Acórdão nº 9208/2004-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 23 de Novembro de 2006

Magistrado ResponsávelGRANJA DA FONSECA
Data da Resolução23 de Novembro de 2006
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: 1.

Por apenso à execução ordinária que o Banco … move contra D…, José … e António …, deduziram os presentes embargos de executado.

Para tanto, e em síntese, alegam a incompetência territorial do tribunal; que a livrança não foi apresentada a protesto por falta de pagamento, pelo que é inoponível aos avalistas; que o preenchimento dos títulos é abusivo, pois que o embargado pôs termo aos contratos de abertura de crédito existentes entre a D… e o embargado sem qualquer fundamento, determinando para o embargante um prejuízo muito elevado, não previsível, obstaculizando ao regular funcionamento da empresa; que todo o clausulado do contrato foi elaborado sem prévia negociação individual, pelo que estamos no domínio das cláusulas contratuais gerais, sendo proibida a cláusula que permite resolver o contrato sem motivo justificativo, fundado em lei ou convenção e, em consequência, nula; que houve uma compensação parcial; que os montantes pelos quais as livranças foram preenchidos estão incorrectos, pois que o embargante pede juros sobre juros, estando igualmente incorrectamente incluídos na livrança o imposto de selo e a selagem do título.

O embargado contestou, dizendo, em suma, que o tribunal é competente; que não é necessário o protesto por falta de pagamento para accionar os avalistas; que a livrança foi preenchida em conformidade com o pacto de preenchimento e de acordo com os montantes devidos; que os contratos estavam em incumprimento e que a situação económica da D… e dos avalistas já não lhes permitia saldar a dívida.

Terminou pedindo a improcedência dos presentes embargos.

Foi elaborado o despacho saneador, considerando-se ser este o tribunal competente em razão da nacionalidade, da matéria, da hierarquia e do território e decidindo-se pela oponibilidade do título aos avalistas.

Foram fixados os factos provados e elaborada a base instrutória.

Procedeu-se a julgamento, tendo o Tribunal proferido decisão sobre a matéria de facto e, em seguida, a sentença, julgando os embargos improcedentes por não provados, deles absolvendo o embargado.

Inconformados, apelaram os embargantes, formulando as seguintes conclusões: (...).

O Apelado não contra - alegou.

  1. Tendo dispensado a audiência preliminar (artigo 508º-B), a Exc. ma Juiz, ao fixar a base instrutória, seleccionou a matéria de facto que considerou assente e a que devia constituir a base instrutória da causa.

    O embargante reclamou, entretanto, contra a selecção da matéria de facto, incluída na base instrutória ou considerada assente, sendo a reclamação deferida parcialmente, conforme despacho de fls. 140, a 143, o que originou a modificação dos factos assentes bem como dos que integravam a base instrutória.

    Não obstante, no recurso interposto da decisão final, o embargante voltou a impugnar, com fundamento em deficiência, o aludido despacho proferido sobre as reclamações dos factos assentes e dos controvertidos, sustentando que deviam ser aditados à matéria assente os factos (...) e incluídos na base instrutória os factos (...).

    Aqui chegados, importará referir que a selecção é feita entre os factos articulados pelas partes, pois, de acordo com o princípio do dispositivo, só esses - e excepcionalmente, os introduzidos pelo juiz ao abrigo do artigo 514º e os factos complementares resultantes da instrução do processo, nos termos do artigo 264º, n.º 3 - podem (e devem) ser tidos em consideração. Esses factos são os que interessam à causa de pedir e os que fundam as excepções (artigo 264º, n.º 1), isto é, os factos principais da causa, pois, em princípio, os factos probatórios, dos quais eles se deduzem, e os factos acessórios, que permitem ou impedem que a dedução se faça, nem estão sujeitos ao ónus da alegação nem têm de ser seleccionados para a relação dos factos assentes ou para a base instrutória, dada a sua natureza instrumental (artigo 264º, n.º 2): só devem sê-lo quando constituem a base duma presunção legal ou um facto contrário ao presumido. Mas tal não impede que possam ser insertos na base instrutória factos instrumentais, em casos em que assumam especial relevância concreta para a prova dos factos principais, em que seja duvidosa a ilação que, a partir deles, possa ser tirada para esta prova ou em que constituam garantia de que o direito à prova não é severamente restringido por limitações legais como a do artigo 633º para a prova testemunhal (1).

    A selecção, quer dos factos assentes quer dos controvertidos, é feita, tendo em conta as várias soluções plausíveis da questão de direito. Quer isto dizer que o juiz não pode limitá-la aos factos essenciais, ou relevantes, para a solução daquelas questões que, no seu entendimento, são pertinentes: seja qual for a sua visão da que deva ser a decisão jurídica da causa e o caminho para a atingir, o juiz tem de seleccionar também os factos que interessem a outras vias de solução possível do litígio, tidas em conta as posições assumidas pelas partes quanto à fundamentação jurídica das pretensões e excepções e as correntes doutrinárias e jurisprudenciais formadas em torno dos tipos de questão que elas levantem. Assim, desde que ambas as teses (jurídicas) sejam compreensivelmente defensáveis, [a base instrutória] deve abranger, entre os factos articulados, todos os que interessam às duas posições (2), em formulação que deve ter em consideração as normas que presidem à distribuição do ónus da prova.

    Mais do que nos articulados, a distinção entre matéria de facto e matéria de direito releva na elaboração da base instrutória, que não deve conter conceitos jurídicos. Espelha-o o artigo 646º, n.º 4, ao não considerar escritas as respostas dadas a questões de direito pelo tribunal que julga a matéria de facto.

    Por aplicação analógica do n.º 4 do artigo 646º, deverá ter-se igualmente por não escrita a resposta dada a um "quesito" que contenha matéria conclusiva e não factual.

    Reportando-nos, ao caso dos autos, verifica-se que os recorrentes discordam da matéria assente, bem como da base instrutória.

    (...) Mas acrescentam que o que se proíbe na norma inserta na alínea b) do citado artigo 22º são as cláusulas que permitam exclusivamente a quem as predisponha a resolução do contrato sem motivo justificativo, fundado na lei ou em convenção.

    Por isso, o importante é saber se a permissão ou faculdade conferida nas citadas cláusulas é atribuída a ambas as partes (por iniciativa de qualquer das partes) e não apenas a uma delas, o Banco embargado que as predispôs.

    Ora a permissão ou faculdade conferida na citada cláusula 4ª é atribuída a ambas as partes ("por iniciativa de qualquer das partes) e não apenas a uma delas, o Banco embargado que as predispôs.

    Não existe, pois, na concreta conformação das cláusulas, uma parte mais fraca (a que alegadamente não predispôs), que careça de maior protecção por força da posição de maior debilidade contratual em que a outra parte a tenha colocado.

    Assim sendo, a citada norma da alínea b) do artigo 22º do DL 446/85, de 25 de Outubro, não nos parece aplicável aos autos.

    De qualquer modo, relevante seria alegar que a resolução dos contratos foi efectuada sem manifesto motivo justificativo e sem fundamento legal, caso em que, a provar-se, poderia vir a ser...

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