Acórdão nº 2764/05-3 de Tribunal da Relação de Évora, 01 de Fevereiro de 2007
Magistrado Responsável | BERNARDO DOMINGOS |
Data da Resolução | 01 de Fevereiro de 2007 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam os Juízes da Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora: Proc.º N.º 2764/05-3 Apelação 3ª Secção Tribunal Judicial da Comarca de Évora - 2º Juízo Cível - proc. n.º 359/00 Recorrente: Luísa Maria……………, Antónia Leonor………….., Carlos …………, Maria João…………. e MP.
Recorrido: Ministério Público * O MºPº intentou a presente acção ordinária contra Caetano ………… pedindo que: a) seja declarada a anulabilidade do acto de divisão e fraccionamento consubstanciado na escritura de divisão de 13.11.97 lavrada no 2° Cartório Notarial de Évora, de fls. 89 a 93 do livro 129-B, do prédio rústico denominado "Quinta do Caldeireiro e Curiosa", sito na freguesia da Malagueira, concelho de Évora, com a área total de vinte e seis hectares e três mil e quinhentos centiares, composto por oito parcelas cadastrais de horta, cultura arvense, terra estéril, dependências agrícolas e um Monte de Habitação, descrito na Conservatória do Registo Predial de Évora sob o n. ° 8298, ainda da freguesia da Sé, inscrito na respectiva matriz daquela freguesia da Sé, a parte rústica sob o artigo 5°, secção B, e a parte urbana inscrita sob o artigo 1948, com todas as consequências legais daí decorrentes; b) seja declarada a anulabilidade dos negócios jurídicos de compra e venda dos imóveis ( novos prédios ) eventualmente realizados, com todas as consequências legais daí resultantes; c) seja ordenado o cancelamento dos registos das parcelas resultantes da divisão.
Para tal alegou, em síntese, que: O fraccionamento efectuado é ilegal porque teve como pressuposto tratar-se de um terreno hortícola, que não é, mas mesmo que o fosse, as parcelas resultantes do fraccionamento teriam que ter uma área mínima de 1 ha, de acordo com a área de cultura resultante da aplicação dos valores da RAN, pelo que no fraccionamento em causa foi violado o art. 1376º nº 1 do CC, ou seja, a unidade de cultura aplicável.
Por outro lado, tratando-se de prédio encravado, o fraccionamento não era permitido nos termos do nº 2 do artigo referido.
Finalmente, a escritura de fraccionamento viola o disposto no art. 20º nº 1 al. c) do DL nº 384/88 de 25.10, já que os prédios resultantes da divisão não têm viabilidade económica, pois nunca produzirão rendimento líquido superior a 40 mil escudos mensais ou 480 mil escudos anuais.
O Réu contestou negando que o prédio esteja na zona de RAN, já que os solos classificados como Reserva Agrícola Nacional nunca foram incluídos no PDM de Évora e não foi publicada no Diário da República a carta de condicionantes incluídas nos Plano Director Municipal de Évora.
Alegou ainda e em síntese que: Devem considerar-se os condicionamentos previstos no próprio PDM que fixa uma área mínima de 5000 m2 para os solos agrícolas protegidos; Foi emitido parecer pela DRA favorável ao fraccionamento do prédio por os novos prédios respeitarem a Unidade de Cultura fixada e regulamentada e ficarem com viabilidade económica, pelo que foram cumpridos todos os formalismos legais para que o fraccionamento seja válido; Do fraccionamento não resultou o encrave do prédio, pois no próprio fraccionamento foi previsto um caminho denominado « Estrada Interna da Quinta do Caldeireiro » que liberta do encrave qualquer das parcelas mencionadas pelo A, na medida em permitirá o respectivo acesso a eventuais futuros proprietários que no acto da compra e venda poderão e deverão fazer consignar a servidão de passagem na denominada « Estrada Interna » e a caracterização de prédio encravado relativamente às parcelas « J » a « Q » nem sequer se coloca uma vez que todas elas continuam a pertencer ao Réu.
Alegou ainda o Réu que a partir do segundo semestre de 1997 e até ao primeiro semestre de 2000 toda a área correspondente ao prédio actualmente fraccionado e denominado « Quinta do Caldeireiro e Curiosa » com excepção do prédio que actualmente se encontra inscrito na matriz cadastral sob o nº 73, foi regularmente semeado com produtos próprios de cultura de regadio hortícola como feijão para colher em verde e em seco, abóboras e fruta de meloal, produtos que o R . colheu e vendeu no âmbito da sua actividade normal de agricultor.
Foi por motivos de saúde que o Réu, nos finais do primeiro semestre de 2000, não procedeu ao cultivo de produtos hortícolas.
Só no prédio inscrito na matriz cadastral sob o nº 73 existe vinha armada e regada , mas tal prédio tem a área de 17,16657 ha e o seu destino é terra de cultura arvense de regadio como consta da própria escritura de fraccionamento.
Por falecimento do R. foram habilitados como seus sucessores Luísa Maria ……. e Antónia Leonor …………...
Foi requerida e admitida a intervenção principal, a título passivo, de Carlos …………. e Maria João ……………, por terem adquirido um dos prédios resultantes do fraccionamento.
