Acórdão nº 6098/2006-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 19 de Outubro de 2006

Magistrado ResponsávelEZAGUY MARTINS
Data da Resolução19 de Outubro de 2006
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam na 2ª Secção (cível) deste Tribunal da Relação de LisboaI- Raul …, Fernando … e Elsa …, intentaram acção de despejo, com processo sob a forma sumária, contra Carlos … e mulher, Olga …, pedindo seja considerado resolvido o contrato de arrendamento para habitação, do 2º andar Dt.º, do prédio urbano que identificam, celebrado entre os anteriores proprietários do mesmo e o 1º R., decretando-se o despejo daquele e sua entrega aos AA., livre e devoluto.

Alegando para tanto, e em suma, que são os actuais donos de tal prédio, e que os RR. Deixaram de ter residência permanente naquele de há uns anos a esta parte, para além de o 1º R. ter montado no locado o seu escritório, assim o afectando a fim diverso do contratado.

Citados, contestaram os RR., separadamente.

Alegando o 1º que a Ré, de quem está separado judicialmente de pessoas e bens há cerca de quatro anos, é que deixou de ter residência permanente no locado.

Impugnando ainda, para além da qualidade dos AA.. de proprietários do locado, a por aqueles alegada afectação dito a fim diverso do acordado.

E rematando com a improcedência da acção.

Convergentemente alegando a Ré, na sua contestação, aliás subscrita pela mesma ilustre advogada.

Arguindo a sua ilegitimidade…na referenciada circunstância da sua separação judicial do 1º R.

O processo seguiu seus termos, com saneamento - considerando-se, expressamente os AA., como parte legítima, e julgando-se a Ré Olga … parte ilegítima, absolvendo-se a mesma da instância - e condensação.

Sendo, ulteriormente, indeferido requerimento de despejo imediato, apresentado pelos AA.

E vindo, realizada que foi a audiência final, a ser proferida sentença que julgou a acção procedente decretando a resolução do contrato de arrendamento respectivo e condenando o R. a despejar imediatamente o locado, a entregar aos AA., livre de pessoas e bens.

Inconformado, recorreu o R., formulando, nas suas alegações, as conclusões seguintes: "1ª- O ora Recorrente requereu a gravação da prova testemunhal a fls. 169 dos autos, a produzir em sede de audiência de discussão e julgamento, o que foi deferido por despacho do Mm° Juiz a quo, constante a fls. 174 dos autos.

  1. A prova testemunhal que se encontra gravada, a saber, os depoimentos das testemunhas oferecidas pelo ora Recorrente, Fernando …, gravado em registo magnético, nas cassetes n° 331/2002, na totalidade do 1° lado da 4a cassete e 2° lado, entre as rotações O e 167, encontra-se na sua maior parte imperceptível, sendo que os depoimentos das testemunhas Maria …, cujo depoimento se encontra gravado em registo magnético, nas cassetes n° 331/2002, no lado A da 1a cassete, entre as rotações 0000 e 1457 e José … cujo depoimento se encontra gravado em registo magnético, nas cassetes n° 331/2002, na P cassete, lado A entre as rotações 1457 a 1676 e lado B, entre as rotações 0000 a 0730, encontram-se totalmente inaudíveis.

  1. - O ora Recorrente só teve conhecimento deste facto, após ter pedido cópia da gravação da audiência, em 24.01.2006, por requerimento constante de fls. 535 dos autos e após ter sido proferida a douta sentença ora recorrida e de ter interposto recurso da mesma (fls. 532 dos autos), pelo que só agora em sede de alegações pode vir alegar a existência de tal nulidade e requerer a anulação da audiência de discussão e julgamento.

  2. - Sendo impossível a audição e transcrição dos depoimentos das referidas testemunhas, tal vai afectar a fixação da matéria de facto pelo tribunal a quo, o que constitui uma irregularidade que influi no exame e na decisão da causa, nos termos do art. 201°, n° 1, do Cód. Proc. Civil, afectando, assim, a validade da douta sentença ora recorrida, devendo o julgamento ser anulado e repetido (Ac. RP, de 29 10.2.1999: BMJ, 484°-440; Ac. RC, de 14.4.1999: BMJ, 491°-342, Ac. STJ, de 9.7.2002, Rev. N° 2005/02-1a, Sumários, 7/2002).

