Acórdão nº 0615384 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 17 de Janeiro de 2007

Magistrado ResponsávelMARIA DO CARMO SILVA DIAS
Data da Resolução17 de Janeiro de 2007
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam, em conferência, os Juízes do Tribunal da Relação do Porto:*I- RELATÓRIO 1. No processo nº …/03.0TAOAZ, em 27/6/2005, os lesados B………. e C……… apresentaram requerimento (fls. 49 a 52), solicitando, nos termos do art. 427 nº 2 do CPP, a prestação pelos arguidos de caução económica de montante não inferior a € 1.404.566,38 (que teriam sido apurados na acusação), acrescidos de € 281.826,00, caução essa a prestar por depósito ou por garantia bancária, irrevogável e paga à primeira solicitação.

  1. Na sequência de tal requerimento, a Srª. Juiz de Instrução Criminal, proferiu a decisão que consta de fls. 43 a 48, na qual decidiu "ordenar a prestação pelos arguidos D………. e E………., no prazo de 20 dias, de uma caução, através de depósito ou garantia bancária irrevogável, no montante de € 1.516.931,69. (…)".

    No início dessa decisão, consta o seguinte: "Vieram B………. e C………. requerer a fixação de uma caução económica em valor nunca inferior a € 1.404.566,38, acrescidos de € 281.826,00.

    Considerando a matéria já apurada nos autos e o conjunto de actividades que indiciariamente se imputam, aos arguidos, como o sejam a facilidade de movimentação de quantias para contas em off shore, entendo que no caso presente não se mostra conveniente a audição prévia dos arguidos (art. 194 nº 2 do Código de Processo Penal), a qual poderia além do mais despoletar a actuação que se visa obstaculizar com o requerimento efectuado; sendo certo que estes sempre poderão oportunamente deduzir a oposição que lhes aprouver, não se cerceando, assim, quaisquer dos seus direitos de defesa, sendo esta uma das excepções que a lei consagra ao previsto nas al. b) do art. 61 do Código de Processo Penal.

    Assim sendo, não se ordenará neste momento a audição destes. (…)".

  2. Notificado do teor da decisão supra referida, o arguido D………., por requerimento que consta de fls. 39 a 42 (correspondente a fls. 415 a 416 dos autos principais), além do mais, invocou, como questão prévia, que a sua não audição antes de ter sido decretada a caução económica, violava o princípio do contraditório, integrando nulidade insanável, prevista no artigo art. 119-c) do CPP, a qual expressamente arguiu.

  3. Na sequência de tal requerimento, a Srª. Juiz proferiu o seguinte despacho: "fls. 415.

    Da alegada nulidade no decretamento da providência.

    Veio o Requerido suscitar a questão da nulidade da caução económica, p. no art. 227º do CPP.

    O Ministério Público nada alegou.

    Os Requerentes pronunciaram-se nos termos que antecedem.

    Vejamos.

    O Requerente estriba a sua pretensão na sua não audição prévia ao despacho que ordenou aquele mecanismo.

    Antes de mais, cumpre dizer que a caução económica não deverá ser confundida com a caução a que alude o art. 197º do CPP. Pois se uma reveste a natureza de medida de coacção, a outra reveste a natureza de garantia patrimonial, com vista a assegurar as finalidades expressas no art. 227, nº 2, do CPP.

    Dando de barato a questão de saber se o arresto preventivo é, ou não, subsidiário daquela, com os inerentes reflexos de admissibilidade, ou inadmissibilidade, da presente providência, a verdade é que a mesma mostra-se ordenada, e assim mostra-se despiciendo discorrer sobre tal temática.

    Importa saber se a falta de audição do Alvo da pretensão despoleta a nulidade sufragada pelo Requerente de fls. 415.

    Sobre tal questão, a título exemplificativo, já foram proferidos os seguintes arestos: * Ac. da Rel. Porto, de 20/11/1996, in www.dgsi.pt * Ac. da Rel. Porto, de 26/2/2003, in www.dgsi.pt * Ac. da Rel. Porto, de 27/11/2002, in www.dgsi.pt * Ac. da Rel. Porto, de 10/02/1999, in www.dgsi.pt * Ac. da Rel. Porto, de 27/05/1998, in www.dgsi.pt * Ac. da Rel. Porto, de 19/07/1999, in www.dgsi.pt, e * Ac. da Rel. Porto, de 07/07/1998, in www.dgsi.pt.

    No despacho de fls. 13 sufragou-se o porquê da não audição dos Requeridos em momento prévio ao despacho que ordenou a providência, aí foram indicados os motivos de facto que justificaram tal tomada de posição. Posição essa que encontra acolhimento legal no Livro IV, Título I, do Código Processo Penal, mormente onde se prevêem as disposições gerais na aplicação das medidas de coacção e de garantia patrimonial. De facto, nos termos do artigo 194º, nº 2, de tal corpo de leis, diz-se que "a aplicação referida no número anterior é precedida, sempre que possível e conveniente, de audição do arguido e pode ter lugar no acto do primeiro interrogatório judicial".

    Ora, o que se pretendia com a providência acima mencionada era evitar que o Arguido/Requerido dissipasse os seus bens, o que seria mais facilitado se se procedesse à sua audição prévia.

    Nessa medida, entendeu-se não ser conveniente ouvir o Arguido, o que se mantém.

    Mas, a própria lei civil, para a qual o artigo 228º do CPP remete, refere no artigo 408º do CPC que o arresto é decretado sem audiência da parte contrária. E nessa medida também ali se sustenta a tramitação legal dos presentes autos.

    Pelo exposto, entende-se que inexiste qualquer nulidade patente no artigo 119º, al. c) do CPP, e assim julga-se improcedente a questão prévia suscitada a fls. 415." 5. Inconformado com essa decisão judicial, o arguido D………. dela interpôs recurso (fls. 1 a 3), formulando as seguintes conclusões: 1. O disposto nos n°s 1 e 2 do art. 194° CPP não têm aplicabilidade no que se refere à garantia patrimonial do pagamento da indemnização ao lesado.

  4. O princípio do contraditório é um princípio processual geral que deve ser igualmente observado nos casos a que se reporta o disposto no art. 227°, n° 2 do CPP 3. Dispõe o art. 61°, n° 1, als. a) e b) do CPP que o arguido goza, em especial, em qualquer fase do processo, dos direitos de estar presente aos actos processuais que directamente lhe digam respeito e de ser ouvido pelo Tribunal e pelo Juiz de instrução sempre que eles devam tomar qualquer decisão que pessoalmente o afecte.

  5. A decisão que impõe ao arguido a prestação de uma garantia patrimonial do pagamento de uma indemnização ao lesado é um acto processual que afecta directamente o arguido.

  6. O arguido tem de ser notificado para estar presente na diligência onde deva ser decidida a prestação de caução económica e ouvido a fim de se pronunciar sobre o objecto da diligência.

  7. O disposto no art. 228° CPP, em consequência do disposto no art. 227° CPP, só faz sentido, atento o constante da conclusão anterior.

  8. Constitui nulidade insanável, que deve ser declarada em qualquer fase ao processo, a ausência do arguido ou do seu defensor nos casos em que a lei exigir a respectiva comparência.

  9. Dispõe o art. 122° n° 1 do CPP que as nulidades tornam inválido o acto em que se verilicarem, bem como todos os que dele dependerem e aqueles que puderem afectar.

  10. Nestes termos, que são os defendidos, entre outros, nos Acórdão do...

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