Acórdão nº 2282/06-2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 07 de Dezembro de 2006

Magistrado ResponsávelROSA TCHING
Data da Resolução07 de Dezembro de 2006
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães 1 Apelação nº2282/2006 - 2ª secção.

Processo ordinário n.º470/2005.

  1. Juízo Tribunal da Comarca de Felgueiras.

    Relatora - Maria Rosa Tching ( nº 507) Adjuntos – Des. Espinheira Baltar - Des. Carvalho Martins Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães António P..., Jorge F..., Paula V..., Manuel F... e Maria J..., residentes na cidade de Felgueiras, instauraram a presente acção com processo ordinário contra a ré Machado & N..., Ldª, com sede em Fafe, pedindo a condenação desta: - A reconhecer que os 1º, 2ºs e 3ºs autores são, respectivamente, proprietários e legítimos possuidores das fracções autónomas identificadas no artº 1º e 4º, 5º e 8º, e 9º e 12º da p.i.; - A reconhecer que existe a favor dessas fracções autónomas dos autores servidão de vistas, ar e luz, constituída por usucapião, através das janelas ou aberturas identificadas nos termos descritos nos artigos 20º e 23º a 27º da p.i.; - A restituir aos autores a posse plena das aludidas fracções autónomas, com a respectiva servidão de vistas, ar e luz, removendo todos e quaisquer obstáculos que tapem essas mesmas aberturas ou janelas ou impeçam as vistas e a entrada de ar e luz através das mesmas, deixando entre elas e o edifício que anda a construir o espaço de 3 metros, ou, no mínimo, metro e meio; - A pagar aos autores uma indemnização, a calcular em execução de sentença, pelos prejuízos que lhes causaram ou vierem a causar, advindos para estes com a colocação de obstáculos à dita servidão de vistas, ar e luz.

    Alegara, para tanto e em síntese, factos demonstrativos da constituição, por usucapião e a favor do prédio deles, de uma servidão de vistas, ar e luz, cujo exercício está a ser impedido pela construção de um edifício levada a cabo no prédio da ré.

    A ré contestou impugnando parcialmente os factos alegados pelos autores.

    Na sua resposta, os autores concluíram como na petição inicial.

    Proferido despacho saneador, elaboraram-se os factos assentes e a base instrutória, os quais foram objecto de reclamação, que não foi atendida.

    Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, com observância de todo o formalismo legal, decidindo-se a matéria de facto controvertida pela forma constante de fls. 215 e 216.

    Afinal foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e, consequentemente,: a) Condenou a ré Machado & N..., Ldª, a reconhecer que os 1º, 2ºs e 3ºs autores são, respectivamente, proprietários e legítimos possuidores das fracções autónomas identificadas nos pontos 1), 2) e 3) dos factos provados b) Absolveu a ré dos demais pedidos deduzidos pelos autores.

