Acórdão nº 0615604 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 22 de Novembro de 2006
Magistrado Responsável | MARIA DO CARMO SILVA DIAS |
Data da Resolução | 22 de Novembro de 2006 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Acordam, em conferência, os Juízes do Tribunal da Relação do Porto:*I- RELATÓRIO No ….º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de V. N. de Famalicão, nos autos de processo comum (Tribunal Singular) nº ……/03.1TAVNF, foi proferida sentença, em 12/5/2006 (fls. 559 a 573), constando do dispositivo o seguinte: "Pelo exposto, e ao abrigo dos citados preceitos, julga-se improcedente a acusação deduzida e, em consequência:
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Absolve-se o arguido B……….. da prática do crime de difamação, p. e p. pelos arts. 180º, n.º 1, 182º, 183º, nº2 e 184º, com referência ao artº 132º, nº2, j), todos do Código Penal.
Custas a cargo do assistente, fixando-se a taxa de justiça em 4 UC- artº 515º, nº1, a), do CPP.
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Julga-se improcedente por não provado o pedido de indemnização civil formulado pelo demandante C………. e em consequência, absolve-se o demandado do pedido.
Custas a cargo do demandante. (…)"*Não se conformando com a sentença, o assistente C……….. interpôs recurso dessa decisão (fls. 580 a 591), formulando as seguintes conclusões: "I- A conduta do arguido, o conjunto das imputações que dirigiu ao assistente, é criminalmente punível, e susceptível de ser integrada no tipo legal de crime previsto no artigo 180° e seguintes do CP.
ll- Não se verifica qualquer causa de justificação quanto ao elemento objectivo do tipo de ilícito; III- O ambiente político, a crítica política, o conflito político ou qualquer outra expressão que se destine a integrar uma causa de justificação atípica, não se verificou no caso concreto; IV- O arguido praticou o crime previsto no artigo 180º e seguintes·do CP porque tinha interesses pessoais (nomeadamente em obras da freguesia em seu proveito próprio) e de seus familiares que se viram frustrados pela actuação do assistente, conforme se pode verificar pelos documentos juntos a estes autos; V- Não é possível negar a ofensabilidadede expressões tais como "não olha a meios para atingir os seus fins", pratica o "abuso de poder" e a "represália", para além da "prepotência" e do "despotismo", que, de resto, ofenderam o assistente; VI - O arguido nunca pretendeu demonstrar qualquer descontentamento com a gestão da freguesia, apenas se limitou a ofender o assistente; VII- Actuou o arguido com dolo directo, na medida em que representou ou prefigurou no seu espírito determinado efeito da sua conduta, e quis esse efeito, como fim último da sua actuação, ainda que conhecedor da sua ilicitude; VIII- Ainda que assim se não entenda, sempre é de considerar que o arguido actuou dolosamente, por qualquer das modalidades previstas no artigo 14° do CP, sendo, pois, punível a sua conduta; IX- As ofensas que o demandado realizou, e que tiveram enorme divulgação pública,violando ilicitamente direitos do demandante, causaram na esfera jurídica·deste danos não patrimoniais; X- Pelo que se impõe, também nesta parte, a revogação da douta sentença recorrida, condenando-se o demandado no montante requerido.
Xl- Foram violadas as disposições constantes do n° 1 do artigo 180°, do artigo 182°, do nº 2 do artigo 183° e do artigo 184°, com referência à alínea j) do n° 2 do artigo 132°, todos do Código Penal, e do artigo 483º do Código Civil." *O MºPº, na 1ª instância, respondeu ao recurso interposto pelo arguido, pugnando pela manutenção da sentença recorrida nos seus precisos termos.
*Nesta Relação, na vista aberta nos termos do art. 416 do CPP, o Sr. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer, conluindo pelo não provimento do recurso.
No exame preliminar, a que alude o art. 417 nº 3 do CPP, a relatora considerou ser caso de rejeitar o recurso, por manifesta improcedência, nos termos do nº 1 do art. 420 do mesmo código.
Colhidos os vistos legais, realizou-se a conferência.
Cumpre, assim, apreciar e decidir.
*Na sentença recorrida foram considerados provados os seguintes factos: «Feito o julgamento e com relevância para a decisão da causa, resultou provada a seguinte matéria de facto: 1. Em Novembro de 2003, o assistente C……….. e o arguido B……….. exerciam, respectivamente, as funções de presidente e de secretário da Junta de Freguesia de ……. .
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Entre o arguido e o assistente existiam desentendimentos relativamente aos procedimentos para adjudicação de obras de pavimentação de caminhos públicos, nomeadamente quanto à necessidade de apresentação de várias propostas orçamentais, na sequência do que o pagamento de algumas das obras adjudicadas e realizadas a empresas de construção veio a ser parcialmente recusado pelo assistente.
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Em consequência, o arguido redigiu e fez publicar no semanário de âmbito local denominado " D………." um artigo de opinião relativo a tais factos, veiculando a sua opinião pessoal acerca do ocorrido.
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Tal artigo veio a ser publicado, a impulso do arguido no referido semanário, na sua edição de 6 de Novembro de 2003, a páginas 26, edição que teve uma tiragem de 5.500 exemplares.
