Acórdão nº 7679/08.3TBMTS.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 15 de Setembro de 2011

Magistrado ResponsávelTELES DE MENEZES
Data da Resolução15 de Setembro de 2011
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Apelação n.º 7679/08.3TBMTS.P1 (28.06.2011) – 3.ª Teles de Menezes e Melo – n.º 1251 Des. Mário Fernandes Des. Leonel Serôdio Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I.

B… intentou a presente acção sob a forma de processo sumário contra C…, SA pedindo que se declare resolvido o contrato de compra e venda celebrado entre a autora e a Ré; a condenação desta a pagar à A. a quantia global de € 12.230,00 (correspondendo: € 9.990,00 à restituição do preço, € 1.040,00 ao armazenamento da viatura desde o mês de Outubro de 2007 até à data, à razão de € 80,00 mensais, e os meses subsequentes até à entrega da viatura, € 200,00, ao tempo do seguro da viatura e € 1.000,00 aos danos morais sofridos pela autora e sua família); e, a condenação da Ré no pagamento dos juros legais, à taxa anual de 4%, sobre € 11.230,00, vencidos desde o mês de Outubro de 2007 até à data, de € 490,00, bem como os vincendos até efectivo pagamento.

Alegou que a Ré levou a cabo, no mês de Setembro de 2007, no recinto do “…”, à …, na cidade do Porto, uma exposição/venda de carros usados que a autora visitou no dia 16. Nesse dia, o seu colaborador/vendedor D…, mostrou à A. o veículo automóvel marca Peugeot, modelo …, matrícula ..-BJ-.., não tendo esta nessa altura ficado com a percepção dos pormenores do carro. No dia seguinte foi a casa da A., a quem disse que ia vender um automóvel que depois de preparado nas oficinas da Ré estaria como novo. Assim se fez a reserva de venda, pelo preço de € 9.990,00, com o sinal de € 200,00, pago pela A.. Em 09.10.2007, à noite, D… apareceu para entregar o automóvel, o que fez com as respectivas chaves. Entregou também um certificado de matrícula, uma autorização de circulação e um termo de responsabilidade que a A. assinou. E recebeu o restante preço, pago por esta, no valor de € 9.790,00, de que não deu quitação. Era suposto a Ré ter entregue à A., como se obrigara, um automóvel em estado impecável, como novo; o registo na Conservatória do Registo Automóvel do veículo em nome da A. ou documento bastante para a promoção do registo; e documento de circulação emitido pela Conservatória do Registo Automóvel. Nada disto aconteceu e, nestas condições, a A. não quer a manutenção do contrato. O automóvel, quando vistoriado no dia seguinte e à luz solar, exibia borrachas vedantes das portas rasgadas; a escova do pára-brisas rasgada; riscos; o encaixe do cinto do condutor partido e colado com fita cola; a luz de presença, no interior nunca funciona; em andamento faz barulho; os pneus da frente estão “carecas”; e, não existe livro de manutenção. De tudo a A. reclamou à Ré, através da pessoa de D…, que nada fez. Entretanto, o automóvel continuou em nome de outrem e a A. não tem documento que a habilite a circular. A A. aderiu ao seguro automóvel proposto por D…, o qual não serve para nada, pelo que fez cancelar a apólice, com o inerente prejuízo, de € 200,00. A A., nas condições em que está o automóvel, desinteressou-se dele. Está o veículo guardado na sua garagem à ordem da Ré, que terá de pagar a armazenagem à razão de € 80,00 por mês. A situação vem causando à A. incómodos, despesas e desgostos.

A Ré contestou, alegando a caducidade do direito da A. propor acção de anulação da venda e alegando que esta teria de formular pedido de eliminação dos defeitos que invoca ou de substituição do veículo, para o que também já operou a caducidade do respectivo direito de acção. Invocou a ineptidão da petição, decorrente do facto de a A., face aos invocados defeitos e vícios do veículo, não poder formular pedido de resolução. De facto, a autora teria direito à eliminação dos defeitos ou à substituição, caso a reparação não fosse possível. Verifica-se assim uma contradição entre a causa de pedir e o pedido, o qual, além do mais, carece de suporte legal, tendo em conta o regime jurídico do contrato de compra e venda. Impugnou a factualidade alegada pela A., dizendo que ela examinou o veículo exposto à luz do sol e recebeu as informações que solicitou, decidindo-se pela sua aquisição. O veículo antes de ser entregue à A. foi objecto de trabalhos de pintura e polimento nas oficinas da "C1…, SA". A Ré procedeu à revisão do estado dos travões, direcção, luzes, óleos, pneus, limpeza do interior, etc, sendo falso que na data da entrega tivesse os defeitos enumerados pela A.. Após a reclamação verbal da A., o vendedor da Ré aceitou que o auto rádio não se encontrava em bom funcionamento e afirmou-lhe que o mesmo seria trocado. Contudo, face à posição da A., que poucos dias após a entrega do veículo já queria “desfazer” o contrato, o diálogo tornou-se impossível. O veículo era um semi-novo ou chamado “veículo de serviço”. Estes veículos mantêm-se na posse do concessionário por determinado período de tempo, mas averbados em nome da importadora. O veículo encontrava-se registado a favor da "E…", importadora para Portugal dos veículos da marca Peugeot. Após a conclusão do contrato com a A., a Ré comunicou à "E…" a venda do veículo para efeitos de ser promovido o registo a favor da cliente. Logo que recebeu o DUA com a propriedade averbada a favor da A. remeteu-lho pelo correio. O facto de a autorização de circulação ter uma validade de 30 dias é ultrapassado com a emissão de nova declaração, pelo vendedor.

