Acórdão nº 0730688 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 08 de Março de 2007

Magistrado ResponsávelTELES DE MENEZES
Data da Resolução08 de Março de 2007
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I.

B………. intentou a presente acção declarativa comum na forma ordinária contra C………., S.A. e D………., Ldª, pedindo que se declare resolvido o contrato de locação financeira que celebrou com a 1ª demandada e que, por via disso, sejam as rés condenadas a restituir-lhe todas as importâncias que pagou em função do aludido contrato. Mais pede a condenação solidária das rés a pagar-lhe a indemnização de € 3.750,00, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação, a título de danos não patrimoniais, bem como nos danos patrimoniais que vierem a ser liquidados em execução de sentença.

Alegou que, no dia 22 de Julho de 2003, celebrou com a 1.ª Ré um contrato de locação financeira tendo por objecto mediato o veículo ligeiro de passageiros, da marca Mercedes Benz, modelo ………., com a matrícula ..-..-VG, veículo este que foi fornecido pela 2.ª Ré, que o vendeu à 1ª.

O veículo foi-lhe entregue no dia 24 de Julho de 2003, passando a partir de então a circular com ele diariamente, até que no dia 28 desse mês, tendo aberto a capota, a mesma não fechou, o que motivou que se tivesse de deslocar às oficinas da 2.ª Ré, onde o técnico de serviço repôs provisoriamente o funcionamento da capota.

No dia 30 de Julho de 2003, quando conduzia a viatura com destino a Vila Nova de Gaia, a caixa de velocidades deixou subitamente de funcionar, sendo que a 1ª e a 2ª velocidades não engrenavam e o veículo só avançava em 3ª velocidade.

Mais tarde, ao tentar pôr o veículo em marcha, de modo a sair do estacionamento, engrenou a marcha-atrás e, ao acelerar, aquele seguiu em frente.

Em face das apontadas anomalias deixou de estar interessada no carro, já que as mesmas impossibilitam a sua utilização, tendo dado conhecimento dessa intenção às demandadas, tanto mais que a caixa de velocidades mantém o mesmo tipo de anomalias, pelo menos no que respeita à engrenagem da marcha-atrás.

Em consequência do relatado viveu momentos de ansiedade e desespero, bem como passou por incomodidades e contratempos, sendo certo que por via da descrita situação perdeu a oportunidade de vender o seu velho automóvel a melhor preço.

A Ré D………., Ldª apresentou contestação na qual alega que todas as avarias verificadas no veículo foram devidamente reparadas, não estando este impossibilitado de ser normalmente utilizado.

A Ré C………., S.A. contestou alegando não ter quaisquer responsabilidades nos defeitos ou não conformidades do bem locado, inexistindo, por isso, fundamento para ser decretada a resolução do contrato de locação financeira que celebrou com a demandante.

II.

Proferiu-se despacho saneador em termos tabelares, fixou-se a matéria de facto assente e organizou-se a base instrutória.

Procedeu-se ao julgamento e veio a ser proferida sentença que julgou a acção improcedente, absolvendo as Rés do pedido.

III.

Recorreu a A., concluindo como segue a sua alegação: 1. (…).

  1. A apelante estriba o seu pedido em anomalias verificadas na viatura locada, as quais configuram um caso de venda e locação defeituosas, abrangido pelo regime jurídico de protecção do consumidor, aprovado, entre outros, pela Lei n.º 24/96, de 31.7, e pelo DL 67/2003, de 8.4, que transpôs para o ordenamento jurídico interno a Directiva Comunitária n.º 1994/44/CE. 3. O Tribunal considerou provado, em sede de decisão de facto, que as anomalias foram reparadas, que o veículo não as mantém, que não impossibilitam a sua utilização e não põem em risco a segurança da apelante e de terceiros, e que a apelante pode utilizá-lo, para além de considerar que esta não logrou provar a ocorrência de danos patrimoniais e não patrimoniais ressarcíveis.

  2. Em sede de decisão de direito, o Tribunal, no pressuposto de que a relação de compra e venda foi estabelecida entre as Ré e não com a apelante, que no caso é apenas locadora, excluiu a aplicação do regime jurídico invocado na p.i., defendendo a aplicação do art. 913.º e ss. do CC, o qual, atenta a prova referida na conclusão 3, nomeadamente a reparação da viatura, afastaria o pretendido direito de resolução do contrato e, consequentemente, o direito à indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais.

  3. (…).

  4. Residem nas respostas negativas aos quesitos 7.º, 8.º, 14.º, 15.º, 16.º, 17.º, 18.º, 21.º, 22.º e 24.º, os pontos concretos da matéria de facto que a apelante considera incorrectamente julgados.

  5. Com base na contestação feita na contestação oferecida pela Ré D………., Ldª e nos depoimentos das testemunhas por esta arroladas, E………. e F………., o Tribunal deveria responder afirmativamente aos factos dos quesitos 7.º e 8.º.

  6. Ao contrário do que lhe competia, a Ré D………., Ldª não logrou identificar e provar a origem dos defeitos, factor de primordial importância em sede de responsabilidade pela venda de coisa defeituosa.

  7. Tendo em conta o relatório pericial e os esclarecimentos prestados pelos peritos, bem como os depoimentos contraditórios das testemunhas arroladas pela Ré D………., Ldª, E………, F………. e G………., o Tribunal deveria dar como não provados o quesito 14.º e como provados os quesitos 15.º, 16.º, 17.º e 18.º.

  8. Com suporte, designadamente, nos depoimentos prestados pelas testemunhas da apelante H………., I………. e J………., o Tribunal deveria responder afirmativamente aos quesitos 21.º, 22.º e 24.º.

  9. O regime jurídico da protecção ao consumidor, aprovado, entre outros, pela Lei n.º 24/96, de 31.7 (art. 2.º/1), e pelo DL n.º 67/2003, de 8.4 (art. 1.º/2), que transpôs para o ordenamento jurídico interno a Directiva Comunitária n.º 1994/44/CE, é aplicável ao caso sub judice.

  10. Por força do disposto, pelo menos, nos art.s 2.º-d) e 4.º do citado DL, a apelante tem o direito de resolver o contrato de locação financeira do veículo ..-..-VG, celebrado em 22.7.2003 com a Ré C………., S.A..

    Pede a revogação da sentença, julgando-se a acção procedente e decretando-se a resolução do contrato de locação financeira e a condenação das Rés no pagamento à apelante da indemnização de € 3.750,00, a título de danos não patrimoniais e no pagamento dos danos patrimoniais que vierem a liquidar-se em execução de sentença.

    As Rés contra-alegaram, pedindo a confirmação do julgado e sucitando, ainda, a Ré D………., Ldª, como questão prévia, a nulidade cometida pela apelante com a transcrição...

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