Foi proferido despacho saneador onde para além do mais foi apreciada a excepção da incompetência material do Tribunal, suscitada pelo R., tendo sido decidido que a mesma não se verificava e que o Tribunal era materialmente competente para conhecer do pleito. Desta decisão não foi interposto qualquer recurso. Instruído o processo procedeu-se a julgamento com observância do legal formalismo. Respondeu-se à base instrutória, sem que tendo havido qualquer reclamação e por fim foi proferida sentença que julgando a acção procedente decidiu o seguinte: «
-
Declaro a anulabilidade do acto de divisão e fraccionamento consubstanciado na escritura de divisão de 13.11.97 lavrada no 2° Cartório Notarial de Évora, de fls. 89 a 93 do livro 129-B, do prédio rústico denominado "Quinta do Caldeireiro e Curiosa", sito na freguesia da Malagueira, concelho de Évora, com a área total de vinte e seis hectares e três mil e quinhentos centiares, composto por oito parcelas cadastrais de horta, cultura arvense, terra estéril, dependências agrícolas e um Monte de Habitação, descrito na Conservatória do Registo Predial de Évora sob o n. ° 8298, ainda da freguesia da Sé, inscrito na respectiva matriz daquela freguesia da Sé, a parte rústica sob o artigo 5°, secção B, e a parte urbana inscrita sob o artigo 1948, com todas as consequências legais daí decorrentes; b) Declaro a anulabilidade da escritura de 23.07.98, lavrada no Cartório Notarial de Coruche, em que o Réu Caetano ………. vendeu ao Interveniente Principal Carlos………………. o prédio rústico sito na Quinta do Caldeireiro e Curiosa, freguesia da Sé, Évora, inscrito na matriz predial rústica da Freguesia da Sé - Évora, sob o artigo 72, secção B, descrito na Conservatória do Registo Predial de Évora sob o nº 10482/20001020, bem com a anulabilidade dos negócios jurídicos de compra e venda dos imóveis (novos prédios) eventualmente realizados, com todas as consequências legais daí resultantes; c) Ordeno o cancelamento dos registos das parcelas resultantes da divisão».
*Inconformados, tanto as RR. como os intervenientes, vieram interpor recursos de apelação.
A R. Luísa Maria, rematou as suas alegações com as seguintes conclusões: 1. «Da conjugação dos artigos 1379°, n.º 3, e 291°, do Código Civil, com os artigos 47°, n.º 3, do DL 103/90, de 22/3, e com os artigos 3°, n.º 1, alíneas a) e b), e n.º 2, 92°, n.º 1, alínea a), e n.º 3, 10° e 11°, do Código do Registo Predial, resulta que o registo da acção de anulação do fraccionamento por motivos previstos no artigo 1376° do Cód. Civil é obrigatório, provisório por natureza e que caduca no fim de três anos, se não tiver sido requerida a sua renovação.
-
Deve entender-se que dessa caducidade , uma vez operada, resulta a extemporaneidade da acção, ainda que já intentada, se no momento dessa caducidade já tiverem decorrido mais de três anos sobre a prática do acto de fraccionamento impugnado, de igual modo se devendo entender relativamente ao novo registo que da acção tenha sido feito após a caducidade - é o efeito útil que se impõe retirar destas situações, tendo em conta que o direito de intentar a acção caduca três anos após o acto de fraccionamento.
-
No caso dos autos tal não sucedeu, pelo que a douta sentença recorrida deve ser anulada , uma vez que, através da errada interpretação que fez dos preceitos referidos na conclusão 1, os violou.
-
Como consequência, deve ser substituída por decisão que declare a extemporaneidade da acção, por caducidade do direito de a intentar, com todas as legais consequências.
-
No caso dos autos, foi constituída pelo proprietário do prédio originário e das fracções ou parcelas em causa uma servidão nos termos e ao abrigo do art.º. 1549°. do Cód. Civil no momento em que foi celebrada a escritura de divisão - ocorrida em 13/11/1997.
-
Por força dessa servidão, as novas parcelas ficaram com acesso a caminhos públicos, nomeadamente à Azinhaga da Santo Antonico, mas também ao caminho público que as delimita a Norte, o qual consta da carta cadastral desde 1951, melhor identificados a fls. 615 a 617 dos autos.
-
Esta servidão é operacional, na prática, desde a altura em que foi constituída, onerando material e juridicamente o prédio originário.
-
Tal servidão adquirirá toda a sua relevância jurídica quando se operar por qualquer meio a alteração da titularidade do domínio ou propriedade das parcelas resultantes do fraccionamento.
-
Para isso, basta que os novos proprietários façam constar dos documentos negociais essa circunstância.
-
A constituição desta servidão impede que se verifique a situação de encrave de qualquer das parcelas para efeitos do n.º. 2 do art.º. 1376°. do Cód. Civil.
-
Tendo sido constituída pelo proprietário do prédio originário das parcelas, quando houver mudança de titular da propriedade de cada uma delas, já está garantido o acesso a caminhos públicos.
-
Uma servidão deste tipo e com estes efeitos impede uma situação de encrave de qualquer das parcelas.
-
Assim, a douta sentença recorrida deve ser anulada por ter feito uma errada interpretação (e por isso violado) do art.º. 1376°., n.º. 2, do Cód. Civil, em conjugação com o art.º. 1549°. do mesmo Código.
-
Se assim não se entender, então deve a dou ta sentença ser...
-
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO