Acórdão nº 125/04.3TALSA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 30 de Maio de 2007

Magistrado ResponsávelAB
Data da Resolução30 de Maio de 2007
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam – em conferência – na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra: I – RELATÓRIO 1 – A...

, assistente, (melhor id.º nos autos, máxime a fls. 1 e 209), inconformado com o despacho judicial de não pronúncia [1] da denunciada/arguida B...

(melhor id.ª a fls. 64), por imputados [2] ilícitos criminais de difamação e injúria contra a sua pessoa, [p. e p. pelos arts. 180.º, n.º 1, 181.º, n.º 1, 182.º e 183.º, n.º 1, al.

b), do C. Penal], pretensamente consubstanciados na imputação de actos comportamentais e na formulação de juízos atentatórios da sua honra e consideração, em relatório de perícia à contabilidade da sociedade comercial C...

, pela id.ª cidadã realizada, por incumbência judicial, no âmbito do Proc. n.º 731/99.6TALSA - então em fase instrutória e entretanto arquivado no TIC de Coimbra -, movido contra o co-sócio (com o ora assistente) D....

, dele interpôs o recurso ora analisando, de cuja motivação [3] .

extraiu o seguinte quadro conclusivo (cujo teor se reproduz): 1 - A meritíssima Juiz violou o art. 308º do C.P.P. ao não proferir o despacho de Pronúncia da Arguida, 2 - porque não interpretou devidamente o nº 2 do art. 180º do C.P.

3 - Violou, ainda os arts. 290º nº 1 e 292º nº 2 do C.P.P. e o art. 120º do C.P.P. ao indeferir os requerimentos de prova requeridos pelo Assistente, que atempadamente arguiu a nulidade do despacho que indeferiu tais requerimentos.

Pois, 4 - É ponto doutrinário assente que o modo de execução do crime de difamação pode ser vário: - imputação de um facto ofensivo, mesmo que somente sob a forma de suspeita; - formulação de um juízo de valor; - reprodução de uma imputação ou de um juízo.

5 - Ora, este elemento objectivo – a Acção – do tipo legal de crime encontra-se amplamente preenchido, bastando para tanto ler-se atentamente o relatório. As considerações e conclusões e Juízos de valor aí vertidos são objectivamente aptos a serem considerados difamatórios, ou seja, atentatórios da honra e consideração, atento um genérico critério da experiência comum. Qualquer "pater famílias" a quem imputassem os factos relatados nos escritos da Arguida, certamente se sentiria ofendido e humilhado.

6 - Quanto ao elemento subjectivo do tipo legal de crime é hoje unanimemente aceite que o Crime de Difamação se basta com o Dolo Genérico, não sendo necessário "animus diffamandi". O crime consuma-se sem a exigência de especial intenção, bastando-se que o agente preveja ou possa prever que a sua conduta é de molde a ser encarada pelo visado como atentatória da sua honra e consideração.

7 - A Senhora Perita, aqui arguida, não pode dizer que desconhecia que o modo como expressou o seu relatório era ofensivo para o aqui Assistente, pois dado o seu grau Académico e Profissional, de Técnica Superiora da Função pública, é-lhe exigível que prevê-se que as suas palavras e conclusões atentavam contra a honra e consideração do aqui Assistente.

8 - Assim sendo, e considerando-se preenchidos os elementos objectivo e subjectivo do tipo legal de crime teríamos que averiguar se existiriam causas de exclusão da ilicitude, nos termos e para os efeitos do artigo 180º nº 2 do C.Penal.

9 - É entendimento geral da Doutrina e Jurisprudência e aliás do próprio legislador, que as causas de exclusão de ilicitude enumeradas nas alíneas a) e b) do nº 2 do art. 180º do C.P. são cumulativas.

10 - Enquanto que a alínea a) do referido normativo nos oferece uma "clausula genérica", de "interesse legítimo", podendo certa e obviamente incluir-se no seu âmbito, como o fez a Meritíssima Juiz ao decidir o despacho de pronúncia, o "interesse legítimo da informação (leia-se ao Tribunal) e da realização da Justiça".

11 - No entanto, quanto à alínea b) do supra referido normativo, necessita da prova da veracidade da imputação, ou prova de que teve fundamento sério para de boa fé reputar de verdadeira a imputação, para que se possa considerar excluída a ilicitude da difamação.

12 - Ora, no despacho recorrido a Meritíssima Juiz só cuidou de valorar a causa de exclusão da ilicitude incerta na alínea a) do nº 2 do art. 180º do C.P..

13 - Para excluir a ilicitude e decidir não pronunciar a arguida a meritíssima juiz SÓ teve em conta o "interesse legítimo da realização da Justiça", consubstanciado, no entendimento da meritíssima Juiz de que a Srª Perita fora nomeada pelo Tribunal como perita, prestara juramento legal e portanto tudo o que dissera se encontrava justificado pelo Supremo interesse do Tribunal na Descoberta da Verdade! 14 - A arguida no ÂMBITO DO PRESENTE PROCESSO tinha o ÓNUS DE PROVAR QUE AS AFIRMAÇÕES QUE FEZ NO SEU RELATÓRIO, SOBRE O ARGUIDO, SÃO VERDADEIRAS AS IMPUTAÇÕES QUE ATRIBUIU AO AQUI ASSISTENTE.

15 - A única diligência realizada no âmbito da fase de instrução do presente processo foi única e exclusivamente a inquirição da arguida, que confirmou o teor do seu relatório.

16 - Se a arguida não carreou para este processo qualquer prova de que as suas imputações eram verdadeiras ou prova de que teve fundamentos sérios para as reputar de verdadeiras, NUNCA poderia a meritíssima Juiz, sem mais ter proferido DESPACHO DE Não PRONÚNCIA.

17 - A Prova da veracidade das afirmações da arguida nos seus escritos tinha que ser obrigatoriamente realizada para excluir a ilicitude da difamação.

18 - A Meritíssima Juiz não podia aqui decidir por mera convicção! O Juiz de Instrução tem por imperativo legal analisar, face à prova produzida, se existe ou não forte probabilidade de em sede de Julgamento vir o arguido a ser condenado ou não.

19 - Dado que no presente caso, se encontrava preenchido o tipo legal de crime, tanto no seu elemento objectivo, como no elemento subjectivo, e porque a arguida não apresentou qualquer prova da veracidade dos factos que imputou ao assistente, que é seu ónus se quer afastar a ilicitude da sua actuação, então, sempre teria a arguida que ter sido levada a julgamento.

20 - Consideramos, também, que no presente caso é de aplicar o nº 4 do art 180º do C.P.. Assim, nunca poderia vir afirmar-se que a arguida teve sérios fundamentos para de boa fé reputar de verdadeiros os factos que imputava ao aqui Assistente.

21 - Certamente não desconhecemos que esta alínea do art. 180º do C.P. foi pensada para o Crime de Difamação através da imprensa, e do dever de informação dos jornalistas, no sentido de averiguarem se as suas fontes são fidedignas antes de veicularem qualquer notícia.

22 - Também no caso sub judice a Senhora Perita, aqui arguida tinha o dever de informação antes de transpor para o papel as suas conclusões, pois, face aos documentos que lhe eram apresentados e ou eram dados verificar nas pastas da contabilidade da Litopapel, Lda dos anos de 1991 a 1995, deveria ter solicitado esclarecimentos do Senhor Técnico de Contas, do Sócio Gerente à data da Peritagem, o aqui Assistente.

23 - Veja-se que qualquer peritagem Fiscal, dada a complexidade da matéria e porque nem sempre os papeis espelham correcta e eficazmente a realidade financeira, e porque, muitas vezes, por inércia, desconhecimento ou lascismo, o contribuinte tem a sua documentação fiscal atrasada, amontoada, com rasuras, apontamentos manuais, prevê-se no Código Comercial, no seu artigo 43º, que o comerciante possa estar presente à fiscalização. Exactamente para assegurar o dever de informação e esclarecimento que é devido ao Perito Fiscal que estiver a analisar a contabilidade é que o contribuinte deve prestar todos os esclarecimentos e explicações solicitadas.

24 - No Presente caso a Senhora Perita nunca pediu auxílio, esclarecimentos ou qualquer justificação para qualquer documento, transacção ou anulação... Pura e simplesmente decidiu a mais das vezes utilizar a expressão: "É de presumir que oA... fez..."; "É de presumir que oA... tenha feito..."; "É de presumir que o D... desconhecesse…". E como é que presumiu? 25 - A Senhora Perita, aqui arguida, não cumpriu o dever que se lhe impunha de verificar, o dever que tinha de pedir informação às únicas três pessoas que podiam e deviam prestar-lhe colaboração e dar-lhe todas as informações: os Sócios da Sociedade, ou seja, o Sócio D... e o Sócio A..., aqui Assistente, e o Técnico de contas.

26 - O Relatório Pericial que o Assistente considera difamatório e atentatório da sua Honra e Consideração, ofende-o genérica e globalmente pela imputação dos factos que o Assistente enumera na Sua Acusação Particular, dos pontos de 1 a 18 (Um a Dezoito) do artigo terceiro do seu clausulado, mas também pelas expressões – Juízos de Valor que a Senhora Perita formula relativamente à pessoa do aqui Assistente.

27 - "Facto é qualquer acontecimento, evento ou situação, passada ou presente, susceptível de ser objecto de prova. Dele se distingue o juízo de valor, que se analisa numa apreciação pessoal sobre o carácter da vítima, ainda que alicerçada em determinados factos. Acerca dos termos da distinção, Faria Costa, Comentário Conimbricense ao Código Penal, I, Coimbra, 1998, ps. 609 e ss..

28 - Se todos os pontos enumerados de um a treze e de dezasseis a dezoito do artigo terceiro da Acusação Particular, que se dá aqui por integralmente por reproduzida por mera economia, são imputação de factos ao aqui Assistente, o mesmo já não entendemos quanto aos pontos 14 e 15.: 14. "É espantoso que este sócio tenha estado, desde o início da actividade da empresa, atento a todas as possibilidades de retirar proveito próprio usando este e outros métodos." 15. "uma fobia por parte do sócio A..., em anular facturas e recibos deste cliente, com quem parece ter havido conluio no sentido de a Escola obter e beneficiar subsídios concedidos por entidades estatais." 29 - Nestes dois pontos concretos do seu Relatório, que consubstanciamos no artigo terceiro, pontos 14 e 15 da acusação particular, a Senhora Perita ora arguida "emite apreciações sobre o carácter" do Assistente. Não lhe imputa um facto ou acontecimento concreto, somente faz, na primeira, ponto 14, uma observação genérica, demonstrativa do juízo que emite...

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