Acórdão nº 0621589 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 06 de Março de 2007

Magistrado ResponsávelMARQUES DE CASTILHO
Data da Resolução06 de Março de 2007
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto: Relatório B………. e outros Já melhor identificados na petição inicial instauraram a presente acção contra C………. e mulher D………. e E………. e F………. e outros, pedindo a condenação dos Réus a verem declarado o direito dos autores à restituição do prédio rústico indicado na petição inicial, na medida do seu interesse, e a ser-lhes reconhecido o direito a executá-lo no património dos segundos réus, nos termos do disposto no artigo 616º do Código Civil.

Alegaram, em síntese, que são os únicos herdeiros de G………., que faleceu no dia 6 de Setembro de 1999.

À data da sua morte o falecido G………. figurava como exequente na acção executiva nº…/99, que corre termos no .º juízo deste Tribunal, em que é executado o primeiro réu marido.

Após a habilitação de herdeiros efectuada naquela execução, os ora autores nomearam à penhora um prédio rústico, um prédio urbano e uma quota que o executado é detentor na sociedade H………., Ldª.

Efectuada a penhora, quanto ao prédio rústico foi lavrado registo provisório, em virtude de existir inscrição de aquisição a favor do segundo réu marido, que o adquiriu em 18/5/99, por compra aos primeiros réus.

A venda do prédio rústico visou apenas impedir a satisfação integral do crédito dos autores.

O bem mais valioso dos primeiros réus era o prédio rústico, e o prédio urbano encontra-se penhorado noutra execução, e não são conhecidos outros bens ao executado.

O crédito dos autores está titulado por um cheque emitido em 10/5/99.

Concluem pela procedência da acção.

Citados os réus, contestou a primeira ré mulher e os segundos réus.

A primeira ré alegou desconhecer qualquer dívida do réu marido, bem como que o montante do cheque não se destinou a despesas inerentes ao governo doméstico.

Alegou ainda que o preço de venda do prédio rústico foi o justo e adequado, uma vez que está localizado em zona de reserva agrícola.

Alega ainda que o primeiro réu marido é possuidor de património suficiente para garantir o pagamento da dívida a que se arrogam os autores.

Também os segundos réus contestaram e alegaram desconhecer os factos alegados pelos autores quanto ao primeiro réu marido.

O preço de compra do prédio rústico constitui um bom negócio, e o segundo réu marido não teve consciência de que estava a lesar o património de qualquer credor.

A segunda ré mulher alegou que ignora tudo o que se passou, tendo sido informada pelo seu marido que tinha feito um bom negócio, com os primeiros réus e que comprara o prédio rústico.

Os autores replicaram mantendo, no essencial, as suas posições já manifestadas na petição inicial.

A primeira ré pronunciou-se pela inadmissibilidade da réplica.

Foi proferido despacho em que foi decidido ser inadmissível a réplica.

Foi proferido despacho saneador, sedimentada a matéria considerada assente, organizada a base instrutória após o que se procedeu à realização da audiência, tendo o tribunal respondido à matéria de facto como consta dos autos a fls. 632 tendo sido a final proferida sentença, após rectificação de lapso operado por despacho de 27/10/2005, ficando exarada nos seguinte termos: "Pelo exposto, julgo procedente a impugnação deduzida e, consequentemente, ordeno a restituição do prédio rústico, identificado no artigo 9º nº 1 da petição inicial, no artº9 nº1 da petição inicial na medida do interesse dos autores podendo o mesmo ser executado no património dos 2ºs réus, na mesma medida daquele interesse para satisfação do seu credito." Assim a folha 656, linhas 23 ficará a constar no artº9 nº1 da petição inicial na medida do interesse dos autores podendo o mesmo ser executado no património dos 2ºs réus, na mesma medida daquele interesse para satisfação do seu credito." Inconformados com o seu teor vieram os RR. tempestivamente interpor o presente recurso de Apelação tendo para o efeito nas alegações oportunamente apresentadas aduzido a seguinte matéria conclusiva que passamos a reproduzir: "

  1. AS RESPOSTAS DADAS AOS QUESITOS DA BASE INSTRUTORIA, 6 - 11 - 12 - 13 - 16 E 17 ATÉ 23, INCLUSIVÉ, DEVEM SER ALTERADAS NO SENTIDO DE "não provados".

