Acórdão nº 3534/2006-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 17 de Outubro de 2006
Magistrado Responsável | GRAÇA AMARAL |
Data da Resolução | 17 de Outubro de 2006 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Acordam na 7ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa, I - Relatório 1.
C.[…], propôs acção declarativa de condenação, sob a forma sumária, contra G.[…] LDA, pedindo a condenação da Ré no pagamento da quantia de a quantia global de Esc.: 2.565.995$00 e juros de mora (sendo 1.551.000$00 correspondente à desvalorização na venda do veículo automóvel; 26.995$00 resultante do valor das despesas de deslocação diária para o local de trabalho, devido à não atribuição de um veículo de substituição; 488.000$00, respeitante a 63 dias de paralisação do seu veículo, montante calculado à taxa diária de 8.000$00 e 500.000$00 pela impossibilidade da sua deslocação e dos seus familiares para gozo de férias de Páscoa de 2000), correspondente aos prejuízos sofridos em virtude de ter adquirido à Ré (em 31.05.1999 e pelo preço de 5.851.000$00) veículo automóvel, estado novo, que apresentava defeitos que não foram reparados por aquela.
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Após citação, a Ré contestou (fls. 51-57) defendendo-se por excepção, invocando a incompetência territorial do tribunal para o conhecimento da acção; por impugnação alegou fundamentalmente que o veículo vendido ao Autor foi reparado (tendo-lhe sido disponibilizado um veículo de substituição, que o mesmo recusou, por pretender um modelo igual ao do automóvel adquirido) e ficado em perfeitas condições, não existindo qualquer defeito de fabrico ou outro que impedisse o seu funcionamento, não tendo aquele procedido ao levantamento atempado da viatura. Deduziu pedido reconvencional pedindo a condenação do Autor no pagamento de indemnização de 34.500$00 correspondente aos dias em que o veículo esteve paralisado nas suas instalações, desde a reparação até ao seu levantamento ( 23 dias x 1.500$00/dia ), acrescida de juros de mora.
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O Autor respondeu à contestação (fls. 72-75) concluindo pela procedência da excepção arguida, pronunciando-se pela improcedência da reconvenção.
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Por despacho de fls. 81-82 foi julgada procedente a excepção dilatória de incompetência relativa com a remessa dos respectivos autos ao tribunal territorialmente competente.
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Admitida a reconvenção foi proferido saneador, seleccionada a matéria provada e elaborada a base instrutória (fls. 105/112).
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Realizado julgamento foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente, condenando a Ré a pagar ao Autor a quantia de € 7.736,36, acrescida de juros de mora, contados desde a data de citação, às taxas legais em vigor, até integral e efectivo pagamento, absolvendo aquela do demais pedido. Foi julgada procedente a reconvenção com a consequente condenação do Autor a pagar à Ré a quantia de € 172,09, acrescida de juros de mora, contados desde a data de notificação da contestação ao Autor, às taxas legais supletivas sucessivamente em vigor, até integral e efectivo pagamento.
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Inconformadas, ambas as partes recorreram da sentença.
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Nas suas alegações o Autor concluiu: 1. Os factos provados nos autos são os que ali constam, tendo necessariamente de se concluir pela incorrecta aplicação dos mesmos ao direito.
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Leva-se à matéria de facto provada com a junção dos documentos que se encontram nos autos, elementos que deveriam levar o douto Tribunal a condenar a apelada no pagamento dos danos patrimoniais pelas deslocações diárias e pelos dias de paralisação do veículo.
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E ainda dos danos não patrimoniais peticionados.
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Não se podendo apurar em concreto quais os danos reclamados em sede de reconvenção, pois que os factos dados por provados apontam precisamente em sentido contrário, ou seja, o veículo só permaneceu na oficina da apelada por culpa exclusiva desta, daí não resultando qualquer tipo de direito para esta.
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A decisão de que se recorre, não foi proferida com os ditames de sabedoria de verificação da prova produzida nos autos e consequente aplicação do direito correspondente.
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Nas suas alegações a Ré concluiu (em resumo): Ø Face à prova documental junta aos autos e à prova produzida em julgamento a apelante não pode aceitar a resposta dada pelo Tribunal aos quesitos 5, 10 e 29.
Ø Considera a apelante que não resultou provado que o ruído reclamado pelo Autor, aqui apelante, tivesse proveniência no motor.
Ø A confirmação da proveniência do ruído não pode fundamentar-se em meras declarações de testemunhas não qualificadas ou que ouviram dizer que o ruído era do motor.
Ø Não foi efectuada ou promovida pelo apelado a realização de qualquer perícia técnica, nem foi apresentado qualquer relatório técnico que comprovasse que, efectivamente, o ruído reclamado era do motor.
Ø Muito menos se provou que, após a última intervenção efectuada pela apelante (Abril de 2000), a viatura apresentava qualquer ruído e (muito menos!) que o ruído era do motor.
Ø Não se provou que o alegado ruído punha em causa a segurança do veículo ou justificava o receio nessa segurança.
Ø De qualquer forma, e ainda que o apelado pudesse estar preocupado com a segurança no veículo ou mesmo ter perdido a confiança no mesmo, não provou (ou sequer alegou) que o veículo tivesse efectivamente problemas de segurança.
Ø O A. não provou nem o defeito nem, a existir este, a gravidade do mesmo.
