Acórdão nº 1341/08.4TJVNF.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 04 de Outubro de 2011

Magistrado ResponsávelRODRIGUES PIRES
Data da Resolução04 de Outubro de 2011
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. 1341/08.4 TJVNF.P1 2º Juízo de Competência Cível de Vila Nova de Famalicão Apelação Recorrente: “B…, SA” Recorrido: C… Relator: Eduardo Rodrigues Pires Adjuntos: Desembargadores Márcia Portela e Pinto dos Santos Acordam na secção cível do Tribunal da Relação do Porto: RELATÓRIO O “B…, S. A.” propôs a presente acção com processo sumário contra C… e mulher D…, pedindo a condenação dos réus a pagar-lhe a quantia de 26.251,73€, acrescida de 1.560,72€ de juros vencidos até 18-04-2008 e de 62,43€ de imposto de selo sobre estes juros e ainda os juros que sobre a dita quantia de 26.251,73€ se vencerem, à taxa anual de 15,50 % desde 19.4.2008 até integral pagamento, bem como o imposto de selo que, à referida taxa de 4% sobre estes juros recair, por força do empréstimo concedido ao 1.º réu em proveito comum do casal, em relação ao qual o referido réu não pagou a 11ª prestação e seguintes, sendo que vencida a primeira, em 10.7.2007, se venceram todas as restantes.

Citados os réus, veio o 1º réu contestar, concluindo pela improcedência da acção.

Em abono da sua pretensão o 1º réu alega, em síntese, o seguinte: - viu-se impossibilitado de proceder ao pagamento das prestações do empréstimo, pelo que o autor lhe propôs que efectuasse a entrega do veículo automóvel objecto de financiamento, com a indicação de que, com essa entrega do veículo e consideradas as prestações já pagas, a dívida ficaria liquidada, nada mais sendo por ele devido; - assim, tendo o réu procedido à entrega do veículo ao autor, não pode este exigir do réu o pagamento de qualquer quantia, pois, com a entrega do veículo, extinguiu-se o crédito do autor, mediante dação em cumprimento; - de qualquer forma para determinação do valor em dívida deverá ser somado ao valor das prestações pagas pelo ora réu, o preço da venda do automóvel, recebido pelo autor.

Mais alega o réu que o contrato de mútuo em causa já se encontrava integralmente impresso não tendo havido qualquer negociação entre o autor e o réu relativamente ao respectivo conteúdo, sendo que o autor não deu cumprimento aos deveres de comunicação e informação que sobre ele impendiam.

Finalmente, refere o réu que o autor não tem direito a quaisquer juros remuneratórios relativamente ao prazo do empréstimo não decorrido.

O autor respondeu às excepções deduzidas, concluindo como na petição inicial.

A fls. 134 foi o réu notificado para vir alegar o montante concreto pelo qual a autora vendeu o veículo, o que o mesmo veio fazer a fls. 152.

Foi proferido despacho saneador, fixada a matéria assente e a base instrutória.

Realizou-se audiência de julgamento com observância do legal formalismo, tendo o Tribunal respondido à matéria de facto através do despacho de fls. 194/6, que não teve qualquer reclamação.

Proferiu-se depois sentença que julgou a acção parcialmente procedente, condenando os réus, solidariamente, a pagarem ao autor a quantia de €8.316,95 (oito mil trezentos e dezasseis euros e noventa e cinco cêntimos).

Inconformado com esta sentença, dela o autor “B…, SA” interpôs recurso, tendo finalizado as suas alegações com as seguintes conclusões: 1. No entender do recorrente, deveria ter sido dada como provada nos autos a matéria de facto constante dos quesitos 2º, 3º, 13º e 14º da base instrutória, quer face aos documentos juntos aos autos, nomeadamente o contrato consubstanciado no documento nº 1 da petição inicial, quer face à prova testemunhal produzida, que foi gravada.

  1. Na verdade, as testemunhas do autor ouvidas durante o julgamento - ouçam-se/leiam-se os depoimentos das testemunhas E… (01 Proc. 1341-08-4TJVNF CDJPMTS), F… (02 Proc.13417-08-4TJVNF CD PRSBFV), G… (03Proc. 1347-08-4TJVNF CD JAS) – afirmaram que o foi acordado entre o A, ora recorrente e o R, ora recorrido – consta até do contrato dos autos – vide doc nº 1 da petição inicial, assinado pelo R conforme por este expressamente confessado – que foi acordado que a falta de pagamento de uma das prestações do contrato implicava o vencimento imediato de todas as demais prestações, bem como que em caso de mora sobre o montante em débito, a título de cláusula penal, acrescia uma indemnização correspondente à taxa de juro contratada acrescida de 4 pontos percentuais Mais referiram as referidas testemunhas, como do seu depoimento expressamente ressalta, que o contrato foi impresso de acordo o acordado entre o R e o fornecedor, pelo que lhe foram comunicadas as cláusulas do contrato e que o R não solicitou ao A qualquer esclarecimento ou informação suplementar, nem anteriormente, nem posteriormente à aposição da sua assinatura no contrato dos autos.

  2. Não obstante a prova documental e a prova testemunhal produzida, o Senhor Juiz “a quo” entendeu, errando de forma flagrante, considerar não provada toda a matéria de facto constante dos quesitos 2º, 3º, 13º e 14º da base instrutória, violando o disposto nos artigos 653º e seguintes do Código de Processo Civil.

