Acórdão nº 7797/2005-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 06 de Fevereiro de 2007
Magistrado Responsável | RUI VOUGA |
Data da Resolução | 06 de Fevereiro de 2007 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Acordam, na Secção Cível da Relação de Lisboa: Nas Varas Cíveis de Lisboa, MARIA instaurou contra P acção com processo ordinário, pedindo que seja declarada a caducidade de um contrato de arrendamento que vigorara entre ela Autora, como senhoria, e Conceição de Matos Fernandes Nunes (viúva do primitivo inquilino), como arrendatária, por morte desta, e a condenação do réu a pagar-lhe uma indemnização pelos danos que lhe tem causado ocupando sem título a fracção que fora objecto daquele contrato - a qual totalizava (à data da propositura da acção - 19SETEMBRO2001) o montante de 6.300.000$00, acrescido da verba de 300.000$00 por cada mês até à entrega efectiva da mesma fracção.
O Réu contestou, reconhecendo a caducidade do arrendamento mas sustentando pretender exercer direito a novo arrendamento (por viver com a aludida arrendatária desde havia mais de cinco anos à data da morte desta, que era sua tia - avó), sendo que a Autora recusou reconhecer-lhe esse direito a novo arrendamento e lhe manifestou vontade de vender a fracção mas sem lhe reconhecer direito de preferência.
Defendendo-se por impugnação, negou a produção de danos, que aliás, seriam excessivamente valorados pela Autora.
Ademais, invocou ainda abuso de direito por parte desta.
A Autora replicou, rebatendo a matéria de excepção.
O processo foi saneado, fixaram-se os factos assentes por acordo das partes e por documentos dotados de força probatória plena e organizou-se a base instrutória, após o que se seguiu a instrução dos autos.
Discutida a causa em audiência de julgamento (com gravação da prova testemunhal produzida) e decidida a matéria de facto controvertida, veio a ser proferida (em 10/2/2005) sentença final que, julgando a acção procedente, por provada, declarou a caducidade do arrendamento e condenou o Réu a pagar à Autora uma indemnização que totaliza, até 19/9/2001 (data da propositura da acção) a quantia de Esc. 5.250.000$00 (26.186,89 euros), acrescida da quantia de Esc. 250.000$00 (1.249,99 euros) por cada mês até entrega efectiva da fracção.
Inconformado, o Réu interpôs recurso de apelação da referida sentença, impugnando quer a matéria de facto apurada pelo tribunal de 1ª instância, quer a solução jurídica dada ao pleito pelo tribunal "a quo".
Apreciando a apelação do Réu, esta Relação, por acórdão de 15/11/2005, negou provimento ao recurso e confirmou integralmente a sentença recorrida.
Mais uma vez inconformado, o Réu interpôs recurso de revista, tendo o Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão de 11/7/2006, declarado nulo o acórdão recorrido, por omissão de pronúncia (quanto ao conhecimento da questão da impugnação da matéria de facto) e determinado a remessa dos autos a esta Relação para, uma vez decidida aquela questão, se fazer a reforma da decisão anulada, se possível pelos mesmos juízes.
Colhidos novos vistos legais, cumpre, pois, apreciar e decidir, em obediência ao decidido pelo Supremo Tribunal de Justiça.
O OBJECTO DA APELAÇÃO Como se sabe, é pelas conclusões com que o recorrente remata a sua alegação (aí indicando, de forma sintéctica, os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida: art. 690º, nº 1, do C.P.C.) que se determina o âmbito de intervenção do tribunal ad quem (1) (2).
Efectivamente, muito embora, na falta de especificação logo no requerimento de interposição, o recurso abranja tudo o que na parte dispositiva da sentença for desfavorável ao recorrente (art. 684º, nº 2, do C.P.C.), esse objecto, assim delimitado, pode vir a ser restringido (expressa ou tacitamente) nas conclusões da alegação (nº 3 do mesmo art. 684º) (3) (4). Por isso, todas as questões de mérito que tenham sido objecto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões da alegação do recorrente, mostrando-se objectiva e materialmente excluídas dessas conclusões, têm de se considerar decididas e arrumadas, não podendo delas conhecer o tribunal de recurso.
O Réu/Apelante rematou a sua alegação de recurso (na apelação por si interposta da sentença final), formulando as seguintes conclusões: "1ª Em primeiro lugar, afigura-se que o contrato de arrendamento em questão nos autos, se renovou, face ao facto do recorrente se ter mantido no gozo da fracção, por um período superior a um ano, sem oposição do locador.
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Resultando do apurado em D) , H) e O) dos factos provados que o recorrente , na sequência da morte de Conceição Nunes, se assumiu como locatário, por se considerar constituído no direito a novo arrendamento, habitando a fracção há vários anos, na qual tem sediada a sua vida pessoal e profissional.
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Com efeito, muito embora, nas datas referidas em E) e F) dos factos provados a A. tenha solicitado a entrega da fracção, após esse facto, decorreu muito mais de um ano, até à interposição da acção judicial, mantendo-se o recorrente no gozo do locado, sem qualquer oposição da A.
