Acórdão nº 0615314 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 25 de Outubro de 2006

Magistrado ResponsávelMARIA DO CARMO SILVA DIAS
Data da Resolução25 de Outubro de 2006
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam, em conferência, os Juízes do Tribunal da Relação do Porto:*I- RELATÓRIO No .º Juízo Criminal do Porto, .ª secção, nos autos de processo comum (Tribunal Singular) nº …./03.0TDPRT, foi proferida sentença, em 31/3/2006 (fls. 311 a 317), constando do dispositivo o seguinte: "Nestes termos, julgo a acusação procedente por provada pelo que decido condenar o arguido B………. como autor material de um crime de Usurpação de Funções, previsto e punido pelo artigo 358.º, b), do Código Penal, na pena de 90 (noventa) dias de multa à razão diária de 10,00 €.

*Custas penais a cargo do arguido, fixando-se a taxa de justiça em 3 UC, acrescendo um por cento da taxa de justiça aplicada, a considerar como receita própria do Cofre Geral dos Tribunais - artigo 13.º, n.º 3, do Decreto Lei n.º 423/91, de 30 de Outubro. (…)"*Não se conformando com a sentença, o arguido B………. interpôs recurso dessa decisão (fls. 324 a 330), formulando as seguintes conclusões: "1º O recorrente alegou em sua defesa que os factos constantes da acusação pública tinham sido praticados de forma inadvertida pois que sua filha Drª. C………. era quem assinava as peças processuais apresentadas, ou a apresentar em juízo e bem assim como também acontecia quando, pessoalmente, necessário fosse pleitear nos tribunais. Mas, o Senhor julgador não acolheu tal tese, visto que considerou, na sua total plenitude, a matéria de facto aduzida na acusação e formou a sua convicção de que o recorrente tinha praticado esses factos talqualmente o assim lhe foram imputados. Contudo, salvo o devido respeito, o signatário discorda, visto que alegou em sua defesa contrariando a mesma e o que corresponde exactamente à verdade.

  1. Na matéria de facto dada como provada, existe contradição com outra considerada como não provada. E isso verifica-se tal assim, na modesta opinião do recorrente, nos factos referentes ao n°. 10 e confrontados com a factualidade dada como não provada do parágrafo 4°., ou seja: "(10) A mesma entidade exequente no processo respectivo e relativamente ao processo n°. … / 01?, do .°. Juízo, .ª. secção, dos Juízos Cíveis da Comarca do Porto, propôs outra execução e contra os mesmos executados relativa ao mesmo assunto e com base em uma letra de câmbio;" E que contradiz, "Que relativamente à outra execução acima em referência, o arguido nada fez e nem tão pouco a sua filha, Drª. C………. por causa de toda esta confusão;". De igual modo, também o Tribunal "a quo" deu como provados factos que, em parte e na modesta opinião do recorrente, são coincidentes com a tese da defesa deste por si feita, mas que não relevaram para a douta decisão ora posta em crise. E factos esses que são os consubstanciados nos n°s. 8 a 17 e 20, devendo, salvo melhor opinião, ser levados em consideração, por serem preponderantes para uma decisão diferente à aqui recorrida.

  2. O recorrente é parente dos então ao tempo executados, D………. e E………., bem assim como também do tio deste, F………. . E por tal situação, o signatário e sua filha Drª. C………., nada cobraram ou cobrariam pelo então serviço a eles prestado. Consequentemente, o respectivo serviço não foi ou iria ser remunerado. Assim, neste sentido, conjugando-se a disposição do Artg°. 53º n°1 dos E.O.A., isto relativamente à redacção que tinham antes de 24 de Agosto de 1994, com a do Artgº 358°., alínea b), do C.P., não existe o cometimento de crime algum pelo recorrente e isto porque verifica-se que os factos relativos às peças processuais assinadas pelo signatário enviadas pelo correio para o processo de execução n°. … /01?, do .º. Juízo, .ª. Secção dos Juízos Cíveis da Comarca do Porto e considerados prestação de serviços da profissão de advogado, não foram remunerados.

