Acórdão nº 1930/06-2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 26 de Outubro de 2006

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução26 de Outubro de 2006
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES: Por sentença proferida em 07/12/2005 (cfr. fls. 53 e segs.), já transitada em julgado, foi declarada insolvente a sociedade "Serralharia, L.da", pessoa colectiva n.º 504 118439, com sede no Lote 2, Pólo Industrial de Penso, freguesia de Penso, concelho de Melgaço e matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Melgaço sob o n.º 143/ 980302.

A fls. 185 e segs. veio a insolvente apresentar plano de insolvência nos termos do disposto nos artigos. 192.° e segs. e 224.°, n.º 2, alínea b) do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de Março, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 200/2004, de 18 de Agosto).

Foi convocada para o dia 16/05/2006 a assembleia de credores para discussão e votação do plano de insolvência, na qual estiveram presentes credores cujos créditos constituem mais de um terço do total de créditos com direito de voto e em que não foi introduzida qualquer alteração ao plano de insolvência apresentado.

Realizada a votação, foi o plano de insolvência aprovado por mais de dois terços da totalidade dos votos emitidos e mais de metade dos votos emitidos correspondentes a créditos não subordinados.

Por nenhum credor ou sócio, associado ou membro do devedor foi requerida a não homologação do plano de insolvência.

A deliberação de aprovação do plano não teve a aquiescência dos credores "Instituto da Segurança Social, I.P" e "Fazenda Nacional".

Com o fundamento em que se não mostravam violadas quaisquer regras procedimentais ou normas aplicáveis ao conteúdo do plano de insolvência, nem havia quaisquer condições suspensivas ou actos ou medidas que deviam preceder a homologação que não estivessem verificadas ou praticados, face ao disposto no art.º 214.° do CIRE, foi homologado por sentença o plano de insolvência junto a fls. 186 a 278.

Inconformados com esta sentença dela recorreram o Ministério Público em representação da Fazenda Nacional e o "Instituto de Segurança Social, I.P", O Ministério Público alegou e concluiu do modo seguinte: 1.° No que concerne aos créditos relativos ao Estado, vigora o princípio da indisponibilidade, ou seja, não é possível que à luz da Lei o Estado possa aderir a medidas que impliquem uma redução dos seus créditos, apenas lhe sendo possível aceitar moratórias no pagamento nos termos da lei, de acordo com esta e nos dentro dos seus limites.

Ou seja, há um dever do Estado de actuar dentro da legalidade e princípio da tipicidade.

2.° É à Lei que cabe definir as formas de pagamento, eventuais alterações, reduções ou até mesmo extinção parcial da obrigação contributiva.

3.º As normas que regulam a obrigação contributiva devem sobrepor-se às decisões tomadas por uma vontade colectiva, em sede de assembleia de credores. Não é possível que esta maioria conseguia verdadeiros benefícios, moratórias, perdões fiscais, conseguidos não nos precisos e excepcionais termos da lei, mas em resultado de uma vontade colectiva.

4.º Ora tal constitui uma violação ao princípio da igualdade e da legalidade.

5.º Assim, o M.mo Juiz, ao homologar o plano de insolvência nos precisos e supra referidos termos, não teve em consideração que o mesmo (e ao não fazer sequer uso da faculdade prevista no art.° 195.°, n.° 2 e) do CIRE) não estava de acordo com as normas que regem as dívidas fiscais, em particular o Código de Procedimento e Processo Tributário.

6.

Nomeadamente, e a saber, foram violados os artigos 196.° e 199.° do CPPT.

7.º Uma vez que é na lei que se encontram as condições em que pode ocorrer uma alteração da obrigação contributiva, o presente plano de insolvência, está em desconformidade com a mesma no sentido em que a mesma teria que: 8.° Prever o pagamento imediato ou regime prestacional, de 36 prestações, sendo que só em casos excepcionais poderia atingir o máximo de sessenta prestações mensais, iguais e sucessivas, nos termos do disposto art.° 1%.° do CPPT, (o que não é o nosso caso), assim sendo ao prever um regime do pagamento das dividas fiscais no prazo de 5 anos, em duas prestações anuais, viola claramente o disposto no art.° 196.°, n.° 1 a 5.° do CPPT.

9.º Sempre teria que haver necessidade de constituição de garantia idónea - garantia real ou garantia bancária -, nos termos do disposto no art.° 199.° do CPPT, e art.° 623.° do Código Civil. - Veja-se o Código de Procedimento e Processo Tributário anotado, de Jorge Lopes de Sousa, Vislis Editora.

10.º Bem como substituição dos gerentes responsáveis pela não entrega dos impostos em causa, nos termos do n.° 3, do art.° 196.º do CPPT.

11.º Para além disso, o plano sempre teria que ter em atenção que não poderia haver lugar a redução de coimas e custas; e 12.° Os créditos teriam que vencer Juros, nos termos do D.L n.° 73/99, de 16 de Março, aceitando-se as taxas praticadas para os créditos da Segurança Social, pelo que não seria possível um perdão dos Juros de mora vencidos e vincendos.

13.º Para além de que, a entidade competente para apreciar o pedido de pagamento em prestações, que também é a competente para apreciar as garantias (art.º 199.º, n.º 8 deste Código), é o órgão de execução fiscal ou o órgão periférico regional, conforme se estabelece nos n.° s 1 e 2 do art.° 197.° do diploma em causa.

Ou seja, só esta entidade é que tem competência para analisar, aceitar e autorizar as verdadeiras excepções que estão previstas na lei quanto a este aspecto (prazo de pagamento das dívidas, juros).

Ora no presente caso, verifica-se que, mesmo com a oposição da Fazenda Nacional, foi aprovado um plano, que foi alvo de uma decisão homologatória, que viola os referidos normativos legais que regem esta matéria.

14.° Para além de que o plano nada alega ou refere quanto à possibilidade de ser dispensada a prestação de garantia, nos termos da lei.

15.° Pelo que não é licito à Assembleia de Credores, atenta e desde logo a oposição da Fazenda Nacional, perdoar ou neste caso modificar o crédito, impondo um prazo excessivamente longo, uma vez que tal não é possível à luz do CPPT, nem é possível determinar que tais créditos deixem de vencer juros, ou neste caso, determinem qual a taxa de juro que vigora em tal prazo.

16.º Tendo sido homologado o referido plano, nos precisos termos supra descritos, entendemos que foi violado o disposto artigo 215.° do CIRE.

17.° Este preceito, que confere ao tribunal o papel de guardião da legalidade, cabendo-lhe em consequência, sindicar o cumprimento das normas aplicáveis como requisito da homologação do plano, quer as que concerne a aspectos de procedimento, como as que concerne ao conteúdo do plano (os respeitantes à sua parte dispositiva e, além deles, os que fixam os princípios a que ele deve obedecer imperativamente e os que definem os temas que a proposta deve apresentar) 18.° Normas relativas ao conteúdo serão, por sua vez, todas as respeitantes à parte dispositiva do plano, mas além destas, ainda aquelas que fixam os princípios a que ele deve obedecer imperativamente e as que definem os temas que a proposta deve contemplar.” - Código de Recuperação de Empresas anotado, Luís Carvalho Fernandes e João Labareda, Volume II, (art.° s 185.° a 304.°), Quid Iuris, 2005).

19.° No patamar do conteúdo, também deverá ser considerado uma violação não negligenciável a omissão da indicação dos preceitos legais derrogados pelo plano - (art.° 195.°, n.° 2 e) do referido diploma legal.

20.° Dir-se-á, com efeito, que são não negligenciáveis todas as violações de normas imperativas que acarretem...

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