Acórdão nº 1292/04.1TBCNT.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 24 de Abril de 2007

Magistrado ResponsávelH
Data da Resolução24 de Abril de 2007
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

ACORDAM OS JUÍZES QUE CONSTITUEM O TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA: A...

e mulher, B....

, residentes na Rua........., ....., Ourentã, Cantanhede, propuseram a presente acção, sob a forma de processo ordinário, contra “C...

”, sociedade por quotas, com sede em ....., Ourentã, Cantanhede, D....

, residente em ......, Mealhada, e E.....

, casado, residente em ........, Cantanhede, pedindo que, na sua procedência, os réus sejam condenados a pagar, solidariamente, aos autores a quantia de 28.891,26€, acrescida de juros de mora, à taxa legal, contados desde a data da citação para a presente acção, até efectivo e integral pagamento, alegando, para o efeito, e, em síntese, que, por escritura datada de 12 de Agosto de 1997, cederam à ré sociedade a exploração de um estabelecimento de restauração de que são donos, cujo recheio ficou a constar de documento anexado à respectiva escritura, servindo os outros réus como fiadores, sendo certo que os autores denunciaram o contrato, para o termo estipulado, ou seja, 31 de Agosto de 2002, recebendo, então, o estabelecimento, mas no qual faltavam muitos móveis e utensílios, e outros encontravam-se avariados, enumerando os bens, as despesas previstas e as operações de reparação e limpeza a realizar, em conformidade com o valor do pedido.

Na contestação, que apenas a ré D.... apresentou, esta aceita parte da matéria invocada na petição inicial, mas alega que o contrato só foi denunciado, em relação à ré sociedade, tendo sido elaborado, no final do mesmo, por ocasião da entrega do estabelecimento, um documento, em que a autora o aceitou, sem reservas, encontrando-se os bens em bom estado de conservação, salvo no que resulta do seu uso ordinário, desconhecendo se, eventualmente, faltam bens, se foram deteriorados, ou qual seja o seu custo, sendo certo, porém, que, logo no início do contrato, a ré sociedade entregou uma quantia aos autores, por estimativa, por conta da deterioração e desvalorização dos móveis, utensílios e máquinas do estabelecimento.

Alega ainda que a fiança não abrange a indemnização pretendida, mas apenas o pagamento do preço do contrato, para além da nulidade deste, nos termos do disposto pelo artigo 280°, do Código Civil, por não se encontrar determinada, à data da celebração do contrato.

Na réplica, os autores afirmam que a denúncia do contrato e os demais efeitos pretendidos não dependem da notificação da fiadora, negando ter recebido qualquer quantia, a título de desvalorização e deterioração dos móveis, utensílios e máquinas, acrescentando que a fiança obriga a tudo quanto consta do contrato e das suas renovações, inexistindo indeterminabilidade da mesma, pois que o contrato contempla o montante das dívidas objecto de garantia e as obrigações do devedor, impondo-se, portanto, que sejam julgadas improcedentes as excepções invocadas.

A sentença julgou a acção, improcedente por não provada, e, em consequência, absolveu os réus do pedido.

Desta sentença, os autores interpuseram recurso de apelação, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões: 1ª – Na douta sentença recorrida deram-se como não provados os pontos 1 a 13 (inclusive) e 15 a 20 (inclusive) da base instrutória e deu-se como provado o ponto 25 da mesma base.

  1. - São estes os concretos pontos de facto que os recorrentes consideram incorrectamente julgados pelo Tribunal "a quo" e que pretendem ver reapreciados e alterados com base nos depoimentos prestados na audiência de julgamento e demais elementos dos autos.

  2. - A convicção do Tribunal recorrido não tem qualquer suporte razoável, quer na gravação da prova, quer nos demais elementos constantes dos autos, nomeadamente na prova documental que não foi impugnada.

  3. - Há uma flagrante desconformidade entre os elementos de prova disponíveis e a decisão nos concretos pontos questionados.

