Acórdão nº 7158/2006-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 23 de Janeiro de 2007

Magistrado ResponsávelAGOSTINHO TORRES
Data da Resolução23 de Janeiro de 2007
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

(...) 2.2- No presente recurso está em apreciação a seguinte questão: No processo de inquérito criminal em que está em averiguação a prática de um crime de falso testemunho, prestado sob juramento em julgamento cível por testemunha cujo depoimento foi considerado fundamental para a convicção do julgador e determinante da condenação da ré a pagamentos que não seriam devidos, pode esta, queixosa naquele processo, como lesada, ser admitida a constituir-se assistente? 2.3- Em nosso entender cremos convictamente que a resposta correcta tem e deve ir no sentido de permitir a requerida constituição de assistente.

Não há dúvida que a requerente, com a actuação do arguido, a ser verdade que depôs com falsidade, sob juramento e tal relevou de forma determinante para a condenação em custos que não seriam de outro modo, devidos, a terá prejudicado directamente.

Também na jurisprudência se podem encontrar razões de peso para esta posição.

É o caso do Supremo Tribunal de Justiça, Acórdão 12 Outubro 2006 No crime de denúncia caluniosa o caluniado tem legitimidade para se constituir assistente no procedimento criminal instaurado contra o caluniador. O ofendido pode constituir-se assistente sempre que seja titular dos interesses que a lei especialmente quis proteger com a incriminação e a incriminação da denúncia caluniosa, ainda que proteja em primeira linha a realização da justiça, fá-lo também relativamente ao bom nome, à honra e consideração do caluniado.

Sobre esta jurisprudência podem ver-se em relação ao tema e questões abordadas: Jurisprudência relacionada: TRP Acórdão 25-2-2004 ; TRP Acórdão 29-1-2003; TRL Acórdão 22-1-2003 ;TRL Acórdão 17-1-2003 ;TRL Acórdão 15-1-2003 ;TRL Acórdão 30-10-2002 ; TRP Acórdão 18-10-2000; TRL Acórdão 31-5-2000; STJ Acórdão 29-3-2000 ;TRP Acórdão 9-2-2000 ; TRP Acórdão 7-4-1999 ; TRP Acórdão 24-3-1999 ; TRL Acórdão 28-4-1998; No mesmo sentido, Ac. TRL de 25-03-2003, nº 1499/2003 (in CJ, II, pág 132) No mesmo sentido, Ac. TRL de 10-04-2003, nº 1504/2003-9 No mesmo sentido, Ac. TRL de 21-04-2005, nº 4880/2004-9 No mesmo sentido, Ac. TRL de 18-05-2005, nº 1967/2005-3 Noutro sentido, Ac. TRP de 20-01-2000, nº10393 Noutro sentido, Ac. TRP de 18-06-1997 (in CJ, II, pág 237) No mesmo sentido, Ac. STJ de 23-05-2002, nº 976/2002-5 No mesmo sentido, Ac. TRL de 17-12-2002, nº 59975 No mesmo sentido, Ac. TRC de 06-11-2002, nº 1974/2002 (in CJ, V, pág 42) Noutro sentido. Ac. STJ de 02-10-1997, nº 508/97 No mesmo sentido, Ac, TRL de 19-10-2000, nº 4676/2002-3 ( relator Consº António Mortágua), acerca de questão muito similar atinente ao crime de denúncia caluniosa .

"Na revisão constitucional de 1997 (7)(7) Lei Constitucional n.º 1/97, de 20 de Setembro.

, a nossa lei fundamental passou a consagrar a tutela do ofendido, estipulando que este "tem o direito de intervir no processo, nos termos da lei" (8)(8) O artigo 32.º, n.º 7, da Constituição da República Portuguesa estipula que "o ofendido tem o direito de intervir no processo, nos termos da lei".

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Reconhece-se, pois, ao ofendido o direito de participar no processo, relegando ao legislador ordinário a indicação do conteúdo de uma tal intervenção.

"A norma constitucional não especifica o conteúdo do direito de intervenção do ofendido, remetendo para a lei ordinária a sua densificação. O que a lei não pode é retirar ao ofendido, directa ou indirectamente, o direito de participar no processo que tenha por objecto a ofensa de que foi vítima (9)(9) Cf. Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, t. I, p. 361.

." Ora, em sede processual penal, no domínio da nossa lei ordinária, a intervenção do ofendido pode assumir as formas de assistente e ou demandante cível .

Postergando, desde já, aquela última vertente, por manifestamente impertinente à discussão em causa, no cotejo legal infraconstitucional, o ofendido/assistente assume-se como um dos sujeitos processuais, com papel principal enquanto acusador nos crimes particulares e com intervenção activa, embora, em regra, subordinada, nas fases de instrução, julgamento e recursos, em crimes semipúblicos e públicos (10)(10) Cf., designadamente, o artigo 69.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, segundo o qual "os assistentes têm a posição de colaboradores do Ministério Público, a cuja actividade subordinam a sua intervenção no processo, salvo as excepções da lei".

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Tal posição insere-se, aliás, na nossa tradição jurídico-processual penal (11)(11) Cf., nomeadamente, artigos 254.º, § único, 266.º, § único, 399.º, 401.º, § 3.º, 404.º, § 1.º, 416.º, 417.º, 430.º, 452.º, 472.º, § 1.º, e 481.º, § único, do Código Penal de 1886, bem como o artigo 11.º do Código de Processo Penal de 1929, e o artigo 4.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 35007, de 13 de Outubro de 1945.

, sendo que também como esta o regime legal actual não explicita uma noção de ofendido/assistente.

O artigo 68.º do Código de Processo Penal indica tão-só os que podem constituir-se assistentes, estipulando, na alínea a) do respectivo n.º 1, que essa qualidade, além do mais, pode ser atribuída aos "ofendidos, considerando-se como tais os titulares dos interesses que a lei especialmente quis proteger com a incriminação, desde que maiores de 16 anos".

Neste contexto, assistente só pode, pois, ser o directamente ofendido com a violação da norma, sendo que havendo uma pluralidade de pessoas que o sejam, qualquer delas pode constituir-se assistente (12)(12) No domínio da legislação anterior, já Beleza dos Santos, in Revista de Legislação e de Jurisprudência, ano 54.º, p. 2, consignava que por "partes particularmente ofendidas [...] devem [...] considerar-se os titulares dos interesses que a lei quis especialmente proteger quando formulou a norma penal. Quando prevê e pune os crimes, o legislador quis defender certos interesses. Praticada a infracção, ofenderam-se [os] interesses que especialmente se tiveram em vista na protecção penal, podendo prejudicar-se secundariamente, acessoriamente, outros interesses. Os titulares dos interesses que a lei penal tem especialmente por fim proteger, quando previu e puniu a infracção e que esta ofendeu ou pôs em perigo, são as partes particularmente ofendidas, ou directamente ofendidas, e que, por isso, se podem constituir acusadores".

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Dito de outro modo, face àquela indicada norma, o ofendido pode constituir-se assistente sempre que a ofensa àquele esteja compreendida na esfera de protecção da incriminação .

Ofendido/assistente é "a pessoa que, segundo o critério que se retira do tipo preenchido pela conduta criminosa, detém a titularidade do interesse jurídico-penal por aquela violado ou posto em perigo" (13)(13) Cf. Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, edição de 1984, p. 505.

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" Não é ofendido qualquer pessoa prejudicada com o crime; ofendido é somente o titular do interesse que...

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