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Consequentemente , a decisão recorrida ao declarar a caducidade do contrato de arrendamento em referência nos autos, violou o disposto nos artgs° 326 n° 1 e 1056º do C.Civil.
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Por outro lado, mesmo que se tivesse verificado a caducidade do arrendamento, o atraso na restituição do locado apenas permite ao locador obter, a título de indemnização, o valor correspondente ao da renda ou ao seu dobro em caso de mora.
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Pelo que a decisão recorrida ao condenar o recorrente ao pagamento de uma indemnização, pelo atraso na restituição do locado, com base nos princípios gerais da responsabilidade civil, violou , manifestamente, o disposto no artg° 1045 n° I do C.Civil.
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Sendo certo que o valor da indemnização correspondente à renda apurada em C) dos factos provados, entre o momento em que o locado deveria ter sido desocupado e a data da propositura da acção - Dezembro de 1999 a Setembro de 2001 - 22 meses, importava em € 2.520,10 , acrescidos de € 114, 55 por cada mês até à entrega efectiva da fracção.
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Não se verificando a mora a que alude o artg° 1045º n° 2 do C.Civil, dado que as comunicações da A. ao recorrente pedindo a devolução do locado, ocorreram antes de ser exigível a sua devolução, não se tendo o recorrente, consequentemente, constituído em mora, nos termos do artg° 1053º do C.Civil e, considerando ainda que na propria acção não é pedida a devolução do locado.
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Por outro lado, o valor de rendimento de € 1.247 para um montante € 249.400 com base numa taxa de capitalização de 6% ao mês é meramente especulativo, por ser esmagadoramente superior à melhor taxa de juro que a banca põe à disposição dos privados para depósitos a prazo, como é do conhecimento público, para além da taxa de juro anual legal para este montante ser de 4% ao ano.
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Por último, a decisão recorrida, ao considerar que a fracção tinha um valor aproximado de € 249. 400 a que corresponde um rendimento mensal de € 1.247 , com base no relatório pericial do perito do Tribunal, não tomou em consideração que ao valor de venda de € 249.400 tinha de ser descontado € 100.000 referentes a obras que casa precisava , o que daria um valor de venda substancialmente inferior, com reflexo directo no rendimento do capital.
NESTES TERMOS e noutros de direito doutamente supridos deverá ser dado provimento ao presente recurso e, por via do mesmo, revogar-se a decisão recorrida, na parte em que declarou a caducidade do contrato de arrendamento ou reduzir-se a indemnização arbitrada para o valor da renda mensal em relação ao período considerado ou reduzir-se o valor da fracção bem como o valor de rendimento da mesma, com o que se fará TOTAL JUSTIÇA." Emerge, portanto, das conclusões da alegação de recurso apresentada pelo Réu ora Apelante que o objecto do seu recurso de apelação está circunscrito às questões de saber: 1) Se o contrato de arrendamento, cuja caducidade a Autora pede seja declarada, se renovou, nos termos do artigo 1056º do Código Civil, visto o facto de o ora recorrente se ter mantido no gozo da fracção, por um período superior a um ano, sem oposição do locador; 2) Se, ainda mesmo que se tivesse verificado a caducidade do arrendamento, como o atraso na restituição do locado apenas permite ao locador obter, a título de indemnização, o valor correspondente ao da renda ou ao seu dobro em caso de mora (nos termos do artigo 1045º, n° 1, do Código Civil), o ora recorrente nunca poderia ser condenado ao pagamento de uma indemnização, pelo atraso na restituição do locado, com base nos princípios gerais da responsabilidade civil, importanto o valor da indemnização correspondente à renda em vigor na data da óbito da última arrendatária, entre o momento em que o locado deveria ter sido desocupado (Dezembro de 1999) e a data da propositura da acção (Setembro de 2001) - 22 meses -, em € 2.520,10 , acrescidos de € 114, 55 por cada mês até à entrega efectiva da fracção; 3) Se o tribunal "a quo" incorreu em erro na apreciação das provas produzidas ao dar como provado que o valor aproximado de 50.000 contos que a Autora receberia se tivesse vendido a fracção poderia originar um rendimento mensal 250 contos ou € 1.247, através da aplicação de capitalização de 6% ao mês (porquanto a aplicação de uma taxa de 6% ao mês excede inexoravelmente as taxas aplicadas para operações bancárias de depósitos de capital a particulares pagas pela Caixa Geral de Depósitos, que não ultrapassam 1,400%, bem como a própria taxa de juros legal resultante da portaria 291/03 de 8/4, que é de 4%); 4) Se o tribunal "a quo" incorreu em erro na apreciação das provas produzidas ao considerar provado que a fracção tinha um valor aproximado de € 249. 400, com base no relatório pericial do perito do Tribunal, por não tomar em consideração que ao valor de venda de € 249.400 tinha de ser descontado € 100.000 referentes a obras de que a casa precisava, o que necessariamente daria um valor de venda substancialmente inferior, com reflexo directo no rendimento do capital.
MATÉRIA DE FACTO Factos Considerados Provados na 1ª Instância: A sentença recorrida elenca como provados os seguintes factos:
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