  2. DA CONJUGAÇÃO DOS DEPOIMENTOS DAS TESTEMUNHAS ARROLADAS PELOS AA. E INQUIRIDAS EM SEDE DE AUDIÊNCIA DE DISCUSSÃO E JULGAMENTO, QUE INCIDIRAM SOBRE OS DITOS QUESITOS, OU SEJA, I………., J……….; L………. (?) M……….; N……….; O……….; P……….; Q………. E S………., RESULTA CLARO QUE O TRIBUNAL NÃO DEVIA TER DADO AS RESPOSTAS QUE DEU, POR FALTA DE SUPORTE FACTUAL, TENDO HAVIDO ASSIM UM CLARO EXCESSO DE PRONUNCIA E ERRO NA APRECIAÇÃO DA PROVA QUE TEM DE SER REDUZIDO AO SEU JUSTO LIMITE.

  3. UMA VEZ ALTERADAS AS RESPOSTAS AOS QUESITOS SUPRA INDICADOS, NO SENTIDO DE "NÃO PROVADOS", A ACÇÃO TERÁ DE IMPROCEDER POR FALTA DE PREENCHIMENTO DOS PRESSUPOSTOS FACTUAIS INTEGRADORES DO "CONSILIUM FRAUDIS" E DA MÁ-FÉ DO Adquirente NO ACTO DA ALIENAÇÃO IMPUGNADA.

  4. CONFORME É DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA DOMINANTE, O REQUISITO DA MÁ-FÉ NA IMPUGNAÇÃO PAULIANA TEM DE VERIFICAR-SE, IN CASU, EM RELAÇÃO AOS ORA 1. RR. E 2. RR., MAXIMÉ, 2. RÉ-MULHER E ORA APELANTE.

  5. ORA, COMPULSADOS OS AUTOS, MAXIMÉ, A PETIÇÃO INICIAL, MATÉRIA ASSENTE, BASE INSTRUTORIA E RESPOSTAS AOS QUESITOS, CONSTATA-SE COM CLAREZA QUE NENHUMA PROVA SE FEZ QUANTO À EVENTUAL MÁ-FÉ DA 2ª RÉ-MULHER E ORA APELANTE, JÁ QUE A MATÉRIA CONSUBSTANCIADORA E INTEGRADORA DE TAL CONCEITO NEM SEQUER FOI ALEGADA E MUITO MENOS PROVADA.

  6. A ACÇÃO TERÁ ASSIM DE IMPROCEDER NA TOTALIDADE DADO OS AA. NÃO TEREM "provado", COMO SE LHES IMPUNHA, (ART. 612 DO C.CIVIL) A MÁ-FÉ DOS ADQUIRENTES, MAXIMÉ, DA ORA RÉ APELANTE.

  7. NÃO SE VERIFICA, IN CASU, DOLO ESPECIFICO RELEVANTE PARA EFEITOS DE IMPUGNAÇÃO PAULIANA, JÁ QUE A DESANEXAÇÃO DO PRÉDIO URBANO, SÓ POR SI, OPERADA EM 5 DE AGOSTO DE 1997, NÃO TEM O CONTEÚDO E ALCANCE QUE O TRIBUNAL a quo LHE DEU, ATENTA A DATA DO CREDITO CONCEDIDO (10 DE MAIO DE 1999).

  8. A ACÇÃO PAULIANA É SIMPLESMENTE CONSERVATÓRIA DA GARANTIA PATRIMONIAL DO CREDOR E NÃO ALTERA A SITUAÇÃO DE RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJACENTE.

  9. ORA, COMO RESULTA DOS AUTOS, A DIVIDA É DA EXCLUSIVA RESPONSABILIDADE DO 1º RÉU-MARIDO, JÁ QUE FOI SÓ ESTE QUE HONROU COM A SUA ASSINATURA O CHEQUE AJUIZADO.

  10. ASSIM E EM CASO DE PROCEDÊNCIA DA ACÇÃO, O QUE NÃO SE ACEITA MAS SE ACAUTELA, APENAS A QUOTA PARTE/MEAÇÃO DO 1º RÉU-MARIDO NO BEM IMÓVEL ALIENADO E IMPUGNADO, É SUSCEPTÍVEL DE PODER VIR A SER EXECUTADA E NÃO A SUA TOTALIDADE, POIS SÓ AQUELA CONSTITUI A GARANTIA PATRIMONIAL DO CREDOR, IN CASU, OS AA.

