Acórdão nº 0721017 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 10 de Abril de 2007

Magistrado ResponsávelCÂNDIDO LEMOS
Data da Resolução10 de Abril de 2007
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

ACORDAM NA SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO: No ..º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Vila do Conde o Ministério Público veio requerer providência cautelar não especificada contra B………., com sede em ………., da comarca e outros, incluindo incertos, pedindo que sem audiência prévia dos requeridos, seja ordenado que estes se abstenham de realizar as corridas de lebres vivas com galgos previstas para o próximo dia 19 de Março de 2006 ou em qualquer outra data de 2006 em ………. ou noutro sítio da comarca de Vila do Conde; e a sua condenação no pagamento de uma multa pecuniária destinada ao Estado Português, a título de sanção pecuniária compulsória, no caso de incumprimento, quantia nunca inferior a €25.000,00.

Dispensado o cumprimento do contraditório e ouvidas as três testemunhas apresentadas, todos elementos da GNR, foi proferido despacho que deferiu a providência nos termos requeridos, assim determinando: 1) que os requeridos certos e incertos se abstenham de realizar as corridas de lebres vivas com galgos, previstas para o dia 19 de Março de 2006, ou em qualquer outra data de 2006,por antecipação ou adiamento daquela, em ………. ou noutro sítio da área da comarca de Vila do Conde; 2) Sem prejuízo da responsabilidade criminal que ao caso couber, condena-se desde já os requeridos certos e incertos no pagamento de uma quantia pecuniária compulsória, que se fixa em €25.000,00 por cada infracção ao ordenado em 1), destinada ao Estado Português.

Faz-se notar que a providência foi requerida em 9 de Março de 2006, sendo decretada em 14 de Março de 2006.

Inconformada a requerida B………. vem em 28 de Março de 2006 interpor este recurso de AGRAVO, o qual apenas a 7 de Novembro de 2006 vem a ser recebido em 1.ª instância, para subir imediatamente, em separado e com efeito meramente devolutivo. Nas alegações são formuladas as seguintes conclusões: 1.ª- Pelas razões expostas supra, sob o n.º 1 e que aqui se renovam, ao Ministério falece capacidade para intentar a presente demanda, nomeadamente, estar vedado, em sede da defesa de um pretenso interesse difuso, que em concreto se não verifica, determinar qual em concreto a norma legal a que deve subordinar a sua actuação, se na defesa do interesse difuso de protecção do direito dos caçadores ao exercício da caça, se na defesa dos pretensos direitos dos animais; 2ª- Os direitos dos animais, assim ditos, não são normas de atribuição de direitos a coisas, como o são os animais, mas sim a imposição de deveres de conduta, não tendo uma dimensão de defesa constitucional ou de direito próprio dos animais e como normas de conduta, não se sobrepõem às demais normas de direito, não sendo possível estabelecer a sua hierarquização ou subordinação aos referidos direitos dos animais; 3ª- As corridas de lebres, são uma actividade mais do que centenária no nosso país, tributárias de uma longa tradição rural, e com cultores, clubes, criadores, associações, regendo-se por normas, regras, classificações, associações e federações, como verdadeira actividade desportiva que são; 4ª- Pelas razões acima enunciadas sob os nºs. III, IV e V, que aqui se reproduzem para os devidos efeitos, e nomeadamente, para a delimitação do objecto do recurso, as corridas de lebres são provas previstas na lei, no âmbito da actividade dos campos de treino de caça, devendo ser consideradas como sendo actividade de caça; 5ª- A actividade da caça, está expressamente excepcionada dos deveres de conduta impostos pela dita Lei de Defesa dos Animais, sendo causa da exclusão expressa constante da Lei n.º 92/95 (Art. 1°, n.º 3, al. f)), ou seja, a norma invocada para a declaração de ilegalidade é a mesma norma que exclui do seu âmbito de protecção a actividade em causa - a prática de caça; 6ª- Como reconhece o Ministério Público, a corrida de lebres cumpria com os requisitos legais, dado que, foi organizada em campo de treino de caça, com a utilização de lebres criadas em cativeiro, e precedida de autorização da DGRF; Indica como violados a alínea f) do n.º 3 do art. 1° da Lei n.º 92/95, e o art. 55° do DL n.º 201/2005.

Pugna pelo provimento do agravo, revogando-se o despacho que decretou a providência, concluindo-se pela legalidade da actividade da recorrente.

Contra-alega o M.º P.º em defesa do decidido, tendo o despacho sido tabelarmente mantido.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

Da instância vêm dados como provados os seguintes factos: 1- Nos últimos anos, os Requeridos têm vindo a promover e a organizar a realização de corridas de lebres vivas com cães galgos, na freguesia de ………., Vila do Conde.

2- Tais corridas são presenciadas por milhares de pessoas, mediante o pagamento de um bilhete, no valor de alguns euros, que permite aceder ao recinto do espectáculo e assistir a este.

3- Sendo que os lucros daí provenientes revertem a favor da Requerida B………. .

4- Para o local do espectáculo e para nele participarem como actores principais são transportadas algumas dezenas de cães galgos e algumas dezenas de lebres vivas, as quais são previamente adquiridas pelos Requeridos.

5- A corrida de lebres vivas com galgos, propriamente dita, que é organizada e realizada pelos Requeridos, processa-se da seguinte forma: - os requeridos soltam ou mandam soltar as lebres vivas no recinto do espectáculo, em princípio uma de cada vez; - seguidamente, largam dois ou mais cães galgos para perseguirem cada uma das lebres; - durante um determinado período de tempo, mais ou menos demorado, decorre a perseguição dos cães galgos à lebre que deles foge; - a corrida termina, regra geral, com um dos canídeos a apanhar a lebre, a mordê-la e a matá-la à dentada, com o auxílio dos restantes e perante o gáudio dos espectadores; - os galgos que se mostrem mais velozes e que consigam apanhar as lebres, competirão com outros, também eles vencedores, numa nova corrida, e assim sucessivamente, até ao apuramento dos galgos finalistas.

6- As lebres utilizadas na corrida sofrem um tratamento cruel e prolongado, quer pela angústia e pânico que vivem antes e durante a corrida, quer pelo sofrimento físico provocado pelas mordeduras e espezinhar dos galgos, ficando, por vezes, vários minutos em agonia moribunda até à morte.

7- A última dessas corridas organizada pelos Requeridos teve lugar no passado dia 13 de Março de 2005, pelas 9 horas, no campo de treino de caça nº .., da Zona de B1………., sito em ………., Vila do Conde.

8- Esse espectáculo foi organizado, não obstante a intervenção da GNR para que tal não acontecesse.

9- Com efeito, quer no dia anterior, quer no próprio dia das corridas, o Sr. Tenente de Infantaria da GNR, C………. e outros militares por ele comandados, deram conhecimento aos Requeridos de que as corridas de galgos com lebres vivas eram ilegais, pois violavam a Lei nº 92/95, de 12.09.95 (Lei de Protecção dos Animais), pelo que deveriam abster-se de a levarem a efeito.

10- Apesar dessa advertência, o espectáculo foi levado a efeito, com uma assistência entre 4 a 5 mil pessoas, tendo cada uma delas pago um bilhete no valor de 5,00 €, para verem uma largada de 35 lebres vivas para várias dezenas de cães, que esquartejaram, à mordedura, os pequenos lagomorfos.

11- A utilização das lebres vivas é completamente desnecessária, pois as corridas podem realizar-se, os galgos correr e a assistência ulular com a performance destes, mediante a utilização de lebres mecânicas.

12- Conforme já foi publicitado na imprensa local, nomeadamente no jornal "D……….", do dia 27.02.2006, encontra-se programada para o próximo dia 19.03.2006, pelas 10.00 horas, no Campo de Treino de Caça, da Zona de B1………., em ………., Vila do Conde, a " 9ª Grande Corrida de Lebres", organizada...

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