Acórdão nº 2798/2007-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 26 de Junho de 2007
Magistrado Responsável | CARLOS MOREIRA |
Data da Resolução | 26 de Junho de 2007 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA 1.
1.1 P e G intentaram contra F, LDA, todos com sinais dos autos, acção declarativa, de condenação, sob a forma de processo ordinário.
Pediram a condenação da ré em indemnização pelos danos emergentes do não cumprimento de contrato de empreitada, bem como lucros cessantes e ainda danos morais, todos a liquidar em execução de sentença.
Para o efeito alegaram, em síntese que: - São casados entre si; - Celebraram com a ré em 24 de Maio de 2002 um contrato de empreitada, através do qual a ré se obrigou a construir uma moradia unifamiliar no Sobral de Monte Agraço, pelo preço global de 224 459,05 €; - A ré comprometeu-se a concluir os trabalhos de empreitada até 20 de Dezembro de 2002; - No início dos trabalhos os autores adiantaram à ré a quantia de 22 445,59 €, fixando-se o restante valor em quantias mensais a entregar conforme autos de medição da obra; - Os autores entregaram à ré as seguintes quantias: 23.08.02 ------------------------- 14 964,00 € 13.09.02 ------------------------- 22 500,00 € 31.10.02 ------------------------- 19 952,00 € 02.12.02 ------------------------- 11 177,22 € 05.12.02 ------------------------- 5 000,00 €; - Findo o prazo para a conclusão da empreitada esta encontrava-se, segundo auto de peritagem, em franco estado de atraso; - Em virtude disso os autores denunciaram o contrato de empreitada por carta registada em 09 de Janeiro de 2003; - Os autores tiveram que efectuar pagamentos aos sub empreiteiros que eram da total responsabilidade da ré; - Sofreram prejuízos materiais e morais pela não conclusão atempada, rigorosa e completa do contrato de empreitada.
1.2.
A ré contestou.
Por excepção invocou a ilegitimidade da autora.
Por impugnação opôs-se à a factualidade alegada pelos autores.
Deduziu ainda pedido reconvencional, impetrando a condenação do autor na quantia de 25 919,45 €.
Para o efeito alegou que: - O montante total entregue pelos autores à ré ascende a 94 861,03 €, o que corresponde à parte efectivamente construída pela ré; - Durante os meses de Outubro, Novembro e Dezembro de 2002 choveu muito, o que impediu o normal desenrolar da obra; - O autor mostrou-se indeciso na escolha de alguns materiais para a obra o que também atrasou a mesma; - O autor não tinha projecto de electricidade, o que também causou atraso nos trabalhos; - A ré teria um lucro de 20% sobre o valor total da empreitada se não fosse o incumprimento do contrato por parte do autor.
Os autores apresentaram réplica, pugnando pela improcedência da reconvenção e reiterando a sua posição já vertida na pi.
1.3.
Foi proferido despacho saneador, no qual se julgou improcedente a arguida excepção de ilegitimidade processual da autora G e se admitiu a ampliação do pedido reconvencional deduzido pela ré, e foram organizadas a matéria assente e base instrutória, que não sofreram reclamação.
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No seguimento dos autos foi prolactada sentença que: Julgou a autora G, na vertente substancial.
Julgou o pedido inicial do autor improcedente, porque não provado, e em consequência, absolveu a ré do mesmo, bem como do pedido de condenação contra esta formulado a título de litigante de má-fé.
Julgou parcialmente procedente, por parcialmente provado, o pedido reconvencional e, em consequência, condenou o autor a pagar à ré reconvinte a quantia que se liquidar em execução de sentença relativamente aos lucros que a mesma poderia ter obtido com a conclusão da obra do mesmo, acrescida de juros de mora à taxa legal contados desde a data da citação e até integral pagamento.
-
Inconformadas recorreram ambas as partes sendo que a ré a título subordinado.
3.1.
O autor rematou as suas alegações com as seguintes conclusões: 1- A concessão, ou não, do prazo admonitório não foi alegada pela R. em nenhum articulado.
2- A concessão, ou não, do prazo admonitório não resulta de qualquer meio de prova junto aos autos.
3- Os AA. desconhecem de onde o Tribunal retirou a conclusão de que não concederam prazo admonitório à R.
4- A decisão proferida pelo Tribunal foi uma decisão surpresa porque nunca antes havia sido invocada por nenhuma das partes, mormente pela R, que é quem aproveita da sua invocação, nem discutida em sede própria.
5- Deste modo a decisão recorrida enferma de erro de julgamento, violação do princípio do contraditório (art. 3º, n.º 3 do CPC), que decorre do princípio da igualdade das partes (art. 3ºA do CPC, art. 1º, art. 2º e art. 13º da CRP), e falta de fundamentação (art. 205º, n.º1 da CRP, art. 158º, art. 668º, n.º1, al. b) do CPC), devendo por isso ser revogada por nulidade (art. 201º, n.º1 do CPC).
6- O contrato de empreitada não é um contrato de prestações duradoiras, mas as suas prestações perduram no tempo.
7- Embora o contrato de empreitada não seja um contrato de execução continuada, por ser de execução prolongada, deve-se aplicar o regime jurídico previsto para aqueles contratos.
