Acórdão nº 117/05-1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 16 de Fevereiro de 2005

Magistrado ResponsávelROSA TCHING
Data da Resolução16 de Fevereiro de 2005
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães "A" e mulher, "B" vieram propor a presente acção declarativa, com processo sumário, contra "C" e mulher, "D", pedindo que seja declarado que gozam do direito de preferência na compra de um prédio rústico que identificaram e que seja ordenada a entrega de tal prédio bem como o cancelamento de qualquer registo entretanto efectuado sobre o mesmo imóvel.

Alegaram, para tanto e em síntese, que os réus compraram aos anteriores proprietário um prédio rústico confinante com outro prédio rústico de que os autores são proprietários, sem que os vendedores tenham comunicado aos autores o projecto de venda e as cláusulas contratuais.

Contestaram os réus, impugnando os factos alegados pelos autores e excepcionando serem também proprietários de prédio rústico confinante com o imóvel objecto da venda, serem titulares de direito de servidões de passagem, aqueduto, estilicílio, esteio e prisões que oneram o prédio objecto da acção em favor de prédios sua propriedade.

Mais excepcionaram que a venda em causa foi publicitada e realizada em leilão, onde os autores estiveram presentes e desistiram expressamente da venda atento o preço petionado.

Pugnaram ainda pela condenação dos autores em indemnização por litigância de má fé.

Os autores responderam à contestação, sustentando a improcedência das excepções deduzidas.

Foi proferido despacho saneador e elaborados os factos assentes e a base instrutória.

Aberta a audiência de julgamento, foi proferido despacho que, conhecendo da excepção dilatória de ilegitimidade, por os vendedores do prédio em questão não terem sido demandados conjuntamente com o réus/adquirentes, absolveu estes da instância.

No prazo a que se refere o art. 269.º, n.º 1, do CPC, vieram os autores requerer a intervenção principal provocada de Judite S... e Aníbal G..., a qual foi admitida, tendo a instância sido julgada renovada.

Vieram, então, os réus/intervenientes deduzir contestação, repetindo os fundamentos invocados pelos primitivos réus e excepcionando a existência de direito de preferência por parte dos compradores, por serem titulares de servidão legal de passagem sobre o prédio em causa.

Foi então proferido despacho que, conhecendo parcialmente do mérito da causa, julgou improcedente a excepção invocada, e ordenou o prosseguimento dos autos com base na selecção da matéria de facto já operada.

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, com observância de todo o formalismo legal, decidindo-se a matéria de facto controvertida pela forma constante do despacho de fls. 276 a 279, que não mereceu qualquer censura.

A final foi proferida sentença que julgou a presente acção totalmente improcedente e, em consequência, absolveu os réus e os intervenientes do pedido, condenando os autores no pagamento das custas.

Não se conformando com esta decisão, dela apelaram os autores, terminando a sua alegação com as seguintes conclusões, que se transcrevem: “1a- O Tribunal "a quo" julgou improcedente a acção por entender que o caminho que separa o terreno objecto do direito de preferência e o prédio pertencente aos Réus é de servidão e não público pelo que os Réus também são confinantes tal qual os AA./Apelantes.

  1. - Os outorgantes da escritura pública de compra e venda (os Apelados: Réus e Intervenientes) qualificaram o caminho como público já que nesse documento afirmam que o terreno vendido e comprado confronta do nascente com caminho público e não com caminho de servidão ou com os compradores.

  2. - Na sua própria Contestação, os Réus/Apelados também admitem que esse caminho é público na medida em que afirmam que eles são confinantes com o terreno vendido apenas porque são proprietários de uma "corte e coberto para guarda de animais e forragens" ou seja, eles próprios não por serem proprietários do leito de uma caminho de servidão adjacente mas sim por, serem proprietários de uma construção que não é prédio rústico ou, melhor dito, terreno.

  3. - Resulta dos articulados oferecidos aos autos que nenhum dos Apelados (Réus e/ou Intervenientes) referem e defendem que o terreno vendido e comprado é ladeado por caminho de servidão; pelo contrário fizeram consignar na escritura pública de compra e venda que, pelo lado nascente (lado poente do prédio dos Réus) confina com caminho público.

  4. - Os mesmos Réus, na sua Contestação, expendem que não existe confínância com caminho público apenas e tão só porque, no seu entender, o terreno confina com uma corte que lhes pertence mas não alegam confínância com terreno próprio.

  5. - Face à matéria provada, o caminho tem cerca de 500 metros de comprimento. Ora, a corte não tem, seguramente, essa extensão.

  6. - Assim, os próprios Apelados reduzem a confinância à extensão da corte (que é uma construção e não terreno apto para cultura).

  7. - Não sendo a corte um terreno apto para cultura e sendo a restante confínância do terreno vendido, a nascente, com caminho público e sendo os Apelantes proprietários de terreno apto para cultura confinante, gozam estes do direito de preferência.

