Acórdão nº 0031448 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 11 de Janeiro de 2001

Magistrado ResponsávelMOREIRA ALVES
Data da Resolução11 de Janeiro de 2001
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação do Porto: Relatório Daniel .…….., intentou no Tribunal de Círculo de Chaves a presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário contra o Banco A, alegando em resumo: - O A. é dono e portador do cheque nº………, sacado por Hilário ………, sob a conta nº….….. de que é titular no banco R. -agência de Guimarães- .

- Tal cheque tem a indicação de ter sido emitido em 10/11/95 com o valor nominal de 4.908.000$00, pagável à ordem de "……… - Agência de Câmbios S.A." a qual por sua vez o endossou ao A. em pagamento da quantia que lhe era devida no quadro de relações comerciais que mantinham.

- O referido cheque foi visado em 10/11/95 pelo R.

- O A. aceitou o endosso do cheque por este se encontrar visado e na convicção que, por isso, estava assegurado o pagamento da quantia titulada.

- Veio, porém, a ser recusado o pagamento do cheque, por ter sido falsificado.

- De facto, o cheque em causa, quando foi visado pelo Réu estava passado pelo valor de 3.900$00 e a favor de outro beneficiário, sofrendo falsificação após a aposição do visto e a entrega à ".…….. Agência de Câmbios S.A.".

- De acordo com a prática bancária em Portugal e segundo as regras das próprias instituições bancárias, incluindo do R., a aposição do visto num cheque pretende informar acerca da existência de provisão na data do visto e de que essa provisão fica cativa sob responsabilidade do sacado e afecta ao pagamento desse cheque.

- Ainda de acordo com aquela prática e regras, o acto de "visar" um cheque é rodeado de medidas destinadas a evitar a falsificação do cheque, daí que esteja estabelecido que os espaços em branco antes e depois das quantias em numerário e por extenso (pelo menos, no extenso) devam ser inutilizados por traço contínuo, e uma cautela acrescida deve mesmo levar o banco a acrescentar, a par do escrito visado, com idêntica letra, por cima do cheque, uma vez mais o valor do cheque visado.

- Tais regras são sancionadas pelo Banco de Portugal.

- A Ré não teve essas cautelas, já que nem sequer inutilizou os espaços em branco, o que permitiu ou pelo menos favoreceu as circunstâncias que permitiram a ulterior falsificação do cheque.

- Agiu, pois, o R. de forma negligente e ficou obrigada a indemnizar o A. pelos prejuízos sofridos nos termos do art. 483º do C.C.

Citado o R. veio contestar, defendendo-se por excepção (caso julgado) e por impugnação, como consta de fls. 15 e seg.

Houve Réplica Na audiência preliminar, não tendo sido possível a conciliação das partes, foi proferido despacho saneador, no âmbito do qual se julgou improcedente a excepção de caso julgado do deduzido pelo banco R.

Fixaram-se os factos assentes e organizou-se a base instrutória.

Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi lida a decisão sobre a matéria de facto que não sofreu reclamações.

Foi, de seguida, proferida sentença que julgou procedente a acção, condenando o banco R. a pagar ao A. o valor do cheque em questão, ou seja, 4.908.000$00.

É desta decisão que recorreu o R., recurso esse que veio a ser admitido como de apelação e com efeito suspensivo.

Conclusões Apresentadas tempestivas alegações formulou o apelante as seguintes conclusões: 1º- As alíneas u) e x) dos factos assentes respeitam a matéria que só pode ser provada por documento (regras do Banco de Portugal); 2º- O aviso circular do Banco de Portugal junto pelo apelado e que suporta tais factos apenas determina que "na zona do extenso qualquer espaço em branco, deve ser inutilizado completamente a traço contínuo".

  1. - Assim, a redacção das referidas alíneas deve passar a ser o seguinte: u) entre essas medidas, está estabelecido que os espaços em branco, antes e depois do valor inscrito por extenso deve ser inutilizado a traço contínuo.

    1. a regra da alínea u) é emanada do Banco de Portugal.

  2. - O cheque dos autos quando foi apresentado para ser visado já se encontrava trancado com traços a seguir ao valor do extenso, com a mesma tinta com que tinham sido dactilografados os demais dizeres dos cheques, pelo que não fazia sentido que os funcionários do apelante procedessem a nova inutilização desse espaço.

  3. - As recomendações do Banco de Portugal transmitidas às instituições de crédito não são fonte de direito.

  4. - A regra do Banco de Portugal a que se alude na sentença em crise visou a uniformidade de procedimentos por parte das instituições de crédito relativamente aos cheques visados e não à protecção de interesses particulares.

  5. - Violou a sentença, por erro de aplicação e de interpretação o disposto nos art.1º e 483 nº1 do C.C. e do art 77º do D.L. nº 232/96 de 5/12.

