Acórdão nº 318/10.4JACBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Setembro de 2011

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução28 de Setembro de 2011
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)
  1. Relatório: No âmbito do processo comum (tribunal colectivo) n.º 318/10.4JACBR que corre termos no 3º Juízo do Tribunal Judicial da Figueira da Foz, foi imputada ao arguido A...

a prática de um crime de homicídio, p. e p. pelo artigo 131.º, do C. Penal.

Realizado o julgamento, por acórdão de 29 de Junho de 2011, foi decidido condenar o arguido, como autor do citado crime de homicídio, na pena de 12 (doze) anos de prisão.

**** Inconformado com a decisão, dela recorreu, em 28/7/2011, o arguido, defendendo, em síntese, a sua revogação e substituição por outra que o condene numa pena “no mínimo de 4 anos de prisão”, extraindo da motivação as seguintes conclusões: 1. O ora recorrente foi condenado, pela prática de um crime p. e p. pelo artigo 131.º, do C. Penal, na pena de doze anos de prisão.

  1. Pelas razões invocadas, ao arguido não deveria ter sido aplicada pena superior a 4 anos de prisão.

  2. O recorrente foi erradamente condenado pelo crime de Homicídio simples, p. e p. pelo artigo 131.º, do C. Penal.

  3. A conduta do recorrente encontra-se confinada ao tipo legal do artigo 133.º, do C. Penal, e nunca ao tipo do artigo 131.º.

  4. No âmbito do recurso, o recorrente pretende ver sindicada a reapreciação da prova gravada, insuficiência para a decisão da matéria dada como provada, erro na apreciação da prova, errada qualificação jurídica e medida da pena.

  5. Importa anexar aos autos a transcrição integral da prova.

  6. Muitas dúvidas se colocam sobre o preenchimento do tipo legal de crime de homicídio simples, imputado ao recorrente.

  7. O arguido recorrente não tem antecedentes criminais de relevo, goza de bom comportamento, é de humilde condição sócio-económica e no meio onde vive é respeitado e respeitador.

  8. Está bem inserido familiarmente.

  9. Conquanto tudo o que consta dos autos, não apresenta perigosidade de maior, sendo bem aceite na localidade onde reside, reconhecendo a censura que lhe cabe face ao comportamento delituoso cometido que atribuiu a uma conduta que ainda hoje não consegue explicar, mas que deve ficar longe da punição infligida.

  10. Desta forma, violou, por ter feito errada interpretação, entre outros: 12. Andou mal o tribunal a quo na interpretação da letra e de um espírito encarnado no artigo 127.º, do CPP, que não admite decisões arbitrárias e sem fundamento, como é aludido em toda a doutrina.

  11. Sendo que, como já se referiu, in casu, estão falidos os pressupostos do artigo 131.º, do C. Penal, devendo, desde logo, e no que diz respeito ao ora recorrente, deveria ter sido feita a convolação ad minus para o artigo 133.º, do citado diploma.

  12. Sem prescindir, entende a defesa que foi erradamente fixada a medida concreta da pena, sendo violados os artigos 40.º, 50.º, 70.º, 71.º e 72.º, do Código Penal.

  13. Logo, a pena aplicada ao ora recorrente é excessiva, desproporcionada e de severidade injustificada, tendo sido ultrapassada em muito a medida da culpa.

  14. O Tribunal a quo foi longe de mais nas conclusões obtidas e a convicção final ficou muito longe da realidade.

  15. Pelo que o Tribunal errou ao considerar a prova, presumindo factos que não encontram sustento factual.

  16. O que, no mínimo, implicava que se usasse o princípio in dubio pro reo.

  17. A pena deverá ser reformada e substancialmente reduzida.

  18. Não se aludem a condenações do género ou de qualquer outro imputados ao arguido e o tribunal a quo deveria ter retirado disso a necessária consequência, como, aliás, manda o artigo 71.º, n.º 2, alíneas a), b) e d), do Código Penal. Com efeito, como ensina o Prof. Figueiredo Dias, nos factos relativos à conduta do agente se perfilham a vida anterior, o passado criminal, o dano “tout court” causa que in casu não foi nenhuma.

  19. Não foram tomadas em devido relevo as circunstâncias externas redutoras da culpa.

  20. Assim, e em suma, o recorrente deveria ter sido condenado numa pena no mínimo de 4 anos de prisão: é o que se requer.

Qualquer albitre que Vªs Exªs considerem não deixarão de fazer. JUSTIÇA.

NORMAS VIOLADAS: a) Artigo 133.º, do C. Penal; b) Artigo 32.º, da C.R.P.; c) Artigos 127.º, 374.º, 379.º e 410.º, n.º 2, todos do C.P.P.; d) Artigos 40.º, 41.º, 50.º, 51.º, 52.º, 53.º, 70.º, 71.º, 72.º, n.º 1, todos do C. Penal.

**** O Ministério Público junto do Tribunal recorrido, em 29/7/2011, apresentou resposta na qual defendeu a manutenção da decisão recorrida, terminando com as seguintes conclusões: 1. O tribunal a quo fundamentou a sua decisão quanto à matéria de facto provada, enumerando os elementos probatórios que contribuíram para a formação da sua convicção, com indicação dos depoimentos prestados pelas testemunhas em audiência e das razões que os dotaram de relevância e credibilidade. Ademais, tal tarefa foi realizada com conhecimentos lógicos e objectivos e alicerçada nos elementos de prova obtidos em audiência, bem como nos documentos juntos aos autos e invocados na motivação fáctica; 2. Também no que respeita à medida concreta da pena, concordamos integralmente com a posição e fundamentação constante da decisão recorrida, pelo que entendemos que a mesma não merece qualquer reparo.

