Acórdão nº 10576/2006-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 27 de Março de 2007

Magistrado ResponsávelMARIA JOSÉ SIMÕES
Data da Resolução27 de Março de 2007
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa I - RELATÓRIO N instaurou em 30-12-99 acção de despejo, sob a forma de processo ordinário, contra Maria em que pede se declare válida e eficaz a denúncia do contrato a que o A. procedeu, condenando-se a R. na entrega do imóvel que ocupa, mais se declarando a caducidade de a R. receber a indemnização prevista no artº89º-B/-2 do RAU, e condenando-se a R. a pagar-lhe a quantia de 3.793.315$00, com juros de mora à taxa de 7% ao ano desde a data da propositura da acção até pagamento sobre a quantia de 3.600.000$00 e ainda a quantia de 708.919$00, com juros de mora à mesma taxa desde a propositura até pagamento sobre 700. 000$00, e quantias vincendas de 200.000$00 por mês desde 1-1-2000 até entrega do prédio, com juros de mora à mesma taxa, devendo essa quantia de 200.000$00 ser anualmente actualizada de acordo com o coeficiente de actualização das rendas anualmente publicado para o regime das rendas livres.

Contestou a R. pedindo que se julgue improcedente a acção, devendo-lhe ser reconhecido o direito à transmissão do contrato de arrendamento, nos termos dos artº85º e 87º-4-a) e b) do RAU, que deve decidir-se ser a renda exigível de 8.836$00 e que as comunicações foram efectuadas no prazo previsto no artº89º do RAU. Mais pede a condenação do A. a proceder às obras de reparação de que o locado precisa.

Caso assim se não entenda, deverá operar a denúncia do contrato e condenar-se o A. a pagar à R. 7.200.000$00.

Deverá ainda, em última hipótese, condenar-se o A. a pagar à R., a título de indemnização por benfeitorias úteis e necessárias, 1.895.630$00.

Replicou o A., mantendo a sua posição.

No saneador foi logo afastado o direito de a R. pedir 35.500$00 por benfeitorias, por estar prescrita nesta parte tal pretensão.

A fl. 440 veio o A. reduzir o pedido, dizendo haver inutilidade do pedido relativamente à alínea d) da petição, apenas se mantendo aqui o pedido de juros desde 29-12-99, já que a R. manteve ilicitamente em seu poder o cheque de 3.600.000$00.

Uma vez que o valor locativo está já fixado em 120.000$00, o pedido da alínea e) deve ficar como segue: "deve a R. ser condenada a pagar ao A., € 598,56 por mês desde Outubro de 1999 até entrega efectiva e juros de mora à taxa legal".

A R. não se opôs à pedida redução do pedido.

Prosseguiram os autos, tendo sido proferida sentença que julgou em parte procedentes acção e reconvenção, decidindo: a) conceder prazo ao A. para depositar a importância total correspondente a 10 anos de renda (renda vigente à data da denúncia), que se fixa em 20 dias; b) Dever o prédio ser restituído de imediato ao A. (artº89º-C-3); c) Ter o A. direito a receber as rendas depositadas.

A partir desta data, a R. pagará não as rendas actualmente em vigor, mas mensalmente a importância correspondente ao valor locativo actual -120.000$00 (II-4 e 10), isto é, 598, 56 €; d) Não haver lugar ao pagamento de juros.

Quanto às despesas efectuadas pelo pai da R.

: O A. responde pelas despesas referidas em II-24, 25, 26 a 31 e 32 a 38, nos termos do artº12º do RAU.

Relativamente às despesas referidas em 26 a 31 e 32 a 38, o seu quantitativo liquidar-se-á oportunamente (661º-2 do CPC).

Os autos não permitiram inferir litigância de má fé.

Inconformada, apelou a ré, tendo apresentado as suas alegações que finalizou com as seguintes conclusões: 1- A sentença recorrida viola o disposto nas alíneas b), c), d) e e) do art.668º nº1 e 659º, nº2 e 3 do C.P.C. e ainda do art.89-A nº2, 89º-B nº1, 89º-C nº1 todos do RAU, como se demonstrará.

2- Face à matéria de facto dada como provada facilmente se conclui que o recorrido não tem qualquer direito ao despejo do locado, nem sequer à sua denúncia mediante o pagamento de uma indemnização à recorrente.

3- O recorrido é proprietário da fracção autónoma designada pela letra B), correspondente ao r/c esq. do prédio constituído no regime da propriedade horizontal sito na Av. Rio de Janeiro, em Lisboa, descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial sob o n°00081 da freguesia de S. João de Brito, inscrito na matriz predial urbana da mesma freguesia sob o art°807, encontra-se inscrita a favor do A. através da inscrição G-l-Ap. 01/131283,) por doação.

4- Por acordo escrito celebrado em l de Dezembro de 1956 H declarou dar de arrendamento a J, pai da recorrente, pelo prazo de seis meses, sucessivamente renovável, e mediante o pagamento da renda mensal de Esc. 830$00, para habitação do mesmo, a fracção autónoma referida, arrendamento que J aceitou e que teve início em l de Dezembro de 1956.

5- O pai da recorrente faleceu, no estado de viúvo, no dia 18 de Setembro de 1998.

