Acórdão nº 0447362 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 06 de Dezembro de 2006

Magistrado ResponsávelERNESTO NASCIMENTO
Data da Resolução06 de Dezembro de 2006
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam, em conferência, na 2ª secção criminal do Tribunal da Relação do Porto I. Relatório I. 1. No …º Juízo do Tribunal Judicial da comarca de S. João da Madeira, na sequência da acusação particular deduzida pelo assistente B…….. contra os arguidos C................ e D................, por factos susceptíveis de integrar, em relação ao primeiro, em autoria material, na forma consumada, o tipo legal de crime de difamação, p. e p. pelos artigos 180º/1 e 183º/2 C Penal, com referência ao artigo 30º da Lei de Imprensa e em relação ao segundo, em comparticipação, o mesmo crime de difamação, com referência aos artigos 30º e 31º/3 da Lei de Imprensa e de um despacho de arquivamento, por parte do MP, quanto à denúncia do assistente de factos alegadamente integradores, por parte dos mesmos arguidos, em co-autoria, ou por algum deles, de um crime de usurpação, p. e p. pelo art. 195°/1 do Código de Direitos de Autor e Direitos Conexos, e ainda, e um crime de utilização ilícita de fotografia, p. e p. pelo art. 199°/2 alínea b) C Penal, finda a Instrução, requerida pelo assistente e pelos ditos arguidos, inconformado aquele, com o despacho de arquivamento, pugnando por que os arguidos cometeram o crime de usurpação, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 195º/1 e 197º/ 1, por referência aos artigos 9º, 67º/1 e 68º/1 e 2 alínea i) e 3 do CDADC e inconformados estes, com a acusação particular, defendendo, que a final deveria ser proferido despacho de não pronúncia e os autos arquivados, foi proferido o seguinte despacho: questões prévias: relativamente aos documentos juntos pelo arguido C……….. tendo em conta que consistem apenas em cópia de artigos publicados em revista sobre "insultos políticos", sem qualquer relação directa com os arguidos, assistente, e matérias em causa nestes autos, não admito a junção, e determino que ficando cópia no seu lugar, sejam devolvidos ao apresentante.

No início do debate veio o Assistente arguir a nulidade prevista na alínea b) do artigo artigo 119° do Código de Processo Penal, por o Ministério Público não ter tomado posição sobre a acusação particular, nos termos dos artigos 219°/1 da Constituição da República Portuguesa, 285°/3 e 48° do Código de Processo Penal.

Pelos arguidos foi dito nada terem a dizer quanto à nulidade arguida pelo assistente.

A seguir veio o arguido C................ arguir a nulidade prevista no artigo 120°/2 alínea d) do Código de Processo Penal, do despacho que indeferiu a solicitação da certidão do Relatório da Acção Inspectiva, por reputar tal documento como absolutamente essencial à comprovação dos factos alegados pela defesa.

Considerou o arguido D................ que a nulidade arguida pelo arguido C................ deveria ser deferida. E veio também este arguido arguir nulidade por insuficiência de instrução, nos termos do artigo 120°/2 alínea d), por não ter sido deferida a inquirição das quatro testemunhas por si arroladas, considerando que foram omitidas diligências essenciais para a descoberta da verdade, bem como serem os factos de instrução manifestamente insuficientes.

Pelo Assistente foi considerado quanto à nulidade arguida pela defesa de C................ que tendo em conta os documentos juntos ao processo, tendo em conta tratar-se de matéria objecto de artigos jornalísticos de teor bastante objectivo e as finalidades do debate consignadas no artigo 298º do Código de Processo Penal, serem os indícios suficientes e não ver obstáculo à pronúncia da decisão instrutória. Nada mais tendo a dizer.

Dada a palavra ao Ministério Público, considerou a Digníssima Magistrada que a nulidade a que se refere o artigo 119° b) do Código de Processo Penal respeita à falta de promoção do Ministério Público, tendo em conta a diferente natureza dos crimes em questão pois refere-se ao artigo 48°, com as restrições dos artigos 49° e 52° do CPP. Assim, tratando-se de crimes de natureza particular a faculdade a que se refere o artigo 285°/3 do Código de Processo Penal não é condição de procedibilidade ou pressupostos processual para o exercício da acção penal. Concluindo não se verificar a nulidade invocada.

Referiu ainda aderir à posição assumida pelo assistente, quanto à nulidade invocada pelo arguido C................ e quanto à nulidade invocada pelo arguido D................, considerar que a mesma existe aderindo agora aos fundamentos de fls. 321.

Cumpre apreciar e decidir.

I) Nulidade arguida pelo Assistente.

Considera o Assistente que o facto do Ministério Público não ter tomado posição sobre a acusação particular configura a nulidade prevista na alínea d) do artigo 119° do CPP.

Os arguidos nada tiveram a dizer e pronunciou-se o Ministério Público no sentido de não se verificar a referida nulidade por estar em causa crimes de natureza particular.