  3. Ora, o Mert°. Juiz, do tribunal "a quo", salvo o devido respeito e bem como de melhor entendimento, deu com provado que o signatário tinha a sua inscrição na AO suspensa desde finais de 1992 e isso a seu pedido, portanto que o não estava a partir de 1997 e isto assim sem a vontade do recorrente. Aliás, a OA quando informou o denunciante desta situação, não revelou o motivo, facto este incompreensível relativamente ao comportamento desse referida entidade. E provou-se que o recorrente foi impedido pela OA a levantar a suspensão da sua inscrição, visto que a respectiva entidade lhe comunicava ter o signatário, cerca de cinco anos, de quotas em divida e no montante de 7.500,00€, acontecendo que também a Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores, exigiam, ao signatário, o pagamento de cerca de 10.000,00€ a titulo de contribuições em dívida desde o mesmo espaço de tempo, e que o mesmo é obrigatório, tal como é do conhecimento geral. Então, perante a situação que era colocada ao recorrente, este contestou tal exigência, recusou sempre satisfazer a pretensão da OA e da Caixa e com o argumento de que nada devia. Visto que tinha sido o recorrente a requerer a suspensão da sua inscrição, mas por erro da OA, que não desculpável, esta a partir do final de 1992, data da requerida suspensão, continuou a contabilizar o vencimento de quotas, não comunicando também à Caixa de Previdência a respectiva requerida suspensão e tal como era seu dever. O recorrente procurou, por várias vezes, levantar a sua suspensão, que sempre negada sem antes ser feito o pagamento e ao mesmo tempo que apresentava reclamações, mas sempre sem êxito. Até que em finais de 1993, a Caixa de Previdência comunicou ao recorrente que a OA lhes oficiara no sentido de que a suspensão da sua inscrição ocorrera desde finais de 1992 e que então, por isso, a divida de contribuições para com a dita entidade, fora anulada. A Ordem dos Advogados nada comunicou ao recorrente relativamente a ente assunto. Perante a notícia nada ao recorrente pela Caixa de Previdência, este, de imediato foi à Ordem e aí procedeu ao levantamento da respectiva suspensão, porque o montante cujo pagamento lhe era exigido e condição "sine qua non" para efectuar esse operação, levantando então a respectiva suspensão. Ora bem, toda esta factualidade foi dada como provada pelo Tribunal "a quo" e daí que, tal como se verifica, o recorrente foi ilegalmente impedido pela OA de exercer a sua profissão de advogado e cuja situação violou as disposições da Constituição, neste caso a dos Artg°.s 47°., n°. 1 e 58°., n°. 1. Assim, perante tal acontecimento, o Mertº. Juiz salvo o devido respeito e bem como de melhor entendimento, deveria ter decidido pela dita inconstitucionalidade do Artgº. 53°., n°. 1, neste caso e não o Artgº. 61°., n°. 1, dos EOA, uma vez que a lei dispõe para o futuro e não pode ser aplicada retroactivamente, portanto, consequentemente por isso se deveria ter absolvido o signatário. Portanto, perante a factualidade antes descrita verifica-se que o EOA não poderia operar contra a Lei Constitucional e neste caso devia considerar-se como não existente a disposição dos EOA, Artg°. 53°., n°. 1, na redacção dada antes de 24 de Agosto de 2004. Assim, a douta sentença posta em crise violou os preceitos legais Artg°s. 47°., n°. 1 e 58º nº 1.

  4. A acusação pública, é nula e isso tal assim em função do disposto no Artg°. 283°., n°. 3, alínea b), do Código de Processo Penal, visto que a mesma não indica a data da ocorrência dos factos, pois que, "3. A acusação contém, sob pena de nulidade: b) A narração, ainda que sintética…incluindo, se possível, o lugar, o tempo e a motivação da sua prática….", portanto verifica-se era legalmente obrigatório. Pois, a indicação do tempo em que os factos imputados ao recorrente ocorreram, era mais que possível, portanto, daí que a falta da indicação do tempo, implica a nulidade da acusação e o Tribunal "a quo", com o devido respeito, deveria assim ter julgado, absolvendo o signatário da dita acusação. Mas facto este que assim não aconteceu.

  5. E para além de tudo mais, também o Tribunal devia, no mínimo dos mínimos, suspender a execução da pena, isto assim no caso de não ser considerada qualquer uma das situações antes aduzidas, pois que nem sequer se pode falar na necessidade de reinserção social do signatário, para não se suspensa a dita execução. Aliás, foi dado provado o anterior bom comportamento do recorrido, visto que nada do seu registo criminal consta." *O MºPº, na 1ª instância, respondeu ao recurso interposto pelo arguido, pugnando pela manutenção na integra da sentença recorrida.

*Nesta Relação, na vista aberta nos termos do art. 416 do CPP, o Sr. Procurador-Geral Adjunto apôs o seu visto (fls. 346).

No exame preliminar, a que alude o art. 417 nº 1 e 3 do CPP, a relatora considerou ser caso de rejeitar o recurso, por manifesta improcedência, nos termos do nº 1 do art. 420 do mesmo código.

Colhidos os vistos legais, realizou-se a conferência.

Cumpre, assim, apreciar e decidir.

*Na sentença recorrida foram considerados provados os seguintes factos: "Factos provados: 1) No Processo de execução n.º …-B/2001, do ..º Juízo, ..ª Secção dos Juízos cíveis da comarca do Porto, o arguido apresentou o requerimento de oposição à execução, por embargos de executado, em representação dos executados em tal processo, D………. e E………., que lhe tinham passado a procuração junta por fotocopia de fls. 22, requerimento esse junto por fotocópia de fls. 15 a 19, aqui dado por reproduzido para todos os efeitos legais, e que o arguido assinou; 2) No mesmo processo o arguido apresentou os requerimentos juntos por fotocópia de fls. 9 a 10, a fls. 12, a fls. 11 e verso e a fls. 25, igualmente assinados por si e também aqui dados por reproduzidos para todos os efeitos legais; 3) Bem sabia o arguido que os actos atrás citados apenas podiam ser praticados por advogado devidamente inscrito como tal na Ordem dos Advogados; 4) Bem sabendo também que o arguido tinha a sua inscrição como advogado na Ordem dos Advogados suspenso desde 4 de Dezembro de 1992, o que aconteceu a seu próprio pedido; 5) Não obstante, o arguido não deixou de actuar como actuou, criando no Tribunal atrás mencionado com a prática dos referidos actos a...

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