daqui resultando que a atribuição das prestações por morte depende: da sentença judicial que reconheça direito a alimentos da herança ao requerente (nº 1 do artº 3º do Dec. Reg. 1/94, de 18/1), desde que na acção intervenha a Segurança Social (artº 6º da Lei 7/2001), ou do reconhecimento judicial da qualidade de titular das prestações por morte, no caso de não ter sentença que lhe reconheça o direito a alimentos por falta ou insuficiência dos bens da herança (artº 3º, nº 2, do Dec. Reg. 1/94, e artº 6º da Lei 7/2001).

    4. : Isto é, tanto na situação prevista no nº 1 do artº 3º, como na prevista no nº 2 do mesmo artigo do Dec. Regulamentar nº 1/94, será necessário alegar e provar: a) que o “de cujus” era pessoa não casada ou separada judicialmente de pessoas e bens; b) factos demonstrativos integradores do conceito de união de facto há mais de dois anos em condições análogas às dos cônjuges (artº 2020º C.Civil); c) factos demonstrativos de inexistência ou insuficiência de bens da herança (nº 2 do artº 3º do Dec. Reg. nº 1/94); d) factos demonstrativos de não poder obter alimentos nos termos das alíneas a) a d) do artº 2009º C. Civil); e) factos demonstrativos da necessidade de alimentos e da impossibilidade de ele próprio prover à sua subsistência.

    5. : Donde para a atribuição da pensão de sobrevivência é condição essencial e necessária a obtenção da sentença judicial onde se reconheçam e verifiquem todos aqueles pressupostos.

    6. : Ora, o Mmº Juiz “a quo” proferiu sentença que absolveu o Réu da instância, considerando que a Autora ora recorrida não tem interesse processual, traduzido na falta de interesse em agir para instaurar a presente acção, porquanto entendeu o Mmº Juiz, salvo o devido respeito, erroneamente, que ao caso em apreço é aplicável o novo regime jurídico previsto pela Lei nº 23/2010 (adiante designada por nova LUF), pelo que foi violado o artº 8º do D.L. 322/90, de 28/10, e os artigos e do Dec. Regulamentar nº 1/94, de 18/01, artº 1º e 6º da Lei nº 7/2001, de 11/05, e artºs 2020º e 2009º do Código Civil.

    7. : Com efeito, no caso sub judice, o Mmº Juiz do Tribunal de 1ª Instância diz na sua douta sentença que “Foi entretanto publicada a Lei nº 23/2010, de 30 de Agosto, que alterou vários artigos da Lei nº 7/2001 e lhe aditou o artº 2º-A.

      (…) Porque a morte do falecido beneficiário da Segurança Social ocorreu antes, mas a acção foi proposta depois de entrarem «em vigor as alterações (e aditamento) à Lei 7/2001, operadas pela Lei nº 23/2010, coloca-se a questão da aplicabilidade ou não de tais alterações, isto é, põe-se-nos um problema de aplicação da lei no tempo.

      (…) A conclusão a extrair é, sem dúvida, a de que a Lei nº 23/2010 tem natureza interpretativa, integrando-se, de acordo com o nº 1 do artº 13º do Cód. Civil, na lei interpretada e sendo, consequentemente, de aplicação imediata (com as ressalvas que aqui não relevam, previstas na 2ª parte do referido nº 1 e no nº 2 do artº 13º do Cód. Civil.

      (…) Porque se trata de acção instaurada em plena vigência da Lei nº 23/2010, de 30 de Agosto, forçoso é concluir pela aplicação da lei e, consequentemente, a A. não tem interesse em agir, não tem nenhum interesse em propor esta ou semelhante acção: o direito que pretende exercer não depende da sua carência de alimentos, a prova da união de facto faz-se pelos meios estabelecidos no artº 2º-A da Lei 7/2001, com a nova redacção ….

      Termos em que, visto o disposto na al. e) do nº 1 do artº 288º e 493º, nºs 1 e 2, ambos do...

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