Acórdão nº 0644904 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 22 de Novembro de 2006

Magistrado ResponsávelERNESTO NASCIMENTO
Data da Resolução22 de Novembro de 2006
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam, em conferência, na 2ª secção criminal do Tribunal da Relação do Porto I. Relatório I. 1. No ….º Juízo do Tribunal de Instrução Criminal do Porto, a culminar a fase da Instrução, requerida pelos arguidos B……….. e C…………, veio a ser proferido a seguinte decisão instrutória: "O Tribunal é competente.

O Ministério Público tem legitimidade para acusar.

Não há nulidades.

Da Prescrição do Procedimento Criminal: o Ministério Público acusa em processo comum e com a intervenção do Tribunal Singular, os arguidos sociedade comercial "D……….., Lda.", B………. e C……….., imputando-lhes a prática de factos que em seu entender integram, quanto a todos os arguidos, em co-autoria material, um crime de Abuso de Confiança Fiscal, p. e p. pelo art. 24º/1 do D.L. 20-A/90 de 15 de ]aneiro, na redacção dada pelo D.L. 394/93 de 24 de Novembro e actualmente p. e p. pelo 105º/1 do RGIT, aprovado pelo nº. 1 do art. 1º da Lei 15/2001 de 5 de Junho.

Os factos reportam-se a IVA liquidado e recebido no âmbito da actividade comercial desenvolvida pela sociedade comercial arguida e que não foi entregue nos cofres do Estado no período compreendido entre Março de 1998 e Novembro do mesmo ano, no valor global de € 5.052.85.

No seu requerimento instrutório, vieram os arguidos invocar a prescrição do procedimento criminal, entendendo que o prazo aplicável é o de 4 anos, resultante do disposto no art. 21º/3 do RGIT conjugado com o disposto no art.45º da LGT.

Assim, dado que o arguido B………. por si e qualidade de legal representante da sociedade arguida, foi constituído como arguido apenas em 11/6/2003 e a arguida C………….. foi constituída como arguida só em 9/3/2004, o referido prazo já havia decorrido.

Cumpre decidir.

De acordo com o disposto no art. 24º/1 do RJIFNA, em vigor na data da prática dos factos, comete o crime de abuso de confiança fiscal, " Quem se apropriar total ou parcialmente de prestação tributária deduzida nos termos da lei e que estava legalmente obrigado a entregar ao credor tributário (...)".

Actualmente o referido tipo de crime vem previsto no nº. 1 do art. 105º do RGIT que reza: " Quem não entregar à administração tributária, total ou parcialmente, prestação tributária deduzida nos termos da lei e que estava legalmente obrigado a entregar, é punido com pena de prisão até 3 anos ou multa até 360 dias".

Acerca do prazo de prescrição do procedimento criminal instaurado pela prática de crime tributário, estatui o art. 21º/1 do RGIT que " 0 procedimento criminal por crime tributário extingue-se por efeito da prescrição logo que sobre a sua prática sejam decorridos 5 anos".

E o seu nº. 3 estabelece que o prazo de prescrição do procedimento criminal é reduzido ao prazo de caducidade do direito à liquidação da prestação tributária, quando a infracção depender daquela liquidação.

A caducidade do direito à liquidação de impostos encontra-se regulada na Lei Geral Tributária.

Diz o actual art. 45º/1 da L.G.T. que " O direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de 4 anos, quando a lei não fixar outro".

O nº. 4 da mesma norma, estabelece que no caso do IVA, o prazo de caducidade conta-se (…) a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou a exigibilidade do imposto ".

Porém, na data da prática dos factos, a redacção do art. 45º era do seguinte teor: " 4 - 0 prazo de caducidade conta-se, (..) nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu".

Ao afirmar-se no nº. 3 do art. 21º do RGIT que o prazo de prescrição do procedimento criminal é reduzido ao prazo de caducidade do direito à liquidação "quando a infracção depender daquela liquidação" quer-se dizer que não existe infracção enquanto não houver liquidação.

O IVA é um imposto de obrigação única, resultando a sua obrigação de cada transmissão de bens ou prestações de serviços, e este tipo de crime pressupõe uma liquidação que é sempre feita por quem tem a obrigação de entregar o imposto, acompanhada do não pagamento do imposto nos prazos previstos na lei().

O IVA é um imposto que incide sobre as transmissões de bens e prestações de serviços efectuadas em território nacional, a título oneroso, por um sujeito passivo agindo como tal - cfr. art. 10º a) do CIVA.

Como é um imposto sobre o consumo1 é devido, regra geral, no local (país) onde o consumo se efectua.

São sujeitos passivos de tal imposto as pessoas singulares ou colectivas que, de um modo independente e com carácter de habitualidade, exerçam actividades de produção, comércio ou prestação de serviços - cfr. art. 2º/1 do CIVA.

O IVA é devido e torna-se exigível nas transmiss6es de bens, no momento em que os bens são postos à disposição do adquirente ou no momento em que a factura é emitida ou devia tê-lo sido.

Conforme ensina o Prof. Diogo Leite de Campo, o facto tributário é composto de um elemento objectivo e um elemento subjectivo.