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A tal artigo atribuiu o arguido o título "Abuso de poder do presidente paralisa Junta de ……….".
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Em tal artigo, redigiu o arguido, além do mais as seguintes frases: "C……….. não se adapta à convivência democrática e não olha a meios para atingir os fins"; "É óbvio que os secretário e tesoureiro não podiam alinhar com tal prepotência do presidente e apresentaram dois orçamentos tendo-se efectuado a pavimentação de 8 400 m2 (em tapete asfáltico e respectivas valetas em betão) por 35 299, 45 euros (menos de metade do preço que o presidente queria impor). Para melhor entendimento diga-se que a poupança foi de OITO MIL CONTOS em relação ao orçamento que o presidente quis impor"; "No entanto, C……….. tinha ainda reservada uma última cartada- o abuso de poder e a represália"; " Em consequência desse abuso de poder e em represália, há dívidas de 22,119, 45 euros que a Junta de Freguesia já devia ter liquidado há cinco meses. Contudo, não o fez devido à prepotência e despotismo do presidente".
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O arguido quis redigir e publicar o texto em causa, através de meio de comunicação social, relatando factos ocorridos e formulando juízos acerca da pessoa e da actuação do assistente, enquanto presidente da Junta de Freguesia.
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Antes e depois da publicação do texto supra referido, o arguido fez inúmeras exposições e participações à Inspecção Geral de Finanças, ao Procurador da República junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, à Inspecção Geral da Administração do Território/Ministro da Administração Interna, Tribunal de Contas, dando conta da existência de irregularidades na Junta de Freguesia.
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Para a execução da pavimentação o arguido e o tesoureiro obtiveram orçamentos, sendo um de E……….. Ldª, a quem veio a ser adjudicada a obra, pelo preço ser inferior aos orçamentos anteriormente obtidos pelo assistente.
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O orçamento apresentado por E………. para a execução das valetas era de 7, 5 euros/ m2, sem IVA e o orçamento para a mesma obra apresentado por F………… era de 4,21 euros/ m2, incluindo IVA.
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As valetas acabaram por ser executadas por F……….., na sequência de deliberação tomada em reunião de junta, em que o presidente de Junta não participou.
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Na sequência das participações do arguido, foi efectuado um Inquérito à Junta de Freguesia …….., pela Inspecção Geral da Administração do Território, onde se apurou: - não eleição pela assembleia de freguesia da sua mesa, nem dos vogais da junta de freguesia; - não elaboração/ aprovação da maior parte dos instrumentos de gestão financeira da freguesia pelo órgão executivo; - aprovação/ apreciação da maior parte dos instrumentos de gestão financeira pela Assembleia de Freguesia, apresentados apenas sob responsabilidade do Presidente da Junta de Freguesia sem intervenção do órgão executivo; - inexistência de qualquer acta de reuniões do órgão executivo desde o início do mandato até Maio de 2003; - irregular funcionamento do órgão executivo, designadamente quanto a reuniões e suas actas, tomada de decisões, movimento de dinheiros públicos e seus registos, agravado com o evidente dissenso entre o Presidente da Junta de Freguesia e os dois vogais, com sinais claros a partir de meados de 2003; - resistência do Presidente da Junta de Freguesia ao pagamento de dívidas da Freguesia, implicando recurso à cobrança coerciva com inerente aumento de encargos; - insuficiente/deficiente instrução e condução de processo e de procedimentos relativos a uma empreitada de pavimentação e valetas; - abertura de conta na CGD/VNFamalicão e sua movimentação só com a assinatura do Presidente da Junta de Freguesia; - incomunicabilidade e retenção recíproca de documentos oficiais da freguesia entre o presidente e os dois vogais da Junta - não pagamento do subsídio de compensação aos dois vogais da Junta de Freguesia.
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O arguido não tem antecedentes criminais.
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O assistente é uma pessoa séria, honrada e respeitada no meio onde reside, sendo várias vezes eleito presidente da Junta, cargo que actualmente ocupa.
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O texto redigido e publicado pelo arguido foi lido e comentado por inúmeras pessoas que se dirigiram ao assistente, indagando-o sobre o conteúdo do mesmo.
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O assistente sentiu-se muito ofendido, desgostoso e angustiado com o conteúdo do texto redigido e publicado pelo arguido." E, quanto aos factos dados como não provados, consta o seguinte: "Com relevância para a decisão da causa não se provou que: 1. Que o arguido tenha redigido e publicado que: " C………. não se adapta à convivência democrática e não olha a meios para atingir os seus fins".
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Que o arguido formulou juízos acerca da pessoa e da actuação do assistente, enquanto titular de órgão autárquico, que são ofensivos da sua honra e consideração, querendo fazê-lo e sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.
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Que o assistente seja membro da assembleia municipal." Da respectiva motivação da matéria de facto provada e não provada, fez-se constar o seguinte: "Motivação: O tribunal formou a sua convicção sobre a factualidade provada e não provada com base na análise crítica e ponderada da prova produzida em audiência de julgamento, designadamente: -...
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