Acórdão nº 0625109 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 24 de Outubro de 2006

Magistrado ResponsávelANABELA DIAS DA SILVA
Data da Resolução24 de Outubro de 2006
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I - B…………, e mediante intervenção principal provocada, C……., ambos residentes na Rua ….., nº ….., 4450-518 ….., Matosinhos, intentaram a presente acção declarativa com processo sumário contra D…….. e E………., ambos com domicílio profissional na Rua ……, nº …., ……, Matosinhos, pedindo a condenação dos réus no pagamento da quantia global de 5.044,39 €, acrescida de juros de mora à taxa legal, a contar da citação, até efectivo e integral pagamento.

Alegaram, para o efeito que em 21.08.1998, F……., marido da autora e pai do chamado e entretanto falecido, adquiriu, pelo preço de 6.234,97 € (1.250.000$00), o veículo automóvel de matrícula ..-..-FT, no stand de comercialização de automóveis "G……", explorado pelos réus, sendo que, nessa data, estes anunciavam a venda do aludido veículo como usado, com cerca de 34.500 Km percorridos.

F…….., convencido da veracidade de tal informação, adquiriu o veículo FT, que pagou mediante o empréstimo contraído por H……., seu amigo.

Esse veículo começou a apresentar problemas mecânicos e F…… levou-o a uma oficina, onde, no dia 31.03.2000 e aquando de uma reparação, veio a saber que o veículo, em 1998, tinha já percorrido 140.000 Km.

Face a tal quilometragem real, o preço de mercado do veículo FT à data da venda fixava-se entre 720.000$00 e 800.000$00, pelo que o F……… pagou em excesso a quantia de 2.224,59 €.

Finalmente dizem os autores que, em função da quilometragem aparente do veículo, despenderam, na celebração do respectivo contrato de seguro automóvel, uma quantia maior do que aquela que teriam despendido se o veículo, na altura, exibisse a quilometragem real, quantia essa que estimam em 1.035,83 €, sendo ainda que, devido ao excesso de quilometragem, o veículo apresentou problemas mecânicos, cuja reparação foi custeada por F…….. e montou a 1.019,00 €. E tanto F……… como a autora entregaram a H……. para este entregar à entidade mutuária, em excesso, a título de juros, a quantia de 744,97 €.

*Pessoal e regularmente citados, os réus, contestaram, o pedido formulado invocando a excepção da ilegitimidade activa da autora, porquanto a acção deveria ter sido intentada também pelo filho de F………., visto que se pretende exercer um direito que integra o acervo hereditário deste último.

Mais alegaram a caducidade do direito de acção, pois tendo a autora configurado o litígio como sendo uma venda de coisa defeituosa, nunca o falecido F……… ou a autora reclamaram qualquer vício do veículo FT, sendo que, de qualquer modo, a acção foi intentada depois de já terem decorrido mais de seis meses sobre a eventual denúncia dos defeitos detectados.

Terminam os réus pedindo a improcedência da acção.

*Em resposta, a autora impugnou a matéria da alegada excepção da caducidade e requereu a intervenção principal do seu filho, C………, o que foi admitido por despacho a fls. 65, assim se julgando sanado a ilegitimidade activa da autora, por preterição de litisconsórcio necessário, em virtude de se pretender fazer valer um direito de crédito pertencente ao falecido marido da autora, sendo que o chamado é seu filho e, consequentemente, também é seu herdeiro legitimário.

*Citado para contestar, o chamado declarou fazer seus os articulados apresentados pela autora, sua mãe.

*Foi proferido o despacho saneador, onde se relegou para sede de sentença final a decisão da excepção da caducidade e depois, considerando a simplicidade da selecção da matéria de facto controvertida, não se procedeu à fixação da base instrutória.

*Procedeu-se a julgamento da matéria de facto, a qual foi decidida a fls. 171 a 176, sem qualquer reclamação das partes.

Finalmente, proferiu-se sentença onde se julgou a acção totalmente improcedente, absolvendo-se os réus do pedido, por procedência da excepção peremptória da caducidade invocada nos autos pelos réus.

*Inconformados com tal decisão, recorreram os autores de apelação, que alegando, formularam as seguintes conclusões : Impugna-se a decisão recorrida que julgou procedente a excepção peremptória da caducidade.

Por um lado, ao pedido deduzido nos presentes autos, de redução do preço e indemnização, sob o regime de venda de coisas defeituosas, é inaplicável o disposto no artº 917º do C.Civil, sendo aplicável o prazo de caducidade de 20 anos, previsto no artº 309º do C.Civil.

Para além de não se verificar o elemento literal, também não se verifica o elemento racional justificativo da interpretação extensiva do disposto no artº 917º do C.Civil, nos casos de redução de preço e indemnização, pela venda de coisas defeituosas, uma vez que a razão de ser da consagração do curto prazo de seis meses de caducidade da acção se prende fundamentalmente com os seguintes objectivos: - encurtar a duração do estado de incerteza, que a anulabilidade lança sobre a compra; e - evitar também as dificuldades de prova que os longos prazos de caducidade acabariam por criar sobre os pontos que interessam à procedência da anulação.

IV - Na verdade, no caso de redução do preço e indemnização não se verifica qualquer dos motivos justificativos supra indicados, uma vez que a coisa que foi objecto do contrato de compra e venda se mantém na posse do comprador, sendo unicamente alterado o preço do negócio e arbitrada uma indemnização. Ou seja, é constituído um mero direito de crédito a favor do comprador.

V - A sentença recorrida, por ter julgado aplicável, por interpretação extensiva, o disposto no artº 917º do C.Civil ao presente litígio, violou essa norma jurídica, bem como o disposto nos artºs 9º e 309º do C.Civil.

VI - Por outro lado, aplica-se ao caso dos autos o disposto no nº 3 do artº 34º da Lei 30-E/2000, de 20 de Dezembro, seja por interpretação extensiva seja por integração de lacunas.

VII - Face a essa aplicação a acção considera-se proposta em 17 de Dezembro de 2002, não tendo sido ultrapassado qualquer prazo de caducidade.

VIII - Ao não aderir a esta tese, a sentença recorrida violou o disposto no artº 9º ou no artº 10º do C.Civil, e errando na determinação da norma aplicável, não aplicou, como devia ter aplicado, o designado no nº 3 do artº 34º da Lei 30-E/2000. Tendo, ainda, violado o disposto nos 2º e 20º da Constituição da República Portuguesa.

Terminam os apelantes pedindo que se dê provimento ao recurso e por via disso se revogue a sentença recorrida, por improcedência da excepção da caducidade, e consequentemente se ordene a baixa do processo ao tribunal "a quo" para aí se conhecer das demais questões e do pedido.

*Os recorridos não apresentaram contra-alegações.

II - Colhidos os vitos legais, cumpre decidir.

Na 1ª instância fixou-se a seguinte matéria de facto: Os RR. exercem a actividade de compra e venda de veículos automóveis, no estabelecimento designado por "Stand G…… - ……", sito na Rua ….., nº …., …., em Matosinhos.

Entre 6 e 21 de Agosto de 1998, os RR. colocaram em exposição, para venda, no "Stand G…..", o veículo Hyundai Pony 1.3 GLS, do ano de 1995, com a matrícula ..-..-FT.

Os RR. anunciaram o veículo identificado em 2) como usado, pelo preço de 6.234,97 € (1.250.000$00).

Por não dispor de crédito bancário, F……. pediu a um amigo, H………, que contraísse um empréstimo bancário no montante indicado em 3), para financiar a aquisição do veículo referenciado em 2).

F……. e I…….. combinaram que este último apenas...

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