A A. respondeu, dizendo não ocorrer ineptidão da petição nem caducidade do direito que pretende exercer através da acção.

Foi elaborado despacho saneador, dispensando-se a selecção da matéria de facto assente e a organização da base instrutória, com fundamento na simplicidade da causa.

Procedeu-se ao julgamento e foi proferida sentença que julgou a acção improcedente, absolvendo a Ré do pedido.

II.

Recorreu a A., concluindo: 1. Foi dado por provado e considerado, na sentença, pela Exa. Senhora Juíza do Tribunal “a quo”, essencialmente o seguinte: a) A recorrente comprou, à recorrida, o automóvel identificado nos autos; b) Nas circunstâncias ali descritas; c) A recorrente pagou, à recorrida, a quantia de € 9.990,00, correspondente ao preço do referido automóvel; d) A recorrida não entregou, à recorrente, nem a factura, nem o recibo do preço que recebera; e) A recorrida devia ter entregue, à recorrente, um automóvel em bom estado, pelo menos impecável, que o Tribunal, não se sabe porquê, se recusou a considerar como novo, até pelo preço que custou; f) O automóvel que a recorrida vendeu, à recorrente, não estava na sua propriedade; g) O automóvel entregue à recorrente, pela recorrida, apresentava muitas mazelas e defeitos, sumariamente enumerados nos autos; h) A recorrida não promoveu, em tempo útil, o registo do veículo no nome da recorrente; i) Nem a recorrida entregou à recorrente, ao menos, documento bastante para que esta o pudesse registar; j) O documento de circulação do automóvel tinha, apenas, a validade de 30 dias; k) A recorrida nunca se preocupou em revalidar ou emitir outro ou outros documentos de circulação do automóvel; l) A recorrida nunca esteve disponível para aquele nem para outros efeitos, por isso, o documento de circulação caducou; m) Por isso, a recorrente, mesmo que quisesse, não podia transitar, com o veículo, na via pública; n) A recorrente reclamou, várias vezes, junto da recorrida, a quem fez sentir aquele estado de coisas, e quanto a perturbavam e prejudicavam; o) A recorrente esperava uma solução, por parte da recorrida, e, como não chegava solução alguma, indicou-lhe a sua; p) A recorrente reclamou logo para o vendedor e representante da recorrida, D…, pedindo-lhe, encarecidamente, tratasse os problemas postos da melhor maneira que conseguisse; q) Mas em vão, pois o Sr. D… nada fez, nem nada promoveu, limitando-se a não mais atender aos muitos telefonemas que a recorrente lhe dirigiu; r) Este Senhor, arrolado pela recorrida, como testemunha, nunca apareceu nas audiências, apesar do Tribunal ter mostrado muito empenho na sua audição; s) A recorrente reclamou, para a recorrida, para a sua sede, pelo telefone, mas em vão, pois ninguém propôs solução alguma; t) A recorrente reclamou, para a recorrida, por escrito, através do seu mandatário, mas em vão, pois não obteve resposta, fosse em que sentido fosse; u) A recorrente reclamou, para a recorrida, agora através de uma notificação judicial avulsa, mas em vão, pois continuou quieta e calada; v) Nem assim, a recorrida se prontificou a solucionar os problemas da recorrente, não lhe propondo uma, sequer, das várias alternativas possíveis.

  1. O mínimo que se exigia da recorrida, um grupo económico, era que tivesse, na melhor conta, o que lhe havia sido dirigido e que, sobre isso, tomasse clara e definitiva posição.

  2. Que apresentasse, à recorrente, alternativas que ela aceitasse, como a reparação dos defeitos e a entrega dos documentos em falta, ou a troca do veículo por outro, ou a redução do preço ou a anulação do contracto.

  3. Ou se aceitava, ou não, a resolução do contracto, o que a recorrente considera que aceitou, ao não ter dado resposta à pretensão que, nesse sentido, lhe fora dirigida por várias vezes.

  4. Direito de...

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