**** O recurso foi, em 8/8/2011, admitido.

Nesta Relação, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto, em 16/8/2011, emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso, acompanhando, de modo integral, a resposta dada em 1ª instância.

Cumpriu-se o disposto no artigo 417.º, n.º 2, do CPP, não tendo sido exercido o direito de resposta.

O arguido encontra-se em prisão preventiva, desde 6 de Julho de 2010, no E.P. de Leiria, tendo sido detido, em 4 de Julho de 2010, para ser sujeito a primeiro interrogatório.

Colhidos os vistos, teve lugar conferência, cumprindo apreciar e decidir.

**** **** **** ****II. Decisão Recorrida: “(…) II.

FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO: * Após a realização da audiência de discussão e julgamento, entende o Tribunal provado, com relevância para a decisão a proferir, o seguinte conjunto de factos: 1 – o arguido e B... – ambos de nacionalidade brasileira e amigos desde diversos anos a essa parte – estiveram juntos toda a noite do dia 3 e a madrugada do dia 4 de Julho de 2010, passando em vários locais de diversão da cidade da Figueira da Foz, onde ingeriram diversas bebidas alcoólicas, designadamente whisky e cerveja, e ainda algumas bebidas (apelidadas de) “energéticas” (“Red Bull”); 2 – assim, entre, sensivelmente, as 2 horas e um pouco antes das 7 horas da madrugada do dito dia 4 de Julho de 2010, permaneceram no recinto do parque de diversões instalado no denominado “Parque das Gaivotas”, sito na Avenida de Espanha, na Figueira da Foz; 3 – em tal parque de diversões, e já algo “liberto” pelo poder do álcool, o B... abordou diversas pessoas que por aí deambulavam – e que o referido B... não conhecia –, com o único propósito de fazer evidenciar a sua presença, intervindo então o arguido, por mais do que uma vez, no sentido do apaziguamento dos ânimos e da cessação do comportamento do seu companheiro; 4 – um pouco antes das 7 horas da manhã, e ainda no recinto do aludido “Parque das Gaivotas”, o B... decidiu postar-se ao volante do automóvel ligeiro de matrícula …, a ele emprestado pela sua companheira, a testemunha C... (melhor identificada nos autos), e realizar um ou dois “piões”, vindo até a embater em uma roulotte de venda de bebidas e sandes ali existente, amolgando o automóvel; 5 – devido ao estado de embriaguez em que o B... . se encontrava, o arguido, pensando estar em melhores condições para conduzir, tentou convencer aquele a confiar-lhe o volante do automóvel em causa, para assim regressarem a casa, o que o B... . não aceitou; 6 – deste modo, no regresso ao prédio n.º …, na Figueira da Foz – onde viviam o arguido no rés-do-chão centro e o B... . no 3º andar centro –, continuou o B... . a conduzir o mencionado automóvel; 7 – já à porta do 3º andar centro do dito prédio o B... . e o arguido começaram a discutir em voz alta, pensando o B... . que o arguido iria falar à sua companheira do “toque” dado no automóvel, acusando-o, além do mais, de não ser seu amigo e de lhe estragar a sua vida; 8 – em tal contexto, um pouco depois das 7 horas da manhã do mencionado dia 4 de Julho de 2010, o arguido, bastante enervado após a discussão com o B... . – e em cujo decurso foi também agredido fisicamente (a soco e a pontapé) por este último no interior fronteiro à porta de acesso ao 3º andar centro do dito prédio e também no corredor de acesso a esse mesmo 3º andar centro –, dirigiu-se à sua residência, sita no rés-do-chão centro de tal prédio, com o objectivo de se munir de uma faca, o que fez; 9 – acto seguido, e munido de uma faca de cozinha, com uma lâmina com cerca de 20,80 centímetros de comprimento e 3 centímetros de largura, o arguido dirigiu-se novamente ao corredor de acesso ao 3º andar centro do aludido prédio, local onde ainda se encontrava o B... .; 11 – então, o arguido empunhou a dita faca e desferiu no corpo do B... . vários golpes ao nível do tórax, do abdómen, dos membros superiores e dos membros inferiores; 12 – assim, tais golpes desferidos pelo arguido provocaram ao nível do tórax do B... . uma ferida corto-perfurante, 1 centímetro abaixo da clavícula esquerda e 5 centímetros da linha média, orientada para baixo e para o meio, com cauda inferior a 1,50 centímetros e medindo 28 milímetros por 9 milímetros, bem como uma ferida corto-perfurante superficial, 1 centímetro para baixo e para a esquerda daqueloutra ferida, medindo 7 milímetros por 3 milímetros de afastamento de bordos; provocaram também, ao nível do tórax, uma ferida corto-perfurante 5,50 centímetros para a esquerda da linha média, abaixo das feridas anteriormente aludidas, com 2,50 centímetros oblíqua para baixo e para fora em direcção ao mamilo esquerdo, com o topo inferior em “V” e o superior redondo, com pequena cauda inferior; os mesmos golpes causaram ainda uma ferida corto-perfurante, 1,50 centímetros à direita da linha média, ao nível da terceira articulação condro-costal direita, oblíqua da...

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