Acórdão nº 5182/2006-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 19 de Setembro de 2006

Magistrado ResponsávelROSÁRIO GONÇALVES
Data da Resolução19 de Setembro de 2006
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa 1- Relatório: A autora, N, S.A. intentou a presente acção ordinária contra a ré, I, S.A., pedindo a sua condenação no pagamento de € 126.356,20, acrescido de juros, atenta a prestação de serviços de telecomunicações, não pagos.

Citada a ré, apresentou defesa por excepção e por impugnação.

Foi proferido saneador - sentença, onde se julgou procedente a excepção de prescrição invocada e se absolveu a ré do pedido.

Inconformada recorreu a autora, concluindo nas suas alegações, em síntese: 1- O douto despacho saneador sentença ao julgar procedente a excepção de prescrição dos créditos relativos a serviços de telecomunicações, invocada pela R. recorrida, absolvendo-a do pedido, interpretou e aplicou de forma incorrecta as disposições legais dos art. 10º, n.º 1 da Lei n.º 23/96 e art. 9º, n.º 4 e 5 do Decreto-lei n.º 381-A/97.

2- Os prazos previstos nos citados preceitos legais respeitam ao direito de exigir o pagamento do preço pelos serviços prestados, que mais não é do que o direito de enviar a factura.

3- É também esta a interpretação que resulta da organização sistemática da Lei n.º 23/96, uma vez que o seu art. 10º, n.º 1 surge imediatamente na sequência de um preceito que confere ao utente o direito a uma factura que especifique os valores que apresenta, devendo-se, por isso, entender que aquele preceito prevê o prazo para o exercício do dever correlativo a esse direito de apresentar uma factura.

4- Só pode ter sido esta a intenção do legislador, que não podia ignorar que, conforme já defendiam antes os Profs. Pires de Lima e Antunes Varela, às dívidas de telefones, aplica-se o prazo de prescrição previsto no art. 310º, alínea g) do Código Civil, tendo, por isso, o legislador esclarecido no n.º 5 do art. 9º do Decreto-lei n.º 381-A/97 que "tem-se por exigido o pagamento com a apresentação da factura".

5-Assim, esta é a interpretação que se impõe não só da letra das normas citadas, por força do disposto no art. 9º, n.º 3 do Código Civil - repare-se nas expressões distintas usadas pelo legislador naqueles preceitos legais e nos arts. 310º, 316º e 317º do Código Civil - mas também da própria ratio das mesmas.

6-O legislador ao prever o prazo de seis meses nos mencionados artigos pretendeu essencialmente proteger o utente/devedor contra demoras excessivas do envio das facturas por parte do prestador/credor face à data da prestação do serviço, o que dificultaria àquele a verificação da correcção daquela factura.

7- Após a apresentação da factura dentro desse prazo, ao respectivo crédito do prestador aplica-se prazo de prescrição de 5 anos, previsto no art. 310º, alínea g) do Código Civil.

8-Interpretação contrária, como a defendida na douta sentença recorrida, conduz a situações que o legislador tem procurado evitar de sobrecarga dos tribunais, que se viriam invadidos com processo de cobrança de "bagatelas", para além de dificultar a via consensual de resolução do litígio, em prejuízo do próprio utente/devedor.

9-No caso dos presentes autos, todas as facturas em causa foram apresentadas dentro do prazo de seis meses (factos 12 e 13 da douta sentença recorrida), pelo que se interrompeu a prescrição prevista para esse efeito, aplicando-se, a partir daí, a prescrição quinquenal.

(...) 12-E, uma vez, que a R., na sua contestação, não alegou ter pago as facturas em causa, nem impugnou o alegado pela A. na sua petição inicial quanto ao não pagamento das mesmas, deve-se considerar como assente, por confissão, ao abrigo do disposto no art. 484º do Código de Processo Civil, que a R. não pagou as facturas referidas no ponto 12, encontrando-se, por isso, em dívida.

13-Deste modo, deve ser a R. condenada a pagar à A. os valores correspondentes às facturas descritas no ponto 12 da douta sentença recorrida, no total de 125.734,96 €, acrescido de juros de mora, a título de indemnização (art. 806º, n.º 1 e 2 do Código Civil), calculados à taxa legal, desde as respectivas datas de vencimento (art. 805º, n.º 2 alínea a) do Código Civil) até integral e efectivo pagamento.

14-Acresce, subsidiariamente, que, a prescrição prevista no art. 10º, n.º 1 da Lei n.º 23/96 (e no art. 9º, n.º 4 do Decreto-lei n.º 381-A/97) é presuntiva.

15-A natureza presuntiva da prescrição de seis meses é adequada ao objectivo da sua previsão, tutelar o devedor, sem sacrificar penosa e injustificadamente o credor.

16-Tratando-se de uma prescrição presuntiva, o credor poderá ilidir a mesma, através de confissão judicial ou extrajudicial do devedor, que se verifica na falta de impugnação especificada dos factos constitutivos da obrigação.

(...) 20-Não obstante, caso se considere que a não impugnação especificada não constitui confissão tácita da dívida, a verdade é que a R. Recorrida ao pôr em causa a sua responsabilidade pelo pagamento da factura indicada no ponto 8 da douta sentença recorrida, questionando, deste modo, o valor da dívida reclamada na presente acção, está a reconhecer expressamente que o valor daquela factura é devida e tacitamente o remanescente da dívida.

21-De qualquer forma, mesmo que assim não se entendesse quanto à confissão tácita da R. Recorrida, sempre se diria que à A., ora Recorrente, na qualidade de prestadora/credora, deveria ainda ter sido dada a oportunidade de requerer o depoimento de parte da R., devedora, para poder ilidir tal presunção.

22-Pelo que, uma decisão sobre a excepção de prescrição presuntiva aqui em causa não pode ser tomada no saneador, mas tão só a final.

23-Em suma, deve ser...

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