  8. - Não se arrogando os Apelados (Réus e Intervenientes) proprietários do leito do caminho não há causa para discutir a sua dominialidade pública ou privada.

  9. - "Quem pretenda ver judicialmente reconhecido um direito real de preferência, na qualidade de proprietário confinante, deverá (terá) alegar e provar, de acordo com a repartição do ónus da prova, os factos constitutivos do seu direito e que são os indicados no artigo 1380" do Código Civil. Por seu turno, quem possa defender-se terá de provar algumas das excepções indicadas no artigo 1381°do mesmo Código" (Ac. supra citado).

  10. - Os Apelados, nos seus articulados não alegam qualquer das excepções enunciadas no art. 1381° Cod. Civil.

  11. - A própria escritura de compra e venda outorgada pelos Apelados faz prova plena não só dos factos dela objecto mas também das declarações nela vertidas e, aí, se consigna que, pelo lado nascente, o terreno vendido e comprado confina com caminho público.

  12. - Ao admitirem, embora não expressamente, nos seus articulados, que existe essa confínância com caminho público, os Apelados confessam-na.

  13. - Aquando da ampliação da Base Instrutória não foi requerida nem oferecida mais ou nova prova apenas na pedida em que não era previsível a discussão sobre a dominialidade, pública ou privada do caminho. Daí que seja lícita, agora, a junção de documento que a essa discussão respeita.

  14. - A douta sentença sob recurso não terá feito a melhor aplicação das normas constantes dos arts. 1380°, 1381°, 238°, 369° e 371° Cod. Civil e 356°, 490° e 524° do Cod. Proc. Civil.

  15. - A douta Sentença em recurso deverá ser revogado por mui douto Acórdão que julgue procedente a Apelação e a acção”.

    Os réus e intervenientes contra-alegaram, pugnando pela manutenção da decisão recorrida.

    Colhidos os vistos legais, cumpre decidir: Os factos dados como provados na 1ª instância (colocando-se entre parênteses as correspondentes alíneas dos factos assentes e dos quesitos da base instrutória), são os seguintes: a) Por escritura outorgada no Cartório Notarial de Monção em 10/11/1995, exarada de fls. 30 a 32 do livro para escrituras diversas 496-C, os RR declararam comprar a Judite S... e marido, Aníbal G..., pelo preço de Esc: 1.400.000$00 o prédio rústico composto de pinhal e mato, denominado “C. do M.” , sito no lugar de ..., freguesia de ..., concelho de Monção, com área de 7.000 m2, a confrontar do norte com Aníbal L..., sul com Luís F..., nascente com caminho público e poente com José L..., omisso na Conservatória do Registo Predial e inscrito na respectiva matriz sob o art. 1161.º - doc. de fls. 7 a 13 dos autos cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido; (alínea A) da especificação) b) Existe um prédio rústico composto de terreno de cultura e vinha em ramada, denominado “E”, sito no lugar de ..., freguesia de ..., concelho de Monção, a confrontar do norte com José L... e o prédio atrás identificado, sul com caminho público, com a área de 8.000 m2, inscrito na matriz sob o art. 1.109.º; (alínea B) da especificação) c) Os RR. são donos e legítimos possuidores do prédio misto composto de casa de morada e leira de cultivo, vinha e monte chamado “Carv..., Leiras do S..., Leira do C... Coch.. e Casc...”, sito nas ...,..., com os arts. 138 (urbano), 103, 105, 123, 124, 125, e 126 rústicos; (alínea C) da especificação) d) Por sentença proferida nos autos de inventário facultativo por óbito de José O..., que neste tribunal correu termos sob o n.º 41/72, foi adjudicado ao autor, descrito sob a verba n.º 7, uma propriedade de lavradio e vinha, sita no lugar das poldras, composta de campo e Leiras da P..., Leira do M..., Leira de T..., Leira de Trás do M..., Leira do C..., Leira da E..., Leiras da Mi..., Leiras de Trás da C... e Campo e Leiras da G..., tudo junto a confrontar do nascente com caminho público, poente com herdeiros de José de O..., norte com Constança G... e outros, e sul com caminho público, descrito no registo predial conjuntamente com outras verbas sob o n.º 15.690, e inscrito na matriz sob os artigos n.º 91.º, 92.º, 93.º, 94.º, 95.º, e 96.º; (resposta ao quesito 1.º) e) O prédio descrito em d) corresponde está actualmente inscrito na matriz sob o art. 1109.º; (resposta ao quesito 3.º) f) Desde 1974 os autores vem lavrando e semeando tal prédio, cultivando vinha, milho e pastagem, colhendo todas as produções; (resposta ao quesito 4.º) g) O que têm feito à vista de toda a gente; (resposta ao quesito 5.º) h) Sem oposição de ninguém; (resposta ao quesito 6.º) i) Ininterruptamente; (resposta ao quesito 7.º) j) Na plena convicção de exercer um direito de propriedade legitimamente adquirido; (resposta ao quesito 8.º) k) Os prédios descritos em a) e b) confinam entre si, pelo lado...

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