Acórdão nº 185/97.1TAVGS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 23 de Maio de 2007

Magistrado ResponsávelIN
Data da Resolução23 de Maio de 2007
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, os juízes da Secção Criminal, do Tribunal da Relação de Coimbra..

* No processo supra identificado, o Ministério Público deduziu acusação contra o arguido A....

, imputando-lhe a prática, em autoria material de um crime de contrafacção, imitação e uso ilegal de marca, p. e p. pelo artigo 264.º, n.º 2 e um crime de concorrência desleal, p. e p. pelo art. 260.º, al. a), ambos do Código da Propriedade Industrial, aprovado pelo DL 16/95, de 24 de Janeiro.

A acusação, deduzida em 15/04/2002, e foi recebida nos seus precisos termos pelo despacho a que se refere o art. 311.º, do CPP, em 11/10/2002.

Posteriormente, em 7/03/2006, foi proferido o despacho de fls. 384 a declarar extinto o procedimento criminal relativamente ao crime de concorrência desleal, atenta a descriminalização deste ilícito, pelo novo Código da Propriedade Industrial, aprovado pelo DL n.º 36/2003, de 5 de Março, com entrada em vigor em 1 de Julho de 2003 (art. 16.º), uma vez que passou a ser punível apenas a título de contra-ordenação (art. 331.º e 317.º), prosseguindo os autos apenas pelo crime de contrafacção, imitação e uso ilegal de marca.

* Procedeu-se a julgamento, tendo o senhor juiz decidido o seguinte:

  1. Declarar a extinção do procedimento criminal em virtude da ausência de queixa por parte dos titulares do bem jurídico tutelado pela norma do artigo 324º do Código da Propriedade Industrial, na redacção do Decreto-Lei n.º36/2003, de 5 de Março e pelo 264º, n.º2 do Código da Propriedade Industrial, na redacção do Decreto-Lei n.º16/95, de 24 de Janeiro, e consequente ilegitimidade superveniente do Ministério Público para o exercício da acção penal.

  2. Declarar a perda a favor do Estado das peças de vestuário apreendidas a fls. 28 dos autos e a destruição das mesmas relativamente às quais não seja possível retirar as etiquetas e insígnias contendo os logótipos contrafeitos das marcas sem as inutilizar ou sem a tornar inidentificável com a marca contrafeita nela aposta.

    * Da sentença interpôs recurso o Ministério Público, alegando que sendo o crime de natureza pública, quando se iniciou o procedimento criminal e passando a semi-público depois de deduzida a acusação, continua a ter legitimidade, apesar de não ter sido apresentada queixa.

    Pede por isso que a sentença recorrida seja nesta parte revogada e substituída por outra que, face aos factos dados como provados, condene o arguido pela prática do crime pelo qual se encontra acusado.

    Formula as seguintes conclusões: «1. O presente procedimento criminal iniciou-se em 9 de Dezembro de 1997, por denúncia obrigatória da Guarda Nacional Republicana com a elaboração de auto de notícia e a sua remessa aos serviços do Ministério Público deste Tribunal, onde viria a ser autuado como inquérito, estando assim adquirida a notícia do crime.

    1. Entretanto, o arguido foi acusado, em 15 de Abril de 2002, pela prática, em autoria material, de um crime de contrafacção, imitação e uso ilegal de marca previsto e punido pelo artigo 264.º, n.º 2, do Código de Propriedade Industrial, na redacção introduzi da pelo Decreto-lei n.º 16/95, de 24 de Janeiro 3. Sucede que a sentença ora recorrida, não obstante dar como provados todos os factos constantes da acusação pública, declarou a extinção do procedimento criminal, com fundamento na ausência de queixa por parte dos titulares do bem jurídico tutelado pela norma do artigo 324.º do Código da Propriedade Industrial, na redacção do Decreto-lei n.º 36/2003, de 5 de Março, e pelo artigo 264.º, n.º 2, do Código da Propriedade Industrial, na redacção do Decreto-lei n.º 16/95, de 24 de Janeiro, e consequente ilegitimidade superveniente do Ministério Público para o exercício da acção penal.

    2. Ora, em regra, compete ao Ministério Público promover e impulsionar o procedimento criminal nos termos do artigo 48.º, do Código de Processo Penal (crimes públicos), sem nos abstrairmos, no entanto, que casos há em tal impulso fica dependente da actividade de terceiros, mormente do exercício do direito de queixa dos ofendidos -crimes semi-públicos - ou de tal queixa acompanhada de uma intervenção mais incisiva no procedimento, veiculada através da constituição de assistente e posterior acusação particular - crimes particulares em sentido estrito (cfr. artigos 49.º e 50.º do Código de Processo Penal).

    3. O crime de contrafacção, imitação e uso ilegal de marca, previsto e punido pelo artigo 264.º, n.º 2, do Código de Propriedade Industrial, na redacção introduzida pelo Decreto-lei n.º 16/95, de 24 de Janeiro, e pelo qual o arguido se encontra acusado, reveste natureza pública.

    4. Actualmente, atendendo ao disposto no citado artigo 329.º do Código da Propriedade Industrial em vigor, o procedimento criminal está dependente do exercício do direito de queixa do ofendido, ou seja, da pessoa detentora da marca, titular dos interesses que a lei quis especialmente proteger com aquela incriminação (cfr. artigo 113.º do Código Penal), pelo que o actual crime de venda, circulação ou ocultação de produtos ou artigos previsto no artigo 324.º reveste agora natureza: semi-pública.

    5. Sucede que entendemos que a queixa é um mero pressuposto processual e as normas relativas ao direito de queixa têm natureza exclusivamente processual formal, sendo de aplicação imediata, para futuro, sem qualquer reflexo de ordem retroactiva, nos termos do artigo 5.º, n.º 1, do Código de Processo Penal.

    6. Não se referindo a queixa a um elemento típico do crime ou susceptível de o definir ou identificar em substância, enquanto conceito normativo descrito pela lei penal, mas reportando-se a uma condição de procedibilidade, não poderia a sentença recorrida ter aplicado as regras da sucessão de leis no tempo nos termos do artigo 2.º, n.º 4, do Código Penal, ou seja, como se se tratasse de alteração de um elemento constitutivo do tipo em que a lei nova se mostrasse mais favorável.

    7. A necessidade de queixa, condição objectiva de procedibilidade, não se configurava no momento em que o Ministério Público fez iniciar o presente procedimento criminal nem em qualquer momento poderia suscitar a intervenção de quem detinha legitimidade para tal, uma vez que no momento da dedução da acusação o crime mantinha a natureza pública.

    8. De facto, o procedimento criminal foi validamente promovido com base no auto de notícia da Guarda Nacional Republicana, na vigência da lei anterior, tendo o Ministério Público deduzido acusação contra o arguido, data na qual ainda não tinha entrado em vigor a alteração legislativa introduzida pelo novo Código da Propriedade Industrial, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 36/2003, de 5 de Março.

    9. Assim, o facto do procedimento criminal estar agora dependente do exercício de direito de queixa do detentor da marca, não pode afectar a validade da acusação deduzida, nem pode implicar a perda de legitimidade do Ministério Público para a prossecução do presente procedimento criminal.

    10. Donde, não tendo o Tribunal no despacho recorrido decidido no sentido ora defendido, tendo sim declarado extinto o procedimento criminal por ilegitimidade superveniente do Ministério Público, violou as disposições constantes nos artigos 5.º, n.º 1, e 48.º, ambos do Código de Processo Penal, e no artigo 264.º, n.º 2, do Código da Propriedade Industrial, aprovado pelo Decreto-lei 16/95, de 24 de Janeiro».

    * Notificado o arguido o arguido para os efeitos do art. 413.º, do CPP, não respondeu.

    Nesta instância o Ex.mo Senhor Procurador Geral-adjunto, emitiu douto parecer no sentido de que o recurso merece provimento.

    Cumprido que foi o disposto no art. 417.º, n.º 2, do CPP, o arguido não apresentou resposta.

    Colhidos os vistos legais e realizada a audiência cumpre decidir.

    Vejamos pois a factualidade dada como assente nos autos.

    Factos provados: «A.

    No dia 7 de Dezembro de 1998, pelas 16h 30m, numa banca de venda na Feira Semanal da Vagueira, sita na Vagueira, área da Comarca de Vagos, o arguido A... tinha exibidos, para venda ao público, diversos artigos de vestuário de várias marcas registadas no Instituto Nacional da Propriedade Industrial.

    B.

    A mercadoria em causa foi apreendida, como consta de fls. 28, sendo composta pelos seguintes artigos: - 54 (cinquenta e quatro) pares de calças que ostentavam a marca “Levi’s”, com um valor total presumível de Esc. 405.000$00; - 2...

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