Acórdão nº 193/06-1 de Tribunal da Relação de Évora, 02 de Maio de 2006
Magistrado Responsável | PIRES DA GRAÇA |
Data da Resolução | 02 de Maio de 2006 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam, em audiência, na Relação de Évora a- Nos autos de processo comum (tribunal colectivo), com o nº … do 2º Juízo da comarca de …, perante o Tribunal Colectivo foi submetido a julgamento o arguido H, solteiro, vigilante, nascido no dia …, filho de … e de …, natural da freguesia de …, concelho do …, residente no …, …, na sequência de acusação formulada pelo Digno Agente do Ministério Público, que lhe imputou a prática de factos, susceptíveis de integrar a autoria material, de um crime de homicídio por negligência, previsto e punível pelo artigo 137º, nº 1 e 2 e artigo 69º, nº 1, alínea b) do Código Penal e um crime de omissão de auxílio, previsto e punível pelo artigo 200º, nº 1 e 2 do Código Penal.
* b- Foi deduzido pedido de indemnização civil, mas, em audiência de julgamento, a instância cível foi julgada extinta por transacção judicial devidamente homologada.
* c- Realizado o julgamento foi proferido acórdão que decidiu julgar a acusação improcedente por não provada e em consequência absolveu o arguido H dos crimes de homicídio por negligência e omissão de auxílio de que vinha acusado; d- Inconformado, recorreu o Ministério Público, concluindo: a) do próprio texto da decisão recorrida resulta uma contradição insanável de fundamentação, uma vez que nela se afirmam factos logicamente inconciliáveis.
b) tal contradição consubstancia o vício previsto no art. 410º nº 2, al. b) do CPP.
c) e, tratando-se de uma contradição substancial, envolvendo matéria de facto dada como provada e não provada, a reparação daquele vício só poderá ser feita com a anulação da decisão recorrida e a repetição do julgamento.
d) pelo que, o acórdão recorrido deverá ser anulado, ordenando-se a repetição do julgamento; e) mas, se por hipótese se entender que o vício supra referido não se verifica, então teria que se concluir que na decisão em causa ressalta um erro notório na apreciação da prova; f) tal erro decorre do próprio texto do acórdão, apreciado á luz das regras da experiência comum, e é um erro manifesto; g) este erro consubstancia o vício previsto no artigo 410º nº 2, c) do CPP.
h) e, não sendo possível a sua correcção, implica a anulação do acórdão e a repetição do julgamento; i) pelo que, também por este motivo, o acórdão recorrido deverá ser anulado, ordenando-se a repetição do julgamento.
e- Não houve resposta à motivação f- Nesta Relação, o Exmo Procurador-Geral Adjunto acompanha a posição do Ministério Público na 1ª instância.
g- Cumpriu-se o disposto no artigo 417º nº 2 do CPP, sem que fosse aduzida resposta.
h- Foi o processo a vistos dos Exmos Addjuntos, após o que o Exmo Presidente designou a audiência que veio a realizar-se na forma legal.
i- Consta da decisão recorrida: "Fundamentação Factos provados Discutida a causa, mostram-se provados os seguintes factos: 1. No dia 6 de Julho de 2002, a hora não concretamente apurada, mas entre as 5.00 horas e as 5,37 horas, o arguido circulava ao volante da viatura de aluguer ligeira de passageiros da marca e modelo …, de matrícula …, pela Estrada Nacional … no sentido …; 2. O arguido, naquela data era titular da carta de condução (categoria B) nº …, emitida em 28 de Setembro de 2001; 3. No mesmo sentido de marcha e ao volante do ciclomotor … circulava J; 4. No dia, hora e Estrada Nacional acima referidos, ao km 115,7, na área desta comarca, ocorreu um acidente de viação em que foram intervenientes os veículos e pessoas acima identificados; 5. O local do acidente caracteriza-se por uma recta extensa e de boa visibilidade, sendo que na altura do acidente havia boas condições atmosféricas, claridade decorrente do início do crepúsculo matutino e iluminação artificial; 6. O veículo conduzido pelo arguido embateu com a parte da frente do lado esquerdo na traseira do ciclomotor conduzido por J; 7. Após o embate, que ocorreu na metade direita da faixa de rodagem, atento o sentido de trânsito de ambos os veículos, a cerca de 80 cm da linha delimitadora da berma do lado direito da estrada (igualmente tendo em conta o sentido de marcha de ambos os condutores); 8. Após o embate, o veículo conduzido pelo arguido arrastou o ciclomotor, projectando-o para a berma do lado direito, atento o sentido de marcha a que seguiam, onde ficou parada, a cerca de 93,50 metros do local do embate; 9. O corpo do condutor do ciclomotor ficou parado do lado esquerdo da via, a cerca de 80 metros do local do embate; 10. Antes de cair para o local referido no número anterior, o corpo de J embateu no para brisas dianteiro do veículo conduzido pelo arguido e no tejadilho do mesmo automóvel; 11. Após a colisão, o arguido prosseguiu a sua marcha, deixando J no local acima referido da via sem assistência; 12. Posteriormente, o arguido dirigiu-se à …, sita em … e onde tinha alugado o carro que conduzia e com o qual embateu, a fim de devolver o veículo; 13. Ambas as viaturas envolvidas no acidente sofreram danos, sendo que o veículo com a matrícula … apresenta danos sobre o seu lado direito, "capot", para brisas dianteiro (que ficou partido) e tejadilho; 14. Em consequência directa e necessária do embate, resultaram para J traumatismo raquimedular e craniano, lesões que foram causa directa e necessária da sua morte, que foi certificada pelo CODU; 15. O arguido, após ter embatido no ciclomotor que circulava à sua frente, apercebeu-se de que havia uma vítima; 16. Contudo, o arguido prosseguiu a sua marcha, não prestando qualquer assistência à referida vítima; 17. Relativamente aos factos supra descritos, o arguido actuou livre, deliberada e conscientemente; 18. O arguido é natural do …, onde, até aos 8 anos de idade, residiu com os seus pais e 3 irmãos; 19. Aos 8 anos de idade vem, com a mãe e irmãos, morar para casa dos avós maternos, vindo o pai do arguido a integrar o novo agregado mais tarde; 20. Iniciou a escolaridade com a idade adequada, tendo completado o 6º ano de escolaridade com 12 anos de idade; 21. Nesta altura o arguido assistiu à desagregação familiar decorrente da separação dos seus progenitores, ficando o arguido, mãe e irmãos a residir em casa dos avós maternos; 22. O arguido ingressou no mercado de trabalho, inicialmente como empregado de balcão e, posteriormente, como vigilante em duas empresas de segurança; 23. Após trabalhou durante 6 meses como ajudante de electricista e igual período no transporte de electrodomésticos; 24. Teve que frequentar novo curso para ficar habilitado a conduzir, já que a carta de condução de que era titular foi-lhe retirada na sequência de infracções estradais que cometeu; 25. Por sentença proferida no dia 9 de Julho de 1999, no âmbito do processo especial sumário nº … do 2º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de …, foi o arguido condenado pela prática, em 3 de Julho de 1999, de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 100 dias de multa; 26. Por sentença proferida no dia 9 de Fevereiro de 2000, no âmbito do processo comum singular nº … do 2º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de …, foi o arguido condenado pela prática, em 10 de Setembro de 1999, de um crime de condução sem habilitação legal, numa pena de multa que, cumulada juridicamente com a pena que lhe tinha sido anteriormente aplicada...
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