Acórdão nº 8713/2006-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 28 de Novembro de 2006

Magistrado ResponsávelLUÍS ESPÍRITO SANTO
Data da Resolução28 de Novembro de 2006
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa ( 7ª Secção ).

I - RELATÓRIO.

Bárbara […] casada, pintora, residente […] em Almada, intentou a presente acção declarativa comum, sob a forma ordinária, contra Eduardo […], residente […] em Lisboa ; Banco […], com sede […]em Lisboa e Ana […], residente […]em Lisboa.

Alegou, essencialmente, que : O 1º R., como proprietário da firma T.[…], que se dedica à recuperação ou reconstrução e posterior venda de prédios degradados sitos nas zonas antigas e históricas de Lisboa, e utilizando duas aguarelas que a A. lhe havia pintado anos antes, mandou fazer um folheto publicitário da sua actividade.

Utilizou as aguarelas da A., sem a autorização ou conhecimento desta.

As cores na reprodução ficaram deturpadas. Na reprodução de um dos quadros a assinatura da A. ficou praticamente invisível e ilegível, podendo induzir quem a vê a atribuir a autoria do quadro à autora do design, 3ª Ré. Os próprios espaços urbanos representados nos quadros originais foram encurtados no folheto.

Foi a 2ª Ré quem pagou à 3ª R. o seu trabalho de designer incorporado no folheto. É de presumir que o mesmo banco tenha pago também o preço da impressão dos folhetos. Foi também o banco que procedeu à divulgação e distribuição, a partir de Maio de 1997, dos folhetos desdobráveis em alguns dos seus balcões.

A A. é uma pintora de arte muito apreciada e com assinalável " curriculum ".

A A. nunca pintou para fins publicitários, nem é sua intenção fazê-lo.

A A. nunca autorizaria a reprodução e divulgação para fins publicitários das suas aguarelas através do folheto em causa, a não ser perante uma " proposta irrecusável ", não inferior a 3.500.000$00 e sempre com a prévia visualização do projecto do folheto. Tal exigência remuneratória justificar-se-ia pela natureza e capacidade financeira das pessoas envolvidas e beneficiárias da publicidade prosseguida, bem como os largos proventos que, presumivelmente, da mesma publicidade resultariam.

Nos termos do artº 40º, nº 2 e 3, do CDADC a autorização para a reprodução dos quadros nos folhetos apenas pode ser concedida por escrito, presume-se onerosa e com carácter não exclusivo, devendo constar da declaração escrita, de forma obrigatória e especificada, a forma autorizada de divulgação, publicação e utilização, bem como as respectivas condições de tempo, lugar e preço.

Não é crível que o 2º R. se tenha bastado com uma informação oral no sentido de que o 1º R. tinha a autorização da A.. A 3º R., exercendo a profissão de designer, não pode deixar de saber as condições em que lhe é lícito aproveitar-se de obras alheias na execução dos seus trabalhos.

Os três RR. violaram o disposto no artº 195º a 199º, do CDADC. Tais ofensas são tão mais graves quando é certo que o legislador as qualifica, além de ilícitos civis, também como ilícitos criminais.

Conclui pedindo a condenação solidária dos RR. no pagamento da indemnização, a título de danos patrimoniais, de 3.500.000$00, e a título de danos não patrimoniais, de 1.500.000$00.

Contestou o Réu Banco […]S.A., a fls. 22 a 28, alegando essencialmente que nada sabe acerca da forma como foi concluída a execução do prospecto desconhecendo as diligências que o 1º e 3º RR. efectuaram junto da A.. Sempre admitiu que os co-RR. tivessem desenvolvido os contactos necessários por forma a garantir que os direitos da A. não viessem a sofrer lesão. Não conhecendo as aguarelas originais, não sabe se a A. tem ou não razão no alegado. Foi alheio à concepção do prospecto. Tais folhetos apenas foram colocados em quatro agências. Foram enviados para as agências em 14 de Abril de 1997 e foram removidos em 6 de Junho de 1997. Não tiveram muita divulgação, não tendo o R. retirado qualquer proveito económico.

Conclui pela improcedência da acção. A fls. 64 a 71, contestaram os RR. Eduardo […] e Ana […].

Essencialmente, alegaram que : O folheto foi executado pela 3ª R., que se limitou a seguir as instruções e directrizes do 1º R.. Foi com base na relação de amizade que o 1º R. informou a A. de que lhe ia enviar o folheto em causa. Nesse momento, a A. não mostrou qualquer reserva ou reprovação. Face à posterior reacção da A., o 1º R. mandou o 2º R. retirar todos os folhetos dos seus balcões. O 1º R. estava convencido de que não necessitava de qualquer autorização para utilizar os quadros pintados pela A. e ignorava que tal conduta era punida ou proibida por lei. Este R. nunca tinha feito nada de semelhante para divulgação da sua actividade. Se soubesse, teria solicitado autorização à A. A 3ª Ré presumiu que o 1º R. tinha dado conhecimento à A. da elaboração do prospecto. Tais aguarelas, ao serem executadas segundo instruções precisas, não tem a qualidade de obra, nos termos e para os efeitos do artº 1º, nº 1, do CDADC.

Concluem pela improcedência da acção.

Procedeu-se ao saneamento dos autos, com a elaboração da base instrutória de fls. 91 a 96.

