Acórdão nº 0742054 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 24 de Outubro de 2007

Magistrado ResponsávelARTUR OLIVEIRA
Data da Resolução24 de Outubro de 2007
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

O TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO - SECÇÃO CRIMINAL (QUARTA) - no recurso n.º 2054/07 - com os juízes Arlindo Teixeira Pinto (presidente da secção), Artur Oliveira (relator), Maria Elisa Marques e José Piedade, - após audiência, profere, em 24 de Outubro de 2007, o seguinte AcórdãoI - RELATÓRIO 1. No processo comum (tribunal singular) n.º .../03.1PAGDM, do .º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Gondomar, em que são assistentes B.......... e C.......... e arguido D.........., procedeu-se a julgamento e foi proferida sentença que decidiu nos seguintes termos (fls. 567): «5.1. Absolvo o arguido D.......... da prática de um crime de homicídio negligente, p. e p. pelo artº 137º, nº1, do C.P.

5.2. Julgo o arguido D.......... autor material de um crime de ofensa à integridade física negligente, p. e p. pelo artº 148º, nº1, do C.P., mas, atenta a ausência de queixa válida, julgo procedente a excepção de ilegitimidade do Ministério Público por falta de condição de procedibilidade e, em consequência, declaro extinto o procedimento criminal contra o arguido, com o consequente arquivamento dos autos." 2. Inconformado, o arguido recorre, extraindo da respectiva motivação as seguintes conclusões (fls. 627, verso - 628): «1 - As assistentes, em seu requerimento a fls. 18 não se limitaram a uma mera constituição de assistentes.

1.1 - Fizeram-no nos termos da al. c) do n.º 1 do artigo 68º e do n.º 3: "aceitando-o no estado em que se encontrara", normativos do C.P.P.

2 - Tal significa que, como filhas, não renunciaram à queixa apresentada, uma vez que se constituíram assistentes.

3 - Ora, aceitar o processo no estado em que se encontre, é ratificar, revalidar todos os actos constantes do mesmo.

3.1 - Com efeito, ratificando o processado, não se pode excluir um acto nuclear, constante desse processado - uma queixa apresentada.

3.2 - A aceitação - ratificação, se opera relativamente ao todo, não pode excluir a parte, a queixa.

4 - A interpretação da meritíssima Juíza "a quo" é abusivamente restritiva e ilegítima.

5 - Esta decisão da não legitimidade do Ministério Público só se entendia, se paralelamente se não se aceitasse como ratificada a queixa, uma vez que o crime deixou de considerar-se público, para ser particular. 6 - Aceitar um processado que inclui uma queixa que é aceite por quem tem legitimidade, al. c) do n.º 1 do art. 68º do C.P.P., e n.º 3, gera legitimidade dessa mesma queixa, pois quem aceita, assim a ratifica.

Termos em que, por violação dos arts. 68º n.º 1, al. c) e n.º 3 e art. 49º n.º 1 ambos do C.P.P. e art. 113º, n.º 2, 115º e 148º do C. Penal, deve a presente sentença recorrida ser revogada na parte que julga procedente a excepção de ilegitimidade do Ministério Público considerando-se válida a queixa, com as consequências legais, maxime a condenação do Arguido pelo crime p. e p. pelo art. 148º n.º 1 do C. Penal assim se fazendo, JUSTIÇA.

  1. Na resposta, o Ministério Público refuta todos os argumentos do recurso, pugnando pela manutenção do decidido (fls. 600-603). Por sua vez o Exmo. procurador-geral-adjunto adere à resposta apresentada, emitindo parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso (fls. 615).

  2. Colhidos os vistos, realizou-se a audiência.

  3. A sentença recorrida deu como provados e não provados os seguintes factos, seguidos da respectiva fundamentação (fls. 545-555): «2. Dos Factos §1. Provados Com relevância para a decisão da causa, da audiência de discussão e julgamento resultaram provados os seguintes factos: 2.1.No dia 10 de Outubro de 2003, pelas 08H15, o arguido conduzia o veículo automóvel ligeiro de mercadorias, de matrícula ..-..-FU, pela hemifaixa direita da Rua ..........., em .........., nesta Comarca, atento o seu sentido de marcha ........../.......... .