  4. - Em relação aos documentos (originais e fotocópias) constantes dos autos bastará consultar as actas das audiências de julgamento para se constatar que a junção aos autos foi ordenada pelo próprio Tribunal recorrido, tendo sido facultada à recorrida o exercício do contraditório.

  5. – Ao não ter sido impugnada a veracidade da letra ou da assinatura de tais documentos, os mesmos têm a força probatória reconhecida pelo artigo 376° do Código Civil.

  6. - Quanto aos pontos 1 a 7 e 10 a 14 da base instrutória, o Tribunal recorrido deveria ter dado estes quesitos como provados face aos depoimentos supratranscritos das testemunhas F....

    , G...

    e H....

    .

  7. - Quanto aos pontos 8, 9.1, 9.2, 9.3, 9.4, 9.5, 9.6 e 10 a 20 da base instrutória, o Tribunal recorrido deveria ter dado estes quesitos como provados face ao depoimento supratranscrito da testemunha I...

    .

  8. - Quanto ao ponto 25 da base instrutória, o Tribunal recorrido deveria ter dado este quesito como não provado com base nos depoimentos das testemunhas supratranscritos e nos documentos juntos aos autos.

  9. - De resto há flagrante contradição entre a resposta negativa dada ao ponto 25 e a resposta dada ao ponto 24.

  10. - Ao decidir como decidiu, o Tribunal recorrido violou o disposto no artigo 376° do Código Civil, 653°, n°2, 659°, n°3 e 515° todos do Código de Processo Civil.

  11. - A decisão do Tribunal recorrido sobre a matéria de facto pode ser alterada com base no disposto nas alíneas a) e b) do artigo 712° do CPC.

    Não foram apresentadas contra-alegações.

    * Tudo visto e analisado, ponderadas as provas existentes, atento o Direito aplicável, cumpre, finalmente, decidir.

    As questões a decidir, na presente apelação, em função das quais se fixa o objecto do recurso, considerando que o «thema decidendum» do mesmo é estabelecido pelas conclusões das respectivas alegações, sem prejuízo daquelas cujo conhecimento oficioso se imponha, com base no preceituado pelas disposições conjugadas dos artigos 660º, nº 2, 661º, 664º, 684º, nº 3 e 690º, todos do Código de Processo Civil (CPC), são as seguintes: I – A questão da alteração da decisão sobre a matéria de facto.

    II – A questão da obrigação de indemnização pelos danos no locado.

    III – A questão da nulidade da fiança.

    I DA ALTERAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO Defendem os autores que devem considerar-se como não provados os pontos 1 a 13 e 15 a 20, inclusive, e como provado o ponto 25, todos da base instrutória, por entenderem que foram, incorrectamente, julgados, pelo Tribunal "a quo", pretendendo a sua reapreciação e alteração, com base nos depoimentos prestados na audiência de julgamento e demais elementos existentes nos autos.

    Saliente-se, desde logo, que os autores pretendem uma alteração radical das respostas à matéria de facto, porquanto querem ver reapreciada, no sentido de virem a obter uma resposta diversa da que foi proferida pelo Tribunal «a quo», a factualidade de vinte dos vinte e sete números da base instrutória.

    Neste particular, registe-se que, segundo o texto preambular do DL nº 39/95, de 15 de Fevereiro, «a garantia do duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto nunca poderá envolver, pela própria natureza das coisas, a reapreciação sistemática e global de toda a prova produzida em audiência – visando apenas a detecção e correcção de pontuais, concretos e seguramente excepcionais erros de julgamento, incidindo sobre pontos determinados da matéria de facto, que o recorrente sempre terá o ónus de apontar claramente e fundamentar na sua minuta do recurso».

    Porém, independentemente da natureza orientadora do preâmbulo do diploma em causa, o que é facto é que o legislador da Reforma do Processo Civil de 1995/96 não consagrou, no texto legal, qualquer norma...

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