Acórdão nº 0636972 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 01 de Março de 2007

Magistrado ResponsávelJOSÉ FERRAZ
Data da Resolução01 de Março de 2007
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação do Porto 1 - B………………, residente na Rua ……….., …., Porto, instaurou acção declarativa ordinária contra C………………, residente na Praça ………, …., ……., Porto, pedindo a condenação deste a abster-se de receber quaisquer rendas dos prédios identificados no artigo 1º da petição e a entregar à A. todos os contratos de arrendamento que tenham por objecto os prédios ou parte deles com identificação dos inquilinos e o saldo da retenção das rendas em seu poder, sem prejuízo de vir a prestar contas da administração que exerceu.

Como fundamento, diz que da herança deixada por D………………. e E…………., de que a autora é cabeça de casal nos inventários abertos por óbito destas, fazem parte os bens imóveis mencionados em 1º da petição, todos eles arrendados.

Desde antes do falecimento daquelas, o R. tem exercido a administração dos imóveis.

Por carta de 25 de Novembro de 2002, a A. solicitou do R. toda a documentação referente aos prédios, designadamente extractos bancários da conta em que os inquilinos têm depositado rendas, identificação dos inquilinos, contratos de arrendamento, apólices de seguro, recibos das obras efectuadas, dinheiro das retenções das rendas que vem sendo efectuadas e proibindo-o de receber as rendas.

Não obstante essa comunicação, o R. não só continuou a receber rendas como comunicou que em Tribunal apresentaria todas as informações.

Na sua contestação, o R. diz que alguns dos bens mencionados pela A. não integram as aludidas heranças e que só após a morte da D…………., por acordo de todos os interessados, passou a administrar todos os imóveis que integravam a herança, o que sempre tem feito até ao recebimento da carta remetida pela autora, em Novembro de 2002.

Impugna a factualidade alegada pela autora.

Pede a improcedência da acção e a sua absolvição do pedido.

A autora respondeu, mantendo o alegado e o conclusivo da petição.

Proferido despacho saneador, foi seleccionada a matéria de facto, com reclamação da autora desatendida.

Realizou-se oportunamente a audiência de discussão e julgamento, no decurso da qual, foi ampliada a base instrutória (fls. 194).

Decidida a matéria de facto provada e não provada, e após alegações das partes, foi proferida sentença que, julgando a acção procedente, condenou o Réu "a abster-se a receber quaisquer rendas dos prédios identificados no item 2 dos factos provados e entregar à Autora todos os contratos de arrendamento que tenham por objecto os prédios ou parte deles com identificação dos inquilinos e o saldo da retenção das rendas em seu poder".

A autora requereu a rectificação da sentença no que respeita à identificação do bem mencionado em d) do nº 2 dos factos provados e bem assim esclarecimento da sentença que omite referência aos bens mencionados em 7 e 8 do artigo 2º da petição.

Por entender esgotado o poder jurisdicional do juiz e não se verificar obscuridade ou ambiguidade a demandar esclarecimento, o réu requer o indeferimento da pretensão da autora.

Pronunciando-se, a Sra Juiz ordena a rectificação requerida, afirma a inexistência de ambiguidade e termina "da leitura da decisão proferida é, assim, manifesto que a condenação proferida deve ser entendida como condenando o Réu a abster-se de receber quaisquer rendas dos prédios relacionado no processo de inventário instaurado por óbito de D…………….., alguns dos quais foram identificados no item 2 dos factos provados, e a entregar à Autora todos os contratos de arrendamento que tenham por objecto os prédios ou parte deles com identificação dos inquilinos e o saldo da retenção das rendas em seu poder. Esta interpretação emerge facilmente da leitura da decisão, pelo que, entendo que esta não enferma de qualquer obscuridade ou ambiguidade".

2 - Inconformado com a sentença, apela o Réu que, alegando, conclui: I - A execução da sentença recorrida, face ao seu teor, causa prejuízo considerável ao recorrente, na medida em que, assim, ficara impedido de receber rendas de imóvel e de partes de imóveis que lhe pertencem por direito próprio, pois a sua condenação abrange as rendas desses prédios, um dos quais lhe foi legado na totalidade, como a própria recorrida reconhece no artº 3° da petição inicial; assim sendo, e porque o recorrente se propôs prestar caução, estão reunidos os requisitos legais para ser atribuído ao presente recurso o efeito suspensivo - cfr. artº 703°, n° 2, do CPC.

II - Face ao disposto no artº 666°, n° 1, do CPC, proferida a sentença, fica imediatamente esgotado o poder jurisdicional do Juiz, cuja actividade a partir desse momento se limita a resolução de questões marginais (por exemplo, rectificação de erros materiais, de escrito ou de cálculo), acessórias ou secundárias, III - pelo que ao M° Juiz a quo estava vedado proferir, sobre o pedido de esclarecimento da sentença feito pela recorrida, um despacho interpretativo, extrapolando o que foi peticionado, despacho esse que, por isso, é nulo, o que deve ser declarado, com as legais consequências, IV - não devendo, por conseguinte, considerar-se que a sentença recorrida abrange todos os prédios relacionados no inventário de D………………., uma vez que no item 2. dos factos provados não se mencionam os imóveis identificados nos pontos 7. e 8., do artº 2° da petição inicial. E não menciona porque, como se vê dos factos constantes dos itens 5. e 6. dos factos provados (base instrutória) quem recebia as rendas desses imóveis era um irmão das partes e a própria recorrida, VI - O pedido formulado pela autora, conjugado com o por ela alegado na petição inicial (cfr. seu artº 3°) exclui o imóvel legado, por pertencer totalmente ao recorrente, sendo certo que os poderes do cabeçalato não abrangem os bens legados; ao condenar o recorrente a abster-se de receber rendas desse imóvel - claramente objecto diferente do peticionado - a sentença recorrida proferiu condenação em objecto diverso do pedido, o que gera a sua nulidade, face ao disposto na última parte, do n° 1, do artº 668°, do CPC.

VII - Dos elementos de prova juntos aos autos, designadamente documentais, resulta que o recorrente é dono da totalidade do imóvel identificado na alínea f), do item 2., dos factos provados, pelo que, nos termos do disposto na alínea a), do n° 1, e n° 4, do are 712°, do CPC, a decisão da matéria de facto proferida pelo Tribunal a quo deve ser alterada no sentido de essa alínea f), do item 2., dos factos provados, deles ser eliminada, com as legais consequências.

VIII - Sem prescindir: a questão nuclear da questão de fundo deste recurso consiste em saber se o cabeçalato instituído por acordo de todos os interessados ao abrigo do disposto no are 2084°, do Código Civil, pode cessar por acto unilateral e arbitrário de um deles ou pela sua nomeação judicial em processo de inventário.

Porque as normas que regem a escolha e nomeação do cabeça de casal não tem carácter imperativo - estamos no domínio do direitos disponíveis -; assim, a destituição desse cargo não pode emergir ou resultar de um acto unilateral e arbitrário de um interessado, mas só se houver fundamento legal para tanto, designadamente justa causa, a sindicar através de adequado procedimento judicial. O mesmo se...

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