8- O regime jurídico a aplicar-se aos contratos de empreitada é o previsto para as prestações duradoiras.
9-O artigo 808º, talhado por medida para negócios sobre transacções de bens, se não ajusta directamente às relações contratuais duradoiras.
10- No caso de relações contratuais duradouras, como a empreitada, a resolução pode operar com base em justa causa, sem recurso aos mecanismos do art. 808º do CC.
11- O caso sub judice trata-se de um contrato de empreitada que por ter natureza análoga à dos contratos duradoiros não se aplica o mecanismo do prazo admonitório.
12- Pelo que, salvo o devido respeito, o fundamento da sentença do Tribunal a quo enferma de vício de violação de lei devendo por isso ser revogada.
13- A existência de justa causa de resolução exclui a necessidade do recurso ao mecanismo do artigo 808º do CC.
14-O comportamento da R. revela uma conduta mais que pouco cooperativa, mas sim, manifestamente violadora do vinculo contratual.
15- Nas relações obrigacionais duradoiras o que está em causa não é a perda do interesse numa concreta prestação (pelo menos em regra) mas a justificada perda do interesse na continuação da relação contratual.
16-Os recorrentes estavam a pagar duas vezes o mesmo serviço sendo por isso evidente a existência de uma justificada perda de confiança por parte dos Recorrentes.
17-Mais, a perda de confiança, que já era nula, agravou-se com a manifesta falta de capacidade da Recorrida concluir a obra, uma vez que, os subempreiteiros haviam rescindido o seu vínculo contratual.
18- Num vínculo cuja execução se protela no tempo, a tomada de decisão quanto a resolver o contrato deverá ser célere, pois, caso contrário, pode criar-se na contraparte a confiança de que o contrato subsistirá não obstante o incumprimento.
19- Destarte, os factos constantes nos autos revelam a gravidade do incumprimento dos Recorridos, sendo eles consubstanciadores da invocação, por parte dos recorrentes, de justa causa para resolver o contrato de empreitada.
20- O Tribunal a quo entendeu que os AA. não alegaram factos concretos que permitam apurar a existência de quaisquer danos.
21- Sucede que, salvo o devido respeito os articulados dos RR não se coadunam com tal afirmação.
22- Os AA. alegaram factos reveladores de danos nos artigos 13º, 20º, 21º, 22º da p.i. e nos artigos 16º e 24º da réplica.
23- O Tribunal a quo deu como provado que os AA. pagaram aos subempreiteiros montantes da responsabilidade do empreiteiro.
24- O Tribunal deu como provado que não obstante a obra estar atrasada, os AA. tinham efectuado os pagamentos ao empreiteiro conforme combinado contratualmente.
25- Destarte, parece-nos que a sentença, nesta parte, para além de não corresponder ao que consta nos articulados enferma de contradição (art. 668º, n.º1, al. c) do CPC).
26- Salvo o devido respeito, os factos atrás referidos consubstanciam danos sofridos directamente pelos AA. Pelo que, esteve mal a sentença ao referir que os AA. não alegaram factos concretos, devendo também por isso ser revogada.
3.1.
Por seu turno a ré aduziu a seguinte argumentação conclusiva: 1) Pelo depoimento das testemunhas (…), o Tribunal a quo deveria ter alterado a matéria assente constante da al. c), bem como dar como não provado o quesito n.º 3 e, provado, na sua totalidade, o quesito n.º 72º da douta base instrutória.
2) Pelo que, não o tendo feito não fez o douto Tribunal a quo uma análise crítica daquela prova, violando assim o disposto no art. 653º nº 2 do C.P.C.
3) Na verdade, deverá o mencionado facto constante da al. c) da matéria assente ser modificado para passar a constar que: A R. comprometeu-se a concluir os trabalhos objecto do contrato de empreitada até, pelo menos, 31 de Março de 2003, conforme resulta do teor do contrato de empreitada.
4) Pois só assim se entende o sentido das restantes cláusulas daquele contrato de empreitada, nomeadamente o sua cláusula 9ª.
5) Por outro lado, deverá ser dado como não provado o quesito n.º 3 e, provado, na sua totalidade, o quesito n.º 72º da douta base instrutória.
6) E assim sendo, deveria o Tribunal a quo ter condenado o A. a pagar à R. a quantia de isto é, 20% sobre o valor total da empreitada, a título de lucros que a R. poderia ter obtido com a conclusão da obra.
7) E não ter relegado para execução de sentença a condenação o lucro que a R. retiraria da empreitada, uma vez que tinha ao seu alcance todos os elementos para fixar o objecto e a quantidade da dita condenação, pelo que, não fez, o Tribunal a quo, uma correcta interpretação do preceituado no art. 661 do C.P.C.
Sendo que, cada um dos litigantes pugna, em contra-alegações, pelo indeferimento do recurso do outro.
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Uma vez que, por via de regra - de que o presente caso não constitui excepção - o teor das conclusões define o objecto do recurso, as questões essenciais decidendas são as seguintes: A.
Do recurso do autor.
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Violação, ou não, do princípio do contraditório (art. 3º, n.º 3 do CPC), que decorre do princípio da igualdade das partes (art. 3ºA do CPC, art. 1º, art. 2º e art. 13º da CRP), por o tribunal ter entendido...
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