6- Em 15 de Dezembro de 1998 a recorrente enviou ao recorrido uma carta registada com aviso de recepção, datada de 14.12.1998, em que comunicou ao recorrido o óbito do seu pai, invocando a qualidade e filha do mesmo, e que desde sempre conviveu com ele, e que entende ter direito à transmissão do arrendamento, esclarecendo efectuar tal comunicação nos termos e para os efeitos do art° 89 do Dec. Lei n° 321-B/90, de 15 de Outubro, tendo remetido certidão de óbito de J da mesma e uma certidão emitida pela Junta de Freguesia de São João de Brito, em Lisboa, de acordo com a qual a mesma residia, à data de 28 de Setembro de 1998, na morada referida em A) há mais de um ano.

7- O recorrido enviou comunicação à recorrente na qual optou pela denúncia do contrato de arrendamento mediante o pagamento de uma indemnização referente a 10 anos de rendas.

8- A recorrente respondeu à carta do recorrido alegando que se encontrava na situação prevista no art.87º nº4 alínea b)do RAU, não sendo licito ao recorrido denunciar o arrendamento, mas à cautela ofereceu nova renda no valor de Esc.60.000$00, tendo contudo referido que só a pagaria se fosse compelida judicialmente a fazê-lo.

9- A recorrente enviou ao recorrido fotocópia autenticada de um atestado médico de incapacidade multiuso, datado de 28 de Abril de 1999, em que se refere que a Ré apresenta deficiências que lhe conferem uma incapacidade permanente global de 70% desde Junho de 1992.

10- O recorrido insistiu na denuncia, tendo enviado à recorrente um cheque no valor de Esc.3.600.000$00 para pagamento de metade da indemnização devida para denuncia do contrato de arrendamento, mas desta vez com a indemnização calculada com base na nova renda proposta pela recorrente.

11- O cheque supra referido encontra-se junto aos autos, junção efectuada pela recorrente, porquanto a mesma considerou estar perante a situação prevista no art.87º nº4 alínea a) e b).

12- Encontra-se provado documentalmente nestes autos, e foi matéria levada à especificação, que a recorrente sofre de uma incapacidade global permanente de 70%, o que a incapacita totalmente para o trabalho, 13- A sentença recorrida considerou provado que a recorrente sofre de uma incapacidade de 55%, atento um relatório pericial efectuado com base não na apreciação das qualidades psíquicas e mentais da recorrente, mas sim com base num exame de clínica geral efectuado à recorrente, e no relatório da junta médica que considerou que a recorrente detinha uma incapacidade permanente global de 70%.

14- Face à conclusão retirada do relatório pericial, a recorrente efectuou um aditamento ao rol de testemunhas, no qual requereu a audição da sua psiquiatra, tendo o mesmo sido indeferido.

15- Ora, tal como foi decidido no Ac. RC de 7.4.1994, BMJ, 436º-458 - "Ocorrendo contradição entre respostas dadas aos quesitos e a matéria de facto especificada, é esta que prevalece, devendo considerar-se não escritas aquelas respostas".

16- Não restam pois dúvidas que deverá ser considerada a incapacidade global permanente da recorrente com base na percentagem de 70%, o que por si só permite à recorrente manter o contrato de arrendamento com a renda praticada à data da morte do seu pai.

17- Acresce ainda que, ainda que se considerasse que o recorrido tinha direito à denuncia do contrato de arrendamento, o que só por mera hipótese académica se concede, ainda assim o recorrido até à data de hoje não fez valida e eficazmente a denuncia, porquanto, o cheque enviado pelo recorrido à recorrente foi por esta junto aos autos, nunca o tendo utilizado.

18- Não tendo o recorrido feito depósito liberatório da quantia à ordem do presente processo, pelo que não se pode considerar que até hoje tenha sido efectuada qualquer denuncia do contrato sub judice.

19- Ao contrário, pela recorrente foi à cautela, e caso a sua pretensão de direito à transmissão do contrato de arrendamento com a renda praticada à data da morte do seu pai não fosse considerada, foi oferecida pela recorrente validamente nova renda.

20- A sentença recorrida ignorou por completo o pedido efectuado pela recorrente na sua reconvenção para que o recorrido procedesse às obras de conservação que o locado carece, a fim de assegurar as condições de habitabilidade necessárias, violando desta forma o disposto no art.668º nº1 alínea d) do C.P.C., o que gera a nulidade da sentença - Ac. STJ, de 17.4.1991:AJ, 18º/92-3 "...a omissão de pronuncia, como nulidade da sentença, só ocorre quando o juiz tenha deixado de proferir decisão sobre questão que devia conhecer".

21- Deverá ser declarada nula a sentença recorrida, substituindo-a por outra na qual se considere válida a transmissão do contrato de arrendamento para a recorrente com a renda praticada à data da morte do seu pai, nos termos do art.87º nº4 alínea a) e b), condenando-se ainda o recorrido a efectuar as obras de conservação requeridas em sede de reconvenção, ou em alternativa que seja considerada válida a proposta de nova renda efectuada pela recorrente, julgando-se totalmente sem efeito a denuncia efectuada pelo recorrido.

Foram produzidas contra-alegações pelo recorrido, tendo pugnado pela improcedência das nulidades invocadas pela recorrente.

Face à invocação de nulidades no recurso, o Mmº Juiz a quo no seu despacho de sustentação, entendeu serem de improceder as nulidades...

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