Resulta dos autos o seguinte: em 30.04.04, deduziu o Ministério Público douto despacho de arquivamento relativamente aos crimes de usurpação, p. e p. pelo artigo 195°/1 do Código de Direitos de Autos e Direitos Conexos (CDADC), de utilização ilícita de fotografia, previsto e punido pelo artigo 199°/2 alínea b) do Código Penal e determinou a notificação do Assistente para em dez dias deduzir acusação particular; em 18.5.2004, veio o Assistente deduzir acusação particular contra os arguidos pela prática dos crimes de difamação pp. e pp. pelos artigos 180º/1 e 183°/2 do Código Penal com referência aos artigos 30° e 31°/3 da Lei de Imprensa (Lei 2/99, de 13 de Janeiro); no despacho seguinte determinou o Ministério Público o cumprimento do disposto no artigo 283°/5 do Código de Processo Penal e no despacho de fls. 251, determinou a remessa dos autos à distribuição; não deduziu acusação por estes crimes, não declarou acompanhar a acusação particular, nem se pronunciou sobre a mesma.

Nos termos da alínea b) do artigo 119° do CPP, constitui nulidade insanável, que deve ser oficiosamente declaradas em qualquer fase do procedimento, a falta de promoção do processo pelo Ministério Público, nos termos do artigo 48°, bem como a sua ausência a actos relativamente aos quais a lei exigir a respectiva comparência.

Refere-se no artigo 285º, o seguinte: 1- Findo o inquérito, quando o procedimento depender de acusação particular, o Ministério Público notifica o assistente para que este deduza em l0 dias, querendo, acusação particular.

2- É correspondentemente aplicável à acusação particular o disposto no artigo 283°/3 3- O Ministério Público pode, nos cinco dias posteriores à apresentação da acusação particular, acusar pelos mesmos factos, por parte deles ou por outros que não importem uma alteração substancial daqueles.

Por outro lado, prescreve-se no artigo 50° nos 1 e 2 o seguinte: 1 - Quando o procedimento criminal depender de acusação particular, do ofendido ou de pessoas, é necessário que essas pessoas se queixem, se constituam assistentes e deduzam acusação particular.

2 - O Ministério Público procede oficiosamente a quaisquer diligências que julgar indispensáveis à descoberta da verdade e couberem na sua competência, participa em todos os actos processuais que intervier a acusação particular, acusa conjuntamente com esta e recorre autonomamente das decisões judiciais.

No artigo 48° dispõe-se ter o Ministério Público legitimidade para promover o processo penal, com as restrições constantes dos artigos 49° a 52°, e no artigo 49°/1 refere-se que quando o procedimento criminal depender de queixa do ofendido ou de outras pessoas, é necessário que essas pessoas dêem conhecimento do facto ao Ministério Público, para que este promova o processo.

Nos artigos 51° e 52° contempla-se a ocorrência de desistência e o concurso de crimes.

Do disposto nestes artigos resulta competir ao Ministério Público a legitimidade para promover o processo penal, mas também que esta legitimidade conhece as restrições decorrentes do previsto nos artigos 49° a 52°.

Assim, nos crimes semi-públicos e particulares o Ministério Público não pode promover o processo se não for deduzida queixa e nos crimes particulares é necessário a constituição de um assistente e que este deduza acusação particular.

Desta forma nos crimes particulares se o ofendido não se constituir assistente e não deduzir acusação particular, ao Ministério Público não caberá pronunciar-se sobre a existência ou não de indícios da prática destes crimes, nem poderia fazê-lo.

Nos crimes particulares e no que se refere à acusação o Ministério Público como que assume uma posição subsidiária em relação ao assistente.

Tendo este deduzido acusação particular, poderá o Ministério Público acusar e se o fizer terá de o fazer pelos mesmos factos, por parte deles ou por outros que não importem uma alteração substancial daqueles (art. 285°/3).

E não se prevê também no artigo 285° que o Ministério Público, se considerar que não existem indícios, possa formular um despacho similar ao de arquivamento. Refere-se apenas que pode acusar.

Sendo que, independentemente do facto de deduzir ou não acusação, é suficiente a acusação particular para que o processo prossiga para as fases processuais seguintes, de instrução se for requerida, ou de julgamento.

Nestes termos, "a intervenção do Ministério Público nos crimes dependentes de acusação particular assume-se como algo de subsidiária, pois está dependente das decisões processuais que o assistente tome" (Damião da Cunha, A participação do sparticulares no exercício da acção penal - Alguns aspectos, in RPCC, ano 8, fasc. 4°, Out-Dez. 998, págs. 593-660, apud Ivo Miguel Barroso, in Estudos Sobre o Objecto do Processo Penal, pág. 136).

No sentido de não se verificar esta nulidade ou sequer uma irregularidade processual, cfr. os Acórdãos da Relação de Lisboa de 19.6.98 e da Relação do Porto de 19.11.2003; em sentido contrário cfr. o Ac. da RL de 8.1.2003; no sentido de se verificar esta nulidade, mas para casos distintos relativos a crimes semi-públicos, em que os assistentes vieram deduzir acusação sem que o Ministério Público antes o tivesse feito...

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