  11. O ORA APELANTE MARIDO APENAS CULTIVOU AGRICOLAMENTE O PRÉDIO RÚSTICO QUE ADQUIRIU DURANTE OS DOIS PRIMEIROS ANOS, TENDO DE SEGUIDA DEIXADO DE O FAZER, DADO DAR PREJUÍZO ECONÓMICO, ATENTO O PREÇO DA MÃO DE OBRA ASSALARIADA E MATERIAIS A INCORPORAR, COMO PESTICIDAS, HERBICIDAS E ADUBOS E O PREÇO DE MERCADO MUITO BAIXO DOS PRODUTOS HORTÍCOLAS E VINÍCOLAS PRODUZIDOS, O QUE ACONTECE DESDE O ANO DE 2001.

  12. O PREÇO PAGO PELO 2º RÉU-MARIDO E ORA APELANTE FOI DE OCASIÃO, POIS DE OUTRO MODO NÃO COMPRAVA O PRÉDIO, MAS ATENTO O SEU RENDIMENTO ANUAL REAL E EFECTIVO LIQUIDO, DEPOIS DE DEDUZIDAS AS DESPESAS DE MANUTENÇÃO, O MESMO É NEGATIVO E DAÍ O SEU ABANDONO PARA FINS AGRÍCOLAS.

  13. VIOLOU A DOUTA SENTENÇA RECORRIDA, POR ERRO DE SUBSUNÇÃO, O DISPOSTO NOS ARTIGOS, 712º DO C. P. CIVIL E ARTIGO 610º E 612º AMBOS DO C. CIVIL.

Termina pedindo que seja a decisão revogada e consequentemente se absolverem os RR. Apelantes do pedido e subsidiariamente e em caso de procedência da acção deve a impugnação ser declarada apenas em relação à quota parte/meação do alienante marido no bem comum objecto da impugnação, só esta podendo ser executada no património do obrigado à restituição.

Foram apresentadas contra alegações nas quais se pugna pela manutenção do decidido.

Mostram-se colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Adjuntos pelo que importa decidir.

THEMA DECIDENDUM A delimitação objectiva do recurso é feita pelas conclusões das alegações dos recorrentes, não podendo este Tribunal decidir sobre matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam do conhecimento oficioso, art. 684 nº3 e 690 nº1 e 3 do Código Processo Civil, como serão todas as outras disposições legais infra citadas de que se não faça menção especial.

DOS FACTOS E DO DIREITO Para melhor facilidade expositiva e de compreensão do objecto do presente recurso passamos a reproduzir a factualidade considerada assente e provada sobre a qual se estruturou a decisão proferida que foi impugnada no recurso nos pontos que se encontram assinalados a sublinhado e carregado nosso e que é do seguinte teor:[1] Os RR vêm nas suas alegações recursivas impugnar a factualidade considerada assente e provada pelo Tribunal a quo nos pontos supra indicados considerando que dos depoimentos registados das testemunhas dos AA. I………., J……….; M……….; N……….; O……….; P……….; Q………. E S………. que incidiram sobre tal factualidade ou seja não pode concluir-se com a amplitude com que o fez a Mmª Juiz.

Importa além do mais dizer o seguinte sobre tal questão de sindicabilidade da prova por este Tribunal e que já por diversas vezes temos afirmado em diversos Acórdãos de que somos Relator e neste acto reiteramos passando a reproduzir: "O julgamento da matéria de facto constitui o principal objectivo do processo civil, sendo a responsabilidade do julgador, no que concerne a tal decisão, directamente proporcional à relevância da correspondente afirmação para cada um dos litigantes.

Como doutrina o ilustre Prof. Antunes Varela [2] "… são tão graves os danos irremovíveis de uma sentença injusta e tão contingentes as possibilidades de correcção dos erros cometidos, que todo o juiz seja qual for a natureza ou o valor da acção, há-de decidir, para ficar quite com a sua consciência, não com o ânimo de quem, por escassez de tempo ou por acumulação de serviço, tem de confiar no carro vassoura do tribunal superior a emenda do erro que eventualmente tenha praticado, mas com a convicção de quem pode estar enviando por sua mão, para a secretaria judicial o instrumento da última palavra da justiça...

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