    Conclui pela revogação da sentença recorrida.

    Nas contra-alegações, defende o A. /apelado a confirmação do decidido.

    Os Factos Foram tidos como provados os factos seguintes:

    1. O A. é portador do cheque nº .…….., sacado por Hilário .…….., sobre a conta nº .…….., de que é titular na agência de Guimarães do Banco A, aqui R.

    2. Do referido cheque consta que foi emitido na cidade de Guimarães, em 10/11/95, pelo valor nominal de 4.908.000$00, a favor da sociedade ".…….. - Agência de Câmbios S.A.".

    3. Do rosto do mesmo cheque consta ainda um carimbo a óleo com os dizeres: «cheque visado (ver verso)».

    4. No respectivo verso, contém as seguintes menções: «visado, 10/11/95 p. p. Banco A - Guimarães - 21.00».

    5. Subjacentes ao reproduzido texto figuram duas assinaturas manuscritas por dois funcionários da agência de Guimarães do R., com poderes para obrigar o R. nesta espécie de actos; f) Sobre as aludidas assinaturas foi aposto o selo branco em uso no Banco A.; g) O referido cheque assim preenchido com todos os dizeres anteriormente referidos, foi entregue à sociedade .…….. - Agência de Câmbios, S.A. pelo sacador, em troca da correspondente quantia em dinheiro que esta sociedade entregou àquele; h) Posteriormente, esta sociedade endossou o mesmo cheque ao A., em pagamento de uma quantia que lhe devia, no quadro de relações comerciais que mantinham; i) Na qualidade de portador legítimo deste cheque, o A. apresentou-o imediatamente a pagamento; j) Porém, foi-lhe recusado o pagamento do referido cheque por parte do R., com o fundamento de que se tratava de "documento falsificado", conforme carimbo no respectivo verso, em 16/11/95; l) Só então o A. soube, através do R., que o cheque em causa tinha sido falsificado quanto ao nome do beneficiário e quanto ao valor em numerário e por extenso, enquanto estava na posse do sacador, Hilário ……… .

    6. Foi, então, comunicado ao A. que este Hilário deslocou-se no dia 10/11/95 à agência de R. em Guimarães, onde era titular da conta referida em a), e solicitou que lhe fossem visados vários cheques, entre os quais figurava o cheque também referido em a), tendo, para o efeito, preenchido o empresso cuja cópia consta de fls. 28.

    7. Então, o cheque aqui em causa, encontrava-se com todos os dizeres preenchidos à máquina e nele figurava como beneficiário Fernando ……… .

    8. Nos lugares do montante do cheque, em numerário e por extenso, tinha inscrito o valor de 3.900$00.

    9. Foi com o cheque preenchido com os dizeres referidos em n) e o) que a agência do R. em Guimarães o visou, nos termos que constam das alíneas c), d) e f).

    10. Foi entre o momento em que o cheque assim visado foi levantado na dita agência do R. pelo sacador e o momento em que este o entregou à sociedade ………-Agência de Câmbios, S.A., que sofreu uma manipulação, em que foi alterado o nome do beneficiário do cheque de "Fernando ………" por "……… -Agência de Câmbios, S.A., e o seu valor em numerário e por extenso, de "3.900$00 (três mil e novecentos escudos)" para "4.908.000$00 (quatro milhões novecentos e oito mil escudos)".

    11. Até ao momento o A. ainda não conseguiu receber o valor de 4.908.000$00 titulado pelo cheque.

    12. De acordo com a prática bancária e segundo as regras das instituições bancárias, incluindo a própria R., a aposição do "visto" num cheque por parte de um banco, pretende informar acerca da existência de provisão na data do visto e de que essa provisão fica activa, sob responsabilidade do sacado, e afecta ao pagamento desse cheque.

    13. Por isso, o acto de "visar" um cheque é rodeado de medidas destinadas a evitar a falsificação do cheque visado.

    14. Entre essas medidas, está estabelecida que os espaços em branco, antes e depois dos valores inscritos, quer em numerário, quer por extenso, devem ser inutilizados com um traço contínuo.

    15. Também como medida de segurança, deve o banco acrescentar, a par do escrito "visado", com idêntica letra, por cima do cheque, o valor do cheque visado.

    16. Tais regras são emanadas do Banco de Portugal.

    17. No momento em que foi visado o cheque pelos funcionários do banco R., não foi escrito nem por extenso nem em numerário, o valor do cheque que estava a ser visado.

    (cof. Acta de fls. 118 - 118 v.).

    Matéria provada decorrente das respostas à matéria da base instrutória.

    1) Ao aporem o "visto" no cheque, nos termos que constam das alíneas c)...

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