    1. Condenou os autores no pagamento das custas.

      Não se conformando com esta decisão, dela, atempadamente, apelaram os autores, terminando a sua alegação com as seguintes conclusões, que se transcrevem: 1a- O thema decidendum no caso sub judice reduz-se à qualificação jurídica das aberturas descritas nas precedentes alíneas I) a M); 2a- O entendimento prevalecente na doutrina e na jurisprudência é o de que “Código novo, inspirando-se na razão da restrição relativa às janelas, designou como caracteres próprios das frestas, seteiras ou óculos para luz e ar o facto de elas estarem situadas a um metro e oitenta centímetros de altura, pelo menos, a contar do solo ou do sobrado, e não terem, numa das suas dimensões, mais de quinze centímetros"; 3a- Assim, todas as frestas que não obedecerem aos requisitos legais já não podem ser tratadas como frestas, aplicando-se-lhes o regime próprio relativo às janelas; 4a - Ou seja, todas as aberturas que respeitem as dimensões e localização previstas naquele n.° 2 do artigo 1363° são consideradas frestas, sendo qualificadas como janelas todas as aberturas que excedam tais dimensões e localização; 5a - E, neste último caso, uma vez decorrido o prazo necessário para se verificar a usucapião, o proprietário de tal abertura/janela adquire uma servidão, que, denominada ou não de vistas, está sujeita ao regime geral das servidões; 6a - Em tal caso, o proprietário vizinho não poderá levantar nenhum edifício ou contramuro, que vede tais aberturas, por ter sido adquirido não só o direito de manter as referidas aberturas em condições diferentes das legais, mas também o direito de impor ao proprietário vizinho a observância do disposto no n.° 2 do art. 1362°; 7a- Quer a abertura maior de 1,55 por 1,06 metros, situada a 88 cm do sobrado, fixa e com vidro fosco separado por prumos ou barras metálicas, e deixando passar luz difusa, quer aquela outra abertura situada no centro desta, situada a l metro e 37/38 cm do sobrado, abrindo por inteiro para dentro até 180° e com as dimensões de 61 cm por 52 cm, não são nem podem ser classificadas como frestas ou "frestas irregulares", pois, quer pelas suas dimensões, quer pela sua localização, quer pelo seu uso ou destino, são janelas; 8a- Através de uma "abertura" com a largura de 61 cm e a altura de 52 cm, situada a l metro e 37/38 cm do sobrado e que abre até 180° para baixo (1.° e 3° andares) ou para o lado (2.° andar), não só passa perfeitamente uma cabeça humana, como é possível uma pessoa debruçar-se; 9a- No próprio auto de inspecção judicial de fls. 88 dos autos de providência cautelar (apenso A) se reconhece expressamente que é possível debruçarmo-nos para o exterior através dessa abertura; 10a- E não se diga que a abertura central com 61 cm de largura por 52 cm de altura não tem qualquer parapeito ou suporte para as pessoas apoiarem os braços para descansar ou mesmo para se debruçarem em tal abertura para olharem para os lados, para cima e para baixo, pois a parte inferior, com a referida medida de 61 cm, funciona perfeitamente como tal para esses indicados fins; 11a - Face ao dito relatório de inspecção judicial feito na providência cautelar apensa e aos factos provados na presente acção nas precedentes als. I) a M), terá de ser também dado como não provado o art.5° da base instrutória, e, consequentemente, como aqui não há meio-termo, ser dado como provado que as aberturas permitem debruçar ou olhar para baixo; 12a - Por sua vez, do art. 3.° da Base Instrutória da presente acção o meritíssimo juiz a quo apenas deu como provado que "o que fizeram e fazem, sem pausas nem interrupções, à vista de todos, e por mera tolerância do proprietário do prédio identificado na al. G) dos factos assentes", quando, em função da prova produzida nos autos, teria de ser dado como totalmente provada a matéria constante do referido art.3.°; 13a - Aliás, nunca tal facto foi alegado pela R. na contestação, pelo que deveria logo ter sido dado como provado, levando-se para os Factos Assentes, que não tinha havido oposição; 14a - Por outro lado, a prova aduzida nos presentes autos e na providência cautelar apensa com a letra "A" foi a mesma, e nesta última ficou dado como provado que "a utilização de tais aberturas ocorreu à vista de toda a gente, sem oposição de quem quer que fosse, sem violência e de forma continuada há mais de 20 anos" (ver sentença, al. O) dos factos provados); 15a - Os fundamentos invocados pelo meritíssimo juiz a quo para se convencer que os autores vinham dando aquele uso às ditas aberturas por mera tolerância da então proprietária do prédio vizinho e sem a convicção do exercício de um direito de servidão não podem, de direito, sustentar uma tal convicção; 16a - Assim, o facto de a testemunha Artur da Silva Leite ter referido que a então dona do prédio da ré se opôs à abertura de quaisquer janelas na empena norte do prédio onde habitam os autores, tendo então ficado acordada com ela a construção das aberturas que hoje existem, sem prejuízo dela, no futuro, poder ali encostar uma construção, tapando-as, não pode, por si só, servir de fundamento para provar que os autores vinham usando as aberturas por mera tolerância; 17a - Faltou provar que, aquando da venda das ditas fracções pelo construtor em 31 de Dezembro de 1981 a terceiros (vejam-se arts. 3°, 7° e 11° da p.i., expressamente confessados pela ré no art. 1° da contestação, e provados pêlos does. n.°16 e 17 da p.i.) e depois, por sua vez, por estes aos autores, foi transmitida de alguma forma a existência desse acordo; 18a - Temos, pois, de concluir pela existência do direito que os ora apelantes se arrogam, a aludida servidão de vistas, ar e luz exercida pelas aberturas/janelas supra aludidas; 19a - Assim, devia ter sido julgada totalmente procedente a presente acção; 20a - Pelo que, ao julgá-la só parcialmente procedente, a decisão recorrida violou o disposto nos arts. 1362° e 1251° do Código Civil”.

      Afinal, pedem seja revogada a decisão recorrida a sua substituição por outra que julgue totalmente procedente a presente acção.

      A ré contra-alegou, pugnando pela manutenção da sentença recorrida.

      Colhidos os vistos legais, cumpre decidir: Os factos dados como provados na 1ª instância (colocando-se entre parênteses as correspondentes alíneas dos factos assentes e os correspondentes números da base instrutória) são os seguintes: 1. Por escritura pública celebrada em 23.11.83, com cópia a fls 42, o autor António P... declarou comprar a Nelson M... e mulher Maria P..., que declararam vender, a fracção autónoma designada pela letra C, correspondente ao 1º andar lado esquerdo, destinada a escritório, do prédio urbano em regime de propriedade horizontal sito no cruzamento da Rua Costa Guimarães com a Avenida Dr. Magalhães Lemos, freguesia de Margaride, concelho de Felgueiras, inscrito na matriz sob o artigo 1273, descrito na Conservatória sob o nº 502 (al. A) dos factos assentes); 2. Encontra-se registada em G-2 a favor dos autores Jorge F... e mulher Paula V..., a fracção autónoma designada pela letra E, correspondente ao segundo andar lado esquerdo, destinada a habitação, do prédio urbano em regime de propriedade horizontal sito no cruzamento da Avenida Dr. Magalhães Lemos com a Rua Costa Guimarães, inscrito na matriz sob o artigo 1273, descrito na Conservatória sob o nº 502 (al. B) da matéria de facto...

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