Acórdão nº 0543061 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 15 de Novembro de 2006

Magistrado ResponsávelARTUR OLIVEIRA
Data da Resolução15 de Novembro de 2006
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO: I - RELATÓRIO 1. No processo comum (tribunal colectivo) n.º …/02.8PAESP, do .º Juízo do Tribunal Judicial de Espinho, o arguido B………. foi condenado, por acórdão de 19 de Janeiro de 2005, na pena de dois (2) anos e dez (10) meses de prisão efectiva "(…) pela prática, como autor material e na forma consumada, de um crime de furto qualificado p. e p. pelo art. 204.º, n.º 2, al. e), ambos do Código Penal (1995)."----- Inconformado, recorre para este Tribunal mediante motivação (fls. 235-266) da qual extrai as seguintes conclusões: - 1. "O douto acórdão recorrido não fez um exame crítico das provas que permitiram formar a sua "convicção" violando o disposto no nº 2 do artº 374 do C.P.P., o que leva à nulidade da sentença, nos termos do artº 379 nº 1 al. a) do C.P.P.

  1. Quanto aos factos não provados o acórdão é totalmente omisso de fundamentação, e a convicção do julgador deve ser objectiva e motivada de forma lógica e racional, o que, salvo o devido respeito, não acontece no caso sub judice.

  2. O acórdão recorrido enferma, na nossa opinião, de nulidade por absoluta falta de fundamentação sobre questão específica, pois como dispõe o artº 355 do C.P.P., só valem em julgamento provas produzidas ou examinadas em audiência.

  3. O arguido foi seriamente afectado no seu direito de defesa, tendo sido violado o disposto nos artºs 32 nº 1 e 5 da C.R.P.; artº 97 nº 4 do C.P.P., já que o tribunal fez errada interpretação da norma constante do artº 97 nº 4 do C.P.P., interpretação essa violadora dos princípios consignados nos artºs 32 nº 1 e 5, e 205 da C.R.P., o que aqui se invoca, também com o objectivo de dar cumprimento ao disposto no artº 72 da Lei do Tribunal Constitucional.

  4. A prova produzida em Audiência de Discussão e Julgamento é manifestamente insuficiente para dar como provados todos os factos constantes da Acusação.

    Se não vejamos: - O arguido negou todos os factos de que estava acusado (declarações gravadas em fita magnética desde o nº 0001 ao nº 0541 do Lado A).

    - As testemunhas de Acusação, C………. e D………., Agentes da P.S.P., afirmaram que não se recordavam do caso, que não conhecem o arguido.

    - A primeira testemunha referiu que "presumivelmente o assaltante terá entrado por uma janela nas traseiras do prédio" (as suas declarações encontram-se gravadas em fita magnética, desde o nº 0542 ao nº 0916 do Lado A, e nº 0917 ao nº 1200 do Lado A).

    - O Ofendido E………., disse que "não conhece o arguido", que "nunca o mesmo esteve em sua casa", que "foi nesse dia que a P.S.P. recolheu as impressões digitais".

    "Exactamente, eu chamei logo a polícia, a polícia apareceu logo, foram rápidos e tiraram as impressões digitais que lá havia na casa espalhadas" (citº cassete nº 1 Lado B do nº 0105 ao nº 1095).

    "Tava, a janela é assim, e o vidro, tiraram o vidro e depois puseram no chão" (cassete nº 1, Lado B).

    "No chão, ao alto, encostado, direitinho" (cassete nº 1, Lado B).

    Em contradição com estas declarações diz a testemunha Agente D………. da P.S.P.: - "Oh, Sr. Agente, o Senhor disse que devem lá ter ido colegas seus recolher o material, o Senhor foi com eles?" - "Não, não, isso é outra secção" (cassete nº 1 Lado A) - "Sabe se eles foram lá e em que dia é que foram lá?" - "Parece que foram lá no mesmo dia" (cassete nº 1 Lado A).

    - "Mas tem a certeza disso?" - "Não, não, não tenho a certeza" (cassete nº 1 Lado A).