  3. - No entanto e à cautela, sobre a restante prova produzida nos autos, constante da inspecção judicial, bem como a documental constante de fls. 198 a 209, 221 a 334 e 478 a 490 e a testemunhal que se encontra gravada e audível, a saber, Leonel …, cujo depoimento, se encontra gravado em registo magnético nas cassetes n° 331/2002, na totalidade da 1a cassete e na 2a cassete, no 1° lado, entre as rotações O e 1099, Ramiro …, cujo depoimento se encontra no registo magnético gravado nas cassetes n° 331/2002, no 1 ° lado da 2a cassete entre as rotações 1100 e até final e no 2° lado da 2a cassete, entre as rotações 0 e 1073, Maria ..., cujo depoimento se encontra gravado no registo magnético, nas cassetes n° 331/2002, no 2° lado da 2a cassete, entre as rotações 1074 e até final e no 1° lado da 3a cassete entre as rotações O e 265, e Maria2… cujo depoimento se encontra gravado em registo magnético nas cassetes n° 331/2002, no 2° lado da 4' cassete entre as rotações 167 e até final e no 1° lado da 5a cassete, entre as rotações 0 e 208, permite dever considerar-se como não provados os factos constantes dos arts. 1°, 2° e 4° da Base Instrutória e, como tal, considerar-se a presente acção de despejo não procedente por não provada, pelo que tal prova deve ser reapreciada no presente recurso, nos termos do art. 712°, n° 1, ais) a) e b) do Cód. Proc. Civil.

  4. - Para se averiguar se o ora Recorrente tem ou não residência permanente no locado, há que averiguar, o seu estilo de vida, não esquecendo que diferentes sujeitos têm diferentes estilos de vida, não se podendo concluir se um indivíduo tem residência permanente ou não num locado, atendendo ao estilo de vida habitual do cidadão comum. Há sim que ter em conta os hábitos do ora Recorrente, o seu concreto estilo de vida e atendendo a isso se o locado é o local onde tem centrada a sua vida familiar, mesmo que nele tenha uma permanência mínima (Ac. da Relação do Porto de 26/6/1974, Boi. 238,281; Ac. da Relação de Évora, de 18/5/1989, Boi. 387,675 e de 28/9/1989, Bol. 389,666).

  5. - Ora, pela prova efectuada nos autos e constante da Inspecção Judicial, bem como pela prova documental e testemunhal produzida, no período considerado na douta sentença ora recorrida, ou seja, desde o ano de 1990 e até à propositura da acção (15/02/2002), provou-se que o ora Recorrente dormiu no andar locado, toma aí as suas refeições e recebe aí as suas visitas, amigos e familiares, pelo que o Mm° Juiz a quo deveria ter dado como não provados os factos constantes da douta Base Instrutória, nos arts. 1°, 2° e 4°. Também o art. 5° da douta Base Instrutória deveria ter sido considerado não provado na sua totalidade.

  6. - Também os Recorridos não lograram provar, como lhes competia, nos termos do art. 342°, n° 1 do Código Civil, os factos por si alegados e que eram causa de pedir da resolução do contrato de arrendamento, a saber, não fizeram a prova dos factos constantes dos arts. 1°, 2°, 3° 4°, 5° e 6° da douta Base Instrutória.

  7. - Uma vez que a prova produzida e na qual o Mm° Juiz a quo se fundamentou para proferir a douta sentença, não podia ter conduzido à fundamentação que consta no seu despacho proferido em 25.10.2005 e constante a fls. 496 a 502 dos autos, atendendo ao estilo de vida e a pessoa do Recorrente, que se provou ser uma pessoa separada, que vive só, sem grandes rendimentos, que não tem o hábito de levar o dia todo em casa, antes pelo contrário, que tem um grande apoio das filhas, tomando algumas refeições na casa delas, que não dá grande valor ao conforto de casa, ou seja, há que ter em conta não o que é habitual no estilo de vida do cidadão comum, mas sim o estilo de vida do próprio Recorrente, para aferir se ele tem ou não residência permanente no locado.

  8. - Nos presentes autos, está claramente provado que o ora Recorrente tem residência permanente no locado, pois dorme no arrendado, toma aí as suas refeições, recebe aí a sua correspondência, recebe as suas visitas amigos e familiares, bem como ficou provado que o Recorrente não montou no locado qualquer escritório, pelo que a prova deve ser reapreciada nos termos do art. 712°, n° 1, als) a) e b) do Cód. Processo Civil, devendo a presente acção ser considerada improcedente por não provada, mantendo-se o contrato de arrendamento celebrado com o Recorrente e, em consequência, não ser decretado o despejo deste do andar locado, só assim se fazendo a costumada JUSTIÇA.".

Contra-alegaram os AA...

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