Acórdão nº 10425/2006-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 29 de Março de 2007

Magistrado ResponsávelMANUELA GOMES
Data da Resolução29 de Março de 2007
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

9 Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa 1.

Maria, professora universitária, residente em Cascais, intentou, no dia 18 de Novembro de 2004, no Tribunal Cível de Lisboa, acção declarativa de simples apreciação, com processo ordinário, contra a Caixa Geral de Aposentações, pedindo que se lhe reconhecesse o direito a receber da ré, por morte do seu defunto companheiro P, as prestações sociais previstas na lei para a eventualidade da morte do subscritor-beneficiário, nomeadamente o subsídio por morte e a pensão de sobrevivência.

Para tanto, alegou, em síntese, que viveu com o beneficiário do ré P, em condições análogas às dos cônjuges, ininterruptamente, desde Setembro de 1998 até à morte dele ocorrida no dia 8.07.2004, encontrando-se ambos no estado de divorciados há vários anos, razão pela qual tem direito a que lhe seja reconhecido o acesso às prestações sociais devidas pela ré, designadamente o subsídio por morte e a pensão de sobrevivência.

Citada, veio a ré Caixa Geral de Aposentações contestar, impugnando, por desconhecer, os factos invocados pela autora relativamente à alegada vivência em união de facto com o falecido Pedro Santos e, basicamente, alegou que para que a acção pudesse proceder a autora teria de alegar, para além do mais, que necessitava de alimentos e que os não podia obter das pessoas referidas nas alíneas a) a d) do artigo 2009º do C. Civil ou da herança do falecido.

Mais invocou que, tendo o subscritor P falecido quando ainda se encontrava no activo, o subsídio por morte regulado pelo DL nº 223/95, de 8 de Setembro, era da responsabilidade do serviço do falecido.

Respondendo, a autora veio reafirmar que face ao diploma aplicável - a Lei nº 7/2001, de 11 de Maio - o companheiro sobrevivo beneficiará das prestações sociais, desde que reúna as condições previstas no art. 2020º do C. Civil, preceito que se não refere à necessidade do alimentando nem às possibilidades do alimentante. A lei ao estabelecer o acesso a prestações sociais pretende tão só permitir ao beneficiário um complemento para a sua subsistência decorrente do "aforro" que foi efectuado pelo seu falecido companheiro, ao longo da vida de trabalho, mediante descontos mensais depositados à ordem da instituição de segurança social; por isso é indiferente saber se o potencial beneficiário tem ou não meios de subsistência próprios.

Chegado o processo a esta fase, por articulado apresentado no dia 7.03.2005, vieram B e Ana, respectivamente filha e ex-mulher do falecido P, deduzir incidente de oposição espontânea, pedindo que, admitido o incidente, se reconhecesse à 1ª oponente, herdeira universal do "de cujus", o direito ao subsídio por morte do pai, a ser pago pela ré e se reconhecesse que a 2ª oponente residia em união de facto com o falecido Pedro Viegas há mais de dois anos sobre a data da morte deste e, consequentemente, fosse a ré condenada a pagar-lhe "todas as prestações decorrentes de tal estatuto", nomeadamente a pensão de sobrevivência a que se refere a Lei nº 7/2001 e art. 2080º do C. Civil.

Mais pediram que a acção fosse julgada improcedente e que, caso se viesse a demonstrar que a autora se servira do processo para fins diversos dos devidos, fosse a mesma condenada como litigante de má fé, em multa e indemnização a favor das oponentes, devendo esta corresponder ao pagamento dos honorários do mandatário, acordados em € 3000, quantia esta acrescida do IVA à taxa legal.

A ré contestou, renovando basicamente a argumentação expendida na contestação anteriormente apresentada, adaptada à pretensão de cada uma das oponentes (fls. 249 a 253).

Por seu turno, contestando a pretensão das oponentes, a autora reafirmou ser ela quem desde 1998 e até à data da morte do falecido - em 2005 - vivera em união de facto com o falecido e deduziu a excepção da ilegitimidade da oponente Patrícia, por ser filha maior do falecido e, não estando já a frequentar o ensino superior nem sofrer de qualquer incapacidade, não ter direito nem ao "subsídio de morte" nem à "pensão de sobrevivência" pretendidos.

A oponente Patrícia respondeu à matéria da excepção conforme resulta de fls. 310 e 311.

Com data de 22.12.2005 e justificado com a divergência jurisprudencial existente sobre a exigência de ser alegada e provada pelas requerentes a "necessidade de alimentos" e a "impossibilidade de os obter nos termos do art. 2009º do C. Civil" foi proferido despacho a convidar, quer a autora Maria quer a oponente Ana, a apresentarem novo articulado com a alegação dos ditos requisitos (fls. 324).

Apenas a autora Maria respondeu ao convite, alegando todavia que, face ao seu entendimento da legislação aplicável e como logo deixara dito, não carecia de alterar a causa de pedir e que à situação em apreço nem sequer tinha aplicação o disposto no art. 508º nº 3 do CPC (fls. 330 e 331).

Em sede de despacho saneador, foi oficiosamente julgada procedente a excepção dilatória da nulidade do processo por ineptidão da petição, por falta de causa de pedir, e a ré absolvida da instância movida tanto 1ª oponente, como pela autora e pela 2ª oponente, com fundamento, essencialmente, na circunstância de, sendo, no caso, a causa de pedir complexa, por constituída por uma pluralidade de requisitos, a falta de alegação de algum ou alguns deles implicar a falta de causa de pedir (fls. 336 a 339).

Dizendo-se inconformada com o assim decidido, obviamente na parte que prejudica a sua pretensão, a autora interpôs recurso de agravo.

Alegou e a final formulou, em síntese, as seguintes conclusões: 1. No douto despacho ora impugnado, foi considerado como fundamento para a procedência da excepção dilatória de nulidade por ineptidão da petição inicial, devido à falta de causa de pedir, a falta de alegação pela aqui Agravante, de factos que preenchessem os requisitos do artigo 2020º, nº 1, conjugado com o artigo 2009º, alíneas a) a d), ambos do Código Civil.

  1. Mas tal fundamento é de todo inconsistente. Com efeito, 3. O artigo 2020°, n° 1, do Código Civil desdobra-se - como qualquer outro preceito legal -, por um lado, em previsão ou hipótese e, por outro lado, em estatuição ou comando.

  2. A previsão ou hipótese do artigo 2020º, n° 1, do Código Civil é a seguinte: "Aquele que, no momento da morte de pessoa não casada ou separada judicialmente de pessoas e bens vivia com ela há mais de dois anos em condições análogas às dos cônjuges." 5. A estatuição do artigo 2020°, nº 1, do Código Civil é a seguinte: "tem direito a exigir alimentos da herança do falecido, se os não puder obter nos termos das alíneas a) a d) do artigo 2009º." 6. Afigura-se óbvio que este artigo 2020°, n° 1, do Código Civil apenas trata de reconhecer ao companheiro sobrevivo da união de facto o direito à prestação de alimentos, correlativo de uma obrigação de natureza essencialmente civilista.

  3. Passando agora para a Lei n° 7/2001, de 11.05, verifica-se que o respectivo artigo 6°, n° 1, ao definir o regime de acesso às prestações sociais por morte de pessoa que vivia em união de facto, tem também, por um lado, uma previsão ou hipótese e, por outro lado, uma estatuição ou comando.

  4. A previsão ou hipótese do artigo 6°, n° 1, da Lei n° 7/2001, é a seguinte: "Quem reunir as condições constantes no artigo 2020º do Código Civil" e a estatuição ou...

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