Acórdão nº 1736/06-1 de Tribunal da Relação de Évora, 10 de Outubro de 2006

Magistrado ResponsávelJOÃO GOMES DE SOUSA
Data da Resolução10 de Outubro de 2006
EmissorTribunal da Relação de Évora

Proc. Nº 1.736/06.1 Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: A - Relatório: No processo comum com intervenção de tribunal colectivo que corre termos no 3º Juízo do Tribunal de …, por despacho proferido em 2 de Maio de 2006, a fls. 111-11370, a MMª Juíza de Instrução proferiu despacho a indeferir o requerimento do recorrente para que se revogasse o arresto decretado nos autos sobre dois bens imóveis de sua propriedade (fracções … empreendimento turístico denominado …, e se permitisse a venda dos mesmos, condicionada a ser depositado, corno caução o montante de 451 000 € ou outro até ao limite de 630 000 €.

Inconformado com uma tal decisão, dela interpôs recurso o arguido, que subiu em separado, pedindo seja concedido provimento ao mesmo, revogando-se o despacho recorrido, substituindo-o por outro que defira a pretensão do arguido de vender os bens e depositar caução, com as seguintes conclusões: O douto despacho da Mma JIC de Fls 710 a 713 denegou ao recorrente a possibilidade de vender os imóveis ora sob arresto, substituindo ele como garantia patrimonial aqueles bens arrestados pelo valor da venda dos imóveis, até ao limite de 630.000 Euros, De tal despacho se recorre.

Tem o arguido neste momento comprador para ambos os imóveis, conjuntamente em relação a ambas as fracções por 315.000 Euros cada, num total de 630.000 Euros; mas o comprador interessado na aquisição só a concretizará se o arresto vier a ser levantado.

O preço oferecido é superior àquele pelo qual os imóveis foram adquiridos; e está o arguido disposto a deixar como caução não apenas o valor que se diz ser a vantagem do crime, mas todo o montante que resultar da venda.

Nos termos do artigo 228.° nº 5 do CPP, aplicável por força do artigo 10° da Lei 5/2002 de 11 de Janeiro "o arresto é revogado a todo o tempo em que o arguido ou o civilmente responsável prestem a caução económica imposta".

Ora, no presente caso, o recorrente manifesta claramente a sua intenção de prestar a caução, até por um valor superior ao do bem actualmente arrestado -- todo o montante resultante da venda, 630.000 Euros.

O douto despacho recorrido entende que a pretensão do arguido não tem suporte legal, pois não se pode revogar o arresto para que se concretize o negócio ficando os autos a aguardar essa concretização para a prestação efectiva da caução; e que também carece de fundamento legal consentir ou autorizar a compra e venda daqueles imóveis condicionada ao depósito de uma caução.

Ora, nada na lei impede que um qualquer negócio ou contrato de compra e venda se celebre sob condição.

Neste caso, a condição (que a venda só colheria eficácia se o valor do preço até 451.000,00 Euros, ou a totalidade do preço, 630.000,00 Euros, fosse de imediato, no acto subsequente à venda, depositado como caução à ordem deste processo) seria desde logo estabelecida por despacho judicial.

Estaria assim garantida a prestação da caução que o arguido se propõe fazer; e cumprida a disposição legal que permite a revogação do arresto mediante a prestação de caução.

Também não carece de fundamento legal que o arresto possa ser levantado previamente à prestação da caução.

Nas condições acima, dada a necessária prestação da caução para que a venda colhesse eficácia, era impossível haver qualquer extravio ou perda da garantia patrimonial.

E é esta impossibilidade de extravio ou diminuição de garantias a razão de ser do arresto preventivo bem como da prestação da caução económica (art. 227º e 228° do CPP).

Na solução requerida e apresentada pelo arguido à Mma JIC inexiste qualquer possibilidade de perda ou falta das garantias ou dos bens; e quanto a diminuição, pelo contrário o que existe é aumento do valor dessas garantias.

O requerimento que o arguido apresentou à M ma JIC, é consentâneo com a liberdade da vida económica e negocial do arguido e não contende com a necessidade do processo se garantir quanto a evitar que os bens ou o seu valor se extraviem.

No caso em concreto, condicionada que fosse a eficácia da venda àquele depósito subsequente, tal situação de eventual extravio de bens ou valores estaria cabal e inteiramente prevenida.

A interpretação que a Mma JIC faz do artigo 228.° do CPP é uma interpretação meramente literal, que não atende ao espírito da norma e à sua integração no sistema.

Assim, ao negar a pretensão do arguido a Mma viola os artigos 228° do CPP e o nº 4 do artigo 10º da Lei 5/2002 de 11 de Janeiro.

Além disso, a interpretação que a Mma faz do artigo 228º do CPP para negar a pretensão do arguido, é claramente inconstitucional, no cotejo com as disposições do artigo 62.° nº 1, 32º nº 1 e 2 e 99.° alíneas a) e e) todos da CRP.

Inconstitucionalidade que desde já se deixa aqui arguida para todos os legais efeitos.

O Ministério Público junto do Tribunal de Olhão apresentou doutas motivações, defendendo a improcedência do recurso.

*Nesta Relação, o Exmº Procurador-geral Adjunto emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

Foi observado o disposto no nº 2 do artigo 417° do Código de Processo Penal.

Colhidos os vistos, o processo foi à conferência.

Cumpre apreciar e decidir.

*B - Fundamentação: Cumpre conhecer São estes os elementos de facto relevantes, decorrentes do processo: I. No âmbito dos autos de Carta Rogatória nº …, provinda de… e que corre termos no 3º Juízo do Tribunal de …, a Mmª Juíza de Instrução Criminal decretou o arresto de dois bens imóveis pertença do recorrente (fracções NA e AO do empreendimento turístico denominado … .

  1. O arresto decretado destina-se a garantir o pagamento do montante de € 451 000, valor correspondente ao apurado como constituindo vantagem da actividade criminosa...

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