Acórdão nº 1559/05-1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 14 de Dezembro de 2005

Magistrado ResponsávelNAZAR
Data da Resolução14 de Dezembro de 2005
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Recurso nº 1559/2005 Acordam, em audiência, os Juízes da Relação de Guimarães.

No Tribunal Judicial da comarca de Celorico de Basto, procº nº 35/01.6FAVNG, o arguido J... Simões, com os demais sinais dos autos, foi submetido a julgamento, em processo comum e com intervenção do tribunal singular, tendo a final sido proferida sentença, constando do respectivo dispositivo, o que se segue (transcrição): “ Face ao exposto: Julgo a acusação parcialmente procedente por provada, pelo que: 3.1. Declaro prescrito o procedimento criminal contra o arguido J... Simões relativamente à contra-ordenação p. p. pelo artigo 6º, nº 1 e 19º, c) do Decreto-Lei nº 3/74, de 08/01 com a redacção introduzida pelo Decreto-Lei nº 58/84, de 21/02, pelo qual vinha acusado.

3.2. Condeno o arguido J... Simões pela prática do crime p. p pelas disposições conjugadas dos artigos 24º, nº 1, c›), 81º, nº 1, a) e 82º, nºs 1, c) e 2, c) do decreto _lei nº 28/84, de 20/01, na pena de: a) Três meses de prisão que substituo por noventa e cinco dias de multa, à taxa diária de 4,5 euros (quatro euros e cinquenta cêntimos) e em setenta e cinco dias de multa à taxa diária de 4,5 euros (quatro euros e cinquenta cêntimos); b) Operando a soma, nos termos do artº 6, nº 1 do DL nº 48/95, de 15/03, vai condenado na pena de multa de cento e setenta dias de multa, à taxa diária de 4,5 euros (quatro euros e cinquenta cêntimos); 3.3. Condeno o arguido no pagamento das custas do processo, que compreendem: - duas UC de taxa de justiça, (arts 314º, nº 1, al. c) e 513º do CPPenal, 74º, 82º, nº 1 e 85º, nº 1, al. b), todos do CCJudiciais) a que acresce, nos termos do disposto no artº 13º, nº 3 do Dec._lei nº 423/91, de 30/10, 1% para o Cofre Geral dos Tribunais.

- procuradoria em ¼ da taxa de justiça, a favor do SSMJ (arts 514º, nº 1 do CPPenal, 74º, nº 1, 89º, nº 1, al. g) e 95º, nºs 1 e 2, estes do CCJudiciais.”*** Inconformado com a sentença, interpôs o arguido J... Simões o presente recurso, findando a respectiva motivação, com as seguintes conclusões: “ 1- Na douta sentença recorrida deu-se como provado que os garrafões de aguardente foram encontrados no mesmo local, armazém, onde o arguido exerce a sua actividade de venda de azeite, e que os garrafões em causa se destinavam a ser vendidos pelo arguido ao público em geral.

2 - Dos autos constam elementos de prova que impõem decisão diversa, com a consequente absolvição do arguido do crime que lhe é imputado, designadamente devem ser considerados como provados os seguintes factos: - A transferência do líquido das garrafas para os garrafões ocorreu na sequência de uma inundação.

- Que a aguardente não se destina ao consumo público, nem era intenção do arguido vendê-la.

- Que as caixas onde estavam embaladas as garrafas ficaram destruídas e que por facilidade de arrumo procedeu-se à referida transferência.

- Que os garrafões estavam arrumados em local fechado e não visível nem acessível ao público.

- No local onde se encontravam os garrafões o arguido não comercializa o que quer que seja.

- Que nem o arguido, nem a sua esposa, passava todos os dias pela aguardente, nem pelo local onde os garrafões se encontravam arrumados.

- Que os garrafões foram encontrados num outro anexo das mesmas instalações, entenda-se edifício, onde foi encontrado o azeite.

- Que os garrafões apreendidos foram encontrados num outro anexo das mesmas instalações, ou seja, do mesmo edifício onde foram encontrados as cubas de azeite, anexo esse que servia de garrafeira particular do arguido.

- Que os garrafões onde se encontrava a aguardente e esta não se destinavam a ser vendidos pelo arguido ao público em geral.

- Que a aguardente não se destinava ao consumo público, nem era intenção do arguido vendê-la e assim obter benefícios económicos.

- Que o arguido não agiu de forma livre deliberada e consciente.

3 - Dos depoimentos das testemunhas não poderia resultar outra decisão que não fosse a da absolvição do arguido, pois não resultou minimamente provado, salvo o devido respeito, que na data em que a aguardente foi apreendida, esta se destinava ao consumo público e que era intenção do arguido proceder à venda da mesma ao público.

4- Acresce ainda que, das testemunhas de acusação inquiridas não pode resultar como provado que o arguido tinha a aguardente guardada e que o seu objectivo era vendê-la e destiná-la ao consumo público.

5 - O tribunal levou ao extremo o Princípio da Livre apreciação da prova, nomeadamente ao ter formado a sua convicção em depoimentos de «ouvir dizer» e «indícios» resultantes de fases processuais precedentes à «Audiência de julgamento», pois nesta, salvo o devido respeito não se provaram vários dos factos dados como provados pela Meritíssima Juíza “ a quo”, e nomeadamente que, a aguardente apreendida se destinava ao consumo público e que era intenção do arguido vendê-la.

6 - Em anotação ao artº 127º do CPP escreveu Manuel Maia Gonçalves, in Código de Processo Penal Anotado que “livre apreciação da prova não se confunde de modo algum com apreciação arbitrária da prova nem com a mera impressão gerada no espírito do julgador pelos diversos meios de prova”.

7 - Dispõe o artigo 127º do CPP que a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente, mas a liberdade de que aqui se fala, como ensina Castanheira Neves, não é, nem deve implicar nunca o arbítrio, ou sequer a decisão irracional, puramente impressionista-emocional que se furte, num incondicional subjectivismo, à fundamentação e à comunicação.

8 - Salvo o devido respeito por melhor opinião, o tribunal “a quo” em 1ª instância decidiu numa base puramente impressionista-emocional, subjectivismo que não se coaduna com os Princípios da Certeza e Segurança Jurídicas, fundamentais e basilares em processo penal.

9 - Sem certezas e sem prova plena não há condenação, havendo apenas e só, lugar à absolvição.

10 - Tendo-se ultrapassado inquestionavelmente o princípio da prova livre, violou-se o artigo 127º do CPP que deve ser interpretado no sentido atrás exposto.

11 - Outro Princípio piramidal do processo penal é o in dúbio pro reo, que constitui o corolário da presunção basilar de inocência.

11 - A condenação penal, a pena criminal, é castigo destinado a resgatar a culpa do delinquente pelo que é de todo inaceitável a condenação sem a certeza moral da culpabilidade a redimir.

12 - É inaceitável que, numa sociedade em que o valor primeiro é a pessoa humana, a condenação penal não tenha por fundamento a certeza da culpa do condenado e possa servir como simples instrumento de intimidação.

13 - Consagra a CRP logo no seu artº 1º o primado da Pessoa Humana e da sua Dignidade, valorizando assim o Ser Humano como Princípio Fundamental do ordenamento jurídico Português e do próprio Sistema Democrático.

14 - No sentido atrás exposto consagrou a CRP um conjunto de “Direitos, Liberdades e Garantias Pessoais”, designadamente relativos ao arguido, plasmados no artº 32º.

15 - Dando relevância probatória «indícios», se é de «indícios» que se tratam, posição com a qual se discorda em absoluto, depoimentos de «na minha opinião era para venda», Tribunal “a quo” violou aquelas normas constitucionais, inconstitucionalidade que hic et nunc expressamente se invoca.

16 - A prova para condenar o arguido é inexistente.

17 - É inquestionável que está vedado ao juiz decidir como lhe apetece, passando nomeadamente por cima das provas produzidas, enquanto se lhe exige um convencimento justificado. – Prof. Figueiredo Dias, direito Processual Penal, vol. I, ed. 1974, pág. 204.

18 - O tribunal a quo incorreu em erro de julgamento ao dar como assente a factualidade atinente: a) A intenção do arguido em vender a aguardente; b) Ao considerar como provado que a aguardente se destinava ao consumo público, se não fosse apreendida naquela data; c) Ao dar como provado que o arguido passava diariamente junto a ela, e que não obstante, ao invés de a deitar fora, manteve-a no armazém, destinando-a ao consumo público e pretendendo vendê-la assim obtendo benefícios económicos.

d)Ao dar como provado que o arguido agiu de forma livre deliberada e consciente, bem sabendo que a sua conduta era punida e proibida por lei.

19 - A Meritíssima Juíza “ a quo” proferiu a sentença ora recorrida, decisão essa proferida tendo em conta os depoimentos das testemunhas de acusação, em detrimento dos depoimentos das testemunhas...

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