Acórdão nº 4310/2003-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 15 de Julho de 2003
Magistrado Responsável | SIMÕES DE CARVALHO |
Data da Resolução | 15 de Julho de 2003 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Acordam na Secção Criminal (5ª) do Tribunal da Relação de Lisboa: No processo n.º 103/96 da Vara de Competência Mista Cível e Criminal de Sintra, por acórdão de 06-12-1999 (cfr. fls. 219 a 230), no que agora interessa, foi decidido: «Nestes termos e pelos fundamentos expostos, acordam os juízes que constituem o tribunal colectivo em julgar procedente a acusação e decidem:
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Condenar o arguido (P) como autor de um crime de homicídio por negligência p. p pelo art° 137° n° 2 do cód. penal, na pena de TRÊS (3) ANOS DE PRISÃO, em concurso real, como autor de um crime de omissão de auxílio, p. p. pelo art° 200° n° l e 2 do cód. penal na pena de DEZOITO (18) MESES DE PRISÃO; como autor de um crime de ofensas à integridade física por negligência, p. e p. pelo art° 148° n° l do cód. penal, na PENA DE SEIS (6) MESES DE PRISÃO e como autor de um crime de condução perigosa de veiculo, p. e p. pelo art° 291° n° l al. b) do cód. penal, na PENA DE DEZOITO (18) MESES DE PRISÃO.
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Efectuar o cúmulo Jurídico das penas parcelares, nos termos do art° 77° do cód. penal e condenar o arguido na PENA ÚNICA DE QUATRO (4) ANOS DE PRISÃO EFECTIVA.
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Condenar ainda o arguido na taxa de justiça de 3 UC, bem como nas legais custas, com 1/4 de procuradoria a favor dos SSMJ e 1% da taxa de justiça nos termos do artº 13º n° 3 do D.L. 423/91 de 30.10.
...».
O supra aludido arguido não aceitou esta decisão e dela recorreu (cfr. fls. 234 a 257), extraindo da motivação as seguintes conclusões: «1. A audiência de julgamento foi gravada e em consequência é admissível o recurso em matéria de facto, o que se solicitou; 2. A Douta Sentença, ora recorrida é absolutamente omissa no referente aos factos não provados, não referindo se existiram factos não provados, ou, havendo quais foram eles; 3. Não cabe ao Arguido presumir tal elemento da sentença; 4. O Arguido foi cerceado dos seus direitos de defesa, pois, não lhe é possível saber se o julgador tomou conhecimento de todas as questões em debate; 5. Existe uma nulidade da sentença ou do acórdão, nos termos do art.º 379º n.º l alínea a) do C.P.P., por violação do estipulado no art.º 374° n.º 2 que obriga à enumeração dos factos considerados pelo tribunal como provados e não provados; 6. No Douto Acórdão ora recorrido, constam factos não instrumentais, que não integravam a acusação ou a pronúncia, uma vez que resultaram da inquirição de testemunhas em sede de julgamento, assim, também não sabe o Arguido quais os restantes factos instrumentais ou essenciais apurados em sede de julgamento que o Douto Tribunal a quo terá considerado não provados; 7. O Douto Acórdão recorrido é nulo; 8. Como tal deverá ser ordenando o reenvio do processo para nova apreciação da matéria de facto nos termos do art.º 426º do C.P.P.; 9. A sentença, encontra-se também ferida de nulidade nos termos do art.º 379° n.° l alínea b), pois existe uma condenação do Arguido por factos e crimes diversos dos descritos na acusação, em violação flagrante do disposto nos art.°s 358° e 359º do C.P.P.; 10. O Arguido foi acusado por uns e posteriormente condenado por outros crimes, existindo uma clara diferença, que não resulta unicamente de diferente qualificação jurídica, mas sim de uma diferente factualidade e grau de culpa; 11. Embora fosse acusado da prática de três crimes sob a forma negligente, foi o Arguido posteriormente condenado por quatro crimes, sendo dois na forma dolosa, ao que acresce a inclusão na Douta Sentença, como provados, de factos omissos na acusação; 12. É na acusação que se determina o objecto do processo, os factos posteriormente surgidos têm de ser objecto de novo inquérito; 13. Existiu uma clara violação do objecto do processo, ou seja, uma alteração dos factos; 14. As alterações não substanciais, dos factos descritos na acusação importam nos termos do art.º 358° n.º l C.P.P. a sua comunicação ao arguido, concedendo-lhe prazo para a sua defesa; 15. Tal comunicação não existiu; 16. Existiu assim uma clara violação do direito à defesa, com absoluto desrespeito do Principio do Contraditório; 17. Existiu também uma clara alteração substancial dos factos descritos na acusação; 18. Tal alteração foi determinante para efeitos da condenação, quer na determinação dos factos em que se baseou a decisão judicial e fundamentais em termos por exemplo do grau de culpa, quer na determinação da moldura penal aplicável e que veio a ser aplicada; 19. Não foi dado o acordo a que se refere o art.º 359 n.º 2, assim, deveria o Douto Tribunal a quo, ter comunicado os novos factos ao Ministério Público para que fossem objecto do competente inquérito, tudo nos termos do art.º 359 do C.P.P.; 20. A comunicação não foi realizada; 21. A sentença, é assim, nula; 22. A presente nulidade, ao valorar para efeitos de determinação das normas aplicáveis e fixação da medida da pena certos factos que não constam da acusação, é insanável, nos termos legais citados; 23. O Douto Tribunal Superior, deverá, declarar a nulidade da sentença com a consequente repetição do julgamento, tudo nos termos dos art.