    2.2. A faixa de rodagem tem a largura de 5,20 metros, com piso em asfalto, apresentando naquele local um traçado rectilíneo, encontrando-se o piso seco e não circulando qualquer outro veículo naquele momento com que se tivesse cruzado.

    2.3. Ao chegar próximo do número ... de polícia, local onde a referida via é marginada por edificações, o arguido, devido à velocidade a que circulava, nunca inferior a 50 Km/hora, bem assim a falta de atenção e ao encandeamento provocado pela luz solar, não avistou E.......... e F.......... que se encontravam a efectuar o atravessamento da faixa de rodagem da esquerda para a direita, atento o sentido de marcha do arguido, embatendo nos mesmos com a parte frontal direita da viatura, quando estes já se encontravam perto do passeio situado do lado esquerdo (atento o sentido de marcha do arguido).

    2.4. Em consequência desse embate, E.......... e F.......... foram projectados para cima da tampa do motor, caindo depois a F.......... desamparada no solo, ficando inanimada e o E.......... foi projectado contra uma habitação.

    2.5. Em consequência do embate, F..........

    sofreu traumatismo crâneoencefálico (hemorragia subaracnoideia e contusões cerebrais) e fractura da bacia (ramos ilio-isquio-púbicos à direita).

    2.6. O arguido ao animar o veículo automóvel que conduzia a uma velocidade nunca inferior a 50 km/hora, por conduzir com falta de atenção à estrada, aliado ao encandeamento solar que lhe diminuía a visibilidade, descurou as mais elementares regras de prudência que podia e devia ter observado, tendo em conta que a via é marcada por edificações, factos que o obrigavam a circular com velocidade adequada a deter a sua marcha no espaço livre e visível á sua frente, perante qualquer obstáculo que se lhe apresentasse na via e que, por esse motivo, embateu em E.......... e F.........., em consequência do qual esta sofreu as lesões físicas descritas, resultado que o arguido não previu nem quis.

    2.7. Sabia o arguido que tais condutas eram proibidas por lei e penalmente punidas e, tendo capacidade de determinação segundo as legais prescrições, ainda assim quis conduzir o veículo da forma referida.

    2.8. Na sequência daquelas lesões F.......... foi internada no Hospital de .........., no Porto, onde viria a falecer em 22/11/2003, por lhe ter sobrevindo infecção cardio-respiratória.

    Mais se provou 2.8. O sol "colocado de frente" para o arguido diminuía-lhe o seu campo de visão no momento em que embateu na vítima.

    2.9. O arguido circulava pela metade direita da estrada, atento seu sentido de marcha.

    2.10. Não há naquele local passadeira para os peões atravessarem a estrada.

    2.11. O veículo era bem visível para quem atravessava a estrada.

    2.12. Após o choque o veículo ficou imobilizado exactamente na metade direita da estrada.

    2.13. Sem qualquer sinal de travagem.

    2.14. Sem marcas no pavimento.

    2.15. Quando o arguido se apercebeu das pessoas, ocorreu o choque.

    2.16. Após o choque o arguido fez tudo o que lhe era possível para prestar auxílio às vítimas.

    2.17. Pediu pelo telefone a presença de seu Pai que é médico.

    2.18. Este compareceu.

    2.19. Examinada a vítima, não apresentava qualquer sinal de risco: pulso normal, respiração correcta, orientada.

    2.20. A vítima havia já sofrido um acidente vascular cerebral, era uma diabética dependente, revelava osteoporose, padecia de arritemia auricular e tinha 86 anos de idade.

    2.21. Das fichas clínicas da vítima resulta que em 24.10.2003 é tida como curada ou pelo menos estável e é considerada como apta para alta.

    2.22. Nesta data está curada do traumatismo craneal e a fractura apenas exige repouso.

    2.23. Todas as lesões que revela são típicas da idade e de acidente vascular cerebral não recente.

    2.24. Nesta data apenas aguarda decisão familiar para a alta.

    2.25...

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