Acórdão nº 1521/08.2TBVIS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 27 de Setembro de 2011

Magistrado ResponsávelFONTE RAMOS
Data da Resolução27 de Setembro de 2011
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I. Agência (…), Lda., J (…) & Filho, Lda. e A (…) e mulher, M (…), intentaram, no Tribunal Judicial de Viseu, a presente acção de despejo, sob a forma sumária, contra MC (…), pedindo a condenação da Ré a ver decretada a resolução do contrato de arrendamento aludido na petição inicial (p. i.) e a ser de imediato despejada do prédio arrendado, entregando-o aos AA., livre e devoluto.

Alegaram, em síntese, que são donos, em compropriedade, do prédio urbano referido no item 1º da p. i. e que o 3º andar foi arrendado ao marido da Ré; por morte deste, a posição de arrendatário transmitiu-se à Ré que, desde 09.4.2006 e na sequência de um incêndio por si provocado, deixou de habitar no referido andar.

A Ré contestou, referindo, em resumo, que é titular do direito de arrendamento por direito próprio; o incêndio em causa não lhe é imputável e foi, aparentemente, causado por “curto-circuito” na instalação eléctrica; deixou de residir no prédio arrendado após o incêndio, por ter ficado inabitável, e ficou a aguardar que os AA./proprietários fizessem as reparações devidas, designadamente na instalação eléctrica e buracos abertos pelos bombeiros para combater o incêndio; os AA., ao não executarem no local arrendado as obras necessárias, estão propositadamente a impedi-la de aí voltar a morar, o que lhe causa grande prejuízo e dor.

Concluiu pela improcedência da acção e, em reconvenção, pediu a condenação dos AA. no pagamento de € 200 mensais, como compensação por danos não patrimoniais, até que lhe seja possibilitado o efectivo regresso ao local arrendado, fixando-se em € 6 000 o montante devido até à data da contestação.

Em resposta à contestação, os AA. mantiveram o alegado na p. i., mormente quanto a origem do referido incêndio e aduziram ainda que a Ré “nunca reclamou perante os AA. a reparação seja do que for”, cabendo-lhe, de resto, reparar os danos causados no prédio pertencente aos AA. (nomeadamente, no tecto da fracção situada no 2º andar); os AA. não tinham sequer conhecimento que o prédio arrendado estava ainda por reparar e a Ré, que deixou de usar o local arrendado, apenas quis manter o contrato para que lhe fosse paga uma indemnização pelos AA., enriquecendo à custa destes. Concluíram como na p. i. e pela improcedência da reconvenção, pedindo ainda a condenação da Ré por litigância de má fé.

Na audiência preliminar os AA. concretizaram e corrigiram a versão dos factos alegados na p. i., com o aditamento de dois novos artigos e a correcção dos artigos 10º e 11º (cf. fls. 123 e seguinte).

Admitido o pedido reconvencional e proferido despacho saneador (tabelar), seleccionou-se, sem reparo, a matéria de facto (assente e controvertida).

Efectuado o julgamento e decidida a matéria de facto, o tribunal recorrido julgou a acção improcedente, por não provada, e, em consequência, absolveu a Ré do pedido e julgou parcialmente procedente e provada a reconvenção, condenando os AA. no pagamento à Ré da quantia de € 2 500 (dois mil e quinhentos euros).

Inconformados e visando a condenação da Ré conforme peticionado na p. i., os AA. interpuseram a presente apelação, formulando as conclusões que assim vão sintetizadas: 1ª - A prova documental e testemunhal produzida nos autos implica uma decisão diversa no que respeita aos “pontos 13, 16, 17, 27 e 28 dos factos provados”[1].

  1. - Deveria ter sido considerado provado que: a) O incêndio foi causado por curto-circuito na instalação eléctrica do 3º andar provocado por um sobreaquecimento de uma tomada onde estava ligado um electrodoméstico.

    1. Após o incêndio, a Ré não reclamou perante os Autores a reparação do 3º andar.

    2. A Ré não comunicou aos Autores a ocorrência do referido incêndio.

  2. - Perscrutando a sentença recorrida, verifica-se existir uma nítida contradição entre a fundamentação e a decisão - atentos os factos dados como provados (mesmo sem se considerar a dita revisão da matéria de facto) o Tribunal a quo não tira as devidas ilações e olvida totalmente os ensinamentos doutrinais, jurisprudenciais e legais, ocorrendo a situação prevista na alínea c) do art.º 668º, do CPC.

  3. - Atendendo aos factos dados como provados, não é crível que a Recorrida tivesse comunicado aos Recorrentes o motivo porque saía do “locado”, imputando-lhes a responsabilidade de reparar um incêndio que tinha sido da sua responsabilidade; durante mais de dois anos nunca o fez, estando os Recorrentes convencidos (já que não têm acesso ao “locado”) que o “locado” tinha sido reparado pela Recorrida.

  4. - O arrendatário é responsável pela perda ou deteriorações do “arrendado” a não ser que prove que a causa daquelas lhe não é imputável, nem a terceiro a quem tenha facultado o seu gozo.

  5. - Não provando o arrendatário que o incêndio causador das deteriorações ocorreu sem culpa sua, devendo-se a caso fortuito ou de força maior, situações em que o risco corre por conta do locador, ou a qualquer causa que lhe seja alheia, responde pela perda ou deteriorações no locado.

  6. - No caso em concreto a causa do incêndio foi um sobreaquecimento na tomada do quarto da Recorrida que motivou o curto-circuito no 3º andar que aquela habitava.

  7. - Dando-se como provado aquele facto e como se provou que desde a ocorrência do incêndio, em 09.4.2006, o 3º andar do prédio se mantém com as portas e janelas fechadas, tendo a Ré deixado de ali cozinhar, comer, dormir, não consumindo no local arrendado água, nem luz, nunca mais ali tendo sido vista, e porque a acção foi intentada em 2008, dúvidas não restam de que à data da sua interposição, há mais de um ano a Ré não usava o “locado”.

    A Ré respondeu, concluindo pela improcedência do recurso.

    A Mm.ª Juíza a quo indeferiu a arguida nulidade da sentença, considerando inexistir qualquer oposição entre os fundamentos e o decidido (fls. 279).

    Atento o referido acervo conclusivo (delimitativo do objecto do recurso nos termos dos art.ºs 684º, n.º 3 e 685º-A, n.ºs 1 e 3, do Código de Processo Civil[2], na redacção...

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