Ø O veículo em causa foi adquirido em estado de novo e sem qualquer defeito.
Ø Há venda de coisa defeituosa se o vendedor entregar ao comprador a coisa devida, mas a coisa sofrer de qualquer dos vícios enumerados no art. 913° do C.C. - "o automóvel ... respeitou todas as condições exigidas pela garantia do seu bom funcionamento".
Ø Considera, pois, a apelante que não poderia o tribunal considerar provados os quesitos n°s 4 e 23.
Ø A diferença de preço entre a compra e venda do automóvel, não consubstancia (como não pode consubstanciar) um dano directamente resultante da alegada permanência do ruído, perda de confiança ou falta de segurança.
Ø Por outro lado, não se provou ou alegou que o apelado não tivesse feito a normal utilização da viatura até à data da venda e que, por isso, dela não retirasse o normal proveito.
Ø A apelante não pode ser condenada na obrigação de indemnizar o apelado, porquanto não se comprovou a existência de qualquer dano.
II - Enquadramento fáctico O tribunal a quo deu como provado o seguinte factualismo: 1) Em 31.05.1999, o Autor comprou, e a Ré vendeu, um veículo automóvel da marca SEAT, modelo ALHAMBRA 1.9 TDI, matrícula […] pelo preço de esc: 5.851.000$00 ( cinco milhões oitocentos e cinquenta e um mil escudos ) - cfr. alínea A) dos Factos Assentes.
2) O automóvel da marca SEAT, matrícula […] respeitou todas as condições exigidas pela garantia do seu bom funcionamento - cfr. alínea B) dos Factos Assentes.
3) O veículo automóvel da marca SEAT, matrícula […] era habitualmente conduzido pelo filho do Autor que o utilizava diariamente da sua residência para o seu local de trabalho sito em Lisboa - cfr. resposta positiva ao quesito 1º da Base Instrutória.
4) Bem como para outras deslocações com a respectiva família - cfr. resposta positiva ao quesito 2º da Base Instrutória.
5) Em Novembro de 1999, quando se ligava a ignição, com o motor a frio, do veículo automóvel SEAT, matrícula […], este fazia uma trepidação - cfr. resposta ao quesito 3º da Base Instrutória.
6) Ficando o Autor preocupado com a segurança que o veículo lhe deixava de proporcionar - cfr. resposta positiva ao quesito 4º da Base Instrutória.
7) O Autor colocou o veículo automóvel na oficina da Ré, no início de Novembro de 1999, a fim de proceder à mudança de óleo, líquido pára-brisas, e à pintura das portas - cfr. resposta ao quesito 25º da Base Instrutória.
8) O Autor colocou o veículo automóvel na oficina da Ré, em Novembro de 1999, após o facto acima referido, a fim de verificar e reparar um ruído, tendo a Ré verificado e reparado ruídos no ar condicionado, no tablier, no interior da porta esquerda, e luz dos comandos […] - cfr. resposta ao quesito 26º da Base Instrutória.
9) O Autor deslocou-se às instalações da Ré, em Novembro de 1999, para ser solucionada a trepidação que o motor do veículo fazia - cfr. resposta positiva ao quesito 5º da Base Instrutória.
10) Onde lhe foi referido que o ruído dizia respeito a uma deficiência nos moto-ventiladores do ar condicionado - cfr. resposta positiva ao quesito 6º da Base Instrutória.
11) O veículo voltou a ter o mesmo problema após a sua reparação - cfr. resposta positiva ao quesito 7º da Base Instrutória.
12) Deslocando-se o Autor às instalações da Ré, em Janeiro de 2000, para ser reparado o veículo automóvel - cfr. resposta positiva ao quesito 8º da Base Instrutória.
13) O Autor colocou o veículo automóvel na oficina da Ré, em 20.12.1999, a fim de verificar e reparar o mesmo ruído, tendo a Ré verificado e reparado um ruído proveniente dos ventiladores - cfr. resposta ao quesito 27º da Base Instrutória.
14) Em 23 de Fevereiro de 2000, foi substituída a correia de distribuição tendo o ruído desaparecido - cfr. resposta positiva ao quesito 9º da Base Instrutória.
15) Porém, ao fim de uma semana, o ruído do motor era maior - cfr. resposta positiva ao quesito 10º da Base Instrutória.
16) Deslocando-se o Autor às instalações da Ré, em Fevereiro de 2000, para ser reparada tal anomalia - cfr. resposta positiva ao quesito 11º da Base Instrutória.
17) Tendo a Ré solicitado que esperasse até ao fim do mês de Março de 2000, por ir transferir as suas instalações para o Cacém - cfr. resposta positiva ao quesito 12º da Base Instrutória.
18) E ficado acordado entre A. e R., o dia 20.03.2000 para o Autor deixar o seu veículo nas instalações desta, para reparação do seu veículo automóvel - cfr. resposta positiva ao quesito 13º da Base Instrutória.
19) O Autor sempre referiu à Ré que ouvia um ruído no motor enquanto este ainda estava frio, o mesmo sucedendo em 20.03.2000- cfr. resposta ao quesito 29º da Base Instrutória.
20) Tendo o automóvel, a pedido do Autor, ficado na oficina da Ré para esta proceder à sua reparação - cfr. resposta positiva ao quesito 30º da Base Instrutória.
21) A Ré efectuou a reparação - cfr. resposta ao quesito...
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