Acórdão nº 6480/2005-3 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 16 de Maio de 2007
Magistrado Responsável | TELO LUCAS |
Data da Resolução | 16 de Maio de 2007 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Lisboa: I - RELATÓRIO 1. Nos autos de inquérito com o NUIPC 5501/03.6TDLSB, instaurado mediante denúncia apresentada por A- Companhia de Seguros, com sede na Rua ..., Porto, contra os arguidos (F) e (S), ali devidamente identificados, e que correu termos pela 8ª secção do DIAP de Lisboa, o Ministério Público determinou, no que aqui importa ter presente, o arquivamento dos autos, nos termos do art. 277º, n.º 1, do Cod. Proc. Penal, quanto a um eventual crime de falsificação de documento.
[1] 2. A denunciante, que foi admitida a intervir nos autos como assistente, discordando de tal arquivamento, requereu a abertura da instrução, pugnando pela pronúncia dos arguidos pela prática do crime de falsificação de documento, p. p. pelas disposições conjugadas dos arts. 255º, al. a), e 256º, n.º 1, al. b), ambos do Cod. Penal.
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Sem que tivessem lugar quaisquer diligências instrutórias, de resto não requeridas, realizou-se o debate instrutório, vindo o Snr. Juiz do 5º Juízo do TIC de Lisboa a proferir despacho de não pronúncia.
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É deste despacho que vem interposto pela assistente o presente recurso, concluindo a respectiva motivação nos seguintes termos (transcrevendo, com sublinhado e negritos da responsabilidade da recorrente): «1.º - Não pode a Assistente conformar-se com a douta decisão instrutória de fls. ora posta em crise, nos termos da qual decidiu-se não pronunciar os Arguidos (F) e (S) pelo crime de falsificação de documentos.
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- Com efeito, vem a douta decisão recorrida fundamentar tal decisão no entendimento de que a declaração amigável de acidente automóvel "mantém o seu valor probatório, ainda que da mesma constem elementos que não correspondem à verdade".
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- Afirmando-se ali que "o que constitui a verdade do documento é tão só a declaração que foi feita e não a verdade dessa declaração", 4.º - Não pode a Assistente concordar com tal entendimento, porquanto o mesmo viola o disposto no artigo art.256°, n.º l alínea b ) do Código Penal.
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- Conforme resulta dos autos, os Arguidos fizeram constar dados relativos a um acidente que bem sabiam ser falso em tal documento e assim determinaram a Assistente a suportar uma indemnização ilegítima dos danos sofridos pelo veículo "FD" noutro acidente.
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- O crime de falsificação de documento é um crime contra a vida em sociedade, em que é protegida a segurança e confiança do tráfico probatório, a verdade intrínseca do documento enquanto tal, como bem jurídico.
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- No seguimento deste entendimento, o artigo 256º do CP na alínea b) do seu n.º 1, prevê como crime de falsificação de documentos aquele em que "o agente, com intenção de causar prejuízo a outra pessoa (ou ao Estado), ou de obter para si ou para outra pessoa benefício ilegítimo", "fizer constar falsamente de documento facto juridicamente relevante".
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- Prevê assim o legislador os casos de falsidade intelectual ou ideológica do documento: o documento não reproduz com verdade aquilo que se destina a comprovar. Existe uma desconformidade entre o documento e a declaração que se destina a exarar, ou entre o documento e a realidade. Foi isso que no caso sub judice sucedeu.
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- Esta forma de falsificação prevista em termos claros e autónomas no n.º 1 da alínea b) do art. 256° do CP é bem distinta da forma de falsificação material do próprio documento (n.º 1, a) do mesmo artigo) ou do uso de documentos falsos (n.º 1, c) do aludido artigo).
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- Também os factos introduzidos pelos Arguidos em tal documento constituem factos com relevância jurídica dado que foram susceptíveis de constituir relações jurídicas.
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- O documento ou impresso denominado de "Declaração Amigável de Acidente Automóvel" serve precisamente para fazer fé das circunstâncias do acidente, acelerando e tomando menos burocrática a regularização dos sinistros, a fim de que os lesados rapidamente sejam indemnizados através do atrás aludido sistema de IDS Indemnização Directa ao Segurado.
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- Assim, com o preenchimento desse documento, os Arguidos não se limitaram a comunicar um acidente, mas antes submeteram a Assistente e a sua congénere FIDELIDADE, ao estabelecido na convenção IDS de Indemnização Directa ao Segurado, o que teve, logo, como consequência que a Assistente ficasse submetida na obrigação de indemnizar o alegado lesado (F), o que acabou por fazer, através do sistema IDS.
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- Pelo que é apta a materializar um facto juridicamente relevante, ou seja, com a mesma constitui-se uma relação jurídica, consubstanciada no pagamento de indemnização.
Nestes termos, deve dar-se provimento ao presente recurso, revogando-se a douta Decisão Instrutória recorrida, e pronunciando-se os Arguidos (F) e (S) pelo crime de falsificação de documento p.p. no artigo art. 256°, n.º 1 alínea b) do Código Penal, fazendo-se assim a...
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