O elemento objectivo é integrado pelas transmissões de bens e prestações de serviços a título oneroso, pelas importações de bens e pelas aquisições intracomunitárias de bens.

O elemento subjectivo é constituído pelo sujeito passivo, tal como é definido pelo art. 2º do CIVA.

Verificados estes dois elementos, a obrigação de imposto surge imediatamente, sendo o imposto devido e exigível nos termos dos arts. 7º e 8º do CIVA.

Adianta ainda o referido Professor que o JVA " (...) para ser exigível não é necessário qualquer procedimento da Administração ou do sujeito passivo. Em termos de por exemplo, o sujeito passivo ter de declarar o acto ou a Administração fiscal ter de liquidar o imposto com base na declaração do contribuinte.

Uma vez realizado o negócio jurídico por um certo preço e conhecida do imposto, a liquidação opera-se por força da lei.

É seguro que o facto tributário é aqui instantâneo, logo que se verifica o elemento material, a transmissão do bem, a prestação do serviço, etc., surge o imposto, a obrigação de imposto, certa e exigível.

Isto, porque aquele que transmite o bem ou presta o serviço, denominado sujeito passivo, deve liquidar o imposto à contraparte. Esta conhece o imposto e deve pagá-lo juntamente com o preço do bem ou serviço.

Nestes termos, parece impor-se a norma de que o sujeito passivo entregará imediatamente o que recebeu a título de imposto. Como pagaria qualquer imposto certo e exigível, que é entregue imediatamente nos cofres do Estado".

O apuramento do imposto devido é feito pela dedução ao imposto liquidado, do imposto suportado nas aquisições, isto é, os sujeitos passivos de IVA suportam impostos nas aquisições de bens e serviços efectuados a outro sujeito passivo e por sua vez liquidam IVA nas transmissões por si efectuadas. Do encontro desses dois valores apura-se o valor do IVA, imposto a pagar pelo sujeito passivo, o crédito de imposto ou IVA liquidado igual ao IVA deduzido, não havendo imposto a pagar ou a receber.

Conforme refere, a propósito o Ac. do STJ de 7/5/2003, relatado pelo Sr. Conselheiro Lourenço Martins, " (...) o sujeito passivo do IVA é alguém que tendo o dever de liquidar o imposto, de o cobrar e de o entregar nos cofres do Estado, está exonerado por lei, através do mecanismo de repercussão fiscal, de o suportar economicamente.

Uma vez que o imposto atinge todas as fases do circuito de produção, concebeu-se uma fórmula que permite ao interveniente, a montante compensar o imposto suportado a jusante.

O que se pretende é que as empresas e todas as empresas que participam num certo circuito, produzindo bens ou vendendo serviços, cobrem o IVA sem que sejam por ele onerado … de modo a que sejam apenas um veículo técnico para o imposto.

A neutralidade do IVA, imposto que acompanha todo o circuito produtivo, implica o direito atribuído o cada sujeito passivo de, no momento em que se apure o imposto devido às suas vendas e serviços prestados, poder deduzir o imposto que suportou nas aquisições de bens e serviços necessários à sua actividade, entregando depois apenas a diferença entre os dois montantes considerados. Tal direito opera a através da compensação e subsidiariamente do reembolso.

Por isso mesmo a estrutura do IVA implica para o sujeito passivo o cumprimento de outras obrigações, tais como o dever de entregar declarações de início, alteração ou cessação de actividade, cfr. artigos 28º/1 a), 30º a 33º do CIVA, assim como entregar nos prazos estabelecidos no art. 40º do CIVA as declarações periódicas - cfr. art. 28º/1 c) do CIVA.

Por sua vez o Estado, normalmente, limita-se a constatar, face aos elementos apresentados pelo sujeito passivo, o montante do imposto apurado, seja ele a pagar, a devolver ou nada a pagar ou a receber; ou seja, o apuramento do montante do IVA não depende de qualquer actividade, nomeadamente de qualquer liquidação, por parte da administração fiscal, salvo nas situações previstas nos arts. 82º, 83º e 83º-A do CIVA.

O Chefe dos Serviços de Finanças competente pode rectificar, nos termos do artigo 82º do CIVA, as declarações apresentadas pelos sujeitos passivos, quando fundamentadamente considere que nelas figura um imposto inferior ou uma dedução superior aos devidos, liquidando-se adicionalmente a diferença.

A Direcção dos Serviços de Cobrança do IVA procede, nos termos do art. 83º do CIVA, à liquidação oficiosa do imposto sempre que o sujeito passivo não tiver apresentado a declaração periódica.

O mesmo pode ser feito, nos termos do citado art. 83º-A do CIVA, pelo Chefe dos Serviços de Finanças competente, quando esta situação de omissão se tiver verificado.

Excepção feita a estas situações mencionadas, o IVA é normalmente arrecadado por via da autoliquidação.

Só confere direito à dedução o imposto mencionado em facturas ou documentos equivalentes passados em forma legal em nome e na posse do sujeito passivo, art. 19º/2 do CIVA.

No caso do IVA, a liquidação pela administração fiscal apenas serve para o Estado apurar o montante da dívida e cobrá-la ao sujeito passivo.

E esta liquidação quando é...

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