Acórdão nº 0712154 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 10 de Outubro de 2007

Magistrado ResponsávelJOAQUIM GOMES
Data da Resolução10 de Outubro de 2007
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam, em Conferência, na 1.ª Secção do Tribunal da Relação do Porto.

  1. RELATÓRIO.

  1. - No PCS n.º .../04.0IDPRT ..º Juízo do Tribunal da Póvoa do Varzim, em que são: Recorrente: Ministério Público.

    Recorrido/Arguido: B.........., Lda. e C..........

    foi proferido despacho no início da audiência de julgamento em 2007/Jan./31, a fls. 312-315, o qual considerou descriminalizados os factos que se encontram descritos na acusação, deduzida em 2005/Nov./30, que imputava aos arguidos um crime de abuso de confiança fiscal, na forma continuada, p. e p. pelo art. 24.º, n.º 5, do Dec.-Lei n.º 20-A/90, de 15/Jan., com a redacção introduzida pelo Dec.-Lei 394/93, de 24/Nov., actualmente art. 105, n.º 5 do RGIT, 30.º, n.º 2, e 79.º, estes do Código Penal.

    Tal despacho surge na sequência da alteração do art. 105.º, n.º 4 do RGIT, efectuada pela Lei n.º 53-A/06, de 29/Dez., que aprovou o Orçamento para 2007, considerada mais favorável aos arguidos, pelo que não se encontrando preenchida a condição agora aditada, prevista na al. b) daquele segmento normativo, encontra-se a sua conduta descriminalizada.

  2. - O Ministério Público interpôs recurso em 2007/Fev./15, a fls. 321/4, pugnando pela revogação do despacho recorrido, o qual deverá ser substituído por outro que ordene a notificação do arguido, singularmente e em representação da sociedade, para no prazo de trinta dias proceder ao pagamento da coima mínima prevista no art. 114.º, por força do disposto no art. 105.º, n.º 4, al. b), ambos do RGIT e art. 2.º, n.º 4, do Código Penal, concluindo do seguinte modo: 1.º) Face à actual redacção do n.º 4 do art. 105.° do RGIT, para haver crime de abuso de confiança toma-se necessário, para além do decurso do prazo de 90 dias sobre o termo do prazo legal da entrega da prestação, existir o não pagamento na sequência de uma notificação para que o agente, em 30 dias, proceda ao pagamento da prestação comunicada à administração fiscal, acrescida de juros e o valor da coima aplicável; 2.º) Não obstante a alteração do regime punitivo, o crime de abuso de confiança fiscal consuma-se com o vencimento do prazo legal de entrega da prestação tributária; 3.º) Em sede de tipicidade a lei orçamental nada alterou; 4.º) Nos processos pendentes, há que lançar mão do disposto no art. 2.º, n.º 4, do Cód. Penal, pois o actual regime é mais favorável para o agente, tanto relativamente à extinção da punibilidade pelo pagamento, como quanto à punibilidade da conduta (como categoria que acresce à tipicidade, à ilicitude e à culpa); 5.º) A lei não identifica qual a coima que deve ser liquidada nem o seu valor, entendendo-se que se trata da coima mínima aplicável à falta de entrega da prestação tributária; 6.º) O despacho recorrido violou o disposto nos art. 105.°, n.º 4, al. a) e b) e 114.°, n.º 1 do RGIT e 2.°, n.º 4 do Código Penal.

  3. - O arguido C.......... respondeu em 2007/Mar./14, a fls. 331/6 sustentando igualmente que os factos descritos na acusação se encontram despenalizados, em virtude do legislador, com a referida alteração, ter acrescentado uma nova condição objectiva de punibilidade, que no caso não se verifica.

  4. - O despacho recorrido foi sustentado e nesta instância foi emitido parecer em 2007/Abr./17, a fls. 353, pelo ilustre PGA, que aderiu ás motivações de recurso.

    *A questão a decidir é se a alteração legislativa que adicionou a al. b) ao n.º 4 do art. 105.º do RGIT conduz ou não à descriminalização dos factos descritos na acusação que foi formulada contra os arguidos.

    * * *II.- FUNDAMENTAÇÃO.

    O crime de abuso de confiança fiscal encontra-se actualmente previsto no art. 105.º, do RGIT[1], punindo-se no seu n.º 1 "Quem não entregar à administração tributária, total ou parcialmente, prestação tributária deduzida nos termos da lei e que estava legalmente obrigado a entregar".

    O tipo objectivo deste ilícito criminal ocorre quando aquele que deduz ou recebe certa prestação tributária, decorrente de uma relação jurídica tributária, não a entrega tempestivamente, originando um prejuízo para o património fiscal.

    Para melhor se compreender esta tríplice relação tributária será de referir que o fisco é credor tributário, o contribuinte surge como o verdadeiro devedor tributário, enquanto aquele que deduz a prestação tributária aparece como o substituto fiscal.

    Assim, este último passa a ser simultaneamente o contribuinte indirecto e o fiel depositário do imposto devido por aquele, porquanto administração tributária atribui-lhe o dever de liquidar e entregar-lhe o respectivo imposto.

    O tipo subjectivo basta-se com o dolo-do-tipo, ou seja, com o conhecimento do dever de entregar a prestação tributária retida e a vontade...

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