  3. Ora, atento o que resultou provado nos autos relativamente à matéria de facto constante dos quesitos 2º, 3º, 13º e 14º da base instrutória, impõe-se, nos termos e de harmonia com o disposto na alínea a), do artigo 712º do Código de Processo Civil, a alteração da resposta dada a tal matéria de facto, que deverá, evidentemente, ser considerada provada.

  4. Deve, pois, conceder-se provimento ao presente recurso de apelação e, em consequência, alterar-se a resposta dada aos quesitos 2º, 3º, 13º e 14º da base instrutória, por forma a considerar-se provada a mesma e, em consequência, considerar-se a presente acção totalmente procedente condenando-se os RR, ora recorridos, no pedido.

    Acresce que, 6. O contrato dos autos – que era o terceiro celebrado entre o A e o R - estava integralmente preenchido quando o R o assinou e o A estava à disposição dele para lhe prestar todos os esclarecimentos e informações complementares que esta eventualmente reputasse necessários, quer anteriormente a este subscrever o contrato referido nos autos, quer posteriormente, sendo que o dito R. não solicitou ao A. recorrente que este lhe prestasse qualquer informação ou esclarecimento suplementar anteriormente à aposição da sua assinatura no contrato dos autos, ou sequer posteriormente (como podia e devia ter feito se tivesse tido dúvidas que pretendesse ver esclarecidas, e como aliás o faria qualquer pessoa que usasse de diligência comum e tivesse dúvidas).

  5. Contrariamente ao que o Sr. Juiz “a quo” “entendeu”, o A. recorrente não tem obrigatoriamente que ler e explicar aos seus clientes todas as cláusulas dos contratos que com eles celebra – excepto evidentemente se estes não souberem ler ou lhe suscitarem dúvidas acerca do conteúdo do contrato -, o que o recorrente tem que fazer - e faz, e fez - é assegurar que as condições contratuais acordadas constam dos contratos antes de estes serem assinados, precisamente para permitir que quem use de “comum diligência” possa ler e analisar o contrato, e estar à disposição dos seus clientes para lhes prestar quaisquer esclarecimentos que estes lhe solicitem sobre os contratos que celebra, e tal ressalta inequívoco dos autos.

  6. E se porventura o R. recorrido não leu - como leu –, ou não se inteirou – como inteirou - do contrato dos autos antes de o assinar foi porque não o quis ler, tanto mais que não lhe foi imposto pelo A. qualquer prazo para assinar o contrato dos autos, não pode é, agora, de boa fé, pretender que tal pretenso “facto” (que aliás é falso) pode de qualquer forma afectar a validade do contrato dos autos, que aliás o dito R. recorrido começou por cumprir e com o qual adquiriu, há muito, o veículo dos autos.

  7. Acresce que não só as cláusulas do contrato dos autos, porque perfeitamente claras e explícitas, não justificam qualquer aclaração em especial - a não ser, evidentemente, que o R. tivesse sobre elas pedido qualquer esclarecimento, o que não fez -, como, sendo o contrato dos autos um contrato celebrado entre ausentes – como ressalta do processo de elaboração antes descrito - sempre se teria que atender “às circunstâncias” que no n.º 1 do referido artigo 6º do Decreto-Lei 445/85, de 25 de Outubro, se ressalvam.

  8. O A. recorrente cumpriu, pois, sem dúvida, os referidos deveres de comunicação e de informação, devendo revogar-se a sentença dos autos porque, erradamente, decide o contrário, não havendo que excluir o que quer que seja do contrato de mútuo dos autos, designadamente as respectivas condições gerais acordadas, que o R. recorrido expressamente subscreveu e aceitou.

  9. Acresce que, como em sede de alegações melhor se explicitou, a invocação nos autos pelo R. ora recorrido da pretensa violação dos referidos deveres de comunicação e informação, atento o momento e os motivos com que é feita, constitui sempre um manifesto abuso de direito por parte do dito R.

  10. A ser como referido na sentença recorrida, então estar-se-ia a deduzir ao montante do capital mutuado o montante de juros remuneratórios incluindo em cada prestação paga, como porque é errado, o entendimento, no sentido de que o vencimento apenas se verificaria relativamente à divida de capital, mas já não aos juros remuneratórios acordados, como ainda, porque são devidos juros de mora, à taxa contratualmente ajustada.

  11. Na verdade, em cada prestação paga estão incluídos juros remuneratórios que ainda que seguindo a tese defendida na sentença recorrida, se venceram, pelo que não é de deduzir o valor das prestações pagas no capital, pois que parte das mesmas se destinou à liquidação de juros remuneratórios e não apenas a capital mutuado (vide plano financeiro ao diante junto como doc. nº 3) 14. Não assiste razão ao entendimento constante da sentença recorrida, na questão relativa aos juros remuneratórios, porque as partes acordaram regime diverso, como explicitado.

  12. Como explicitado, mesmo sem a cláusula penal de 4% a acrescer à taxa de juro acordada, sempre o A. recorrente teria direito aos juros moratórios à taxa de 13,50% ao ano (ou seja 11,50 + 2%), e o respectivo imposto de selo.

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