Realizou-se audiência final, tendo a decisão de facto sido proferida conforme despacho de fls. 197 a 200.

Foi proferida sentença julgando a presente acção parcialmente procedente, condenando-se o R. Eduardo […] no pagamento da indemnização de € 15.000,00 à A., tendo sido os restantes RR. absolvidos do pedido ( cfr. fls. 239 a 261 ).

Apresentou a A. recurso desta decisão, que foi admitido como de apelação ( cfr. fls. 238 ).

Juntas as competentes alegações, a fls. 346 a 356, formulou a A. as seguintes conclusões : 1º - Tanto os factos provados e confessados quanto o contexto, o conteúdo e os " dizeres " de folheto desdobrável que consubstancia as violações dos direitos da A. ocorridas e que deu origem ao presente processo apontam directa e inequivocamente para a responsabilidade solidária de todos os RR., embora o comportamento dos três tenha algumas " nuances ".

  1. - O nome, o endereço e o logotipo do Banco […] constam do folheto, tratando-se indiscutivelmente de uma das entidades objectiva e subjectivamente envolvidas e beneficiárias da acção de publicidade à qual o mesmo folheto se destinou.

  2. - E por isso o Banco […] pagou à Ré Ana […] - veja-se a alegação do próprio banco sobre o aspecto jurídico da causa - 90% do preço referente ao trabalho da designer incorporado no folheto, e bem assim pagou 90% do preço do trabalho de impressão.

  3. - O Banco […] procedeu à divulgação e distribuição ao público dos folhetos em alguns dos seus balcões.

  4. - Era o Banco […] quem financiava o R. Eduardo para fazer as obras de recuperação dos imóveis a cuja venda se destinava a publicidade contida no folheto.

  5. - O Banco […] tinha estrita obrigação de juntar ao dossier relativo a esta operação de publicidade uma fotocópia da autorização da A., visto que a lei exige que tal autorização seja escrita.

  6. - Contentando-se, como contentou - segundo o próprio banco confessou - com a declaração do R. Eduardo de que dispunha da autorização necessária, agiu o banco com indesculpável negligência.

  7. - Não ser o Banco proprietário das obras abusivamente reproduzidas no folheto, ser alheio à concepção do folheto e ser alheio à inclusão dos demais elementos que o compõem ( o que é estranhíssimo, visto que o Banco pagou 90% das despesas de composição e de impressão ), não chega para desresponsabilizar o mesmo Banco.

  8. - Pela mesma ordem de razões, também não se compreende que a Ré Ana […) tenha sido absolvida do pedido.

  9. - A mesma Ré é designer de grande experiência, é irmã do R. […], foi ela que perpetrou o crime de violação do direito moral, porquanto foi ela que procedeu ao design que deu origem à péssima reprodução dos quadros no folheto, e só por cumplicidade ou indesculpável negligência se pode entender que não se tenha assegurado da existência da autorização da A., tanto mais que foi paga pelo banco da quase totalidade do seu trabalho.

  10. - Causa perplexidade a declaração constante da sentença recorrida segundo a qual o R. […] " estava convencido de que não necessitava de qualquer autorização para utilizar no folheto os quadros da A. ", e de que " ignorava que esta conduta fosse proibida e punida pela Lei ".

  11. - Dada a personalidade e perfil do R. em causa e o conjunto dos elementos constantes do processo, só por ingenuidade e credulidade infantis se podem admitir as " ignorâncias ", aliás inócuas, por ele alegadas.

  12. - De resto, tais asserções estão em flagrante contradição com o facto de ter afirmado aos outros RR., como estes alegaram, que possuía a necessária autorização da A..

  13. - Houve um telefonema do R. […] à A. em que esta ouviu nitidamente que aquele lhe dizia que lhe telefonava para lhe dizer que lhe iria enviar um folheto com os quadros pintados por ela lá reproduzidos, para que ela não deparasse, de surpresa, com o folheto nalgum dos balcões do banco, " tanto mais que havia a questão dos direitos de autor ".

  14. - O R. nega agora que tenha pronunciado a frase indicada, mas não constituirá nenhum juízo temerário afirmar-se que o R. não se daria ao trabalho de fazer tal telefonema se não quisesse, exactamente, falar dos direitos de autor, em jeito de sondagem…além de que a A. não mente.

  15. - De tudo quanto foi exposto se conclui ter o R. […] agido com evidente dolo, e não com culpa inconsciente.

  16. - Quer pelo grau de culpabilidade dos RR., quer porque o montante do pedido formulado pela A. - € 25.000 - foi criteriosamente ponderado e obteve a concordância de entidades ligadas à Sociedade Portuguesa de Autores, não se justifica qualquer redução daquele montante.

    Apresentaram os apelados contra-alegações, pugnando pela manutenção do decidido.

    Apresentou o R. Eduardo […] recurso desta decisão, que foi admitido como de apelação ( cfr. fls. 238 ).

    Juntas as competentes alegações, a fls. 419 a 433, formulou o R. as seguintes conclusões : 1º - Decidiu mal o juiz a quo ao considerar que as aguarelas pintadas pela A. consubstanciavam o conceito de Obra Protegida, nos termos e para os efeitos do artº 1º, nº 1, CDADC, sob o controlo, atento que o apelante fez saber à A. os termos exactos em que os quadros deveriam ser...

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