Acórdão nº 1587/03-1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Outubro de 2003

Magistrado ResponsávelROSA TCHING
Data da Resolução15 de Outubro de 2003
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães "A", sociedade austríaca, com sede em Voegeisbergweg, Wattens, Áustria, intentou a presente acção, sob a forma de processo ordinário, contra "B", residentes no lugar de ... Barcelos, "C", residentes no Lugar da Igreja... Barcelos, "D", residentes no Lugar da ... Barcelos, e "E", pedindo que seja: a) - declarada ineficaz, em relação à A, a rectificação à escritura de doação de 17.11.80, a partilha e a partilha em vida, operadas pela escritura de 04.06.98, lavrada no Cartório Notarial de Esposende, podendo, consequentemente, a A executar, no património do terceiro réu, a propriedade limitada pelo usufruto dos prédios referidos no artigo 1º da petição inicial; b)- declarada ineficaz, em relação à A , a compra e venda da fracção autónoma identificada no artigo 2º da petição inicial, operada pela escritura de 19.11.98, lavrada no 1º cartório Notarial de Barcelos, podendo, consequentemente, a A executá-la no património da quinta ré.

Citados, os RR. contestaram, impugnando os factos articulados pela A, e concluindo pela improcedência da acção.

Foi proferido o despacho saneador, no qual se afirmou a validade e a regularidade da inastância, e foram elaboradas a matéria de facto assente e a base instrutória.

Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento com observância de todo o formalismo legal, decidindo-se a matéria de facto controvertida pela forma constante do despacho de fls. 271, que não mereceu qualquer censura.

A final foi proferida sentença que julgou a presente acção procedente, por provada, e, em consequência, declarou impugnadas as doações e venda constantes dos factos provados n°s 4 e 11, efectuada pelos primeiros RR. aos RR. "B"; "C" e "D" e "E", respectivamente, reconhecendo-se à A., "A", o direito a executar, na medida do seu interesse, no património destes últimos, o seu crédito.

- Condenou os RR. no pagamento das custas.

Não se conformando com a decisão, dela, atempadamente apelaram os réus, terminando a sua alegação com as seguintes conclusões, que se transcrevem: “l- Os Réus, ora apelantes, alegam na sua contestação que os bens doados ao Réu "B" com a declaração que o eram por conta das quotas disponíveis dos doadores, só o foi, para permitir que fossem dados como garantia hipotecária dos empréstimos que o mesmo iria contrair junto da banca e que esta só nessas condições é que faria o empréstimo.

2- Pois os doadores não queriam beneficiar nenhum filho em detrimento dos outros.

3- Por isso é que todos os interessados efectuaram essa correcção no acto da partilha, fls.4 da escritura de partilha.

4- Alegam ainda os Réus que os bens doados ao Réu "B" se encontravam hipotecados à banca e que as hipotecas são muito anteriores ao crédito da Autora, como, aliás, resulta da certidão da Conservatória do registo Predial de fls. 115 e segs.

5- Alegaram ainda que as hipotecas foram canceladas depois da partilha, como, aliás, também resulta da aludida certidão.

6- Alegaram os apelantes que o Réu "B" não efectuou nenhuma alienação dos bens doados, apenas fez a partilha com os demais herdeiros e, porque estes atribuíram um valor superior aos bens que lhe haviam sido doados, o Réu "B" preferiu receber dinheiro a ficar com bens pelos valores atribuídos pelos outros interessados.

7- Tais factos não foram levados à base instrutória, pelo que os apelantes reclamaram através do seu requerimento de fls. e, posteriormente na audiência de julgamento, tendo sido ambos os requerimentos indeferidos, como se constata do douto despacho de fls. 154 e da acta de fls. 269.

8- A referida matéria encontra-se vertida nos itens 7º a 24º da contestação e no seu entender tem interesse para uma correcta apreciação da causa.

9- Pelo que aqueles despachos violam o art° 511° do C. P. C..

10- A intervenção de um herdeiro na partilha, judicial ou extra-judicial, sobretudo sendo simultaneamente donatário, é um acto de natureza pessoal. O donatário, quer queira, quer não, terá que efectuar a partilha com os demais herdeiros. E verdade que não é o exemplo clássico de acto de natureza pessoal que se costume enunciar. Mas, que é de natureza pessoal, é.

11 - Os actos de natureza pessoal não podem ser objecto de impugnação pauliana - art° 610° do C. C..

12-Consta da escritura de partilha que o de cuius e sua esposa haviam feito doações por conta das suas quotas disponíveis tanto ao Réu Luís como ao "D" e que tais doações foram feitas naqueles termos "para não tolher a eventual obtenção de empréstimos junto das instituições bancárias, porquanto a sua vontade era que as mesmas fossem feitas por conta das legítimas dos respectivos donatários", fls.4 da mencionada escritura de fls.20 e seguintes dos autos.

13-Nos termos do disposto no art° 1365°, n°l do C. P. C., qualquer herdeiro legitimário pode requerer a licitação nos bens doados pelo inventariado e, se o donatário, seja ou não conferente, se não opuser, os bens regressam ao acervo da herança, podendo ir parar às mãos de qualquer interessado, que não o donatário.

14- Se em processo de inventário as coisas se podem passar da forma exposta, não se vê razão alguma para que nas partilhas extra-judiciais o donatário não possa abrir mão dos bens doados, quando os demais herdeiros legitimários atribuem aos bens doados valores superiores aos do donatário. Como aconteceu na partilha que se pretende impugnar.

15- E o resultado é o mesmo, quer se trate de doações por conta da legítima ou de doações por conta das quotas disponíveis dos doadores. Num e noutro caso, o donatário pode abrir mãos dos bens doados, recebendo dinheiro. E, tanto numa como noutra situação, o resultado para o eventual credor do donatário, é o mesmo. Aquele deixou de ter bens e passou a ter dinheiro.

16-Quer na partilha judicial, quer na partilha em vida, os quinhões hereditários do primeiro Réu foram preenchidos em dinheiro —alínea F) da matéria assente.

Daqui ressalta que o acto realizado pelo Réu "B" é um acto oneroso e não gratuito. Pois que abriu mão dos bens doados, mas recebeu dinheiro.

17- O acto oneroso só pode ser objecto de impugnação pauliana, se os intervenientes tiverem agido com má fé, como exige o art° 612° do C. C..

18-Ora, a Autora, não alegou e, fortiori, não provou que o Réu "B" e os demais herdeiros tenham agido de má fé, isto é, com consciência de que estavam a causar prejuízo à Autora.

19-Pelo que a partilha efectuada pelo Réu "B" com os demais herdeiros não está sujeita à impugnação pauliana.

20- As respostas aos n°.s l e 2 da base instrutória, no que respeita aos valores reais dos imóveis, é irrelevante para a decisão da presente causa, tanto mais que é um facto notório que nas partilhas amigáveis, tanto judiciais, como extra-judiciais, os valores atribuídos aos bens são os constantes do cadastro matricial e o valor das tornas recebidas são encontrados em função daqueles. Nunca os intervenientes atribuem aos bens e às tornas os valores reais. Como se disse, tal prática é um facto notório e os factos notórios não carecem de ser alegados nem provados -art° 514° C. P. C..

21-A venda da fracção, descrito na alínea J) da matéria assente é, obviamente...

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