°s 359º, 379°, 410° e 426º, todos do C.P.P.; 24. A Sentença recorrida, violou também o disposto no art.º 397° n.° l alínea c), pronunciando-se sobre questões de que não podia ter conhecimento, no caso matéria contra-ordenacional, que já foi objecto da competente e oportuna sanção e constituindo à presente data caso julgado, que como tal não pode nem deve ser sujeita a julgamento; 25. O Acórdão ora recorrido, padece ainda de um lapso, que se encontra logo no parágrafo inicial e embora a sua eliminação não importe modificação substancial, deverá ser corrigido nos termos do art.º 380°, n.°s l e 2 do C.P.P.; 26. A sentença ora recorrida, contém ainda uma obscuridade, que corrigida, poderá implicar uma alteração substancial, já que na folha n.° 3 da sentença, correspondente a fls. ... dos autos, no parágrafo que se inicia por: "O Arguido (P)", existe uma referência a "momentos antes", mas não se diz antes de quê?; 27. Tal facto, pode ter relevância no apuramento do comportamento do Arguido; 28. Assim, o Douto Tribunal a quem, deverá, não havendo alteração substancial, proceder à correcção da sentença, nesta parte e segundo o prescrito no art.º 380° n.° 2 do C.P.P., ou existindo aquela alteração, proceder nos termos dos art.°s 359°, 379º, 410° e 426º, todos do C.P.P.; 29 Em alguns pontos, a Douta Sentença do Tribunal a quo terá incorrido em erro de facto e na apreciação da prova, nos termos do art.º 410º, n.º 2 do C.P.P.: 30. Existiram também alguns factos que o Douto Tribunal não apreciou ou considerou relevantes, mas, em boa Justiça deveriam ter sido considerados como provados, em violação de igual preceito; 31. Bem como alguns factos notórios que não foram considerados pelo Douto Tribunal; 32. A reapreciação da prova referente à matéria de facto implicará a revogação do Douto Acórdão recorrido, mediante alteração das motivações de facto, nos termos peticionados e em consequência subsunção de forma diferente nos tipos de crime de que o Arguido vem acusado; 33. Assim, terá também de concluir-se que o Arguido terá praticado um único crime de homicídio por negligência p. e p. pelo art.º 137º n.º l, ao invés do art.º 137 n.° 2, acrescido de um crime de omissão do dever de auxilio, embora com culpa reduzida p. e p. pelo art.º 200° n.° 1, sendo absolvido da prática dos crimes de condução perigosa e ofensas corporais p. e p. pelos art.°s 148º n.° l e 291º n.° l e n.º 2, todos do Código Penal; 34. Na determinação da medida da pena, deverão ser tidos em conta, nos termos dos art.°s 71º e 72º do C.P., como características atenuantes, que é uma pessoa casada, plenamente inserida socialmente em termos pessoais e profissionais, que os factos ocorreram à quase quatro anos, quando ainda era muito jovem, que agiu com negligência simples, que possui baixo grau de escolaridade e que se apresentou livre e pessoalmente às autoridades competentes, bem como a confissão parcial dos factos em sede de julgamento; 35. Desta forma, deve aplicar-se ao Arguido uma pena de multa, ou, quando muito pena de prisão até ao máximo, em cúmulo jurídico, de três anos, embora suspensa na sua execução e serão cumpridas as disposições referentes às regras de prevenção geral e especial dos tipos de crime em apreço.
Nestes termos, e nos demais de direito, que o Douto Tribunal Superior certamente suprirá, devem os autos ser: a) declarados nulos por falta de indicação da matéria de facto não provada; b) declarados nulos por considerarem factos e preceitos jurídicos que importam alteração substancial e não substancial dos factos, não tendo sido cumprido o formalismo legal prescrito; c) declarados nulos, por o Tribunal ter conhecido de factos de que não podia ter conhecimento; d) corrigidos nos lapsos e obscuridades invocados; e) reapreciados no respeitante à matéria de facto erradamente dada como provada; f) ser reapreciados no respeitante aos tipos de crime em que o arguido foi condenado; g) e ser reduzidos na medida da pena aplicada. ...».
Admitido o recurso (cfr. fls. 263), e efectuadas as necessárias notificações, apresentaram resposta o Mº Pº (cfr. fls. 264 a 270) e os assistentes (ID)e (V) (cfr. fls. 280), que concluíram: I - O Mº Pº «1ª - Dando como provada toda a matéria de facto vertida na pronúncia e não tendo sido apresentada pelo arguido outra versão dos factos seria espúria a pretendida referência a factos não provados.
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- Todos os factos indiciariamente integradores das quatro infracções por que o arguido foi pronunciado foram considerados provados, pelo que preenchidos que ficaram todos os seus elementos típicos, bem andou o Tribunal em condenar o arguido pelo cometimento das quatro infracções.
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- Alguns elementos circunstanciais plasmados na decisão, v.g. o modelo do carro utilizado, que uma das vitimas revelou ter tido medo da condução do arguido ou um desabafo proferido por ele após o acidente, em nada influenciaram a incriminação feita ou afectaram a culpa do agente e por...
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