    Em contradição com as declarações do ofendido, os Agentes da P.S.P., afirmam que pouco se lembram do caso, mas de não terem sido eles a recolher o material para exame lafoscópico, não sabendo quem foi, quando foi, nem em que circunstâncias (Cassete nº 1, Lado A).

    6 A única prova que o tribunal considerou para dar os factos 1º, 2º, 3º, 4º, 5º e 6º como provados foi o exame pericial junto a fls. 41 a 49 "que refere que num tal vidro foram encontrados vestígios digitais do dedo do arguido", que não sabemos onde foi recolhido, quando e em que circunstâncias.

    7 Entendemos que esta prova, é nos termos do artº 151 do C.P.P. um meio de prova que deve ser conjugado com os demais meios (artº 127 do C.P.P.), estes vestígios digitais, desacompanhados de qualquer outra prova, salvo o devido respeito, são manifestamente insuficientes para a condenação do recorrente por crime de furto qualificado.

    8 Pelo que, não aceitamos os factos dados como provados em 1º; 2º; 3º; 4º; 5º e 6º, quando refere "ser o arguido o autor dos factos", devendo a autoria ser dada como não provada.

    9 Não tendo ficado, na nossa opinião, provado, nem suficientemente demonstrado, que o arguido foi o autor dos factos, nem sequer que o autor dos factos entrou pela janela, pois nenhuma prova directa foi produzida sobre tais factos.

    10 Existe uma clara insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, contradição insanável entre a fundamentação e a decisão e ainda erro notório na apreciação da prova, e tais vícios resultam do texto da decisão recorrida, conjugado com as regras da experiência comum (artº 410 nº 2 do C.P.P.).

    11 Ora, não existindo qualquer prova directa, não tendo sido reconhecido, não tendo sido apreendido ao arguido nenhum objecto, residindo ele habitualmente em Castelo de Paiva, não pode o mesmo ser condenado como autor do crime, só o tendo sido por erro notório na apreciação da prova, pois o princípio da livre apreciação da prova (artº 127 do C.P.P.) encontra no In dubio pro reo o seu limite normativo.

    12 Acresce que, o arguido foi condenado pela prática de um crime de furto qualificado nos termos da alínea e) do nº 2 do artº 204 do C.P.

    13 Salvo o devido respeito, entendemos que a factualidade provada integra tão só o crime de furto simples, o que só não foi reconhecido por erro notório na apreciação da prova, sendo detectável, pelo observador comum, que não ficou provado que o arguido arrombou a janela, e que a mesma estava fechada, ou que tenha entrado por essa janela, por escalamento (pois como já supra - referimos, o que as testemunhas afirmaram foi que "presumivelmente terá entrado").

    14 A dúvida a respeito do factualismo integrador do elemento qualificativo deve ser resolvida a favor do arguido, princípio In dubio pro reo, desqualificando-se o crime de furto.

    15 É vício - ou são vícios - que, necessariamente inquinam - de forma inevitável - a decisão proferida e que impõem a renovação da prova ou anulação do julgamento e sua repetição.

    16 Em síntese, entendemos não haver prova suficiente e bastante para se condenar o arguido por crime de furto qualificado, devendo o mesmo ser absolvido.

    Por mera cautela, e sem prescindir, caso Vossas Excelências Excelentíssimos Senhores Desembargadores, assim não entendam, então impõe-se reduzir a pena concreta aplicada, pois a mesma peca por excessiva e ultrapassa a culpa do agente na prática dos factos.

    17 O recorrente foi condenado pela prática de um crime de furto qualificado p. e p. pelo artº 204 nº 2 al. e) do C.P., na pena única de 2 anos e 10 meses de prisão efectiva.

    18 No modesto entender do recorrente, a pena aplicada peca por excessiva e ultrapassa a medida da culpa evidenciada na prática dos factos.

    19 De acordo com o artº 40 nº 1 do C.P., a aplicação das penas visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade, e estipula o nº 2 que, em caso algum, a pena pode ultrapassar a medida da culpa. Por sua vez, o nº 1 do artº 71 estatui que a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa, das circunstâncias que não fazendo...

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